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A violência pode se concretizar de várias formas. Para fins didáticos do presente estudo, abordar-se-á a violência por quatro enfoques diferentes: a física, a psicológica, a sexual e a decorrente de negligência, embora seja fácil compreender que na prática muitas vezes estes aspectos acabam sendo cumulativos, interagindo entre si.

3.3.1 Violência física doméstica

Nesse contexto, a violência física é caracterizada pelo uso da força ou ainda por outros atos praticados pelos pais ou responsáveis, com o objetivo de ferir

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ou não, deixando ou não marcas evidentes. São frequentes casos de tapas, agressões com diversos objetos e queimaduras por objetos ou líquidos quentes.

Neste tipo de violência, verifica-se a chamada síndrome do bebê sacudido, que se caracteriza por lesões graves, que ocorrem quando uma criança, geralmente recém-nascida, é sacudida com violência, o que pode levá-la à cegueira ou a lesões oftalmológicas, a atraso no desenvolvimento, a convulsões, lesões na espinha, lesões cerebrais e até mesmo a óbito14.

Segundo a lição de Veronese e Costa,

Incontestável é que a maior parte das vítimas desse tipo de violência apresenta frequentes retardos escolares, tais como inadaptação ao convívio com outras crianças, dificuldade de expressão (retardo de linguagem), e em sua própria concepção do ambiente escolar, uma vez que tendem a ver nele, não um lugar de aprendizado, mas somente um refúgio para aplacar sua situação, o que não deixa de ser totalmente compreensível15.

Nas famílias onde existe violência física, as relações dos pais com os filhos se caracterizam pela superioridade dos pais e inferioridade dos filhos, que são vistos como objetos, tendo estes o dever de satisfazer as necessidades dos pais. Isso gera expectativas superiores à capacidade dos filhos, num ambiente onde a disciplina severa é considerada método de educação16.

Em relação aos pais nesse meio, pode-se dizer que na maioria das vezes eles ocultam as lesões da criança ou adolescente ou as justificam de forma não convincente; colocam a culpa no comportamento desobediente da criança; muitos são viciados em álcool e/ou em outras drogas; possuem expectativas irreais da criança ou adolescente; foram maltratados quando criança, ou possuem como cultura familiar a disciplina rígida e severa17.

3.3.2 Violência sexual doméstica

14 RIBEIRO; MARTINS, 2008, p. 115. 15 VERONESE; COSTA, 2006, p. 108. 16 AZEVEDO; GUERRA, 1995, p. 48. 17 Ibid., p. 49.

A violência sexual doméstica mostra-se como um ato ou jogo sexual, onde pode haver relação hetero ou homossexual, entre um ou mais adultos e uma criança ou adolescente, que tem por fim estimular a sexualidade da criança ou adolescente, ou utilizá-lo para obtenção de estímulos sexuais para si ou de outra pessoa. Destaca-se que nas ocorrências a criança sempre figurará como vítima, e não poderá ser transformada em ré. A intenção da violência sexual é a obtenção do prazer, de forma direta ou indireta, em benefício do adulto, anotando-se que a participação da criança sempre se dá mediante coerção exercida pelo adulto18.

A lição de Faleiros destaca alguns pontos de enorme importância quanto à dimensão da violência sexual doméstica:

O segredo familiar, pois está em segredo e tem o envolvimento de outros familiares; há a reincidência por parte dos agressores, pois tendem a repetir a violência com outras pessoas; as pessoas que cometem a agressão tendem a ter sido agredidas quando criança; este tipo de violência está presente em todas as classes sociais; as crianças abusadas podem ser vitimizadas em qualquer idade, sendo que os traumas sofridos são diferenciados de acordo com a idade; o agressor muitas vezes é perdoado pela família, por razões culturais e autoritárias; por não aguentar mais as violências sofridas, a criança ou adolescente acaba fugindo de casa; há a necessidade de acompanhamento terapêutico com a criança abusada, pois as marcas da violência são profundas19.

3.3.3 Violência psicológica doméstica

A violência psicológica, também conhecida como tortura psicológica, transpassa todos os demais tipos de violência, e ocorre quando a criança é depreciada constantemente pelo adulto, que bloqueia os esforços de auto-aceitação da criança, causando-lhe grande sofrimento mental. Essa exposição da criança ou adolescente a constantes situações de humilhação e/ou constrangimento, gerada por agressões verbais, faz com que a vítima se sinta rejeitada, sem valor, o que a impede de ter relações de confiança com outros adultos20.

18

AZEVEDO; GUERRA, 1995, p. 53.

19

CRESCER SEM VIOLÊNCIA, 1999, p. 30-31.

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A violência psicológica doméstica pode se manifestar em forma de rejeição, depreciação, discriminação e desrespeito, por parte dos pais, com as crianças e adolescentes.

A ocorrência mais comum desse tipo de violência se dá em forma de punições exageradas, que não deixam marcas visíveis, mas as marcas que ficam podem durar para toda a vida21.

3.3.4 Negligência doméstica

A negligência, nos termos delimitados do presente estudo, consiste na omissão em termos de prover as necessidades físicas e emocionais de uma criança ou adolescente. Ela guarda relação direta com o grau de disponibilidade dos pais em relação aos filhos e seus interesses22.

Esse tipo de violência fica configurado quando os pais cometem falhas em questões como alimentação, vestuário, educação e orientação, e quando tais falhas atingem as necessidades básicas e fundamentais de sobrevivência.

A negligência pode se apresentar de forma moderada ou severa. Isso depende, como já mencionado, da disponibilidade dos pais para com seus filhos. Assim, por exemplo, é evidente que em ambientes onde os pais negligenciam seus filhos severamente, pela falta de cuidados básicos para que estes se desenvolvam de forma saudável, pode-se dizer que as crianças e adolescentes vivem praticamente em estado de abandono, mesmo que este se dê (e muitas vezes se dá) no seu próprio lar23.