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3 A QUARTA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL: O INÍCIO DE UMA NOVA ESTRUTURA

3.4 Transformação nas Relações de Trabalho

Conforme afirma Castells (1999b), a tecnologia da informação é um fator fundamental para essa emergente economia em rede, pois permite a formação de redes de produção e gerenciamento onde os indivíduos possam ser conectados e desconectados de acordo com as necessidades das empresas ou do mercado. Isso induz uma grande diversidade de status de emprego: tempo parcial, trabalho temporário, trabalho autônomo e subcontratação. Logo, a tendência será a progressiva desativação de empregos sob o modelo estável de longo prazo e cada vez mais contratações temporárias e por demanda.

Diante do afrouxamento dos vínculos entre as empresas e trabalhadores, Castells (1999b), apresenta os seguintes desafios:

Para as empresas: elas terão que administrar a contradição entre, por um lado, o papel crítico do envolvimento do trabalho em fomentar a produtividade no sistema informacional de produção e, por outro lado, os limites ao envolvimento do trabalho devido à natureza temporária da conexão dos trabalhadores com a empresa. Para trabalhadores: seu valor dependerá cada vez mais de sua capacidade de armazenar conhecimentos especializados e reprogramar suas habilidades de acordo com a demanda do mercado, o que, em última análise, significa educação e desenvolvimento cultural. Para os sindicatos: com o vínculo entre as empresas e seus trabalhadores cada vez mais frouxos, terão que reinventar seu papel mais como atores políticos da sociedade, em vez de representantes de funcionários com base em firmas, pois agora os trabalhadores estão cada vez mais diversificados no universo da empresa em rede (CASTELLS, 1999b, p.4, tradução nossa).

Visto isso, esse autor conclui que de certa forma esse modelo de produção em rede e a individualização do trabalho deixam os trabalhadores independentes para trabalharem onde, como e quando quiserem. O que pode ser considerado bom quando estão fortes, saudáveis e aptos às exigências do mercado, todavia, pode se transformar em uma condição dramática quando suas habilidades se mostrarem insuficientes as demandas ou quando forem acometidos por algum imprevisto (doenças, acréscimos, problemas psicológicos, falta de habitação etc.).

O fenômeno do aumento significativo no número de trabalhadores independentes e/ou transitando por várias empresas e negócios, foi pesquisado por Daniel Pink (2001). Na época da publicação de seu estudo, foi constatado que cerca

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de 30 milhões de profissionais, dos EUA e Austrália, abandonaram voluntariamente ou não seus empregos para tornarem-se profissionais autônomos: freelances, contratados, microempreendedores, executivos interinos, franqueados e muitas outros tipos de trabalhos autônomos. O autor propõe que essa espécie de êxodo empregatício decorre de vários motivos, entre eles os mais aparentes são: várias empresas reduzindo e/ou atualizando seus quadros de funcionários; novas oportunidades de negócio; trabalhadores com mais poder de compra; a ascensão da ideia de que qualquer um pode ser empreendedor; a busca por mais significado sobre o que fazem e anseio por mais liberdade em suas ações.

No entanto, o autor também salienta que essa transição não é uniformemente positiva, especialmente para aqueles com menos qualificações ou recursos para exercer funções que estejam à disposição. Estes, poderão acabar se transformando em “escravos temporários”— pessoas que passarão a vida em uma espécie de esteira sem fim ganhando baixos salários, sem benefícios e sem segurança (PINK, 2001).

Segundo Schwab (2016), o advento desse novo paradigma econômico baseado na demanda tem transformado fundamentalmente as relações de trabalho. Além disso, sinaliza a crescente utilização das “nuvens humanas” por parte das empresas, ou seja, estas estão recorrendo cada vez mais a serviços terceirizados.

Sobre as “nuvens humanas” e a nova modalidade de “trabalho por demanda” o autor diz o seguinte:

As atividades profissionais são separadas em atribuições e projetos distintos; em seguida, elas são lançadas em uma nuvem virtual de potenciais trabalhadores, localizados em qualquer lugar do mundo. Essa é a nova economia sob demanda, em que os prestadores de serviços não são mais empregados no sentido tradicional, mas são trabalhadores bastante independentes que realizam tarefas específicas (SCHWAB, 2016, p.41).

Esse modelo de contratação torna-se muito vantajoso para as empresas e, em particular, para as startups que crescem muito rapidamente oferecendo esse tipo de mediação. “Já que as plataformas de nuvem humana [como Uber, Getninjas, Airbnb etc.] classificam os trabalhadores como autônomos, elas estão — no momento — livres da obrigação de pagar salários mínimos, tributos e benefícios sociais” (SCHWAB, 2016, p.41).

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Levando em conta todos esses aspectos apresentados, Schwab aponta as seguintes questões:

Será que esse é o começo de uma revolução do novo trabalho flexível que irá empoderar qualquer indivíduo que tenha uma conexão de internet e que irá eliminar a escassez de competências? Ou será que irá desencadear o início de uma inexorável corrida para o fundo em um mundo de fábricas virtuais não regulamentadas? Se o resultado for o último — um mundo do "precariado", uma classe social de trabalhadores que se desloca de tarefa em tarefa para conseguir se sustentar enquanto perde seus direitos trabalhistas, ganhos das negociações coletivas e segurança no trabalho —, será que isso criaria uma grande fonte de agitação social e instabilidade política? Por fim, será que o desenvolvimento da nuvem humana irá apenas acelerar a automação dos postos de trabalho humano? (SCHWAB, 2016, p.42).

Para Antunes (2018), as empresas, sob o comando do capital financeiro, buscam garantir seus altos lucros impondo aos trabalhadores e trabalhadoras a responsabilidade pela maximização do tempo, das altas taxas de produtividade e redução dos custos. O autor aponta que a terceirização vem se tornando uma estratégia empresarial muito utilizada,

uma vez que as relações sociais estabelecidas entre capital e trabalho são disfarçadas em relações interempresas, baseadas em contratos por tempo determinado, flexíveis, de acordo com os ritmos produtivos das empresas contratantes, com consequências profundas que desestruturam ainda mais a classe trabalhadora, seu tempo de trabalho e de vida, seus direitos, suas condições de saúde, seu universo subjetivo etc. (ANTUNES, 2018, p. 32). Esse autor, ainda apresenta outra modalidade de trabalho: o zero hour contract (contrato de zero horas). Ele descreve essa modalidade da seguinte forma:

A instabilidade e a insegurança são traços constitutivos dessas novas modalidades de trabalho. Vide a experiência britânica do zero hour contract [contrato de zero horas], o novo sonho do empresariado global. Trata-se de uma espécie de trabalho sem contrato, no qual não há demanda, basta uma chamada e os trabalhadores e as trabalhadoras devem estar on-line para atender o trabalho intermitente (ANTUNES, 2018, p.23).

Pela observação dos aspectos analisados até aqui, conclui-se que, juntamente com as transformações na econômicos e no trabalho, emergem novos desafios e oportunidades. Portando, cabe a todos os envolvidos (trabalhadores, empresários,

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Estado e lideranças) uma participação ativa, buscando garantir não só a produtividade mais também sustentabilidade e qualidade de vida para as pessoas.

No capítulo seguinte, falaremos sobre e processo de constituição subjetiva dos sujeitos contemporâneos, identificando características específicas desse novo sujeito e, para finalizar, é feita uma discussão acerca dos rompimentos das barreiras entre o público e privado e também sobre como nossas informações pessoais viraram um capital muito valioso.

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4 TECNOLOGIAS E SUBJETIVIDADE

Neste capítulo, ao pretendermos trabalhar questões mais específicas advindas da inter-relação entre os sujeitos e as novas tecnologias, continuaremos partindo de concepções interdisciplinares que envolvem disciplinas como psicologia, psicanálise, antropologia, sociologia e filosofia a fim de compreendermos os mais diversos aspectos subjetivos dessa interação.

4.1 Inovações Tecnológicas e suas Implicações Subjetivas

A atual relação simbiótica entre desenvolvimento tecnológico e capitalismo contemporâneo engendra uma verdadeira metamorfose na configuração mundial. Essas transformações não são apenas no âmbito econômico (mercado), mas também se referem ao modo como os sujeitos se constituem em suas práticas materiais. Desse modo, conforme Chiaretti (2016) presenciamos também uma nova economia da subjetividade, “marcada pela relação entre consumo e tecnologia, que inaugura maneiras inéditas de ser e estar no mundo” (p.3).

Graças a comunicação sem fio e aos dispositivos móveis, nos transformamos em seres híbridos, com ações mediadas por diversas plataformas digitais. Essa nova experiência ganhou até um nome: “cibridismo”, um termo novo, utilizado para representar o elo existente entre a vivência on e off-line.

De Andrade e Santos (2018), afirmam que essa nossa sociedade em rede não só afeta a forma como o sujeito se constitui e se relaciona, como também faz com que essas novas ferramentas passem a fazer parte do seu modo de ser. Além disso, esses autores acrescentam que a disseminação das novas tecnologias digitais casou perfeitamente com os propósitos do capitalismo à medida que potencializam o consumismo, a competitividade e a exposição.

McLuhan (1974), um dos primeiros a falar acerca da influência das novas tecnologias no comportamento humano, foi taxativo ao afirmar que qualquer artefato produzido pelo homem se transforma em extensão deste ao ser utilizado. Talvez, dessas ideias inovadoras tenha surgido a icônica frase atribuída a ele: “os homens criam as ferramentas, e as ferramentas recriam os homens”.