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2 REGULAÇÃO DO PREÇO E DA ESTRUTURA TARIFÁRIA NO

2.2 Regulação da Estrutura Tarifária

2.2.2 Discriminação Indireta ou de 2º Grau

2.2.2.1 Tarifa em Duas Parcelas (Two-Part Tariff)

De acordo com Borrmann (2003) e McAfee (2006), two-part tariff consiste na cobrança de uma parcela fixa (tarifa de acesso ou entrada) tarifa que permite o consumidor ter acesso ao serviço ou ao produto e de uma parcela que varia com a quantidade consumida (tarifa de uso) os consumidores pagam o mesmo preço unitário (R$/m³) por cada unidade adicional consumida46.

Lewis (1941) sugeriu que os monopólios naturais, em que a equalização preço e custo marginal não é aconselhável, deveriam utilizar two-part tariff, porque essa estrutura satisfaz as metas de eficiência econômica e de cobertura dos custos da firma monopolista. A parte variável da tarifa refletiria o custo marginal e a parte fixa representaria a receita complementar necessária para cobertura dos custos.

45 O caso geral de uma precificação não linear pode ser representado pela seguinte equação: D =

D(X), onde D (despesa total) e X (quantidade consumida) são variáveis, D(.) é um operador funcional e D(X) é uma função contínua e diferenciável. Nesse caso, o preço médio (D/X) e o >

a uma taxa decrescente). Além disso, é possível que uma parcela da despesa (F) seja independente da quantidade consumida: D = F + D(X).

46 De acordo com Lewis (1949, p. 50 apud two-part tariff was first proposed by Dr John Hopkinson in 1892 with reference to electricity pricing in England

Segundo Whittington et al. (2002, p. 8), as duas parcelas podem ser utilizadas de diversas maneiras: a parcela fixa pode ser positiva ou negativa (rebate) e a parcela relacionada com o consumo pode ser crescente ou decrescente. Segundo Dandy et al. (1997, p. 125), a tarifa em

a fixed charge plus a rate per unit which is the same for all levels of consumption [...] is common throughout Australia and in many other countries

Em seguida, Coase (1946), assumindo que a demanda para ter direito ao serviço ou ao produto é independente da respectiva tarifa de acesso47, mostrou que a estrutura two-part tariff pode ser desenhada de tal forma que a combinação precificação first-best e subsídio pode ser alcançada. O nível de consumo ótimo é atingido pela equalização tarifa de uso e custo marginal, enquanto o orçamento equilibrado da firma, quando o custo é mínimo, é garantido pelas receitas obtidas pela tarifa de acesso. Nesse caso, a tarifa de acesso serve apenas como uma transferência de fundos do consumidor para a firma regulada, sem impacto na quantidade consumida. Como resultado, a firma prefere produzir de maneira eficiente, pois ela perderia dinheiro se não operasse no patamar de custo ótimo48.

Conforme Ng & Weisser (1974, p. 337), a tarifa em duas parcelas é um mecanismo bem conhecido para elevar a eficiência da precificação de monopólios estatais quando o custo médio é decrescente49. Além disso, diversos modelos (Ng & Weisser, 1974; Leland & Meyer, 1976; Spence, 1980; Schmalensee, 1981) têm mostrado que uma autoridade pública com restrição orçamentária pode aumentar o bem-estar da sociedade através da utilização apropriada de uma tarifa em duas parcelas.

Todavia, Brown & Sibley (1986, p. 67) lembram que a igualdade entre a tarifa de uso e o custo marginal pode se efetivar num nível muito baixo, implicando uma tarifa de acesso bastante elevada para viabilizar o orçamento equilibrado da firma. Nesse caso, uma parcela expressiva de consumidores não teria possibilidade de participar do mercado, dada a alta tarifa de acesso. Esse problema pode ser mitigado se a tarifa de acesso variar de acordo

47 No serviço de coleta de esgoto, a hipótese de Coase (1946) é bastante razoável, vez que, em

municípios onde há a cobrança de uma taxa de esgoto, os domicílios são conectados à rede de forma compulsória, em decorrência dos impactos ambientais e de saúde pública.

48 E Coase Result

49 No entanto, a tarifa em duas parcelas também pode ser empregada em indústrias de bens

duráveis nos casos em que a propriedade e o consumo podem ser precificados ou tributados

com a disponibilidade a pagar de cada consumidor50. Mesmo assim, fica evidente a existência de um trade-off entre a precificação eficiente do consumo e a maximização do número de consumidores com acesso ao serviço51.

Do ponto de vista da indústria de água e esgoto, Altmann (2007, p. 19) cita as seguintes desvantagens na equalização tarifa de uso e custo marginal: flutuações frequentes da tarifa de uso provocam insatisfações nos consumidores com repercussões políticas negativas; os fundos para investimento em capacidade produtiva adicional podem estar disponíveis em períodos de capacidade ociosa, fazendo com que os consumidores questionem a necessidade da elevação de tarifa; e existência de riscos consideráveis na manutenção da oferta igual ou próxima do nível de demanda.

Em decorrência da parcela fixa, essa estrutura tarifária proporciona ao consumidor a obtenção de descontos decrescentes (preço médio despesa dividida pela quantidade consumida decrescente) por quantidades crescentes de consumo (Gráfico 2.3), o que pode gerar estímulos ao consumo não é recomendável níveis de consumo próximos de

50 Numa indústria muito intensiva em capital, a maior parcela dos seus ativos é depreciada no

longo prazo. Desse modo, a tarifa de uso deveria ser igual ao custo marginal de longo prazo e a tarifa de acesso deveria ser variável de acordo com a disponibilidade a pagar do consumidor. Oi

A discriminating two-part tariff is equivalent to P -

degree price discrimination structure, which globally maximizes monopoly profits by extracting all

consumer surpluses. A truly discriminatory two-part tariff is difficult to implement and would

probably be illegal

51 Brown & Sib Coase Result

However, if this entry fee would cause some consumer types to drop out of the market, the Coase two-part tariff would no longer be optimal Todavia, eles afirmam (p. 97) que em mercados onde a elasticidade-preço da

demanda da tarifa de acesso é inelástica, como é o caso da indústria de energia elétrica, não é

Whether nonuniform price structures ought to be simple two-part tariffs or complex multipart tariffs depends on the elasticity of consumer participation. In the case of a market such as residential electricity consumption, it is almost inconceivable that any reasonable entry fee will cause any consumers to exit the market. In such a case, the Coase two-part tariff is the most efficient

zero52. Para os grandes consumidores, essa estrutura promove ganhos de escala, mas ela pode gerar impactos consideráveis em regiões com significativas assimetrias de renda.

Quantidade (m³)

Gráfico 2.3 Two-Part Tariff

Preço Médio

A despesa do consumidor é composta de uma parcela fixa, que permite a acessibilidade ao produto ou ao serviço, e de uma parcela que cresce com a quantidade consumida (Gráfico 2.4) 53.

52 Na indústria de telecomunicação, a estrutura tarifária das chamadas locais na telefonia fixa

brasileira (horário normal do Plano Básico) é um exemplo de two-part tariff: a assinatura básica (parcela fixa) dá direito ao consumidor ter acesso à rede de telefonia e a parcela variável (R$/minuto) está relacionada com o tempo da ligação. Obviamente que, nesse caso, a demanda para ter direito à linha de telefonia fixa depende do preço a ser pago pela assinatura básica (tarifa de acesso), a qual possui uma elasticidade-preço específica.

53 A despesa (D) do consumidor é dada pela parcela fixa (F) mais a parcela variável (PX): D = F +

PX. O preço méd

possua dois bens: água (Xa) e outros bens e serviços (Xb é o numerário), a linha orçamentária é dada por: se Xa = 0, então Xb = R (renda do consumidor); e se Xa > 0, então Xb = R F PXa.

Quantidade (m³)

Gráfico 2.4 Two-Part Tariff

Conta