5.1 – Sai Riedel, entra Brandt
No caminho de Ouro Preto, Lund e Riedel passaram por diversos arraiais ao longo da
Serra do Caraça até chegar em 24 de novembro de 1834 a capital da Província de Minas
Gerais, o ponto final da expedição. Uma vez lá, Riedel desejava seguir imediatamente para
o Rio de Janeiro a fim de descansar junto a sua família, que não via há 13 meses, mas caiu
doente por várias semanas. Lund, por sua vez, sonhava voltar aos limites do cerrado para
voltar a pesquisar as “cavernas místicas”, como se referia a elas. Mas aproveitou a estadia
para escrever um estudo detalhado sobre a vegetação dos campos, intitulado “Observações
sobre a vegetação dos planaltos interiores do Brasil, em especial com relação à história das
plantas”(LUND, 1835), terminado em 8 de fevereiro e enviado desde a pequena Cachoeira
do Campo, atual distrito de Ouro Preto, a J. Reinhardt, a quem Lund pediu para que a
memória fosse apresentada em sessão da Sociedade Científica de Copenhagen, o que de
fato aconteceu em 10 de julho.
Nesta memória Lund detalha os três principais tipos de vegetação encontrados nos
campos, quais sejam a então já rara mata fechada ou catanduva;127 o cerrado com sua
vegetação arbustiva, seus troncos tortuosos e espinhentos; e os campos limpos
propriamente ditos. Este talvez seja o principal trabalho de Lund na área da Botânica, pois
em sua análise o naturalista descreve as três vegetações como fruto das queimadas feitas
pela ação humana. De acordo com Lund, as queimadas promovidas pelos portugueses
desde os tempos coloniais não seriam suficientes para explicar a diferença entre aquelas
vegetações. Segundo o autor, a diferenciação entre catanduva, cerrado e campo só poderia
127
Segundo Warming, a catanduva (“a matta virgem particular dos planaltos”) citada por Lund seria
originária do Estado de São Paulo (WARMING, 1980, p.106). Para Löfgren, “encontram-se estas mattas
principalmente no interior e fora dos cursos dos grandes rios. São os cerradões ou caatanduvas, como os
indígenas lhes denominam” (LÖFGREN, 1917, p.13). Para uma explicação mais aprofundada vide WALTER,
2006.
ser explicada se tivessem havido antes da chegada dos europeus incontáveis incêndios
promovidos pela população indígena.128
Lund enviou uma parte da coleção botânica reunida durante a viagem para De
Candolle, em Genebra. Outra parte seguiu para o Jardim Botânico de Copenhagen, assim
como para J. W. Hornemann.129 Riedel, por sua vez, despachou suas coleções para São
Petersburgo, comprometido que estava com o governo russo.130
Riedel precisou de seis semanas para se consvalescer. Nesse meio tempo, Lund
aproveitou para visitar algumas grutas no arredores de Cachoeira do Campo. Quando
Riedel por fim se restabeleceu, no início de fevereiro de 1835, partiu para o Rio, indo ao
encontro da sua família e de uma longa carreira como diretor do Jardim do Passeio Público,
o futuro Jardim Botânico do Rio de Janeiro – mas isso ele ainda não sabia. O alemão jamais
veria seu companheiro dinamarquês novamente, embora tenham trocado extensa
correspondência pelo resto da vida de Riedel.
A partida do amigo liberou Lund para perseguir seu destino. Deixou Ouro Preto em 9
de fevereiro com destino a Curvelo, decidido a estudar as cavernas de ossos. Ao longo do
caminho, cruzou as cidades de Congonhas, Sabará e, pela segunda vez, Lagoa Santa. Apeou
na fazenda Porteirinhas um mês depois, como recorda em carta ao irmão caçula Henrik
Ferdinand, de 21 de abril de 1835:
“Foi uma feliz coincidência o fato de que, justamente no local em que eu começo as
minhas pesquisas nas grutas, mora um fazendeiro, o Sr. Claussen, que tem uma
fazenda de criação de gado e uma casa construída em estilo europeu. Quando ele me
convidou para me hospedar em sua casa durante a fase de pesquisa, eu aceitei de bom
128
Com efeito, se esta constatação já era brilhante para a época em que foi feita, ela se reveste de grande
atualidade, uma vez que, passados 170 anos, a ação antropogênica na formação da vegetação brasileira é a
tese defendida com relação à floresta amazônica por arqueólogos como Eduardo Góes Neves, do Museu de
Arqueologia e Etnologia da USP, e Michael J. Heckenberger, do Departamento de Antropologia da
Universidade da Flórida (vide HECKENBERGER et al, 1999; HECKENBERGER, 2003;
HECKENBERGER et al, 2007; para uma visão opositora, vide BUSH et al., 2007).
129
Jens Wilken Hornemann (1770-1841), botânico dinamarquês, professor na Universidade de Copenhagen.
130O restante da coleção de Lund seria dado 30 anos mais tarde ao jovem botânico Johannes Eugenius Bülow
Warming (1841-1924), que trabalhou como seu secretário entre 1863 e 1866. Warming usaria a coleção como
fonte de estudo para a sua obra Symbolae ad floram Brasiliae centralis cognoscendam (1867-93).
grado, e agora eu me encontro em uma situação que não poderia ser mais
agradável”.131
Mas a tranqüilidade durou pouco, como informou ao mesmo irmão em 18 de agosto:
“Nas minhas viagens para pesquisar grutas, fui levado a uma fazenda, acho que já
havia mencionado esse fato em outra carta, cujo proprietário é um dinamarquês
chamado Claussen. A localização privilegiada de tal fazenda, próxima às mais
fantásticas grutas, fez com que eu aceitasse o convite para ali me hospedar até a
conclusão das pesquisas. Eu mal tinha acabado de me instalar na fazenda quando algo
aconteceu e perturbou a paz do meu trabalho: a chegada de uma pequena colônia de
dinamarqueses, composta de homens e mulheres, parentes de Claussen, que deveriam
participar da administração da fazenda. Sem ter onde me refugiar, tive que continuar
lá, muito a contragosto. Eu não tinha muita simpatia por Claussen e o que previa
aconteceu: os homens se desentenderam. Enquanto isso as mulheres, longe de tudo
que lembrava a terra natal e sem nenhum tipo de compensação para preencher tal
lacuna, por fim se desiludiram e gritavam que queriam voltar para casa. Mas, os
irmãos, egoístas por natureza e vendo suas expectativas frustradas, se negaram a
ajudá-las a esse respeito. Finalmente, consegui me livrar dessa rede de intrigas,
formada por tanta discórdia, e fui morar em uma cidadezinha perto dali. Mas ainda
assim não consegui retomar a paz desejada. As infelizes vítimas dessa egoísta
especulação recorreram a mim, em busca de proteção, então eu tive que providenciar
a viagem delas para o Rio, antes de prosseguir minha viagem.Todo esse episódio me
causou muito aborrecimento, além de representar um grande desperdício de tempo,
mas, em meio a tudo isso algo de bom aconteceu: eu conheci um pintor norueguês
que, por caminhos tortuosos, veio parar na fazenda e, desapontado com os
acontecimentos e sem perspectiva, só pensava em me acompanhar nas viagens”.132
Este homem de 46 anos era Peter Andreas Brandt, que havia anos antes abandonado a
família em Trondheim na Noruega para tentar a sorte na América, destino escolhido por
131
Tradução gentilmente cedida por Augusto Auler.
132Idem.
outros 50 milhões de europeus no século XIX. O objetivo inicial de Brandt era seguir para
o Chile, mas acabou sem vintém e no Brasil, na fazenda Porteirinhas de Peter Claussen.133
Mesmo sem jamais conseguir falar bem o português, Brandt tinha um talento para o
desenho que se mostraria de inestimável ajuda para as memórias de Lund sobre as
cavernas. A partir deste dia, e até a sua morte, o destino de Brandt estaria ligado ao do
naturalista dinamarquês.
5.2 – Crônica de uma rivalidade
Lund não era um homem de repetir a mesma história. Na coleção de mais de mil
cartas armazenadas na Biblioteca Real de Copenhagen, percebe-se que ele não costumava
retomar com alguém um assunto já tratado nem tratar de assuntos específicos que não se
referiam diretamente àquele determinado destinatário. Assim, o irmão distante nunca
procurou detalhar a rotina do trabalho nas cavernas e das suas pesquisas científicas na
correspondência trocada com seus familiares. Do mesmo modo, o naturalista jamais
confessou nenhuma dificuldade financeira nas mensagens trocadas com seu orientador, o
Prof. J. Reinhardt. No caso deste último, a lembrança daquele primeiro desentendimento
com Claussen – haveria muitos outros – foi retomada em 20 de fevereiro de 1839:
“Quanto ao meu trabalho, pela primeira vez eu me queixo sobre um incidente
ocorrido, algo que me atingiu, ou melhor, que afetou o meu trabalho, tal incidente
tendo sido obra de um fazendeiro, um Sr. Claussen, sobre quem eu já tinha falado em
outra carta. Eu me hospedei em sua fazenda quando iniciei o trabalho de pesquisa nas
primeiras grutas. Como você sabe, foi através dele que encontrei as primeiras ossadas.
Mas, por motivos bem fundados, resolvi me afastar dele, embora naquela época ele
não tivesse feito nada comigo. Há um ano e meio estive em uma gruta em Sete
Lagoas, onde descobri ossadas de Megalonyx cuvieri;134 eu não dispunha de meio de
transporte suficiente, por isso só deixei que escavassem o que podia carregar, com a
intenção de voltar assim que surgisse uma oportunidade, para pegar o resto. Por uma
133
A primeira biografia de Brandt foi recentemente publicada na Dinamarca (vide HOLTEN et al, 2003).
134Megalonyx, uma das diversas espécies extintas de preguiça terrícola.
incrível coincidência, fui obrigado a demitir por causa de mau comportamento um
inglês que até então tinha me acompanhado, mas ele permaneceu ali naquela área e
acabou indo parar na casa do Sr. Claussen, tendo lhe contado sobre a descoberta;
Além disso, o Sr. Claussen tinha acabado de vender a fazenda, estava saindo de
Curvello e passou exatamente pelo local onde ficava a gruta mencionada acima. Ao
fingir para o proprietário da gruta que tinha sido mandado por mim, conseguiu
permissão para levar o resto da ossada, tendo enviado tal ossada para o Rio. Assim
que tomei conhecimento disso, escrevi ao meu correspondente no Rio e pedi que ele
tratasse desse assunto com o Sr. Claussen. Ele tentou encontrá-lo várias vezes e
quando finalmente conseguiu, era tarde demais: a ossada tinha sido vendida para um
francês, Sr. Guillemin,135 que se encontrava no Rio de Janeiro. Ele tinha oferecido
uma quantia correspondente a 250 rigsdaler. Essa foi a primeira interferência no
monopólio que eu tinha a felicidade de possuir. Isso me preocupou muito, não só pela
perda que representava para mim, mas também pelas conseqüências que teria,
inevitavelmente, no futuro”.136
Uma nova carta a J. Reinhardt de 13 de maio de 1840 traz mais informações sobre o
acirramento do ânimo de Lund com relação ao seu compatriota:
“Como você deve se lembrar, nas cartas mais antigas eu mencionei que o encontrei na
cidade de Curvello, próxima ao local onde se situava a fazenda dele. Eu e o Sr. Riedel
tínhamos sido convidados a permanecer alguns dias em sua fazenda, após nossa
penosa viagem pelo sertão. Foi aqui que eu vi os primeiros ossos de fósseis e para
onde resolvi voltar, depois de concluir a viagem com o Sr. Riedel. Logo depois do
meu retorno, pesquisei com ele a gruta de Maquiné, e o fato dele ter demonstrado
grande entusiasmo e interesse por esse tipo de pesquisa me levou a aceitar sua
sugestão de fazermos juntos outras viagens com tal fim. Mas acabei ficando muito
pouco tempo na casa dele. O desentendimento entre ele e seus familiares, que tinham
vindo da Dinamarca, me desanimou de tal forma que falei para ele que iria deixar a
fazenda. Eu me mudei para Curvello, ali perto. As cenas que tinha presenciado na
135
Antoine Guillemin (1796-1842).
136
Tradução gentilmente cedida por Augusto Auler.
fazenda acabaram por me revelar traços em seu caráter que me desagradaram. Eu me
preparei para retomar as viagens e quando ele me procurou para me lembrar que
tínhamos combinado de viajar juntos. Eu disse, sem rodeios, que não tinha nada
contra ele, mas que as atitudes dele em relação à família me revelaram um lado dele
que me fez entender que nós tínhamos uma diferença tão grande de caráter e de
princípios que não daria certo viajarmos juntos. Isso o deixou furioso e, como
conseqüência, ele me tentou prejudicar em várias ocasiões. Um prova disso foi o
mencionado roubo nas grutas de Sete Lagoas. Ele levou das grutas o resto de dois
esqueletos de Platyonyx cuvieri e owenii,137 dos quais eu tinha levado uma parte, e,
juntamente com algumas ossadas pequenas, os vendeu para Guillemin, um botânico
francês que se encontrava no Rio (a mando do governo francês, para levar plantas de
chá daqui para a Argélia); tal material foi enviado para o museu em Paris. Claussen
recebeu 3.000 francos e foi nomeado correspondente do museu. O sucesso dessa
primeira tentativa o encheu de entusiasmo e eu previ que ele seria um perigoso
concorrente. Mas o que mais me fez mal é que ele queria tratar o caso como
especulação, o que afetaria, por um lado, a ciência, já que se tratava de uma escavação
feita por um especialista, para evitar as inevitáveis trocas e enganos em relação à
idade das ossadas e, por outro lado, a Dinamarca, que perderia os tesouros que seriam,
com muito orgulho, enviados por mim. Ele prontamente reiniciou as viagens, veio a
Lagoa Santa e me fez uma visita. Tendo em mente o grande prejuízo que sofri por ter
evitado o contato com ele, achei por bem colocar uma pedra sobre o que tinha
acontecido. Embora desejasse cortar a ligação com ele, preferi fazer um sacrifício em
nome da ciência. Então eu o recebi sem reservas, mostrei-lhe o que tinha recolhido e o
informei sobre minhas descobertas. E também dei a ele as instruções necessárias para
encontrar cada uma das várias grutas onde eu tinha estado, declarando em qual delas
eu tinha encontrado, ou não, ossadas, fazendo apenas a ressalva de que eu deveria ter
o direito de negociação do material que ele poderia vir a encontrar nessas grutas.
Como eu tinha encerrado minhas pesquisas nessas grutas e não tencionava visitá-las
novamente, a vantagem é que ele poderia fazer uma nova pesquisa em tais grutas uma
vez que eu, devido ao acordo feito com ele, tinha garantido o direito de negociação de
137
Lund descreveu o Platyonyx Lund nos Annales des Sciences Naturelles, Paris, v.13, p.316, 1840.
todo o material que fosse encontrado. A única coisa que me deixava um tanto
apreensivo é que existia por aqui uma gruta onde eu ainda não havia estado, ou onde
eu ouvi falar que existiam ossadas. Mas eu calculava que ele não sairia à procura de
tal gruta. Depois de ter pesquisado, em vão, as grutas que eu tinha mencionado, ele se
esforçou ao máximo para fazer novas descobertas e, como eu temia, saiu em busca
daquela gruta onde eu não havia estado. Todo esse esforço foi recompensado com
algumas pequenas descobertas que foram colocadas à minha disposição. Todo o
material encontrado cabia em uma caixa de alguns centímetros cúbicos, mas dentre tal
material havia restos de quatro novas espécies, como um dente de Megatherium
(tabela 74) e um crânio de um Mephitis (tabela 73), uma mandíbula de um Cebus
(tabela 72) e um pedaço do osso ilíaco de uma pequena espécie de Jacchus. Em troca,
dei a ele uma quantidade bem maior de restos de fósseis da minha coleção, dos quais
eu tinha duplicata, e ele ficou satisfeito com a troca. Então nós manifestamos um
desejo mútuo de, a partir daquele momento, não prejudicar o trabalho um do outro, e
sim unir nossos esforços para que os dois pudessem ser beneficiados.” 138
Sobre o mesmo assunto, Lund escreveu ao Henrik Ferdinand em 7 de maio de 1840:
“Talvez você se lembre que, nas cartas mais antigas, eu mencionei um fazendeiro
chamado Claussen. Como ele pretende viajar para a Europa e é provável que inclua a
Dinamarca no roteiro, e, nesse caso, certamente entraria em contato com você e
Christian, é importante que lhe conte algo sobre essa pessoa. Eu tive muito contato
com ele aqui e, embora ele não tivesse feito nada diretamente contra mim, eu não o
considerava uma pessoa de bom caráter, por isso me afastei dele. Ele ficou com raiva
e tentou me prejudicar de várias maneiras. Quando esteve aqui e me fez uma visita,
intui que seria melhor esquecer o que passou, ou seja, que seria melhor ficar em bons
termos com ele. Ele é muito talentoso e com a garra que tem, com as atividades que
promove em relação ao trabalho, poderia prestar uma grande ajuda, mas, como já
disse, na minha opinião ele não é uma pessoa de bom caráter. Por isso, não quero me
138
Tradução gentilmente cedida por Augusto Auler.
envolver muito com ele, mas também não quero romper definitivamente a ligação.”
139
Como Claussen prosseguiu na sua caça sistemática por traféus fósseis para venda, as
relações entre os dois deterioraram definitivamente. Ao saber do embarque do rival para a
Inglaterra em 1840, levando consigo uma grande coleção de fósseis,140 Lund tratou de
advertir o irmão mais velho, Johan Christian, em carta de 21 de agosto de 1840.
“Há pouco tempo chegou a Antuérpia, proveniente do Rio, um fazendeiro, Claussen,
acho que já escrevi sobre ele nas cartas mais antigas. Como ele talvez vá a Dinamarca
e pense em procurar você ou o Ferdinand, é bom que vocês saibam que tipo de pessoa
ele é. Eu o conheci, coincidentemente, no interior e me hospedei por um curto período
na fazenda que, naquele época, era propriedade dele. Nesse período eu pude conhecer
um lado não muito agradável de sua personalidade. Ao mesmo tempo ouvi, em
viagens que fiz à capital do Estado, vários relatos negativos a seu respeito. Quando
voltei, então, para a fazenda dele, lá encontrei algumas pessoas de sua família e
observei, no modo como tratava tais parentes, algo que muito me desagradou. Por isso
achei que seria conveniente me afastar dele. Ele ficou furioso com minha reação e, daí
em diante, tentou me prejudicar em várias ocasiões, algumas vezes com êxito, por
exemplo, uma vez em que seguiu meus passos e levou uma parte considerável de
ossadas que eu tinha reservado, por não poder transportá-las no dia em que as
descobri. Tais ossadas foram por ele levadas ao Rio de Janeiro e, em seguida,
vendidas para um museu em Paris por 3.000 francos. Como percebi que era perigoso
tê-lo como inimigo, resolvi colocar uma pedra sobre o que tinha acontecido quando
soube que ele queria me procurar. Então, quando ele, passado algum tempo, veio me
procurar, eu o recebi sem reservas. Enfim, esse é um resumo da minha relação com
ele, o que é bom você saber, uma vez que ele é uma pessoa extremamente ardilosa e,
portanto, cheio de “planos”. Eu pressinto que ele, para atingir seus objetivos, tire
139
Idem.
140
Inteiramente adquirida pelo Museu Britânico entre 1841 (DARWIN, 1988, p.195).
proveito desse bom entendimento que agora estamos tendo novamente para forjar
uma intimidade, ou ligação, entre nós, e depois poder me enganar.” 141
Em 1843, Claussen retornou ao Brasil. Veio com equipamentos, instrumentos e
recursos para retomar e ampliar sua busca por fósseis, ao que Lund reagiu em carta a J.
Reinhardt, de 16 de Novembro de 1843:
“Apesar da pausa de 10 meses (...) devo me justificar por esta espera através de uma
carta longa e detalhada para preencher esta lacuna. (...) Este período de silêncio foi
utilizado em viagens e escavações nas cavernas, nas quais eu tive minha coleta mais
importante, de um lado por ter coletado tudo que havia sido deixado do ano passado
quando a revolução me deixou perturbado, e por outro lado por ter salvado tudo o que
pude de ser pilhado pelo notório Claussen, que voltou trazendo a bordo uma enorme
bagagem, que teve que transportar por quase toda a Europa” (LUND, 16/11/1843). 142
No ano seguinte, em carta enviada a J. Reinhardt em 26 de abril, Lund conta como
evitou o contato com uma expedição francesa unicamente porque Claussen já havia feito
contato com ela, mostrando um desejo de isolamento que com o tempo só iria se
acentuar.143
“O freqüentemente mencionado e notório ex-colega Claussen (que agora se passa por
francês144) partiu uma vez mais para a Europa com a sua coleção per faz + nefas.145
Só Deus sabe quantas insolências e falsidades impertinentes ele irá espalhar desta vez,
No documento
tel-00289537, version 1 - 21 Jun 2008
(páginas 93-121)