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Tem sido comum analisar a realidade profissional das mulheres a partir de metáforas/analogias/comparações que possibilitem expressar de forma simples as dificuldades e bar- reiras que as mulheres encontram no mundo trabalho, den- tre as quais destacamos: o piso/assoalho pegajoso, a escada pegajosa e o teto de vidro/cristal.

A ocupação de postos de trabalho com baixos salários e pouca/nenhuma mobilidade de carreira pode ser associada a um piso/assoalho pegajoso, ilustrando uma quase paralisia profissional de determinadas atividades femininas. São pro- fissões que não possuem qualquer tipo de plano de cargos e salários e que, inclusive, não contribuem para agregar saberes que possibilitem mudanças para outra profissão.

O setor de trabalho doméstico1 no Brasil exemplifica essa

analogia do piso pegajoso, pois emprega aproximadamente 7 (sete) milhões de mulheres e 500 (quinhentos) mil homens e é uma das profissões que se destaca por baixa valorização,

1 Informações do Ministério do Trabalho e Emprego dão conta que o traço diferen- ciador do emprego doméstico é o caráter não-econômico da atividade exercida no âmbito residencial do/a empregador/a e que integram a categoria: cozinheiro/a, governanta, babá, lavadeira, faxineiro/a, vigia, motorista particular, jardineiro/a, acompanhante de idosos/as, caseiro/a, dentre outras.

poucas (quase nenhuma) possibilidades de ascensão na car- reira e baixa formalização (apenas 26,3% de trabalhadoras têm carteira de trabalho assinada).

Vale destacar na análise dessa realidade, conforme Kymlicka (2006), que os processos de dominação e desi- gualdade de gênero podem tornar desnecessárias discrimi- nações arbitrárias contra a mulher, porque muitas não têm condições de competir por determinados empregos, seja porque a divisão sexual do trabalho a que se submeteram a mantiveram em dependência econômica, ou criaram di- ficuldades para qualificar-se, seja porque as precárias con- dições de vida as impelem a aceitar condições degradantes de trabalho e as impedem de se organizar para reivindicar e conquistar melhores condições de vida. Ou seja, existe um problema de dominação e a igualdade vai requerer poder. A partir de um poder igual não se criariam sistemas que defi- nissem trabalhos masculinos como superiores aos femini- nos e o valor do trabalho não estaria baseado no gênero de quem o desenvolve, já que essa categoria não mais eviden- ciaria formas de poder expressas em valor ou desvalor do trabalho (KYMLICKA, 2006).

No entanto, estamos longe dessa igualdade. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (2014), em 2011 o rendimento médio do trabalho das mulheres era de R$ 1.343,81, enquanto o dos homens era de R$ 1.857,63, ou seja, o rendimento feminino era 72,3% do valor médio masculino. Esses indicam que o trabalho feminino permanece em seto- res de baixa remuneração, revelando que o piso pegajoso

ainda dificulta o arrastar dos pés das mulheres em direção às atividades de melhor remuneração.

Já a escada pegajosa representa o esforço e a dificuldade das mulheres para ascender na hierarquia profissional, ilus- trando as maiores dificuldades que mulheres enfrentam nesse processo. E para aquelas que conseguem alguma ascensão na carreira, pode-se deparar com um fenômeno conhecido como

teto de vidro/cristal que consiste em barreiras não formais as quais embora invisíveis, dificultam a ascensão das mulheres ao topo de uma carreira. Vale destacar que algumas barreiras para ascensão funcional, pela dificuldade encontrada para se- rem transpostas, configurando-se como verdadeiros tetos de pedra, quebráveis sim, mas exigindo mais esforço e organiza- ção das mulheres, pois se tais obstáculos fossem enfrentados individualmente, dificilmente seriam ultrapassados.

Para Lima (2013), o teto de vidro representa obstáculos concretos, porém invisíveis, e que impedem as mulheres de ocupar posições de prestígio nas profissões. Nessa metáfora, a autora destaca a questão da transparência do vidro, referin- do-se à ausência de barreiras formais/legais que dificultem a atuação profissional e a participação de mulheres em cargos de poder bem como, a posição do teto, que representa en- traves e dificuldades que, embora expressem possibilidades, também expressam que as mulheres acabam limitadas a um determinado ponto da carreira.

A ascensão profissional das mulheres acaba sendo di- ficultada por aspectos socioculturais nem sempre perceptí- veis, pois aparentemente não existe impedimento para que as mulheres ocupem qualquer posto na hierarquia de uma empresa/instituição privada ou pública. No entanto, não é isso que ocorre, pois mulheres com excelente formação e com grande dedicação ao trabalho não conseguem atingir os postos hierarquicamente superiores por fatores que não

se relacionam à sua capacidade, mas, sim, a processos ad- vindos de uma cultura relacionada à discriminação e pre- conceito com o trabalho feminino.

Vale destacar que grande parte das barreiras que a mu- lher enfrenta no mercado de trabalho nem sempre é explici- tada. A escolha de quem deve ser promovida ou não em um determinado emprego não se fundamenta em discriminações arbitrárias, inclusive porque são proibidas legalmente, mas por processos que mascaram a discriminação e o preconceito e se refletem em uma maior valorização do trabalho masculino.

Outras metáforas foram feitas para explicar as condições de trabalho das mulheres e a continuidade de um processo que as desvaloriza e as mantém em situação de precariedade. Nes- te trabalho, todavia, destacaremos na sequência a discussão da participação feminina nas carreiras científicas e tecnológicas.

Inúmeros avanços devem ser considerados na discussão do trabalho feminino no Brasil, sendo perceptível o rompi- mento de fronteiras entre trabalho masculino e feminino. As mulheres passaram a atuar em diversas profissões considera- das masculinas, ampliando a participação feminina em áreas como ciência e tecnologia e também o reconhecimento de que os conhecimentos produzidos pelas mulheres são tam- bém científicos e tecnológicos.

Atividades de pesquisa que buscam resgatar a participa- ção histórica da mulher na área de C&T e políticas públicas estimulando as mulheres a entrar nessas carreiras têm propor- cionado uma nova percepção sobre o conhecimento, possibi- litando a desconstrução da invisibilidade feminina nessa área e, gradativamente, mudando o perfil de gênero e abandonan- do associações de C&T somente com o universo masculino.