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A enfermagem, como ciência, necessita de uma filosofia própria, pois nenhuma ciência consegue sobreviver sem possui sua própria filosofia. Dessa maneira, ter um corpo de conhecimentos próprios e uma prática autônoma é uma das maiores ambições da enfermagem (CIANCIARULLO, 1987).

Em toda filosofia há um Ser, que na enfermagem distingue-se em três: Ser- Enfermeiro, que a partir do compromisso com a enfermagem recebe o direito de cuidar de outras pessoas; o Ser-paciente, que é o indivíduo, a família ou comunidade que necessita de cuidados de saúde ao longo do ciclo saúde-doença; e o Ser-Enfermagem, que nasce da interação dos dois outros seres, com o objetivo de atender as NHB (HORTA, 1979).

A enfermagem caracteriza-se como ciência por ser uma atividade humana que vem ao longo do tempo acumulando conhecimento e prática empírica e desenvolvendo teorias que se referem ao universo e se relacionam entre si. Dessa maneira, precisa apresentar de forma clara seu objeto de conhecimento científico, que é assistir o ser humano no atendimento de suas necessidades básicas, sendo estas últimas, os entes da enfermagem, habitáculos do ser (indivíduo, família ou comunidade). A ciência da enfermagem é a descrição, explicação e relações desses entes, por isso caracteriza-se como hermenêutica (HORTA, 1979).

Entende-se por teoria um conjunto de proposições e conceitos que explicam um ou mais fenômenos naturais, a partir de relações entre os fatos. A teoria serve como guia de ações que orientam a assistência sistematizada, organizada e documentada, com explicação da natureza da ciência, possibilitando práxis no cuidado, e quando efetuada torna-se técnica (CUNHA; BARROS, 2005; HORTA, 1979). A escolha de uma teoria é essencial para a

sistematização da assistência e oferecimento de qualidade do cuidado (RODRIGUES; MARIA, 2009).

A teoria das NHB é do tipo IV, de médio alcance, prescritiva, porque é produtora de uma situação, ao determinar todos os fatores para que a mesma aconteça e quais os resultados disso. Ela tem agente, recipiente, término, processo, estrutura e dinâmica e dela derivam conceitos, proposições e princípios (HORTA, 1979).

Algumas leis gerais que regem o universo são alicerce para a teoria das NHB, são elas: a lei do equilíbrio, que trata sobre o equilíbrio dinâmico entre os seres do universo; a lei da adaptação, a qual define que todo ser age para adaptar-se ao meio externo e assim manter- se em equilíbrio com ele; e a lei do holismo, que considera o universo e o ser humano como um todo, além da soma das partes (HORTA, 1979).

Em seu livro, Horta (1979) relata que sua criação é baseada na teoria da motivação humana, de Maslow, que classifica as necessidades humanas em psicobiológicas, psicossociais ou psicoespirituais, sendo estas últimas características inerentes apenas ao ser humano (Quadro 1).

QUADRO 1 - NECESSIDADES HUMANAS BÁSICAS.

NECESSIDADES HUMANAS BÁSICAS

Psicobiológicas

Oxigenação, nutrição, hidratação, eliminação, sono e repouso, exercício e atividades físicas, sexualidade, abrigo, mecânica corporal, motilidade, cuidado corporal, integridade cutâneo-mucosa, integridade física, regulação (térmica, hormonal, neurológica, hidrossalina, eletrolítica, imunológica, crescimento celular, vascular), locomoção, percepção (olfativa, visual, aditiva, tátil, gustativa, dolorosa), ambiente e terapêutica

Psicossociais

Segurança, amor, liberdade, comunicação, criatividade, aprendizagem (educação à saúde), gregária, recreação, lazer, espaço, orientação no tempo-espaço, aceitação, autoestima, autorrealização, participação, autoimagem, atenção

Psicoespirituais Religiosa ou teológica, ética ou de filosofia de vida Fonte: Adaptado de Horta (1979).

Estas necessidades são universais e estão relacionadas entre si e fazem parte de um todo indivisível (CIANCIARULLO, 1987). Para entendê-las é preciso primeiramente compreender que o ser humano é parte integrante do universo e está em constante interação com ele. O universo vive em sucessivos equilíbrios e desequilíbrios, e, dessa maneira, o ser humano como parte pensante integrante deste ambiente também sente o equilíbrio e desequilíbrio, e é também o agente causador desses estados (HORTA, 1979).

A teoria das NHB define alguns conceitos dos quais derivam sua fundamentação. Entre eles estão aqueles que compõem o meta-paradigma da enfermagem. Os mesmos serão elencados abaixo (HORTA, 1979):

• Enfermagem: a arte e a ciência de atender o ser humano em suas necessidades básicas, a fim de torná-lo independente a partir do autocuidado, com a recuperação e promoção da saúde, em conjunto com demais profissionais;

• Ser humano: um todo indivisível (bio-psico-sócio-espiritual) e dinâmico com capacidade de reflexão, poder de simbolização e imaginação, inserido em uma família ou comunidade e agente ativo no seu autocuidado;

• Ambiente: ecossistema onde o indivíduo irá atender suas necessidades, incluindo físicas, ecológicas, sócio-políticas e culturais;

• Saúde: estar com as necessidades (fisio-socio-psicológicas-espirituais) equilibradas de forma dinâmica no tempo e no espaço. Doença é o desequilíbrio do ser humano com o ambiente;

• Necessidades humanas básicas: tensões conscientes ou inconscientes, decorrentes de desequilíbrios hemodinâmicos dos fenômenos vitais;

• Assistir em enfermagem: supervisionar, orientar, ensinar ou encaminhar os indivíduos a outros profissionais quando necessário, auxiliar quando os indivíduos estão parcialmente impossibilitados de realizar autocuidado ou fazer por ele, caso ele não possa fazer por si mesmo.

Quando o ser humano está em desequilíbrio ele busca satisfazer suas necessidades para reestabelecer o equilíbrio. Quando não obtém sucesso neste processo, surge o desconforto, que de forma prolongada torna-se doença. Como o conhecimento para reconduzir ao equilíbrio é limitado, muitas vezes é necessário intervenção de um profissional habilitado: os profissionais de enfermagem (HORTA, 1979).

Assim, a enfermagem atua para manter o equilíbrio e completo bem-estar, para prevenir e reverter desequilíbrios (HORTA, 1979). Em suma:

A enfermagem como parte integrante da equipe de saúde implementa estados de equilíbrio, previne estados de desequilíbrio e reverte desequilíbrios em equilíbrio pela assistência ao ser humano no atendimento de suas necessidades básicas; procura sempre reconduzi-la à situação de equilíbrio dinâmico no tempo e espaço (HORTA, 1979).

A assistência de enfermagem fundamenta-se em fazer, auxiliar, ensinar, supervisionar e encaminhar. Estas ações estão situadas em três áreas: específica (atender as NHB e promover autocuidado), de interdependência (atuar dentro da equipe para manter, promover e recuperar saúde) e social (agir à serviço da sociedade em ensino, pesquisa, administração e outros). Como princípios, a enfermagem respeita a individualidade do ser humano, assiste-o e o enxerga como agente de autocuidado e membro da família ou comunidade, atuando desde a prevenção à recuperação (HORTA, 1979).

Diferente da definição da teoria, atualmente algumas conceituações de enfermagem não a enxergam mais como arte e se utilizam muito dos termos ciência, disciplina e profissão (RODRIGUES; MARIA, 2009).

Entretanto o atual código de ética em enfermagem brasileiro a estabelece como arte, ciência e prática social necessária ao funcionamento dos serviços de saúde, que tem como responsabilidades a promoção e restauração da saúde, prevenção de doenças e agravos e alívio dos sintomas na pessoa, família ou comunidade. Este documento orienta a enfermagem a agir pela saúde e não pela doença, tendo como princípio fundamental o comprometimento com a saúde e a QV da pessoa, família e coletividade (COFEN, 2017).

Para que os enfermeiros atuem em acordo com a teoria das NHB é necessário um método científico, definido, neste caso, como processo de enfermagem. Na aplicação deste processo sugerido por Horta, além de diagnosticar os problemas de enfermagem, o enfermeiro deve determinar o grau de dependências do seu cliente em natureza e extensão, estabelecidos a partir dos indicadores: conhecimento, deambulação, motilidade, estado mental, condições do ambiente e condições socioeconômicas (HORTA, 1979).

O PE pode ser realizado de diversas maneiras. Os diferentes teóricos da enfermagem publicaram sobre como realizá-lo. Sendo assim, as formas do PE foram se modificando em acordo com a época que eram pensados. A primeira geração do PE focava nas necessidades de cuidado e solução dos problemas, já a segunda revolucionou com a inclusão da etapa diagnóstica. Por último, a terceira geração iniciou-se nos anos 1990 e centra-se na testagem de intervenções e dos resultados encontrados a partir delas (GARCIA; NÓBREGA, 2009).

A teoria das NHB foi pioneira na fundamentação da aplicação do PE no Brasil, ganhando destaque em todo o mundo, sendo uma das mais utilizadas quando se trata de PE e, por isto, foi escolhida neste estudo. Ela traz que o PE deveria acontecer em seis etapas: histórico de enfermagem, Diagnóstico de Enfermagem (DE), plano assistencial, plano de cuidados ou prescrição de enfermagem, evolução e prognóstico (HORTA, 1979).

Neste estudo optou-se por utilizar o PE guiado pelas taxonomias da NANDA-I, NIC, NOC (BULECHEK, 2016; MOORHHEAD, 2016; NANDA-I, 2018). Esta escolha se deu por estas serem classificações amplamente utilizadas na contemporaneidade e por se preocuparem em estar em constante atualização e em consonância com a atualidade do cenário da enfermagem, além de ser um método mais palpável de realizar o PE, pois as três obras trazem de forma detalhada como realizar cada etapa.

De acordo com a NANDA-I (2018), o PE pode ser aplicado com base em diferentes teorias. Por tratar-se de um estudo sobre qualidade de vida relacionada à saúde, conceito que engloba todos os aspectos de vida do indivíduo, optou-se por utilizar a teoria das NHB, que busca enquadrar entre essas necessidades os âmbitos bio-psico-socio-espirituais.

Aplicar uma teoria na prática é uma tarefa árdua, mas que faz a diferença no fazer Enfermagem. É preciso compromisso, familiaridade e conscientização de toda equipe para que o modelo assistencial seja praticado (RODRIGUES; MARIA, 2007).

4.2 PROCESSO DE ENFERMAGEM E A TAXONOMIA DAS CLASSIFICAÇÕES