• Nenhum resultado encontrado

2.7 Conceituação e taxonomia de patologias em SPHS

2.7.2 Taxonomia das patologias em SPHS quanto à manifestação

Outra forma de classificar as patologias em SPHS é quanto à manifestação. Esta, mais sintética que a categorização por natureza anterior, é particularmente útil na classificação dos problemas que mais afetam os SPHS e na sua associação às respectivas origens. Quanto à forma de manifestação, estas patologias são simplesmente classificadas como manifestas e não manifestas. As patologias não manifestas podem ser latentes (ou em curso) e potenciais. VÍCIOS  DEFEITOS  APARENTES  OCULTOS  problemas de  operação e  manutenção  ‐ de planejamento  ‐ de execução  ‐  operacionais   ‐ gerenciais  normativas, regulatórias,  legais, de boas práticas  Afetam ou  ameaçam afetar a  segurança ou saúde  (PATOLOGIAS  POTENCIAIS)  Afetam o  desempenho ou  tornam o produto  inadequado  ENDÓGENAS:  problemas de  projeto, execução,  especificações e  componentes  constatados no  prazo de garantia  EXÓGENAS:  danos causados  por terceiros ‐  naturais: de causas  naturais  ‐  funcionais: de agentes  de degradação  VÍCIOS CONSTRUTIVOS  Prejuízos materiais    a terceiros / gastos  para reabilitação  REDIBITÓRIOS:  Diminuem o valor do  produto ou tornam  impróprio para uso; se  de prévia ciência:  desconto ou anulação  do contrato  Ostensivos,  facilmente  detectáveis   (PATOLOGIAS  MANIFESTAS)  Aparecem após a  entrega do edifício;  apenas perceptíveis  por especialistas  (PATOLOGIAS  LATENTES) 

a) patologias manifestas

São todas aquelas cujas conseqüências físicas são perceptíveis através dos sentidos humanos, neste caso ditas “manifestações patológicas”. Segundo Ilha (2009), quando afetam os SPHS de uma edificação, apresentam sintomas característicos, tais como:

• vazamentos a partir de tubulações, componentes e equipamentos; • mau cheiro proveniente de desconectores, como ralos e sifões;

• oscilação temporal da temperatura da água aquecida oriunda de misturadores; • oscilações de pressão e vazão das águas fria e quente durante o uso de aparelhos

sanitários dotados de misturadores;

• refluxo de esgoto a partir de desconectores, acompanhados ou não de ruídos de borbulhamento e odores fétidos característicos;

• retorno de espuma através de ralos e sifões;

• refluxo de águas pluviais em sacadas e varandas sob chuvas mais intensas; • ruídos transmitidos a partir de vibrações de bombas centrífugas;

• ruídos devidos a escoamentos líquidos e durante a utilização de aparelhos sanitários.

Por definição, constituem patologias manifestas nos SPHS as anomalias construtivas em geral que os acometem (endógenas e exógenas – naturais ou funcionais), os vícios construtivos aparentes e as falhas, já suficientemente exemplificados neste trabalho.

b) patologias latentes ou em curso

São aquelas já presentes nos SPHS, porém, ainda sem sintomas aparentes, ou seja, sem manifestações patológicas ostensivas, perceptíveis pelos sentidos. Disto decorre que, para esta classe de patologias é incorreto referir-se a manifestações patológicas. Entretanto, pela própria definição, patologias latentes são aquelas existentes nos sistemas prediais hidráulicos e sanitários do edifício cuja intensidade dos sintomas ainda é insuficiente para a percepção por meio dos sentidos humanos; algumas são detectáveis por meio de equipamentos apropriados.

Este fato inexoravelmente um dia ocorrerá, ainda que transcorram muitos anos para tanto; daí a designação alternativa “patologias em curso”. Isto porque algumas patologias nesses sistemas da edificação, pela própria natureza, têm uma progressão ou evolução muito lenta. Este é o caso do processo de corrosão das tubulações de distribuição de gás combustível de aço preto (sem zincagem superficial por imersão a quente – a galvanização) embutidas nas alvenarias ou em contrapisos. Como o gás natural é seco, ou seja, praticamente isento de umidade em sua composição, e o GLP apresenta insignificante teor de umidade (na forma de vapor de água), a oxidação das superfícies internas em contato direto com estes gases é pouco significativa. Diversamente da água, que porta oxigênio no ar nela dissolvido na forma de bolhas microscópicas e que constitui agente natural de degradação do material por oxidação superficial, por pite, etc., estes gases não o possuem. Em sua composição característica, praticamente não há produtos agentes de degradação do aço em quantidade necessária para alimentar a corrosão em grau suficiente para constituir uma patologia.

Sobre as superfícies internas das tubulações de aço preto forma-se uma delgada camada de óxido de ferro quando a tubulação ainda está em contato com o ar atmosférico, antes de ser posta em uso definitivo. Após o comissionamento, o processo de espessamento desta camada estaciona e o óxido aí formado em nada interfere com o gás conduzido. Entretanto, tal fenômeno pode não ocorrer na superfície externa dos trechos embutidos em contrapisos e nas alvenarias, ou ainda nos trechos diretamente enterrados desprovidos de proteção superficial adequada. Dependendo das condições de exposição e presença, ainda que eventual, de agentes de degradação atuando sobre as superfícies desses trechos, pode estar em curso um lento processo de corrosão superficial externa. Isto pode acontecer, por exemplo, em trecho de tubulação de aço preto condutora de gás combustível correndo embutido no contrapiso de uma cozinha, cujos moradores têm por hábito sanitário a lavagem frequente do piso. Parte da água empregada é inevitavelmente absorvida pelos rejuntes, supostamente permeáveis, das lajotas cerâmicas de piso.

A infiltração assim descrita acaba por umedecer a argamassa de assentamento, solubilizando em parte sais alcalinos dela componentes, constituindo o agente de degradação que atuará no processo oxidativo da tubulação. Neste caso, é breve o tempo de contato da água infiltrada com a tubulação. Isto porque, acabada a lavagem, a umidade permeada tende a se evaporar pelos mesmos rejuntes.

Consequentemente, a agressão a cada vez é pequena e o tempo requerido para ocorrer a manifestação da patologia (o vazamento de gás) pode se estender por dezenas de anos.

Este caso, no entanto, exemplifica uma patologia latente, a saber, o lento processo de corrosão superficial inexoravelmente ocorrendo, mas ainda insuficiente para permitir a manifestação patológica, a saber, o característico cheiro de gás combustível indicativo do vazamento.

Uma solução preventiva está no emprego de tubulação menos suscetível aos agentes de degradação presentes, como tubos e conexões de cobre ou os tubos e conexões plásticos multicamada. Outra medida preventiva reside no prévio envolvimento da tubulação a embutir no contrapiso com fita adesiva protetora apropriada, de forma helicoidal com recobrimento adequado, procedimento comumente dito enfitamento (Figura 2.41).

Figura 2.41 – Tubulações de aço embutidas em contrapiso sem proteção superficial (esq.), enfitamento protetor (centro) e tubulação de gás enfitada na parte enterrada (dir.). (Fonte (centro): ALTOQI, [2005]) A propósito, a ação agressiva do meio sobre as superfícies externas de tubulações de aço é bem mais intensa e rápida quando diretamente enterradas sem qualquer proteção superficial. Isto ocorre porque a presença de umidade é mais freqüente, assim como a sua quantidade, intervindo também o pH do solo e composição salina característica, fatores aceleradores do processo de corrosão superficial. A Figura 2.42 exemplifica este caso. Por definição, constituem patologias latentes ou em curso os vícios construtivos ocultos, redibitórios ou não.

Figura 2.42 – Corrosão e vazamento de gás em tubulações de aço enterradas sem proteção superficial (Fonte: Conjunto Habitacional Diadema D – CDHU)

c) Patologias potenciais

São aquelas assim já consideradas neste texto, a exemplo das não conformidades e dos defeitos, ainda não manifestas e nem latentes, representando, todavia, risco potencial à vida, à segurança ou à saúde dos ocupantes e da própria edificação, com alguma probabilidade ou risco de se manifestarem; por isto, por vezes, são ditas “riscos potenciais”.

A propósito, o CIB (1993) adverte que “segurança” não pode ser observada diretamente. O aspecto segurança nos sistemas prediais hidráulicos e sanitários deve ser preferencialmente expresso em termos de “probabilidade de ocorrência” de uma dada patologia. Além disto, esta probabilidade deve estar associada a um nível aceitável de risco. Este organismo entende que o conceito de risco deve ser compreendido não como uma casualidade, incidente ou erro (no sentido de escolha ou decisão imprópria), mas deve ser associado a um processo estocástico (por exemplo, uma função de distribuição de probabilidade).

Entretanto, gestão de riscos e análise probabilística de riscos são assuntos que transcendem os propósitos deste trabalho, apesar de indubitavelmente se relacionarem com a ocorrência de patologias construtivas.

Com referência aos SPHS de um dado edifício, um gestor de riscos está voltado para a identificação, análise, estimação, avaliação e controle dos respectivos riscos com vistas à determinação das conseqüências e responsabilidades, por exemplo, para efeito de estipular o valor de prêmio de seguro. Já o investigador de patologias neste caso está preocupado com a proposição de intervenções preventivas que eliminem ou reduzam a possibilidade de sua ocorrência.

Em especial, constituem patologias potenciais todas as não conformidades relacionadas à proteção sanitária e prevenção da contaminação da água potável nas edificações, uma vez que representam ameaça à saúde e à vida dos usuários. A norma NBR 5626:1998 (ABNT, 1998a), por exemplo, trata do assunto ao menos nas seguintes seções e artigos:

• 5.2.4 Preservação da potabilidade em reservatórios (p. 9); • 5.4 Proteção sanitária da água potável (p. 12);

• 5.4.3 Proteção contra o refluxo de água (p.13);

• 5.4.4. Proteção contra interligação entre água potável e não potável (p.14); • Anexo B (normativo): Verificação da proteção contra a retrossifonagem em

dispositivos de prevenção ao refluxo (p. 34).

Exemplos deste gênero de patologias, considerando apenas os sistemas prediais de água fria, são por demais abundantes. Envolvem conceitos técnicos importantes, como conexão cruzada, contaminação da água potável por microorganismos potencialmente patogênicos, retrossifonagem, separação atmosférica, dispositivos mecânicos de prevenção ao refluxo, etc., cujo detalhamento seria bastante relevante. Ficam, porém, como sugestão para um estudo acadêmico específico, na forma de futura dissertação ou tese. A sua exploração neste trabalho, a despeito da relevância do tema e das correspondentes consequências patológicas, não será feita por causa da amplitude envolvida e da profundidade que exigem.

Apenas a título de exemplificação de uma patologia potencial, que representa risco à segurança, à integridade ou à vida dos ocupantes do edifício, segue uma relacionada a equívoco na concepção do projeto de um sistema predial de água quente, no tocante ao posicionamento inadequado de aquecedor de acumulação elétrico horizontal num sobrado.

Para a compreensão da patologia potencial por trás de uma não conformidade, é antes necessário recordar que um aquecedor de água por acumulação tem por característica de funcionamento aquecer gradualmente a água armazenada em seu interior. Para tanto, a fonte energética se situa na porção inferior do tambor, região de admissão da água fria, que, ao ser aquecida, tende a subir por diferença de densidade e se acumular no alto, de onde sai para abastecer os pontos de utilização a jusante (Figura 2.43).

Figura 2.43 – Componentes de aquecedores de acumulação vertical (a gás – esq.) e horizontal (elétrico – dir.) (Fonte: TÉCHNE, 2006)

Consequentemente, ocorre uma estratificação natural na temperatura da água armazenada, sempre maior no topo do tambor. Em razão da própria geometria característica, a estratificação é mais expressiva em aquecedores verticais do que nos horizontais.

A norma técnica NBR 7198:1993 determina que “todo aquecedor de acumulação alimentado com água fria por gravidade, a partir de um reservatório elevado, deve ter o seu nível superior necessariamente abaixo da cota inferior da respectiva saída de alimentação do reservatório” (ABNT, 1993, p. 4), condição ilustrada na Figura 2.44.

Figura 2.44 - Aquecedor de acumulação com o topo situado abaixo da saída de alimentação do reservatório (Fonte: ALTOQI, [2007])

Nota-se na figura a existência de um tubo-respiro, derivado da tubulação de alimentação de água fria para o aquecedor. Caso a prescrição normativa mencionada não seja observada, caracterizando uma não conformidade, havendo diminuição do nível d’água dentro do reservatório, pelo princípio de vasos comunicantes, haverá tendência de igual abaixamento do nível de água dentro do tambor do aquecedor (Figura 2.45).

Figura 2.45 - Aquecedor de acumulação com o topo situado acima da saída de alimentação do reservatório (Fonte: ALTOQI, [2007])

Isto propiciará a vaporização da água na porção mais elevada do tambor, onde se encontra sob temperatura mais elevada, havendo aí acumulação de vapor. Isto ocorrerá se nenhum ponto de utilização de água quente a jusante estiver aberto e alimentação de água fria ao aquecedor for indevidamente dotada de válvula de retenção, impeditiva do refluxo de água em direção ao reservatório, ou com registro de gaveta ou esfera fechado. Aliás, a presença desta válvula é vedada pela norma citada quando a alimentação de água fria por gravidade do aquecedor não for dotada de tubo-respiro (ABNT, 1993, p. 4).

A consequência é que, havendo falha no termostato responsável pela desativação da fonte energética, a água dentro do aquecedor irá passar para a fase vapor, exercendo pressão sobre o tambor. Se este for apenas resistente a baixas pressões (por exemplo, 20 kPa), estará sujeito a explodir.

Portanto, no exemplo descrito, a não conformidade (aquecedor de acumulação com o topo situado acima da saída de alimentação do reservatório) está vinculada a uma patologia potencial (a explosão do tambor do aquecedor) e suas consequências funestas. A patologia potencial apontada, neste caso, constitui ameaça à vida, à segurança ou à saúde dos ocupantes e da própria edificação.

Compete observar que o risco ou probabilidade desta patologia potencial tornar-se manifesta, ou seja, de ocorrer, é reduzida, uma vez que, para isto, várias condições têm de se verificar simultaneamente, a saber:

I. aquecedor de acumulação com o topo situado acima da saída de alimentação do reservatório;

II. inexistência de tubo-respiro derivado da tubulação de alimentação de água fria para o aquecedor;

III. diminuição do nível d’água dentro do reservatório;

IV. existência de válvula de retenção ou de registro de gaveta ou esfera fechado na tubulação de alimentação de água fria para o aquecedor;

V. falha no termostato responsável pela desativação da fonte energética; VI. aquecedor de baixa pressão.

Disto se conclui que, no exemplo apresentado, o risco associado é extremamente baixo, uma vez ser pouco provável a ocorrência concomitante de todos os fatores apontados. Mesmo estando correta esta conclusão, a condição de vulnerabilidade persiste na medida da ocorrência da não conformidade e existência da patologia potencial associada. Apenas para efeito de constatação de que situações pouco prováveis de ocorrer sempre têm uma probabilidade de ocorrer, mesmo que pequena, seguem-se fotos da explosão de aquecedor de acumulação com tambor de fibra de vidro, nas condições descritas (Figura 2.46).

Figura 2.46 – Efeitos da explosão de aquecedor de acumulação de baixa pressão com tambor de fibra de vidro (Fonte: Acervo Ad Fiducia Avaliações e Perícias S/C Ltda., Joinville – SC, 2007)

Tanto o reservatório quanto o aquecedor estavam alojados no interior de ambiente técnico exclusivo, constituindo o volume construtivo destacado acima do telhado da cobertura.

Esta explosão comprova a assertiva que há, em geral, um fundamento atrás de uma prescrição, critério ou requisito de desempenho presente em norma técnica, geralmente associado a alguma forma de patologia, seja esta manifesta, latente ou potencial.