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CAPÍTULO 5 – Caracterização sócio-ambiental

5.2. Visitas, diálogos e impressões

5.2.11. Transecto Iporanga-Miracatu

Ao final do trabalho de campo realizado em novembro de 2004, decidi evitar o retorno pelo mesmo caminho que eu havia utilizado, isto é, a rota via Apiaí, por considerar que a estrada, dadas as suas condições naquele momento, oferecesse muito risco e perigo efetivos. Optei por atravessar o Vale e conhecer a outra rota utilizada pelos turistas para chegar a Iporanga.

Tracei o caminho em meu mapa e dei início à viagem. O percurso, rumo à rodovia Régis Bittencourt, teve como referência os municípios de Eldorado, Sete Barras, Juquiá e Miracatu. A estrada, apesar da precariedade, era infinitamente mais segura do que a outra que eu havia evitado. As condições do asfalto, mesmo com os inúmeros buracos, permitiam um trafegar tranqüilo. Sempre acompanhando o curso do rio Ribeira, a estrada assentada sobre a planície ao fundo do vale permite uma visão privilegiada do uso e ocupação das margens do rio. Durante o percurso, há grandes extensões onde a floresta ciliar foi totalmente removida e, quando não, há indícios de forte alteração fitofisionômica (Figura 5.2.11.1).

Figura 5.2.11.1 – Ausência de mata ciliar. Trecho do rio Ribeira de Iguape entre os municípios de Iporanga e Eldorado (foto do autor).

As matas ciliares possuem um importante papel dentro da rede de drenagem de uma bacia hidrográfica. De acordo com Lima (1989), essas formações florestais são parte integrante do sistema hidrológico e desempenham suas funções de várias formas, entre as quais se destacam a sua propriedade em promover a estabilização das ribanceiras dos rios por meio do desenvolvimento e manutenção de um extenso emaranhado radicular. Além disso, diminuem e filtram o escoamento superficial, impedindo ou dificultando o carreamento de sedimentos para o sistema aquático, contribuindo, dessa forma, para a manutenção da qualidade da água nas bacias hidrográficas. Outro aspecto que deve ser ressaltado diz respeito à sua integração com a superfície da água, proporcionando cobertura e alimentação para peixes e outros componentes da fauna aquática, ou mesmo contribuindo para a estabilidade térmica dos cursos d’água.

Apesar de serem formações vegetais protegidas através da Lei Federal nº 4.771 de 15 de setembro de 1965, e mais tarde contemplada na Constituição Federal de 1988, as matas ciliares vêm sendo devastadas, principalmente para a retirada de madeira e para a exploração agropecuária (BARBOSA et al., 1989), tal como tem ocorrido em boa parte das áreas de várzeas ao longo do rio Ribeira, no trecho entre Iporanga e Eldorado, onde a mata

original cedeu lugar para extensos campos de pastagens ocupados por rebanhos bovinos (Figura 5.2.11.2). Embora haja uma boa manada de búfalos, a pecuária convencional foi avistada com maior freqüência por ocasião deste trabalho. Pela qualidade do rebanho, pouco selecionado e repleto de cruzamentos, podemos inferir que se trata de uma atividade em estágio rudimentar.

Figura 5.2.11.2 – Área de pastagem ao longo do rio Ribeira entre Iporanga e Eldorado. As conseqüências negativas sobre o ambiente devido à remoção da floresta ciliar se estendem por uma longa lista de problemas ecológicos (veja, por exemplo, MENDES JR, 1999). Contudo, para o caso deste trabalho, não podemos deixar de ressaltar os problemas ligados à erosão de camadas superficiais do solo e ao desmoronamento das barranceiras, com efeito direto no processo de assoreamento do rio Ribeira. De acordo com o Instituto Socioambiental (2002), as enchentes do rio Ribeira vêm se avolumando nos últimos anos em função do assoreamento causado pelo desmatamento das margens desse rio. Outro problema que vale a pena salientar, que também resulta da remoção da cobertura ciliar, diz respeito ao aumento na taxa de contaminação da água por insumos agrícolas, principalmente aqueles provenientes da bananicultura, pois a mata ciliar opera como um sistema tampão, filtrando e retendo os sedimentos antes que esses sejam drenados para o curso do rio (REICHARDT, 1989).

Outro elemento bastante freqüente nesta região são os lagos artificiais para a produção de peixes que se destinam ao abastecimento de empreendimentos ligados à pesca esportiva, os

quais são denominados popularmente de “pesque-pagues” (Figura 5.2.11.3). De acordo com o relatório final da Agenda de Ecoturismo do Vale do Ribeira (2005), a pesca esportiva se constitui num importante atrativo turístico da região e está baseada na psicultura de peixes exóticos à região. Esse tipo de psicultura, de acordo com a mesma fonte, produz sérios impactos ambientais na região. Isso se dá em função da fuga de peixes exóticos para os rios, o que ocorre principalmente durante as cheias e inundações ao longo do período chuvoso. Esses peixes que escapam de seu confinamento, os tanques de cultivo, causam danos às espécies de peixes nativos por meio da transmissão de doenças, competição por alimento e por áreas de reprodução. A Agenda de Ecoturismo, nesse mesmo relatório, aponta que estudos realizados recentemente pelo Núcleo de Pesquisas do Litoral Sul, vinculado ao Instituto de Pesca, indicam uma diminuição anual do estoque de pescado nativo em favor de um número crescente de espécies exóticas.

Ao longo do caminho, nas proximidades de Eldorado, extensos bananais se tornam mais freqüentes na paisagem que se completa com extensas áreas de floresta sobre terrenos montanhosos.

Figura 5.2.11.3 – Pesqueiro localizado às margens da estrada entre Iporanga e Eldorado (foto do autor).

A partir de Eldorado, em direção ao município de Sete Barras, a estrada vai, aos poucos, ganhando condições graves de precariedade, principalmente, nos trechos entre bananais. A monocultura da banana se torna o elemento dominante na paisagem (Figura 5.2.11.4), mas ainda é possível encontrar a pecuária bovina, lagos destinados à pesca esportiva e algumas pousadas na beira da estrada, indicando alguma atividade turística.

Figura 5.2.11.4 – Bananal nas proximidades do município de Sete Barras (foto do autor). Os bananais na região do município de Sete Barras, em direção ao município de Juquiá, estendem-se por muitos quilômetros e possuem uma estrutura interessante. Mais ou menos a cada quilômetro, há uma pequena casa feita em alvenaria na beira da estrada, sempre igual na sua arquitetura, encravada no meio do bananal. Praticamente todas são habitadas e, a depender do tamanho da família, algumas possuem cômodos adicionados à estrutura básica que compõe todas as outras casinhas. Minha hipótese é que deve haver um sistema onde cada grupo familiar é responsável por um talhão com dimensões idênticas, sendo toda a propriedade pertencente a um patrão. Em alguns poucos pontos, ao longo dessa estrutura linear, algumas casas se agregam formando pequenas vilas, muito pobres, que vão vivendo às expensas da cultura da banana.