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2 EXPERIENCIALISMO

2.4 Teoria Integrada da Metáfora Primária

2.4.3 Teoria Neural da Metáfora

A pesquisa de Narayanan (1997) trata a fusão, discutida anteriormente, como um conjunto de ativações neurais. O período de fusão de domínios nada mais é do que as redes neurais ativadas simultaneamente, e mesmo com a separação conceitual destes domínios, a conexão neural permanece, proporcionando assim o pensamento metafórico.

De acordo com a pesquisa, foi observado que as conexões neurais ocorrem durante a infância, quando há a fusão entre as primeiras experiências sensório-motoras e as experiências subjetivas. Por exemplo, com respeito à metáfora primária MAIS É PARA CIMA, ao observar o volume de uma pilha de livros subir à medida que o número de livros também cresce, ocorre uma fusão entre quantidade e verticalidade, de modo que as redes neurais de um conceito e outro são ativadas simultaneamente. Embora posteriormente aconteça a separação dos conceitos, a ativação neural simultânea entre eles permanece. Então, quando alguém diz que “o índice de criminalidade está subindo”, a primeira parte, “índice de criminalidade”, já ativa as redes de quantidade, enquanto a segunda, “estão subindo”, ativa as redes neurais de verticalidade.

Um problema levantado para esta proposta teórica foi que, se há a ativação neural simultânea dos domínios conceituais, por que o mapeamento sugere ser sempre do sensório-motor para o subjetivo, e não o inverso também? Isto é, por que é possível conceitualizar MAIS É PARA CIMA, e não é possível PARA CIMA É MAIS?

Narayanan (1997) responde que o número de conexões da rede do domínio sensório-motor é maior que as conexões das experiências subjetivas e, por isso, apresenta uma capacidade inferencial maior. Desse modo, como ocorre mais ativação do lado sensório-motor, os mapeamentos são direcionados em um único sentido: sensório-motor – abstrato, para as metáforas primárias. É exatamente a direção da inferência que determina o que é domínio fonte e domínio alvo, pelo menos para as metáforas primárias, que são mais básicas e corpóreas, pois as metáforas sistemáticas e até mesmo algumas conceituais complexas podem obedecer a um mapeamento multidirecional (ver capítulo 4).

O modelo neural ainda contempla que as ativações podem ocorrer ou não, dependendo das escolhas metafóricas, ou seja, algumas ativações são inibidas devido a outras serem acionadas, em detrimento da escolha de algumas metáforas ao invés de outras.

Além do estudo de Narayanan (1997), outras evidências neurocientíficas fundamentam a cognição corporificada. De acordo com a terminologia clássica da

neurofisiologia, o sensório era visto como “entrada” (input) de dados e o motor como a resposta (output) destas entradas. A neurofisiologia experimental, em oposição a este dualismo, adota a visão de que “as funções motoras do sistema nervoso não só oferecem meios para controlar e executar ações, mas também para representá-las” (GALLESE, 2000, p. 23). A contribuição da neurociência se dá ao oferecer ao conceito de corporificação uma explicação que vai além de especulações filosóficas ou interpretações subjetivas de dados. Ela detalha como a estrutura biológica se torna canal para a representação da realidade. O corpo possui um sistema nervoso em conexão com o cérebro, onde os estados mentais emergem através das forças sinápticas. Estas ocorrem de acordo com as experiências, fazendo emergir certas representações e organizações de conceitos (categorização).

Experiências recentes no campo da neurofisiologia têm demonstrado a existência de dois tipos diferentes de neurônios, chamados de neurônios bimodais por serem equipados com propriedades visuais e motoras (GARBARINI & ADENZATO, 2004). A característica principal a ser destacada por esses neurônios é que eles são ativados não somente durante a execução de uma ação, mas também podem ativar durante a pura observação desta mesma ação. Assim, é possível inicialmente afirmar que as representações sócio-cognitivas do conceito de VIOLÊNCIA não difere nas vítimas diretas e indiretas do ato. As vítimas diretas por terem experienciado violência em sua execução ativam o mesmo conjunto de neurônios que as vítimas indiretas, que também experienciam o ato, mas apenas em caráter observacional. Os dois tipos de neurônios localizam-se em duas partes diferentes da área F5 (um setor da área 6 de Brodmann19) e são respectivamente os neurônios canônicos e os neurônios-espelho20. Os primeiros emitem respostas seletivas à apresentação de objetos tridimensionais e a grupos de objetos que possuem características semelhantes, permitindo a interação do sujeito com as características que o objeto tem para possibilitar tal interação. Como os canônicos, os neurônios-espelho também estão ativos durante a observação, mesmo

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Área localizada no córtex frontal do cérebro humano e responsável pelo planejamento de movimentos complexos e coordenados. É composta pelo córtex pré-motor e parcialmente pela área motora suplementar.

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na ausência do movimento ativo no exato momento. Mas, ao contrário dos canônicos, os neurônios-espelho não reagem à apresentação de objetos, mas à execução e à observação das ações de indivíduos: “a observação da ação de outro indivíduo evoca uma reação no sistema neural do observador, que é ativado ‘como se’ ele mesmo estivesse executando a ação que está sendo observada”21 (GARBARINI & ADENZATO, 2004, p. 102).

Talvez, seja possível que esta ativação não só fizesse com que o observador representasse ‘como se’ ele estivesse executando a ação, mas ‘como se’ ele estivesse sofrendo a ação. Acredita-se, então, que este possa ser o caso de vítimas indiretas de violência conseguirem compartilhar conceitos, mesmo nunca tendo passado por tal experiência direta, ou seja, há uma relação de empatia baseada na simulação motora e emocional, permitindo uma construção dos conceitos através da simulação de uma ação efetiva e real.