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‘Em relação à representação de um objecto na forma mais simplificada do sinal, deve-se mencionar aqui, mesmo que à margem das nossas observações, os sinais de adivinhação. Toda a ambiguidade desperta interesse e dá lugar a uma análise visual e intelectual. O sinal de adivinhação é simplesmente um sinal de objecto, porém codificado, porque o ângulo de visão é escolhido de forma que a silhueta normal ou a perspectiva da figura permaneça invisível.’ (Frutiger, 2007: 46)

Podemos dizer que a síntese é uma espécie de sinal de adivinhação: revela sem ostentar, cria interesse e desperta a curiosidade, sem se tornar vazia por conceptualmente desprovida de sentido, mas também por não ser demasiadamente imbuída de ruído visual. A função simbólica pode ser também coadjuvada por todo o sistema de identidade da empresa, (desde os seus objectos e produtos até ao branding, mas que não se inscrevem no objecto de estudo desta investigação), a marca gráfica contém só por si uma forte carga emocional que lhe permite ser preenchida com poder comunicativo e semântico (Chaves, 1994; Mollerup, 1997; Costa, 2001).

Roland Barthes, quando aborda o ‘mito’ em

‘Myth Today’ na sua obra Mythologies (1972) menciona que esse conceito carrega consigo uma ideologia, uma dimensão comunicativa que forma visualmente uma ideia perante o nosso olhar,65

onde a forma é derivada da sua significação. O ‘mito’ é uma espécie de sistema vinculador de ideias, um concentrado de dimensão semântica que condiciona a nossa forma de ver e percepcionar:

algo que nós poderemos dizer ser semelhante ao condensado comunicacional de uma marca gráfica. ‘Myth is a pure ideographic system, where

the forms are still motivated by the concept which they represent while not yet, by a long way, covering the sum of its possibilities for representation.’ (1972: 127.)

Para este filósofo e semiólogo, esta questão do mito funciona melhor com o que o autor chama de ‘imagens pobres’, no sentido de imagens que estão mais receptivas a serem preenchidas com conceitos diferentes; imagens isentas de tudo aquilo que não é essencial. Nos resultados dos inquéritos que fizemos ao público em geral sobre os conceitos associados a cada marca do corpus da investigação (consoante analisado no capítulo anterior), nas marcas mais sintetizadas as respostas eram mais abertas e ligadas à classe a que pertence o referente da marca – por exemplo, a KLM: interpretada como coroa; a Shell como concha; ao passo que as marcas gráficas mais realistas

65. Barthes ressalta que

a leitura entre conceito e ‘mito’ é essencialmente uma relação de deformação (Barthes, 1972: 123). Não obstante, colocá-la-ia de outra forma: não enquanto uma relação de deformação, dado o carácter pejorativo da palavra, mas, literalmente, uma relação de formação: o significado é algo etéreo, mas que condiciona a nossa percepção da forma, da imagem ou da marca visual. Nesse sentido, há alguma corporalidade no mito e no seu significado que condiciona a percepção do significante.

66. Com menor

coerência formal ou elementos que não acrescentam valor: Boeing, Fiba e Applebulb, marca descarregável em <logoworks.com>.

67. De uma forma mais

sintética e coerente (em cima), com autoria de referência para uma marca gráfica mais realista (em baixo): Adams Trucking (Almanac Advertising: 1981); Tomato Bank (Shigeo Katsuoka: 1989); The International Society for Heart Research (Alan Fletcher: 1995); Prudential (Lee & Young: 1984); United Airlines (Saul Bass: 1976).

3. resultados

e menos sintetizadas, as respostas eram mais diversificadas porque as pessoas interpretavam mais de acordo com o seu sentir (por exemplo: Peugeot, CMP, Applebulb da logoworks, Michelin), dando respostas mais variadas e de espectro mais estreito, com conceitos menos alargados.

‘(...) myth prefers to work with poor, incomplete images, where the meaning is already relieved of its fat, and ready for signification, such as

caricatures, pastiches, symbols, etc.’ (1972: 127).

Assim, podemos concluir que, quanto mais condensadas e sucintas estas imagens são, quanto mais simplificadas são na forma, mais compactadas com ideias serão, e melhor o conceito de mito funcionará através delas. Por conseguinte, podemos integrar as marcas estilizadas e mais sintéticas neste conceito de Barthes: são marcas gráficas aliviadas do excesso, que representam o essencial, sem elementos supérfluos, sendo, portanto, permeadas de conotações metafóricas e alegóricas como Chaves (1994) e Costa (2001) sublinham e os nossos resultados comprovam.

3.3.1. síntese: o jogo entre a

identificação e a adivinhação

‘I think the easiest it is for somebody else to sketch or draw it or keep it in their mind, the strongest a mark is! That’s what simplicity is, I think, on the whole.’

(Ross Shaw, 2012)

Podemos citar como exemplo da nossa forma de ver a síntese, a entrevista que efectuamos a Ross Shaw, onde refere que esta acontece quando alguém consegue desenhar, de memória, replicando a marca gráfica em questão.

Para além dos factores identificativos é importante frisar que deve estar presente no design de

uma marca gráfica uma certa audácia, alguma forma que despolete o interesse e seja como um punctum (Barthes, 1982: 51), como aquele detalhe que suscita o interesse, por ser um factor diferenciador. Para nós e para Joan Costa (2004), o facto da marca gráfica gerir a forma e o fundo com complementaridade é um factor de emotividade da marca. A pregnância desta gestão, também pode ser verificada nos testes de Rorschach68

(1927). Um interessante resultado observado nesses testes, aquando das observações, é que a maioria das pessoas se focava num pormenor da mancha, um elemento que não era necessariamente aquele mais denso de informação ou maior, pelo contrário, aquele que era dominante por ter um carácter de excepção ou de contraste.

68. No início do século

XX, Hermann Rorschach desenvolveu um teste com manchas de tinta simétricas para obter dados sobre o perfil psicológico do observador, ao projectar- -se na interpretação das mesmas (Rorschach, 1927).

29 % 18 % 6 %

3. resultados

O jogo do Pictionary, por exemplo, serve de forma semelhante, como uma imagem para esta questão da síntese a utilizar nas marcas gráficas enquanto equilíbrio entre a identificação e a adivinhação.69 O objectivo deste jogo de mesa é

desenhar um dos conceitos que calhou à sorte a cada equipa. O facto de ser necessário desenhar um conceito num espaço muito limitado de tempo – no máximo um minuto – de modo a ganhar à(s)

equipa(s) adversária(s), faz com que as opções de representação escolhidas pelos jogadores se foquem na apresentação estratégica da síntese: em vez da forma ser totalmente fechada, detalhada e realista, os jogadores vencedores optam por representar apenas aquilo que é fundamental para a identificação daquele objecto ou conceito. O que faz, por exemplo, uma gabardina ser uma gabardina e não um casaco de inverno ou um kispo; são as golas, botões e o facto de proteger da chuva; o que faz uma ambulância ser uma ambulância e não outra viatura qualquer?; o que faz a imagem de um piloto não ser a de um motorista ou a de outro condutor? A forma da marca, tal como no jogo do Pictionary utiliza, por um lado, o estereótipo da classe a que pertence, mas por outro lado, deve procurar também distanciar-se e representar-se de uma forma não demasiadamente explícita, para ser inovadora e original. (Ver sub-

69. Pictionary é um jogo de

adivinhar palavras através do desenho inventado por Robert Angel, com design gráfico de Gary Everson e publicado em 1985 pela Seattle Games. Desde 1994, é editado pela Hasbro.

70. Desenhos feitos pela

autora e outros jogadores do Pictionary em sua casa. Esta síntese operada nos desenhos do Pictonary permite a capacidade do observador se concentrar na ideia, no punctum repleto de sentido definidor e distinto.

3.3.2 síntese e economia ocular

Breve paralelismo com o estudo do