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Capítulo I Enquadramento Teórico

1.3. A criança no centro do processo educativo: princípios inerentes à prática

1.3.4. Trabalho cooperativo: aprender partilhando

Entende-se por trabalho cooperativo aquele que envolve mais do que uma pessoa na realização de um determinado projeto, neste caso a aprendizagem, onde o êxito ou o fracasso influenciam mutuamente a interajuda para alcançar o sucesso individual (Burden, s/d, referido por Lopes & Silva, 2009). Neste sentido, o trabalho cooperativo surge como uma estratégia privilegiada na aprendizagem e na partilha de conhecimento, tanto no trabalho dos alunos, como também no do professor.

Como vimos anteriormente, a aprendizagem e a educação são processos individuais, mas ambos têm um caracter interativo entre o corpo, a mente e as relações sociais (Fonseca, 2014). De acordo com Lopes e Silva (2009), é neste processo que assenta a aprendizagem cooperativa, através da qual as crianças se ajudam e atuam como parceiros entre si e com o docente, numa dialética sincrónica que visa adquirir conhecimentos sobre um dado objeto ou tema. As relações que se estabelecem nestes processos de cooperação refletem a necessidade de se abarcar a diversidade e o multiculturalismo nas salas de aula, partilhando não só saberes e experiências, como também adquirindo competências pessoais e sociais que viabilizam o trabalho em equipa, a resolução de problemas e a aquisição de uma intervenção autónoma e crítica

no grupo, com vista à democracia e à cidadania (Kaye,1991, citado por Lopes & Silva, 2009).

De acordo com Johnson, Johnson e Holubec (1999), para que haja sucesso nesta forma de trabalhar e de aprender, existem cinco dimensões que são essenciais na organização do processo de ensino-aprendizagem que são:

Interdependência positiva – existe uma preocupação com a aprendizagem do colega e um sentimento de trabalho conjunto para atingir um objetivo comum;

Responsabilidade individual e de grupo – cada elemento do grupo deve sentir-se responsável pela sua aprendizagem e tem de compreender que a sua contribuição é fundamental para o sucesso do outro e do grupo; Interação face-a-face – os processos de comunicação e de interação

verbal visam alcançar os objetivos previstos pelo grupo através da discussão de ideias e de pontos de vista diferentes;

Habilidades interpessoais – para que se diminua os conflitos desnecessários e prevaleça o bom funcionamento do grupo é necessário ativar as competências de comunicação, de liderança, de confiança e de tomada de decisão, com vista à criação de relações positivas;

Avaliação dos processos realizados pelo grupo – permite que o próprio grupo autorregule o processo de aprendizagem, sendo que todos os elementos do grupo devem refletir e identificar comportamentos que considerem facilitadores ou perturbadores do sucesso do grupo.

Ressalve-se que estas competências são extremamente valorizadas pela sociedade atual e pelo mundo do trabalho, isto porque cada vez mais o trabalho é realizado em parcerias e como tal, torna-se imprescindível dotar as crianças com ideais de solidariedade, de responsabilidade individual e social e de liberdade que lhes permitam serem incluídas na sociedade enquanto seres livres, responsáveis e solidários. Santana (2007) refere que o docente é, “nesta perspectiva, um tutor, ajudando, os alunos, nesse processo, de forma atenta, e dinâmica actuando na ZDP” (p. 36). Esta intervenção incita a criação de contextos de aprendizagem, em que haja a possibilidade de as crianças encontrarem a solução para um problema com a ajuda do adulto ou de outro colega mais capacitado (Díaz-Aguado, 2000).

E porque trabalhar cooperativamente é diferente de trabalhar em grupo, onde cada um faz o seu papel ou em que muitas vezes uns aprendem enquanto outros não, o papel do professor, de acordo com Johnson e Johnson (1991) e Lopes e Silva (2009), destaca-se em três fases essenciais: pré-implementação, implementação e pós- implementação.

Segundo estes autores, durante a fase de pré-implementação, é importante que o professor explique em que consiste o trabalho cooperativo, quais as suas vantagens para os alunos e para a sua vida e qual a necessidade de se atribuir papéis e/ou tarefas a cada elemento do grupo. Nesta fase, é também necessário promover a motivação do grupo através da realização de atividades variadas e estimulantes e informar os grupos acerca das competências que serão avaliadas e dos instrumentos que serão utilizados para a avaliação. Na fase seguinte, ou seja, durante o trabalho do grupo, o papel do professor é menos centrado em si e este deve circular pela sala para observar as interações que se desenvolvem no seio dos grupos, intervindo apenas para ajudar as crianças a encontrarem as suas próprias soluções, elogiar o grupo e cada um dos seus elementos quando trabalham de forma adequada e incitar a que vejam o erro como forma de aprendizagem. No caso de o docente reparar que existem muitas dificuldades pode adicionar outros recursos e/ou pontos de vista e intervir na gestão de conflitos. Na última fase, pós-implementação, depois da apresentação dos trabalhos à turma, o professor juntamente com os alunos deve refletir e identificar os pontos positivos e negativos desta metodologia, a dinâmica e o desempenho do grupo.

Ainda dentro desta linha de pensamento, importa referir algumas caraterísticas essenciais à formação e à organização de grupos de trabalho. Segundo Freitas e Freitas (2003), existem três possibilidades de constituição de grupos: formar grupos ao acaso; deixar que sejam os alunos a escolher; ser o professor a decidir. A formação dos grupos, bem como a sua dimensão dependerá da complexidade das tarefas, das finalidades do trabalho que se pretende desenvolver e também das competências dos alunos em trabalhar cooperativamente.

Tendo em conta a informação explanada, Lopes e Silva (2009) afirmam que o docente, na fase inicial do trabalho cooperativo, pode promover a atribuição de papéis dentro do grupo, pois com esta intervenção o trabalho fluirá mais produtivamente e todos os membros trabalharão conjuntamente para atingirem o mesmo objetivo. Todavia, nas abordagens seguintes esta tarefa deverá ser da competência das crianças,

com vista a aprendem a trabalhar em grupo e de modo a desenvolverem a sua autonomia, a responsabilidade e a confiança (Fontes & Freixo, 2004).

Finalmente, é da competência do docente a organização do espaço e dos materiais, porém este pode solicitar a colaboração das crianças para adequarem os materiais e as estratégias para que estes facilitem o trabalho do grupo e a aprendizagem. Esta organização deve favorecer a comunicação, a autonomia e a responsabilidade na utilização dos materiais (Freitas e Freitas, 2003). Os mesmos autores consideram ainda importante que alguns instrumentos de monitorização das regras e dos tempos dedicados a cada tarefa se encontrem ao alcance dos educandos (por exemplo: quadros de regras e relógio ou ampulheta), de forma a conseguirem controlar o desenvolvimento do seu trabalho no tempo pré-estabelecido.

Em conclusão, o trabalho cooperativo assume uma grande importância no desenvolvimento cognitivo das crianças e na aquisição de novo conhecimento, pois este permite que as crianças trabalhem, verdadeiramente, em conjunto e em prol de um objetivo comum, em que a competição dá origem à interajuda e à partilha de saberes. Desta forma, as aprendizagens são realizadas em interação com os colegas, o ritmo de aprendizagem de cada um é respeitado e, ao mesmo tempo, as crianças são incentivadas e alcançarem novas metas no seu processo de aprendizagem.