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Um desenvolvimento tecnológico desenfreado

No documento O CIBERESPAÇO COMO CATEGORIA GEOGRÁFICA (páginas 113-116)

4. PRESSUPOSTOS TERRITORIAIS DO CIBERESPAÇO

4.4 Um desenvolvimento tecnológico desenfreado

Desde que em 1965, Gordon E. Moore dispôs sua previsão acerca da possibilidade de que a cada 18 meses a capacidade de processamento de computadores dobraria (MOORE, 1965), a indústria de microeletrônica nunca mais parou de concretizar tal previsão, a ponto de ela ganhar o status de lei – a Lei de Moore. O desenvolvimento de novas tecnologias tem ganhando um incremento tal a cada momento, que torna impossível o acompanhamento para um cidadão mediano.

A sensação que se tem é a de que a tecnologia microeletrônica avança em

grau muito superior às reais necessidades humanas. Um indivíduos mediano necessita basicamente de um computador para acessar a internet, ver vídeos, escutar música e trabalhar com textos, planilhas e apresentações, nem mesmo a editoração de imagens é algo tão recorrente aos usuários médios. Acontece que os dispositivos tecnológicos mais recentes possuem uma capacidade de processamento infinitamente superior à realidade de uso.

A mesma coisa acontece para a capacidade de armazenamento de dados. Computadores atuais, com sua capacidade de armazenamento na ordem dos terabytes são muitas vezes subutilizados. Amplia-se freneticamente os discos rígidos dos computadores, compra-se dispositivos de armazenamento móveis (HDs externos) e no final, nunca se atinge a plenitude de utilização dessa capacidade.

Por mais que as necessidades não sejam as que a indústria de microeletrônica dispõe, elas se tornam em algum momento necessidades dado o grau de desejo impelido a objetos tecnológicos. A propaganda e a publicidade são nesse aspecto os criadores dessa ordem fetichizada da tecnologia, transformando em desejo de consumo o exagero de desempenho performático de computadores. E o mesmo ocorre com outros objetos que já ganharam o mesmo status, como os smartphones, por exemplo. Grande parte dos usuários de telefones móveis não sabe informar quantos celulares já possuíram ao longo da vida, trocando-os em muitos casos apenas porque outro modelo mais “moderno” já alcançava um preço mais acessível, ou quando não, o crediário possibilitava a aquisição desse bem pelo qual o indivíduo não possuía o dinheiro necessário para comprar.

A “Lei de Moore” pode não ser algo eterno, conforme mesmo preveem os especialistas (STRICKLAND, 2013, on-line), mas a capacidade de a indústria vender o desnecessário certamente ainda vai durar pelo menos uma década com a expansão da capacidade de processamento se ampliando nos modelos baseados em transístores, até que novas tecnologias sejam apontadas como necessárias em especial – os já pesquisados e em amplo desenvolvimento chips óticos, nanotubos ou processadores quânticos, são exemplos do que está por vir.

É certo que o desenvolvimento de tecnologias de microeletrônica com maior capacidade de processamento e armazenamento resultam em diversos outros aspectos que podem ser incorporados a um cálculo de eficiência e produtividade para certos ramos da economia, ou mesmo para o desenvolvimento científico, visto a necessidade cada vez mais latente da ampliação das capacidades humanas para a sustentação de certas ciências, como a física quântica, a astronomia, a genética, a bioquímica, a físico-química, dentre outras tantas possíveis – os contornos de uma ciência ciborgue? –, mas ainda assim, o sentido desse desenvolvimento é pouco questionado, como quase tudo que gira em torno do desenvolvimento tecnológico.

De todo modo, esse desenvolvimento da microeletrônica contribui de modo ímpar para a potencialização de dinâmicas territoriais, uma vez que é graças à dispersão dessas tecnologias que indivíduos mais proativos dentro do ciberespaço promovem suas ações. Se não fosse a possibilidade de uma conexão com a internet mais rápida e em maior quantidade de bytes trafegados, possível por meio da expansão das redes de fibras ópticas e das tecnologias via satélites, ainda existiria um gargalo comunicacional – à revelia de que ainda existam esses gargalos, como áreas rurais, ou continentes quase inteiros, como a África – que impediria o surgimento do fenômeno do tempo real que estrutura realidades territoriais bem complexas.

O sujeito conectado ao ciberespaço por meio de tecnologias extremamente ágeis de comunicação e informação podem estabelecer elos territoriais que não seriam possíveis no espaço geográfico comum. Por exemplo, a possibilidade de se filmar uma ação policial de uma ocupação urbana do Movimento de Trabalhadores Sem Teto em determinado local de São Paulo por meio de um smartphone e a exibição desse registro praticamente em tempo real devido às conexões 3G ou 4G à rede internet desses aparelhos, permite que sujeitos deslocados desse lugar específico se manifestem pró-ativamente com relação à ação policial, como bem demonstra o exemplo do coletivo Mídia Ninja75.

75 Coletivo que visa cobrir eventos em tempo real utilizando-se de tecnologias móveis de comunicação e informação, contrapondo-se à letargia dos grandes veículos informacionais tradicionais. Para maiores ingormações consultar: <https://www.facebook.com/midiaNINJA> e <https://twitter.com/MidiaNINJA>, acesso em 26 de julho de 2013.

Um sujeito que se aglutina ideologicamente com o Movimento de Trabalhadores Sem Teto de São Paulo, mas que mora em Belém do Pará, ecoa as manifestações e faz um coro que pode repercutir muito além do território delimitado pela ocupação em São Paulo: os territórios da rede são do tamanho das ideias que dão corpo a eles. Nesse sentido uma ocupação urbana em São Paulo pode estar sendo pressionada por sua manutenção ou por sua dissolução a partir de lugares absurdamente desconectados em termos de conexão física, mas altamente conectados em termos de conexão cibernética. Os princípios de conexão e extensão geográficas ficam, assim, remodulados no ambiente do ciberespaço.

Nesse sentido, o desenvolvimento tecnológico é peça-chave para a compressão de como os fenômenos territoriais ocorrem no ciberespaço. Quem promove esse desenvolvimento são, em última instância, as grandes corporações que controlam os hardwares e softwares, bem como os aparelhos híbridos (convergentes) da nova era digital que permitem a conexão direta ao ciberespaço. Compreender o papel do desenvolvimento tecnológico, bem como o papel das indústrias de microeletrônica e da propaganda e publicidade em torno dos bens produzidos por essas indústrias é premente para que se tenha uma ampla visão dos cenários de disputas territoriais empreendidos no ciberespaço.

No documento O CIBERESPAÇO COMO CATEGORIA GEOGRÁFICA (páginas 113-116)