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Fonte: facebook, grupo selecionado, 13/04/2018

Esta publicação de Iyalorixá teve 215 reações entre “curtir”, “amei” e “uau”; e 38 comentários, sendo que dois destes se destacam por indicarem contrapontos as ideias na postagem. Após lermos o texto publicado com título “#Reflexão” , se percebe o quanto faz sentido esta escolha, afinal, o fenômeno do uso do ciberaxé pelo povo-de-santo, no cotidiano das roças de candomblé será abordado de forma crítica nesta produção. Iyalorixá , em sua linha de raciocínio, inicia o texto, com a frase [1], na qual aparece uma única condição para se estar em uma casa de candomblé, “amando-a”, o que significa conviver com todas as coisas boas e ruins nela existentes. O contrário seria sair deste lugar. A autora, nesta frase expõe uma posição maniqueísta e que não condiz com a relação que o povo-de-santo costuma estabelecer com este espaço sagrado. É comum, por exemplo, membros só estarem presentes fisicamente nas roças, nos rituais que acontecem em datas especificas do ano e não frequentarem o dia-a-dia da roça com os demais membros mais assíduos. Portanto, estes não chegam a se envolverem em outras questões relacionais que comumente surgem nestas comunidades.

Na continuidade do texto Iyalorixá citará na frase [2] o não envolvimento de “alguns ou

muitos filhos de santo ao seu Aşé”, enquanto na frase [3] ela relaciona os que não se doam ao axé àqueles/as usuários de jargões, que são as linguagens comumente utilizadas por usuários de redes virtuais de relacionamento. Estes sujeitos, em sua grande maioria, foram denominados

por Prensky (2001)86 de nativos digitais, são jovens que começavam a mostrar sinais de mudanças de comportamento decorrentes do desenvolvimento e ampliação das novas Tecnologias da Informação e da Comunicação (TDIC). O uso de expressões como as citadas por Iyalorixá, fazem parte desta nova conduta comportamental destes nativos digitais que também estão presentes nas comunidades de axé, desenvolvendo diferentes formas de ciberativismo, movimentos afirmativos e de participação política, (re)criando práticas culturais que envolvem a defesa e valorização de suas pertenças afro-religiosas negras, ao mesmo tempo em que combatem o racismo e as práticas de intolerância religiosa que persistem em acontecer contra estas populações (BORGES, 2017a; FREITAS, 2015).

É preciso relativizar esta posição de Iyalorixá Ela é uma internauta bem ativa no Grupo selecionado, tendo inclusive uma página nesta plataforma sob sua administração. Ao expressar esta opinião perante este novo protagonismo surgido nas redes virtuais e estendido a realidade off-line Iyalorixá desconsidera as conquistas das interações no ciberespaço. Na relação desta internauta no grupo do facebook é perceptível que a mesma explora várias das ferramentas disponíveis no facebook, como a postagem de fotos de pessoas, eventos, festas, rituais; publicação de textos e vídeos com diferentes teores, lives, ou seja, mostra-se em sintonia com as dinâmicas e condutas comportamentais advindos a partir da popularização da internet e das plataformas virtuais de relacionamento. Classificar este novos comportamentos como sendo daqueles/as “mais ausentes dentro de uma Casa de Aşé” é injusto.

Em sua explicação daquilo que considera incompatível com a dinâmica de terreiro de candomblé, embora deixe claro que não se trate de um problema generalizado para todas as casas de culto, é citada a ausência, a falta de membros nas atividades nestas comunidades, noutros casos, quando presentes, expressam uma conduta equivocada, como explica em [2] e [3]. É fato que as atividades religiosas nos dias em que ocorrem os rituais costumam ocupar muitas horas do dia, as vezes mais de um e até semanas em alguns casos. São afazeres relacionados as preparações que antecedem a execução dos rituais, as atividades de cozinha, de costura, limpeza e organização do espaço físico, além da manutenção dos elementos sagrados existentes no roça. A frase [4] descreve um pouco deste cotidiano. São tarefas difíceis de serem conciliadas com a rotina do trabalho, da escola ou mesmo com as atribuições de sua vida privada, pois demandam a presença do sujeito e como esta disponibilidade para estar fisicamente na roça não é igual para todos, isto tende a se tornar um dos fatores geradores de conflitos nestas comunidades.

O conflito entre o povo-de-axé sempre se fez presente, e por motivos diversos, sendo inclusive eixo estruturante da pedagogia do candomblé (CONCEIÇÃO, 2006). O conflito pode aparecer, por exemplo, quando o membro da roça não consegue equilibrar suas atribuições internas do candomblé com os compromissos externos a este espaço. Este equilíbrio demanda esforço individual, na qual cada pessoa o administra de uma forma, envolve a subjetividade de cada um e está associado as condições objetivas, concretas que se enfrenta. Um filho-de-santo trabalha em horário administrativo, em uma empresa e pode ir as noites ao terreiro ajudar em algum atividade; enquanto outro além de se ocupar no trabalho todo o dia, ainda traz serviço para casa e só pode ir aos finais de semana na roça; ou ainda aquele que divide o tempo entre trabalho na rua e os afazeres domésticos com filhos/as, companheiro/a, etc., e quando encontra algum momento livre consegui passar rapidamente na roça para dar uma ajuda a sua família de santo. Estes são alguns casos, contudo a quantidade de variáveis e situações experiênciadas pelo povo-de-santo são infinitas. Daí a questão: como é possível se mensurar a doação de alguém, diferente de si, em relação a alguma coisa?

Na frase [5] se evidencia o posicionamento de Iyalorixá sobre quem pode, e de que maneira a pessoa deve se filiar a uma casa de candomblé. Ela consegue ser ainda mais incisava ao afirmar que os sujeito sem o pré-requisito da disponibilidade em se entregar e sendo preguiçoso/a sequer poderá identificar-se como sendo do candomblé. Este é um ponto de vista que contradiz a pluralidade de perfis que coexiste nestas comunidades, as diferentes formas como estes integrantes concebem o sagrado e constroem significações. O convívio com as diferenças é um dos traços marcantes nas comunidades de axé, que a diferenciam quando comparada a outras manifestações religiosas. A diversidade no candomblé se manifesta em múltiplos aspectos, não só na forma de expressar a liturgia, os procedimentos sagrados. Por mais verdade que possa existir, no ponto do vista de Iyalorixá, sobre como se deve operar com o sagrado em um terreiro de candomblé, no dia-a-dia não é assim que as coisas de processam. A opinião desta autora representa um anseio, um desejo que poderá, ou não, ser absorvido pela sua comunidade, mas sempre de maneira diferenciada, afinal cada indivíduo tem seu tempo de assimilar e processar estas noções.

Seguindo o texto vamos ver o trecho [7], no qual fará referência a atual difusão do uso das TICs para transmissão de saberes do culto como sendo algo questionável: “Aprendizado pelo zap ou algo do gênero está disseminado no Candomblé de hoje (Mas não tem vivência nem experiência na prática)”. Em seguida, esta internauta irá desqualificar as interações virtuais, a partir de expressões como “doe-se”, “derrame seu suor”, indicando que o aprendizagem presencial é mais ainda significativa; fala de “filho cliente”, ou seja, daquele/a

membro que paga para outro membro para cumprir suas tarefas na roça; e compara a não participação na comunidade de axé, com a participação em uma empresa sem que haja produção, na qual a consequência é o sujeito “ou está fora ou será remanejado”.

Nos trabalhos pesquisados (Tramonte, 2001; Freitas, 2002; Santos, 2002; Lopes, 2012; Silva 2013) que tratam do uso da internet por membros do candomblé, ainda que apresentem enfoques distintos demostram em comum que os sujeitos pesquisados, não abrem mão ou deixam em um plano inferior a não participação presencial, ou seja a off-line, em suas comunidades de axé, pelo fato de utilizarem os canais virtuais para acessarem conteúdos sagrados. Portanto, a narrativa de Iyalorixá, por mais que tragam elementos que traduzam comportamentos que parecem conhecidos em algumas casas de axé, não representam uma totalidade. A diversidade de realidades e situações vivenciadas nestas comunidades são muito mais complexas.

4. MAÍRA AZEVEDO: INFLUENCIADORA DIGITAL NA REDE

CIBERAXÉ

Entre os tantos “nós” da complexa rede de circulação e difusão de dados, conteúdos, imagens, informações e desinformações sobre as religiões afro-brasileiras que o ciberaxé representa, encontramos alguns que assumem destaques momentâneos. Seja porque suas publicações expressam um estilo inusitado, tão peculiar a ponto de ser um diferencial, um modelo próprio de singularidade; ou porque conseguem traduzir, de uma forma excepcional o pensamento de muita gente; ou ainda porque postam imagens ou fotos capazes de mexer fortemente com nossas emoções. Porém, estes episódios não determinam que estas pessoas, por traz deste “nós”, irão manter-se em constate destaque nas redes todas as vezes em que realizar novas postagens, apresentando a mesmas performance do episódio passado que “viralizou”, ainda que seja esta seja sua maior intenção. Afinal, faz parte do jogo de acertos e erros, de idas e vindas, inconstâncias que tão bem caracterizam as redes sociais na internet o imprevisível.

Porém, neste universo de transformações e configurações idiossincráticas é possível a confluência de fatores convergirem para que um ou uma, entre tantos “nós”, ganhe mais notoriedade. Este é o caso de Maíra Azevedo, uma influenciadora digital que costuma se apresentar usando vários adjetivos que, como costuma dizer, “lhe representam mais não a resumem”. Todavia, farei recorte dentre destes diversos papeis que ela exibe, e me focarei naqueles que me motivaram a escolhe-la para este estudo: sua condição de egbomi em um terreiro de candomblé em Salvador(BA) e de influenciadora digital que traz entre os assuntos para discussão nas redes o combate ao racismo religioso, a intolerância religiosa contra os cultos afro-brasileiros; e a socialização de informações que ajudem a desconstruir o imaginário negativo referente as práticas e aos praticantes das comunidades de axé. Antes, faz-se necessário trazer um conceito sobre o que seja um/a influenciador/a digital. Karhawi (2017) se pauta no discurso da mídia a respeito desta novo sujeito contemporâneo para dizer que:

[...] os influenciadores são aqueles que têm algum poder no processo de decisão de compra de um sujeito; poder de colocar discussões em circulação; poder de influenciar em decisões em relação ao estilo de vida, gostos e bens culturais daqueles que estão em sua rede (p.1)

Para esta autora, os influenciadores digitais são os novos profissionais que eclodem das características sociais, econômicas e tecnológicas da sociedade atual. O contexto para este emergência é um cenário no qual temos de um lado uma maior facilidade de participação de sujeitos amadores como produtores, que não precisam de autorização para manifestar-se em público. De outro, uma sociedade que a cada dia valoriza mais e mais a imagem de si. As condições de se fazer ver são intensificadas com as possibilidade de ver e ser visto, simultaneamente, em espaço e tempos distintos; e isto, conclui Karhawi, está diretamente relacionando a mostrar-se, desfazendo por dentro a dicotomia entre o público e o privado. Este seria, sumariamente, o cenário no qual se ampara os novos perfis profissionais de blogueiros, vlogueiros, e seu derivado mais recentemente: os/as influenciadores/as digitais. (KARHAWI, 2017).

4.1 Itinerância do pesquisador encarnado à influenciadora do ciberaxé

Se a atividade de influenciadora digital, como disse Karhawi, é fruto deste momento, precisamos regressar um pouco no tempo a fim de entender como Maira Azevedo chegou a este lugar tendo mais de 84.000 inscritos no youtube e 518.000 seguidores no facebook87. Nestas

duas plataformas o nome e a imagem de Maíra Azevedo se intercalam com a de Tia Má, que é ela mesma, porém falando com mais liberdade. Mais adiante voltarei a este assunto.

Conheci Maira Azevedo no terreiro de Oxumaré, de onde é filha, e eu sou neto88, no mês de agosto de 2015, quando acontece o ciclo de festas para Oxumarê, Ewá, Ossain, Iroco e finalmente o Olubajé. Embora sejamos da “mesma água” e eu tenha mais tempo de iniciado do que ela, quando nos encontramos não estava frequentando, regularmente, o terreiro de Oxumaré, por isso não sabia que era filha da roça. Nesta época ela ainda não tinha a visibilidade de hoje nas redes sociais.

Não há nada de estranho nesse encontro tardio, sobretudo quando se trata de uma roça de candomblé antiga, como a nossa, onde a circulação de membros é intensa, com pessoas oriundas de muitas lugares, com diferentes atividades, que mantem relações de maior e menor frequência na comunidade. Vivenciar estas experiências de encontros e desencontros entre filhos e netos de mesmo axé faz parte da rotina. O fato é que nos reconhecemos, durante os rituais, na forma semelhante como executávamos as tarefas. Afinal, imprimíamos seriedade e

87 Estes números são de 25/07/2019

disciplina nas atividades que nos eram colocados. Foi a partir deste sintonia, no trabalho, que começamos a estabelecer uma simpatia um pelo outro, eu com minhas atribuições como ogan e ela ainda como Iyawô89.

Além destes encontros esporádicos na roça do Oxumaré, quando ia aos rituais, só mesmo na mídia que tenho notícias de Maíra, primeiro impressa, quando trabalhava como repórter em uma empresa de jornalismo de Salvador; depois no facebook onde já exercia o ativismo com a temática racial, fazendo postagens refletindo sobre a condição singular de solidão vivida pela mulher negra. Logo depois ela aparecia com o bordão “Tia Má”, “tia ama”, “tira o sapatinho, bota o pé no chão” e se tornaria uma referência entre os influenciadores digitais.

Foi me valendo dessa proximidade e sintonia construída no âmbito da roça de Oxumarê que fiz o convite para Maira colaborar nesta pesquisa. A princípio queria apenas autorização para usar suas postagens. Assim lhe enviei uma mensagem, pelo whatsapp , fazendo este pedido. Ela respondeu: “Oxente meu irmão! O senhor tem total autorização, me sinto inclusive honrada”. A empatia em sua resposta, me motivou a pensar em algo mais: por que não fazer uma entrevista?! A dúvida tinha a ver com a existência ou não de disponibilidade de sua parte. Fiz, novo contato, desta vez propondo o encontro. Mais uma vez ela demostrou um acolhimento valoroso e disponibilidade para me receber em sua casa. Nos preparativos para este entrevista elaborei um questionário semi-estruturado. Na formulação destas questões tomei como referência uma entrevista que ela deu ao programa Perfil &Opinião, da TVE Bahia, exibido em 26/09/2018; e seis postagens suas no Facebook:

• Dia 04/06/2017, com um texto no qual, traz de forma afirmativa, sua pertença religiosa e sobre da importância de tornar isto público, tanto para defesa do candomblé, como das demais bandeiras que fortalecem negros/as;

link:https://www.facebook.com/dicasdatiama/photos/a.1038448752856447/15502051383474 0/?type=3

• Dia 16/06/2017, tratando sobre os afazeres cotidianos praticados na roça de candomblé e as implicações destes para o fortalecimento da espiritualidade;

link: https://www.facebook.com/casadeoxumare/posts/1484365011586732:0

• Dia 23/08/2017, sobre o desconhecimento e preconceito das pessoas com relação a sacralização do sacrifício de animais dentro do axé;

link:https://www.facebook.com/maira.azevedo25/posts/1861159403900873

• Dia 29/12/201890(A), sobre o uso responsável das redes sociais, a atual circulação de

informações nas redes; e os aspectos que caracterizam o candomblé e dos cuidados que os adeptos precisam ter para deixar desvirtuá-lo;

link:https://www.facebook.com/maira.azevedo25/posts/2510495772300563

• Dia 29/12/2018 (B), sobre a exposição midiática com relação ao episódio na morte de Mãe Stela; link:https://www.facebook.com/maira.azevedo25/posts/2510451392305001 • Dia 29/03/2019, publicação na qual questiona e denuncia equívocos nas postagens de

uma internauta vegana, contaria a decisão do STF de considerar o abate de animais em

cultos sagrados como sendo constitucionais;

link:https://www.facebook.com/dicasdatiama/posts/2377685712266071:0

4.2. “Sou Preta, Gorda, Periférica, Mãe Solo, Nordestina, Candomblecista e Jornalista!”

São com estas referências que Maira Azevedo costuma se apresentar nas entrevistas que faz, ou no show stand up “Tia Má com a Língua Solta”, que vêm realizando em várias lugares do Brasil! São identidades que perpassam sua trajetória de vida e a constituem, lhe acompanhando a qualquer lugar que adentre. São múltiplas faces que nas telas das redes virtuais encontram condições propicias para sofrer reconfigurações e até multiplicar-se, aumentando ainda mais o leque de possibilidades de imagens de si. No entanto, nossa interlocutora, com todo este repertório identitário, diante do contingente de seguidores que costumam lhe fazer inúmeros apelos, pedidos e cobranças, as vezes, sobre o que deve e não deve ser, a respeito do que fazer e mostrar nos canais (este foi um dos assuntos que surgiram em nossa conversa!), estabelece limites. Ela se resguarda, pondo algumas resistências, buscando manter um certo distanciamento e criticidade, além da autenticidade, para também não se render aos anseios e a fome insaciável do mundo da virtual. Neste sentido dissertar sobre sua história de vida nos ajuda compreender como ela consegue transitar estabelecendo este limites na rede.

Maira foi criada no bairro de Plataforma, que é um dos mais antigos do Subúrbio Ferroviário de Salvador (BA) e que está situado à margem da avenida Suburbana. A casa de Maira fica do lado desta avenida que não é banhada pela Baia do Todos os Santos. Seguindo

pela Suburbana, depois da loja automotiva Junior Rodas, na primeira entrada à direita, sobe a ladeira até o final e pergunta onde fica a casa de China (seu Pai), que todos conhecem. Esta foi a orientação que ela me passou em áudio mensagem. E de fato consegui chegar com ajuda das pessoas da comunidade. A casa de Maira tem dois pavimentos; embaixo moram seus pais. Ela me recebeu, juntamente com seu filho Aladê Koman, a quem cobrou, com rigor: “como se faz diante de mais velho no axé?”. Aladê foi indicado para ogan, no terreiro Oxumarê, portanto, desde já deve começar a realizar estes procedimentos. Passada esta etapa inicial das apresentações, me sento próximo dela, na sala, para assegurar uma boa gravação da conversa. Lhe apresento, em linhas gerais, o teor das questões e em seguida começamos.

Embora tenha origem em bairro de periferia, onde a maioria dos moradores vivem com baixa renda e tem poucas oportunidade para manter-se nos estudos ou de projetar perspectivas melhores de crescimento social e econômico, Maira Azevedo é uma exceção. Fez todo seu percurso formativo em instituições particulares, pois, seus pais queriam assegurar a formação superior para suas filhas e não as deixar à mercê das constantes greves que assolavam as universidade pública da época. Ela fugia também a regra da maioria das famílias pobres desta região, porque sua ascendência não era de mulheres lavadeiras, empregadas domésticas ou que não tiveram acesso à escola; ela teve uma bisavó que foi empreendedora, proprietária de várias casas de aluguel; uma avó dona de casa e viúva de um funcionário público federal; e uma mãe, sra. Miralva Dias, professora. Contudo, os privilégios de sua condição não lhe passariam desapercebidos e a subsidiariam na jornada durante o curso de jornalismo, onde aprenderia a usar o poder da comunicação:

“[...] eu sempre morei na periferia, mas sempre estudei em escolas particulares, mas sempre tive em espaços onde eu era a única preta do rolê, [....] a ameixa do pudim. Então eu comecei a entender, logo desde cedo que tinha lugares que para a população preta estar inserida era mais complicado. Então desde muito nova eu comecei a entender que eu precisava, eu queria entender que fenômeno é esse! [...] come é que no meu bairro todo mundo é negão, porque eu morava aqui na suburbuna [...] na minha escola eu tenho poucas pessoas pretas? [...] mesmo sem conseguir explicar estes conceitos eu conseguia entender, então quando eu entrei na faculdade de jornalismo e eu me tornei jornalista porque eu queria falar sobre isso”

Sua relação com o candomblé começa aos 7 anos, quando “um orixá se manifesta em meu corpo”, diz Maira. A família, educada dentro da religião católica, e candomblé não era