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Usco e usco minimal

No documento UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (páginas 40-44)

Nesta seção estudamos as funções multi-avaliadas semicontínuas superiores e suas propriedades. A menos de menção contrária, vamos supor que os espaços topológicos são Hausdorff. Para uma leitura mais profunda e completa, o leitor pode consultar a referência

HOLA; HOLÝ.

Definição 1.4.1. Uma função multi-avaliada F entre X e Y é uma função F ∶ X → 𝒫(Y ). Isto é, para cada x ∈ X , F(x) é um subconjunto de Y . Dados A ⊆ X e B ⊆ Y não vazios, F(A) = ⋃

x∈A

F(x)

é a imagem de A e F−1(B) = {x ∈ X ⋃︀ F(x) ∩ B ≠ ∅}é a pré-imagem de B. O gráfico de F é definido como Gra f (F) = {(x, y) ∈ X ×Y ⋃︀ y ∈ F(x)}.

Definição 1.4.2. Seja F ∶ X → 𝒫(Y ) uma função multi-avaliada. Dizemos que F é um-avaliada num subconjunto E de X se, para cada x ∈ E, F(x) é um conjunto unitário.

Uma função h ∶ X → Y é uma seleção de F se h(x) ∈ F(x), para todo x ∈ X .

Definição 1.4.3. Sejam X e Y espaços topológicos. Dizemos que ϕ ∶ X → 𝒫(Y ) é usco (upper semicontinuous and compact valued) se, para cada x ∈ X , ϕ(x) é um conjunto compacto não vazio e, para cada aberto W de Y , temos que {x ∈ X ⋃︀ ϕ(x) ⊆ W } é um aberto de X . Além disso, se o gráfico do ϕ não contém propriamente o gráfico de qualquer outro usco definido em X , então ϕ é chamada de usco minimal.

Exemplo 1.4.4. Definamos F ∶ R → 𝒫(R) como F(x) = {⋃︀x⋃︀

x(︀, se x ≠ 0, e F(0) = {−1, 1}. É claro que, para cada x ∈ R, F(x) é compacto e não vazio. Sejam U ⊆ R um aberto e z ∈ A = {x ∈ R⋃︀F(x) ⊆ U }. Se z > 0, existe r > 0 tal que (z − r, z + r) ⊆ (0, ∞). Logo, para qualquer w ∈ (z − r, z + r) temos que F(w) = {1} ⊆ U . Analogamente para o caso z < 0. Agora, se z = 0, qualquer t > 0 satisfaz que (−t,t) ⊆ A. Assim, A é aberto. Ou seja, F é usco.

Suponhamos que exista G ∶ R → 𝒫(R) usco tal que Gra f (G) ⊊ Gra f (F). Então G(x) = F(x) para todo x ∈ R ∖ {0}. Assim, G(0) ⊊ F(0). No caso G(x0) = {1}, existe r > 0 tal que (−r, r) ⊆ {x ∈ R ⋃︀ G(x) ⊆ (12,32)}. Logo G(−2r) = −1 ∈ (12,32), o que é absurdo. Analogamente obtemos uma contradição no caso G(0) = {−1}. Portanto, F é usco minimal.

Observação 1.4.5. Dados ϕ ∶ X → 𝒫(Y ) usco e A ⊆ X , tem-se que ϕ⋃︀A∶A → 𝒫(Y )é usco. Lema 1.4.6. Seja F ∶ X → 𝒫(Y ) usco. São equivalentes

a) F é usco minimal.

b) Para quaisquer aberto G de X e fechado K de Y tais que F(x) ∩ K ≠ ∅, para todo x ∈ G, temos que F(G) ⊆ K.

c) Dados dois abertos U ⊆ X e W ⊆ Y tais que F(U ) ∩ W ≠ ∅, existe um aberto não vazio V ⊆ U tal que F(V ) ⊆ W .

d) Para toda função contínua g ∶ Y → Z temos que g ○ F ∶ X → 𝒫(Z), definida por (g ○ F)(x) = {g(y) ⋃︀ y ∈ F(x)}, é usco minimal.

Demonstração. Primeiro vejamos que (a) implica (b). De fato, sejam G ⊆ X um aberto e K ⊆ Y um fechado tais que F(x)∩K ≠ ∅ para todo x ∈ G. Definimos ϕ ∶ X → 𝒫(Y ) como ϕ(x) = F(x)∩K, se x ∈ G, e ϕ(x) = F(x) se x ∈ X ∖ G. Não é difícil ver que ϕ é usco e Gra f (ϕ) ⊆ Gra f (F). Como F é usco minimal, Gra f (ϕ) = Gra f (F). Logo, se x ∈ G, então F(x) = F(x) ∩ K ⊆ K. Ou seja, F(G) ⊆ K.

Agora provaremos (c) a partir de (b). Dados dois abertos U ⊆ X e W ⊆ Y tais que F(U ) ∩W ≠ ∅. Suponhamos que F(x) ∩Y ∖W ≠ ∅, para todo x ∈ U . Pelo item (b), temos que F(U ) ⊆ Y ∖W , o que é falso. Logo, existe x0∈U tal que F(x0) ⊆W. Então o conjunto V = {x ∈ X ⋃︀ F(x) ⊆ W } ∩U

é um aberto não vazio que satisfaz F(V ) ⊆ W .

Em seguida veremos que (c) implica (d). Dada uma função contínua g ∶ Y → Z, é claro que g ○ F ∶ X → 𝒫(Z)é usco. Seja H ∶ X → 𝒫(Z) usco tal que Gra f (H) ⊆ Gra f (g ○ F). Suponhamos que Gra f (H) ⊊ Gra f (g ○ F), logo existe x0∈Xtal que H(x0) ⊊ (g ○ F)(x0). Devido à Proposição

1.2.22, existe um aberto U ⊆ Z tal que H(x0) ∩U = ∅ e (g ○ F)(x0) ∩U ≠ ∅. Existe um aberto V ⊆ X tal que x0∈V e V ⊆ {x ∈ X ⋃︀ H(x) ⊆ Z ∖U }. Como F(V ) ∩ g−1(U ) ≠ ∅, existe um aberto não vazio W ⊆ V tal que F(W ) ⊆ g−1(U ). Então (g ○ F)(W ) ⊆ U e, em consequência, H(W ) ⊆ U mas H(W ) ∩U = ∅, obtendo assim uma contradição. Portanto, Gra f (H) = Gra f (g ○ F). Isto é, g ○ Fé usco minimal.

Finalmente, basta usar a função identidade i ∶ Y → Y para ver que (d) implica (a).

Proposição 1.4.7. Dado F ∶ X → 𝒫(Y ) usco, existe ϕ ∶ X → 𝒫(Y ) usco minimal tal que ϕ(x) ⊆ F(x), para todo x ∈ X .

Demonstração. Seja ℱ = {G ⋃︀ G ∶ X → 𝒫(Y ) é usco e Gra f (G) ⊆ Gra f (F)}. Dados H1, H2∈ ℱ, dizemos que H1≤H2se Gra f (H2) ⊆Gra f (H1). Em virtude do Lema de Zorn, basta provar que cada cadeia possui cota superior.

Dada uma cadeia 𝒞, definamos F0∶X → 𝒫(Y )por F0(x) = ⋂

G∈𝒞

G(x)para cada x ∈ X . Mostraremos que F0é uma cota superior de 𝒞.

Em virtude da Proposição1.2.23, sabemos que cada F0(x)é um compacto não vazio. Sejam

U ⊆ Y um aberto e z ∈ X tais que F0(z) ⊆ U. Se G(z) ∖ U é não vazio, para cada G ∈ 𝒞, então

aplicando novamente a Proposição1.2.23obtemos que F0(z) ∖U = ⋂

G∈𝒞

G(x) ∖U é não vazio, o que é absurdo. Então existe H ∈ 𝒞 tal que H(z) ∖ U = ∅. Logo F0(z) ⊆ H(z) ⊆ U. Ou seja,

considerando o aberto V = {x ∈ X ⋃︀ H(x) ⊆ U }, temos que z ∈ V ⊆ {x ∈ X ⋃︀ F0(x) ⊆ U }. Isto é, F0é

usco e, claramente, é uma cota superior de 𝒞.

Proposição 1.4.8. Seja ϕ ∶ X → 𝒫(Y ) usco minimal. Se A é um subconjunto denso ou aberto de X, então ϕ⋃︀A∶A → 𝒫(Y )é usco minimal.

Demonstração. Sabemos que ψ = ϕ⋃︀Aé usco. Sejam U um aberto de A e W um aberto de Y tais

que ψ(U ) ∩W ≠ ∅. No caso que A seja aberto, ψ é usco minimal a partir do item (c) do Lema

1.4.6. No caso que A seja denso, existe um aberto V de X tal que U = V ∩ A. Pelo item (c) do Lema1.4.6, existe um aberto não vazio Ω ⊆ V tal que ϕ(Ω) ⊆ W . Logo Ω ∩ A é um aberto não vazio tal que Ω ∩ A ⊆ U e ψ(Ω ∩ A) ⊆ W . Então ψ é usco minimal.

Proposição 1.4.9. Se ϕ ∶ X → 𝒫(Y ) é usco minimal, então ϕ é um-avaliada no conjunto dos pontos isolados de X .

Demonstração. Sejam a ∈ X um ponto isolado e z ∈ ϕ(a). Como Y é Hausdorff, temos que {z} ⊆ ϕ(a) é fechado. Em virtude do item (b) do Lema 1.4.6, temos que ϕ(a) ⊆ {z}. Ou seja, ϕ (a) = {z}. Assim, ϕ é um-avaliada em cada ponto isolado de X .

Definição 1.4.10. Sejam X um espaço topológico e ρ uma pseudo-métrica definida nele. Dize- mos que X é fragmentado por ρ se, para quaisquer ε > 0 e A ⊆ X não vazio, existe um aberto U tal que A ∩U ≠ ∅ e ρ − diam(A ∩U ) < ε.

Observação 1.4.11. Seja ρ uma pseudo-métrica definida num espaço topológico (X , τ). Se toda ρ −bola aberta é τ −aberta, então X é fragmentado por ρ .

Proposição 1.4.12. Seja ϕ ∶ X → 𝒫(Y ) usco minimal. Se Y é fragmentado por uma pseudo- métrica ρ, então existe um subconjunto residual R em X tal que ρ − diam(ϕ(x)) = 0, para todo x ∈ R.

Demonstração. Para cada n ∈ N>0 definimos o conjunto An= {x ∈ X ⋃︀existe um aberto U , com

x ∈ U, tal que ρ − diam(ϕ(U )) <1n}. Não é difícil ver que cada Ané um aberto. Vamos mostrar que, para todo n ∈ N>0, An é denso. De fato, seja W um aberto não vazio de X , como Y é

fragmentado por ρ, existe um aberto Ω de Y tal que ϕ(W ) ∩ Ω ≠ ∅ e ρ − diam(ϕ(W ) ∩ Ω) <1n. Pelo item (c) do Lema1.4.6, existe um aberto não vazio V tal que V ⊆ W e ϕ(V ) ⊆ Ω. Assim,

∅ ≠V ⊆ W ∩ An. Agora só basta tomar R =

n=1

An, o que é residual, e que satisfaz a propriedade

desejada.

Observação 1.4.13. Na proposição anterior, no caso que ρ seja uma métrica, ϕ é um-avaliada em R.

Teorema 1.4.14. Sejam B um espaço de Baire e ϕ ∶ B → 𝒫(X ) usco minimal.

a) A família ℛ = {E ⊆ X ⋃︀ existe G, um subconjunto Gδ denso de B, tal que ϕ(x) ⊆ E ou ϕ (x) ⊆ Ec para todo x ∈ G} é uma σ −álgebra que contém os Borelianos de X 2. Além disso, para cada T ∈ ℛ, o conjunto ϕ−1(T ) ∖ {x ∈ B ⋃︀ ϕ(x) ⊆ T } é magro.

b) A família ℳ = {E ∈ ℛ ⋃︀ ϕ−1(E) possui a propriedade de Baire} é uma σ −álgebra que

contém os Borelianos de X .

Demonstração.

a) Note que ℛ é fechado por complementos. Seja (An)n∈N uma sequência de elementos de ℛ. Para cada n ∈ N, existe Gn, um conjunto Gδ denso de B, tal que ϕ(x) ⊆ Anou ϕ(x) ⊆ Acnpara

todo x ∈ Gn. Sejam G = ⋂ n∈N

Gnum conjunto Gδ denso de B e x ∈ G tal que ϕ(x) ∩ ⋂

n∈N

An≠ ∅. Se existe m ∈ N tal que ϕ(x) ⊈ Am, então ϕ(x) ⊆ Acm, mas isso não pode acontecer. Logo

ϕ (x) ⊆ Anpara todo n ∈ N. Ou seja, ϕ(x) ⊆ ⋂ n∈N An. Isto é, ϕ(x) ⊆ ⋂ n∈N Anou ϕ(x) ⊆ ( ⋂ n∈N An) c

para todo x ∈ G. Então ⋂

n∈N

An∈ ℛ.

2 A σ−álgebra de Borel é a menor σ−álgebra que contém a topología. Seus elementos são chamados

Se F é um fechado de X , definamos GF = {x ∈ B ⋃︀ ϕ(x) ⊆ Fc} ∪int(ϕ−1(F)). Não é difícil ver que GF é aberto e denso. Pelo item (b) do Lema 1.4.6, temos que ϕ(x) ⊆ F ou

ϕ (x) ⊆ Fcpara todo x ∈ GF. Logo F ∈ ℛ. Concluímos que ℛ é uma σ −álgebra que contém

os Borelianos de X .

Por último note que, dado T ∈ ℛ, o conjunto {x ∈ B ⋃︀ ϕ(x) ⊆ T ou ϕ(x) ⊆ Tc}é residual. Ou

seja, ϕ−1(T ) ∩ ϕ−1(Tc) =ϕ−1(T ) ∖ {x ∈ B ⋃︀ ϕ(x) ⊆ T } é magro.

b) Note que ℳ contém os conjuntos fechados de X . Seja (An)n∈Numa sequência de elementos de ℳ. Logo ϕ−1( ⋃

n∈N

An) = ⋃

n∈N

ϕ−1(An) possui a propriedade de Baire. Isto é, ⋃

n∈N

An∈ ℳ. Dado E ∈ ℳ, temos que ϕ−1(Ec) = (ϕ−1(E) ∩ ϕ−1(Ec)) ∪ (B ∖ ϕ−1(E)) possui a

propriedade de Baire devido ao Teorema 1.3.12. Ou seja, Ec∈ ℳ. Portanto, ℳ é uma

σ −álgebra que contém os Borelianos de X .

Corolário 1.4.15. Sejam B um espaço de Baire e ϕ ∶ B → 𝒫(X ) usco minimal. Se K é um Boreliano de X e ϕ−1(K)é de segunda categoria, então existem um aberto não vazio U ⊆ B e G, um subconjunto Gδ denso de U , tais que ϕ(G) ⊆ K.

Demonstração. Seja KB= {x ∈ B ⋃︀ ϕ(x) ⊆ K}. Pelo Teorema1.4.14, e seguindo a notação dele, sabemos que K ∈ ℳ e ϕ−1(K) ∖ KB é magro. Dado que ϕ−1(K)possui a propriedade de Baire, existe um aberto U ⊆ B tal que U △ ϕ−1(K)é magro. Mais ainda, como ϕ−1(K)é de segunda categoria, U é não vazio e U ∩ ϕ−1(K) é de segunda categoria. Em consequência, U ∩ KB é

residual em U . Logo existe G, um subconjunto Gδ denso de U , tal que G ⊆ U ∩ KB. Portanto

ϕ (G) ⊆ K.

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