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Tecnologias digitais de informação e comunicação no ensino de Matemática

2 ASPECTOS TEÓRICOS DO TRABALHO

2.2 Tecnologias digitais de informação e comunicação no ensino de Matemática

Os inúmeros artefatos tecnológicos que nos cercam, mostram o quanto as tecnologias estão presentes em nosso dia a dia, não estamos falando apenas de tecnologias digitais, como: televisores, smartphones e computadores. Para Almeida (2016, p. 226) a presença maciça das tecnologias digitais em nosso cotidiano e as mudanças sociais por elas causadas, nos remetem quase que instantaneamente a associar tecnologia a aparelhos eletroeletrônicos. Segundo Kenski (2007, p. 15) as tecnologias são tão antigas quanto o ser humano, as necessidades encontradas pelo homem em todos os tempos fizeram surgir as mais diversas tecnologias. Ao discorrer sobre a faculdade de projetar da espécie humana, Pinto (2005, p. 54) destaca que a essência do projeto repousa sobre a forma como o homem se propõe a desenvolver novas possibilidades de existência para si. Enquanto as espécies animais irracionais promovem a sua adaptação biológica como forma de sobrevivência, o ser humano realiza a transformação do

ambiente ao seu redor, em busca de novas condições que possam garantir a sua existência. Segundo Pinto (2005), é importante observar que:

O poder da ação que o homem manifesta sobre a natureza distingue-se do possuído pelos demais seres vivos por se exercer em consequência da capacidade de projetar. Mas, ao contrário do que julgam as doutrinas idealistas, que transformam essa atividade num mistério existencial, o projeto na origem é pura e simplesmente a percepção mental das possibilidades de conexão entre as coisas. Cada conexão não é imediatamente dada, mas sugerida, pensada antecipadamente pelo organismo que adquiriu a faculdade da representação abstrativa em grau suficiente para se destacar do contato sensível, atual e direto com o mundo e para manejar as ideias às coisas, de forma a estabelecer entre elas relações tais que as fazem configurar imediatamente um corpo, um maquinismo, uma instituição ou um artefato ainda não existente, a ser fabricado, em consequência, de acordo com o “projeto”. (PINTO, 2005, p. 55).

Desta forma, o homem altera a realidade ao seu redor, por intermédio da construção intencional de produtos, que anteriormente projetados, passam a existir graças a habilidade humana de transformar o meio em que vive.

De acordo com Kenski (2007, p. 15), a sobrevivência humana durante a Idade da Pedra só foi possível graças a sua engenhosidade e astúcia, tendo em vista, a inferioridade física do homem quando comparada aos grandes animais e as manifestações da natureza. A capacidade de raciocinar permitiu a espécie humana identificar novas possibilidades, que aliadas ao conhecimento adquirido deram origem a diversos equipamentos, recursos, processos, que podemos chamar de tecnologias. Kenski (2007) mostra que,

Na relação com a natureza, a espécie humana modificou-se e criou formas de adaptação aos ambientes mais inóspitos. Para garantir a sobrevivência, roupas, habitações, alimentos e armas foram sendo criados, descobertos, utilizados e transformados. Organizados em tribos nômades, os homens primitivos dominavam as técnicas de caça e de criação de objetos de pedra. (KENSKI, 2007, p. 20).

O desenvolvimento tecnológico propicia a elaboração e construção de novas técnicas e produtos que contribuem para melhorar a qualidade de vida do ser humano, mais do que isso, ele altera o comportamento individual e coletivo. Ainda segundo Kenski (2007, p. 21) “o homem transita culturalmente mediado pelas tecnologias que lhe são contemporâneas. Elas transformam sua maneira de pensar, sentir, agir.” O que é exemplificado pela autora ao analisar as implicações sociais resultantes da invenção da roda, dentre elas podemos citar: a

transformação na forma de deslocamento, a redefinição da produção, a comercialização, o armazenamento de produtos além de outras descobertas.

As tecnologias não se resumem a equipamentos e aparelhos, a linguagem, por exemplo, é um tipo específico de tecnologia, que não se apresenta necessariamente por meio de uma máquina. Segundo Kenski, (2007, p. 23), “a linguagem é uma construção criada pela inteligência humana para possibilitar a comunicação entre os membros de um determinado grupo social.” Essa mesma autora conceitua tecnologia como o “conjunto de conhecimentos e princípios científicos que se aplicam ao planejamento, à construção e à utilização de um equipamento em um determinado tipo de atividade [...]” (Idem, 2007, p. 24). Para ela, a presença das tecnologias é tão intensa em nosso cotidiano, que nem se percebe mais que não são coisas naturais, a título de exemplo, podemos citar alguns como: lápis, cadernos e canetas; itens que foram projetados para nos auxiliar durante a aprendizagem.

As tecnologias atualmente se referem principalmente a produtos e processos que se relacionam com os conhecimentos da eletrônica, da microeletrônica e das telecomunicações (Idem). Os artefatos tecnológicos interferem em nossa forma de: pensar, agir, sentir, relacionar socialmente e adquirir conhecimentos; essa nova sociedade “[...] caracteriza-se pela personalização das interações com a informação e as ações comunicativas.” (KENSKI, 2012, p. 24).

De acordo com Valente (1993, p. 4), a utilização de computadores na educação tem suas origens no ensino por meio de máquinas quando, em 1924, Sidney Pressey desenvolveu uma máquina para corrigir testes de múltipla escolha. Em 1950, Burrhus Frederic Skinner, professor da Universidade de Havard, nos Estados Unidos, apresentou um aparelho para ensinar utilizando o conceito de instrução programada. Houve, por parte do governo Norte Americano, durante a década de 1960, um investimento significativo de recursos para o desenvolvimento de diversos programas fazendo surgir a instrução auxiliada por computador:

Computer-aided instruction (CAI). O custo de um computador ainda era bastante elevado, o

que inviabilizava a aquisição dessas máquinas pelas escolas, o que só veio a ocorrer com o surgimento dos microcomputadores. De acordo com Valente (1993),

Além da diversidade de CAIs9 a ideia de ensino pelo computador permitiu a elaboração de outras abordagens, onde o computador é usado como ferramenta no auxílio de resolução de problemas, na produção de textos,

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Sigla para Computer-aidedinstruction, traduzido por Valente (1993) como instrução auxiliada por

manipulação de banco de dados e controle de processos em tempo real. (VALENTE, 1993, p. 5).

Essas novas modalidades de uso do computador indicavam uma nova direção, diferente daquela que tinha suas raízes na máquina de ensinar; ele passa agora a ser visto como uma ferramenta educacional, que pode aperfeiçoar e permitir mudanças na qualidade do ensino.

Segundo Valente e Almeida (1997, p. 1), foi ainda na década de 1970 que teve início a história da informática no Brasil, o que ocorreu por meio de algumas experiências ocorridas na UFRJ, UFRGS e UNICAMP. Em sua obra, Borba, Silva e Gadanidis (2018, p. 17) apresentam o uso das tecnologias digitais na Educação Matemática no Brasil sobre uma perspectiva que aponta quatro fases, expondo as particularidades e semelhanças entre elas.

A primeira fase ocorreu na década de 1980, expressões como Tecnologias

Informáticas (TI) e tecnologias computacionais eram utilizadas para se referir ao uso do

computador e de softwares. De acordo com Borba, Silva e Gadanidis (2018, p. 22), essa fase é caracterizada basicamente pela utilização do software LOGO10, que ocorreu em meados da década de 80, o uso pedagógico do LOGO ressaltava as relações entre pensamento matemático e linguagem de programação. Durante a mesma década pesquisadores se dedicavam em busca de novas possibilidades de uso das TI na alteração de práticas didáticas e pedagógicas. A busca por essas mudanças fica evidente em Valente (1993), quando nos diz que:

A mudança da função do computador como meio educacional acontece juntamente com um questionamento da função da escola e do papel do professor. A função do aparato educacional não deve ser a de ensinar mas sim a de promover o aprendizado. Isto significa que o professor deixa de ser o repassador do conhecimento – o computador pode fazer isso e o faz muito mais eficientemente do que o professor – para ser o criador de ambientes de aprendizado e facilitador do processo pelo qual o aluno adquire conhecimento. (VALENTE, 1993, p. 5).

A proposta era que a utilização dos computadores em sala de aula permitisse novas abordagens para educação, o que contribuiria para a formação de sujeitos reflexivos, capazes de utilizar as tecnologias em diversas situações. Borba, Silva e Gadanidis, (2018, p. 25) destacam que durante essa fase “[...] o papel atribuído as tecnologias era o de catalisador para a mudança pedagógica.”

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A segunda fase iniciou-se ainda na primeira metade da década de 1990, quando ocorreu a popularização do uso dos computadores, nesse período também surgem inúmeros programas para computadores voltados para educação (Winplot, Fun, Cabri Géomètre, dentre outros) e também cursos de capacitação para docentes; esses softwares tinham como principal característica: o caráter experimental, os aspectos visuais e o dinamismo. De acordo com Borba, Silva e Gadanidis, (2018, p. 27), “em geometria dinâmica (GD), o dinamismo pode ser atribuído às possibilidades em podermos utilizar, manipular, combinar, visualizar e construir virtualmente objetos geométricos, permitindo traçar novos caminhos de investigação.” Diferenciar desenho de construção geométrica não fazia sentido, a partir de elaborações que utilizavam lápis e papel, a utilização dos softwares para o ensino de geometria permitiu que essa distinção ocorresse. Por meio deles era possível visualizar que uma construção geométrica mantinha suas propriedades inalteradas, mesmo quando era movimentada, fato que não se repetia quando desenhos geométricos eram submetidos a mesma situação. Utilizar

softwares de geometria dinâmica para construir objetos geométricos proporciona um ambiente

favorável a investigação Matemática.

A terceira fase ocorreu no fim do século XX, por volta do ano de 1999, com a chegada da internet, sua utilização na educação se deu principalmente como fonte de informação, canal de comunicação entre alunos e professores, para a formação continuada de alunos e professores, por meio de cursos a distância (BORBA; SILVA; GADANIDIS 2018, p. 35). Nesse período surgem expressões como tecnologias da informação e Tecnologias da

Informação e Comunicação (TIC). Em sua obra Borba, Silva e Gadanidis (2018), ressaltam

que:

Pesquisas sugerem que diferentes interfaces moldam a natureza de comunicação e da interação entre os usuários (estudantes e/ou professores e pesquisadores) e, consequentemente, a natureza das ideias matemáticas é transformada em ambientes online ou ambientes virtuais de aprendizagem [...] (BORBA; SILVA; GADANIDIS, 2018, p. 36).

Propiciar um ambiente que permite a interação entre os participantes favorece a aprendizagem. Borba e Penteado (2012, p. 76) alertam sobre a importância de que os cursos a distância superem as barreiras físicas que separam seus participantes, e consigam pensar coletivamente sobre determinados problemas, os autores ainda criticam os cursos a distância que utilizam a internet apenas como um banco de dados, e não oportunizam uma relação síncrona entre os estudantes.

Atualmente vivenciamos a quarta fase das tecnologias digitais em Educação Matemática. Segundo Borba, Silva e Gadanidis (2018, p. 39), o início desse período ocorreu no ano de 2004, com o surgimento da internet rápida, o que proporcionou uma melhor qualidade na conexão, o aumento dos recursos disponíveis via internet e o aperfeiçoamento da comunicação online. Nessa fase a expressão Tecnologias Digitais (TD) é bastante empregada para tratar dos recursos tecnológicos utilizados, algumas características que se destacam nesse momento são: a utilização de plataformas e repositórios, o uso de tecnologias móveis, maior interatividade, utilização das redes sociais, além da produção e do compartilhamento online de vídeos. De acordo com Borba, Silva e Gadanidis (2018), existe uma continuidade entre as fases:

É importante destacarmos que o surgimento de cada fase não exclui ou substitui a anterior. Há certa „sobreposição‟ entre as fases, elas vão se integrando. Ou seja, muito dos aspectos que surgiram nas três primeiras fases são ainda fundamentais dentro da quarta fase. Muitas das tecnologias „antigas‟ ainda são utilizadas. (BORBA; SILVA; GADANIDIS, 2018, p. 41).

A integração e a sobreposição mencionadas anteriormente torna-se mais evidente quando analisamos a terceira e a quarta fase; de forma que, estabelecer um marco que consiga realizar a separação entre as duas fases é algo bastante arriscado.

Ao discutir a posição que o computador deve ocupar nas práticas educativas, Borba, Silva e Gadanidis (2018, p. 45) destacam que, “[...] uma nova mídia, como a informática, abre possibilidades de mudanças dentro do próprio conhecimento e que é possível haver uma ressonância entre uma dada pedagogia, uma mídia e uma visão de conhecimento.” Sobre a informática, os autores entendem que:

Ela é uma nova extensão de memória, com diferenças qualitativas em relação às outras tecnologias da inteligência e permite que a linearidade de raciocínios seja desafiada por modos de pensar, baseados na simulação, na experimentação e em uma „nova linguagem‟ que envolve escrita, oralidade, imagens e comunicação instantânea. (BORBA; PENTEADO, 2012, p. 48).

Para aqueles autores, a utilização do computador em sala de aula permite a superação de antigas práticas, de forma que a perspectiva de construção do conhecimento priorize o processo e não o produto. Para alguns professores, a utilização de tecnologias digitais durante suas aulas ainda é algo desconfortável. Segundo Borba e Penteado (2012, p. 56), alguns

professores durante sua prática docente procuram permanecer em uma área denominada pelo autor de zona de conforto, neste ambiente tudo é previsível e controlável, não existe nessa zona uma preocupação por parte do docente de se movimentar em direção a novas possibilidades de aperfeiçoamento de sua prática educativa. De acordo com os mesmos autores, a utilização da informática em sala de aula pode ser encarada como uma zona de

risco, ambiente cercado por desafios e aonde paira a imprevisibilidade, a título de exemplo

podemos citar: problemas de ordem técnica, diversidade de caminhos para realização de uma tarefa e dúvidas que surgem nos alunos durante a utilização do computador.

Borba, Silva e Gadanidis (2018, p. 21) destacam ainda que as diversas inovações tecnológicas têm possibilitado o surgimento e a exploração de situações alternativas para a educação, com destaque para o ensino e a aprendizagem da Matemática. Os docentes estão diante de um grande desafio, conseguir se apropriar das tecnologias digitais e utilizá-las em sala de aula. Kenski (2012), por sua vez, ao discorrer sobre a atividade docente destaca que,

[...] É preciso que esse profissional tenha tempo e oportunidades de familiarização com as novas tecnologias educativas, suas possibilidades e seus limites, para que, na prática, faça escolhas conscientes sobre o uso das formas mais adequadas ao ensino de um determinado tipo de conhecimento, em um determinado nível de complexidade, para um grupo específicos de alunos e no tempo disponível. (KENSKI, 2012, p. 48).

Não basta, portanto, fazer o uso de uma determinada tecnologia digital, é necessário analisar a forma como suas potencialidades são exploradas em sala de aula. Borba e Penteado (2012, p. 88) alertam ainda sobre o risco de domesticação de uma mídia, os autores citam como exemplo dessa domesticação, uma aula expositiva que utiliza o computador apenas para apresentar exemplos. Segundo ele o uso do computador poderia ocorre para promover: a experimentação, a visualização dentre outras possibilidades. Ainda sobre a domesticação:

Entendemos que domesticar uma tecnologia significa utilizá-la de forma a manter intacta práticas que eram desenvolvidas com uma mídia que é predominante em um determinado momento da produção de conhecimento. Manter tais práticas de forma acrítica, como por exemplo usar ambientes virtuais de aprendizagem apenas para enviar um PDF é o que chamamos de domesticação. O envio substitui o correio usual que entregava um texto, mas não incorpora o que pode ser feito com uma nova mídia. (BORBA; SILVA; GADANIDIS, 2018, p. 29).

Para os autores, uma forma de evitar essa domesticação é buscar novos tipos de problemas e diferentes tipos de soluções e encarar a zona de risco como local de possibilidades.