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Após a grande festa da Rua do Choro, o Clube do Choro seguiu com suas atividades. Um dos objetivos iniciais do Clube era a publicação de um caderno com informações sobre música e partituras, que seria distribuído a seus sócios. A concretização desse objetivo se deu no final de maio de 1978, quando foi lançado o caderno informativo do Clube do Choro de São Paulo, o Urubu Malandro n.0. O nome do caderno foi inspirado na música homônima de Pixinguinha.

O número zero do Urubu trazia na capa uma foto do aniversário de um ano do Clube e os dizeres ‘Um ano de vida e o Clube está na Rua’, fazendo alusão à Rua do Choro. Trazia uma matéria chamada ‘Temos uma História pra Contar!’, onde era narrada a história do Clube até então, pontuando as datas mais importantes, como a da assembléia de fundação e o show com Paulinho da Viola e Canhoto da Paraíba no Teatro Municipal. Nas páginas centrais, fotos dos músicos que atuariam no espetáculo de aniversário de um ano do Clube e o programa que seria tocado durante esse show.

O número zero trazia ainda uma matéria intitulada ‘Disco – Armandinho: o Primeiro’. Essa matéria explicava o processo de pesquisa utilizado para recuperar e selecionar as faixas do Lp em homenagem a Armando Neves, que o Clube lançaria em Julho de 1978. A matéria falava que as pesquisas se iniciaram a partir do contato com o projetista, pesquisador e músico Olavo Rodrigues Nunes de Souza, que era amigo pessoal de Armandinho e entrou na redação do jornal Folha de São Paulo em 1976 com a informação de que o músico havia morrido. Em seguida, o engenheiro e pesquisador Gilberto Périgo foi agregado ao ‘projeto Armandinho’, e suas pesquisas resultaram no disco que seria lançado posteriormente. A matéria fazia ainda uma descrição de todas as atividades do Departamento de Arquivo e Memória até aquela data. Contava sobre os grupos de choro redescobertos, os compositores pesquisados e os depoimentos que haviam sido colhidos. Informava ainda que todo esse material estava sendo organizado de forma a resultar em pautas para um programa de rádio.

Capa do Urubu Malandro n. Zero (1978). Fonte: acervo ‘Oswaldo Luiz Vitta’.

O número um do Urubu Malandro trazia mais páginas do que o número anterior, além de um encarte com as partituras de todas as faixas do Lp de Armandinho Neves. A capa trazia uma foto do músico e os dizeres: Clube do Choro, primeiro disco: homenagem a Armandinho. A página dois trazia um pequeno histórico sobre a fundação e o funcionamento do Clube, com foto da Diretoria eleita. A página três trazia a capa do disco de Armandinho e falava sobre o processo de produção, desde o início da pesquisa até a seleção das faixas pelos seus intérpretes. Alertava que os solistas haviam oferecido seus direitos de gravação ao Clube, visando à produção de um novo Lp. Na página quatro, eles aparecem caricaturados como um time de futebol; o trabalho artístico novamente foi do caricaturista Laerte Coutinho, que era sócio do Clube. A próxima página explica o desenho bem-humorado. Seu título é ‘Estes são os que jogam no time do Armandinho’. Nessa e nas próximas páginas faz-se um pequeno currículo de cada

um dos solistas, brincando com o fato de Armandinho ter sido jogador de futebol em sua juventude.

A partir da página sete, existe uma biografia de Armandinho, escrita por Olavo Rodrigues Nunes, amigo pessoal e pesquisador da obra do violonista. A biografia conta, de forma bem humorada, as passagens mais importantes da vida de Armandinho. Não deixa de fazer menção às condições precárias em que o músico se encontrava no final da vida, quando conta a passagem sobre a inundação de sua casa, onde ele quase perdeu seu violão. Durante esse episódio, Armandinho teria acordado de madrugada e visto seu instrumento de trabalho boiando pela casa alagada, assim como algumas panelas e outros objetos. A última página do Urubu Malandro traz propagandas sobre os bares ligados ao Clube do Choro: Café Paris, Quincas Borba e Bar Latino Americano.

Além das informações sobre o Clube e sobre Armandinho Neves, o Urubu

Malandro n.1 ainda trazia um encarte de doze páginas, cada uma com uma música gravada no Lp em homenagem ao violonista. O objetivo desse encarte era divulgar a obra de Armandinho, para que mais violonistas se interessassem por elas e pudessem tocar. As partituras foram escritas a mão pelo engenheiro Gilberto Périgo.

Além de divulgar o primeiro disco do Clube, essa edição do Urubu Malandro teve ainda a função de fazer justiça àqueles que haviam trabalhado na produção do disco. Depois de todo o trabalho que pesquisadores e produtores tiveram com o disco, a gravadora Bandeirantes/Clack não fez menção a nenhum deles na contracapa do disco. Ela traz apenas os dizeres: ‘Agradecimentos ao Clube do Choro de São Paulo’. Não menciona o pessoal envolvido na produção nem na pesquisa e seleção das faixas. Como o Lp seria distribuído entre os sócios, o pessoal da diretoria colocou dentro das capas de todos os discos uma cópia do Urubu, para que todos conhecessem o trabalho dos sócios do Clube na produção daquela obra. Oswaldo Vitta, o Colibri, comenta o ocorrido:

...nós pensamos; ‘Não podemos deixar uma capa desse jeito’. Aí entra a loucura do jornalista: conseguimos três patrocínios, era o Café Paris, o Quincas Borba, que era um outro lugar que tocava choro, e o Café Latino Americano, para o Urubu Malandro. Fizemos o Urubu Malandro de encarte do disco. Pegamos todos os discos que saíram, antes de ir para a loja, eles deram um reparte pequeno para nós, e enfiamos o Urubu Malandro lá. E nele tem uma apresentação minha contando sobre o Clube do Choro, a história do Armandinho Neves escrita pelo Olavo e a transcrição, que foi uma sacada do Gilberto de colocar, mesmo num papel jornal vagabundo, as partituras do Armandinho Neves. Porque ele tinha visto isso num disco do Japão, achou maravilhoso, um encarte com todas as partituras, isso é um negócio para ajudar músico... Hoje tem músico que só tem isso, as partituras, porque o Urubu rodou muito mais que o disco. E nós enfiamos um Urubu em cada disco, para mostrar quem é que fez. Porque a contracapa não dizia nada (VITTA, 2008).

O lançamento do Lp de Armandinho aconteceu em julho de 1978. Depois disso, o Clube entrou em um processo de dificuldades financeiras e desagregação de seus sócios, o que resultou na suspensão da publicação do Urubu Malandro. O disco de homenagem a Armandinho esgotou-se rapidamente, mas ainda hoje existem músicos e pesquisadores que possuem alguns exemplares do número um do Urubu. Ele foi um marco importante da história do Clube e também da história do violão brasileiro, quando fez a divulgação das partituras da obra de Armandinho.