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3 A interlocução inicial na EBM Adelaide Starke

4 O trabalho com o gênero crônica

Nesta seção abordaremos o início propriamente dito dos trabalhos que nos envolveram diretamente com os alunos. Esse momento da metodologia da pesquisa (que compreende as seções 4 e 5 e suas subdivisões) foi o mais importante porque nele trabalhamos o objetivo central desta pesquisa, o desenvolvimento da proposta didático- metodológica do ensino/aprendizagem da produção textual escrita do gênero crônica.

Como procedimento metodológico para esse momento, foi necessário construir um

Plano de Ensino (PEP), específico. O PEP foi dividido basicamente em três partes que nomeamos como: a) o terreno escolar como lugar da interação: a semeadura; b) o terreno escolar como lugar da interação: a colheita; c) avaliação da proposta didático-metodológica. A primeira parte (a semeadura) focalizou aspectos antecedentes à produção textual propriamente dita, tais como: as concepções de texto dos alunos e a leitura de enunciados (crônicas diversas) do gênero proposto para o trabalho. A segunda parte (a colheita) orientou-se para a produção textual, pelos alunos, do gênero, para a divulgação das crônicas produzidas para o leitor efetivo e para a avaliação dos alunos sobre a proposta didático-metodológica

desenvolvida. A terceira parte tratou da avaliação das atividades e estratégias propostas e da avaliação dos textos dos alunos.

A opção pelo gênero crônica ocorreu durante a observação das aulas e a partir da discussão com a professora. Optamos pela crônica porque, além de estar prevista no PE da professora, era o próximo gênero a ser trabalhado dentre todos os previstos na primeira parte do PE (no projeto I). Diante dessa discussão, a primeira atividade do planejamento foi elaborar uma coletânea de enunciados desse gênero para ser trabalhada com os alunos. Pensamos na apresentação das crônicas em uma coletânea para os alunos e não no suporte original de circulação, porque o jornal local, Jornal de Santa Catarina (JSC), com que a professora trabalhava em sala, apesar de haver disponível um exemplar para cada aluno, não trazia o espaço para esse gênero, pelo menos até o momento da realização desta pesquisa. Além disso, a aquisição dos jornais O Estado de São Paulo (OESP) e o Diário Catarinense (DC), com cujas crônicas trabalhamos nesta proposta, foi considerada onerosa e inviável. Onerosa por tratar-se uma turma com 38 alunos; inviável, porque precisávamos de um tempo para estudar os enunciados selecionados antes de discuti-los com os alunos.

Dessa forma, a coletânea foi feita a partir de dois jornais: um regional (DC) e outro de alcance nacional (OESP). A escolha do periódico de alcance nacional foi aleatória, a do regional, arbitrária, pelo fato de o cronista daquele jornal disponibilizar-se a ir à escola conversar com os alunos. Do periódico nacional, coletamos, no mínimo, uma crônica de cada autor que escreve semanalmente naquele espaço, o que resultou em um total de 14 crônicas. Do regional, coletamos 14 crônicas. Todas as 28 crônicas foram coletadas entre dezembro de 2002 e maio de 2003. A única exceção se deu com a crônica de Paulo Sant’Ana, que foi publicada no jornal Zero Hora (ZH), do dia 20 de janeiro de 2002. A razão dessa escolha foi considerarmos a crônica interessante para trabalhar com a ironia.

Optamos por essa heterogeneidade de cronistas para que pudéssemos perceber os estilos individuais de cada escritor e a relativa estabilidade do gênero. As crônicas selecionadas para a coletânea tiveram como critério de escolha a pertinência do assunto ao público adolescente, sujeitos envolvidos na pesquisa, por um lado, e o estilo e a composição, por outro.

A distribuição das aulas para cada uma das atividades do PEP foi feita de acordo com as necessidades peculiares de cada atividade proposta. Para questionarmos os alunos sobre as suas concepções de texto e discutirmos as respostas não foi preciso mais que dois encontros. Para a atividade de leitura dos enunciados do gênero crônica foram necessários oito encontros. A produção textual do gênero, incluindo a correção, digitação e revisão ocorreram em três encontros. A divulgação das crônicas dos alunos e a avaliação da proposta didático- metodológica por parte dos alunos foram realizadas em um único encontro, o último. Reiteramos que cada encontro correspondeu a duas aulas; nesse sentido, lecionamos, no total, 24 aulas.

O questionário que objetivou ver quais as concepções de texto dos alunos, bem como discuti-las foi entregue (aos alunos) antes que tivéssemos feito menção ao gênero com que iríamos trabalhar. Fizemos perguntas simples para que os alunos pudessem responder em grupo e expor suas respostas oralmente ao grande grupo. Procuramos, com discussões acerca das respostas, fazer os alunos refletirem sobre a noção de “texto”.

Para as aulas de leitura dos enunciados do gênero, precisamos pensar em algumas estratégias, a fim de não tornar a leitura monótona, maçante e desinteressante, principalmente em se tratando de adolescentes, cujo poder de concentração é tarefa bastante árdua para o professor manter. Nesse sentido, criamos atividades de leituras envolvendo pesquisador, professora e alunos, dramatizações de crônicas pelos alunos ou simplesmente sua leitura sem explorar questões ligadas ao gênero. Também houve a exploração de algumas crônicas do

ponto de vista verbal e extraverbal do gênero, a partir de questionários dirigidos entregues junto com uma determinada crônica a um grupo de alunos. A visita do escritor Maicon Tenfen, entre outras atividades, foi também estratégia para incentivar o envolvimento de todos. Essas primeiras atividades, a do questionário sobre as concepções de texto e a de prática de leitura de crônicas, foram imprescindíveis para passarmos às atividades seguintes, que contemplavam a produção textual do gênero.

A atividade de prática de leitura de crônicas pelos alunos anteriormente à sua produção foi um procedimento metodológico pautado na concepção do domínio procedimental do gênero (leitura e produção textual) e na reflexão conjunta, voltada para a análise das características desse gênero. Não quisemos, em hipótese alguma, partir do conceito de gênero com os alunos. Pelo contrário, a atividade de leitura foi justamente para que eles construíssem, por meio da leitura analítica, o conhecimento do gênero antes de fazermos qualquer trabalho de produção textual. Eles precisavam conhecer o gênero, não a partir de um conhecimento metalingüístico, mas de sua práxis e reflexão. Esse procedimento foi adotado por acreditarmos que só produzimos o que conhecemos. A leitura das crônicas foi o insight inicial para o desenvolvimento desta proposta didático-metodológica. Consideramos que a leitura pudesse ser o caminho para a construção do conhecimento sobre o gênero.

Retorno ao sumário

atividade, tanto que responderam às questões dentro do tempo previsto. Essa discussão inicial acerca do “texto” em forma de questionário abriu o primeiro encontro e seguiu até o final da primeira aula do encontro seguinte (vigésimo), quando foram feitas as apresentações das respostas e a discussão no grande grupo. No questionário, havia um enunciado explicativo sobre o que pretendíamos com aquele trabalho, conforme segue abaixo:

Caros estudantes, leiam atentamente cada item. Em seguida, discutam um por um com seus colegas. Façam todas as anotações necessárias num rascunho e, em seguida, redijam uma resposta para cada questão, comentando-a. Não se preocupem com o conceito de certo ou de errado. Esta pesquisa não quer verificar seu conhecimento sobre o assunto, mas apenas constatar tudo o que vocês sabem sobre ele. Por isso, relaxem (não muito, hehehehe!!!) e façam da melhor maneira que puderem. Lembrem-se de que suas contribuições serão importantíssimas para esta pesquisa, bem como para os conseqüentes resultados positivos que surtirem. A partir de agora, vocês estão entrando para mais uma história, aquela que contribui para o bem comum da sociedade. Obrigado e bom trabalho.

Durante o desenvolvimento do trabalho, visitamos cada um dos grupos para dirimir as dúvidas que porventura pudessem surgir ao responderem ao seguinte questionário:

1. O que vocês entendem por “texto”?

2. Qual a diferença entre o texto oral e escrito? Qual se usa mais? Onde? Quando? 3. Para quem vocês escrevem?

4. Em quais situações vocês escrevem?

5. Existe diferença para vocês entre produzir um texto na escola e produzir um texto em outro momento, que não seja na escola? Comentem.

6. Descrevam quais os textos que você produz na escola, ou apenas comentem sobre eles.

7. E sobre os tipos de textos produzidos fora da escola? Falem sobre isso.

Foram dois os objetivos previstos para essas aulas. O primeiro, levar os alunos a perceber que:

a) no seu dia-a-dia, há inúmeros gêneros do discurso que circulam nas mais diversas esferas sociais (jornalística, do comércio, escolar, trabalho, cotidiano, etc.);

b) os gêneros podem ser produzidos na modalidade oral ou escrita;

c) eles produzirão os gêneros nas diversas situações de interação e de acordo com as esferas em que estiverem inseridos;

d) há diferença entre escrever um texto de acordo com a esfera;

e) a esfera escolar é o lugar em que mais se produz (ou se deveria produzir) textos nessa idade em que eles estão, principalmente e, infelizmente, os gêneros escolarizados.

f) através das discussões sobre as respostas dadas, eles podiam descobrir as diversas práticas textuais, os diversos modos de dizer na sociedade.

O segundo objetivo foi explicitar e analisar as concepções de “texto” dos alunos. As respostas de todos os grupos foram reunidas, a fim de melhor se proceder às comparações. As respostas a todas as questões não surpreenderam por seu teor, uma vez que já esperávamos que os alunos fossem reproduzir, de certa forma, o ensino escolar. A tradição do ensino da gramática e o trabalho com a produção de texto como pretexto para os aspectos gramaticais, como já expusemos no capítulo I, talvez possam justificar as respostas dadas pelos alunos. Contudo, houve casos em que algumas respostas contradisseram o discurso e a prática escolar. E é sobre esses casos, principalmente, que nesta seção se chamará a atenção. À medida que iam ocorrendo as apresentações/discussões das respostas, íamos trabalhando as idéias centrais previstas para cada objetivo proposto para a atividade desenvolvida com o questionário.