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Variáveis relevantes para o fenômeno

No documento Universidade Federal do Rio de Janeiro (páginas 89-109)

5. ANÁLISE DOS DADOS

5.1. Lexias verbais simples

5.1.2. Variáveis relevantes para o fenômeno

Serão apresentadas, nesta seção, as variáveis independentes que se mostraram significativas para o condicionamento da colocação dos clíticos pronominais em lexias verbais simples, considerando-se como valor de aplicação a variante proclítica. As variáveis selecionadas pelo pacote de programas Goldvarb-X, de acordo com a ordem de seleção para o favorecimento da próclise, foram as seguintes: “elemento antecedente ao clítico”, “forma verbal”, “tipo de oração” e “distância entre o clítico e elemento antecedente”. Salienta-se que, na rodada escolhida para a análise do fenômeno, a significância foi de 0.00 e o input de .49 (variante pré-verbal).

I) Elemento antecedente ao clítico

.98 .97.95.94 .76 .53 .18 .10 .08 .04 .01 0 0,2 0,4 0,6 0,8 1 P e s o R e la ti v o Partículas de negação Prep. 'para', 'de', 'por' e 'sem' Elementos de foco

Estruturas clivadas Elementos subordinativos Advérbios

Preposições 'a' e 'em' SN sujeito

SPrep

Elementos discursivos Conjunções coordenativas

Elemento antecedente ao clítico

Valor Absoluto Percentual Peso Relativo

Pronomes e advérbios relativos25 13/13 100% _

Palavras QU 12/12 100% _

Partículas de negação 225/229 98% .98

Prep. para, de, por e sem 124/129 96% .97

Elementos de foco 115/128 89% .95 Estruturas clivadas 198/206 96% .94 Elementos subordinativos 226/257 88% .76 Advérbios 48/128 37% .53 Preposições a e em 3/21 14% .18 SN Sujeito 19/297 7% .10 SPrep complemento 1/19 5% .08 Elementos discursivos 4/37 11% .04 Conjunções coordenativas 1/441 1% .01 Locuções adverbiais 0/3 0% _

Tabela 1: Aplicação da próclise segundo o elemento antecedente ao clítico

Pode-se verificar, de acordo com o gráfico 3 e a tabela 1, que as partículas de negação, as preposições para, de, por e sem, os elementos de foco, as estruturas clivadas, as estruturas subordinativas e os advérbios são elementos favorecedores da variante proclítica. De outro lado, as preposições a e em, os SN sujeito, os sintagmas preposicionais antepostos, os elementos discursivos e as conjunções coordenativas desfavorecem a variante pré-verbal.

Na tabela 1, observa-se que há próclise categórica para os dados que têm como antecedente as palavras QU e os pronomes e advérbios relativos, enquanto a ênclise foi categórica para as ocorrências de verbos precedidos de locuções adverbiais.

Vale destacar o forte favorecimento da próclise na presença das preposições para, de, por e sem (.97). Esse comportamento das preposições confirma em absoluto o que já foi atestado por Mateus et alii (2003), em que se advoga que há alguns casos particulares na ordem do clítico em frases não finitas e “o terceiro caso particular de

25 Os pronomes e advérbios relativos, as palavras QU e as locuções adverbiais não foram expostos no

gráfico por constituírem contextos de aplicação categórica, de modo que, durante a recodificação, receberam não se aplica (/).

colocação envolve o estatuto das preposições como atractores de próclise” (p. 863). As autoras ainda advertem que “a preposição a (...) não está marcada como atractor de próclise” (p.863).

A título de ilustração, pode-se observar, nos exemplos a seguir, o favorecimento da variante pré-verbal com algumas preposições do tipo para, de, por e sem e seu desfavorecimento com as preposições a e em:

4) ● INF em volta da estopa e no fim metia entre a estopa […] e a correia para ficar preso, para se não soltar.

INQ Sim senhor. E era fivela que se dava? [FIS-Crescência-M]

5) ● INQ Antes não se costumava, aqui não se costumava fazer da lenha, costumava-se queimar a lenha para ficar assim toda preta, que era para depois acender?…

INF Carvão. INQ Sim.

INF Para se botar no ferro, para se passar a roupa a ferro. [STE-Isaltina-M] 6) ● Os filhos dela… A Encarnação – olhe, essa Encarnação que aqui esteve, já vinha atrás de mim; em me vendo, já vinha: ‘A mãe! A mãe! A mãe’! De lhe eu dar o peito.

INF2 Porque ela era amiga de lhe dar a mama.

INF1 De lhe eu dar o peito, chamava-me mãe. [GRJ-Ercília-M]

7) ● Fui eu que o criei. Tive-o mesmo em minha casa a criá-lo. O Estrabãozinho, fui eu que o criei. [GRJ-Ercília-M]

8) ● Eu dei-lhe três socos e ela deu-me com água na cara. Mas eu também me consolei em dar-lhe três socos. [STE-Isaltina-M]

Também se mostrou fortemente atuante no condicionamento da variante proclítica a presença de elementos de foco (só, até, ainda e também). Percebe-se que sua atuação (.95) é maior do que a dos elementos subordinativos (.76). Para exemplificar a atuação dos elementos focalizadores, seguem alguns exemplos em que tal favorecimento é comprovado:

9) ● Histórias e adivinhas e assim umas coisas para fazer rir as pessoas. Que o meu ele era… O meu era um deles, coitadinho.

INQ2 Pois.

INF […] O último ano que se fez o fiadeiro aí, ele estava lá e eu só lhe disse assim: "Ó senhor Aristóteles, cale-se lá que já nos dói até a barriga de tanto nos rir". [OUT-Astreia-M]

10) ● O tractor corta as pestanas às árvores. Os chocalhos, […] o gado, quando era de Inverno, as ovelhas soltavam-se às nove, dez horas, para não apanhar a

maresia. Porque a maresia punha pieira e dava cabo das ovelhas. Só se soltavam no fim de enxugar. [STJ-Danilo-H]

11) ● Digo-lhe mais: Deus o queira que não lhe suceda, mas se assucedesse, é uma maravilha.

INQ1 Pois. Mas é uma dor muito grande, não é?

INF Oi, [ele] dor?! Eu até me atirava a Cristo e ao padre, quanto mais! E mordeu-me em dois sítios.Depois, pus cá […] as cuecas […] da senhora, ligadas, porque senão depois manchava a outra roupa, não é? [OUT-Austrino-H]

12) ● INQ1 O cartapaço é uma carapuça que se põe? De papel?

INF É. Há cartapaços muito lindos! Até os faziam das cartas de jogar, muito bonitos.

INQ1 Ah! Sim, sim.

INF Outras vezes, dum papelão bonito. […] Eu sei-lhos fazer os cartapácios. [OUT-Astreia-M]

13) ● INF "Sou da família dos Balaões. A minha mãe chamava-se Aurora". Depois eu ainda lhe dei conhecimento de algumas pessoas. E ele conhecia algumas pessoas […] onde a minha nora esteve também lá em casa deles. [OUT-Astreia-M]

14) ● INQ1 Olhe, e depois aq-, há uns paus que se punham ao alto. Como é que chamava?

INF Fueiros. Tenho-os eu ali. Ainda os ontem tirei do carroço. Também os aqui meto. [MST-Ambrósio-H]

15)● INF2 Era leiteira.

INF1 Era muito leiteirinha, ai isso era! INF3 Ai eu também, graças a Deus!

INF1 E a minha Eunice também assim era. E a Eurídice? A Eurídice também os

criou todos ao peito.

INF3 Eu, graças a Deus também. [GRJ-Ercília-M]

16) ● INQ1 Portanto e além do, dos, dos…, não usavam uma outra coisa, que era assim entrançada, que era quando queria a- acarrear estrume e, e isso tudo?

INF Quando queríamos acarrear estrume tinha a gente umas portas. Punha a gente assim dos lados e outra assim na frente e outra assim detrás [baixo].

INQ1 Chamava a isso portas?

INF As portas. Também as eu ali tenho. [MST-Ambrósio-H]

Curiosamente, observa-se que as partículas de negação, as estruturas clivadas e os elementos subordinativos, apesar de serem elementos “atratores” clássicos, não registraram a próclise de maneira categórica; houve diversos dados em que o elemento antecedente ao clítico era um dos listados anteriormente e a colocação pronominal utilizada foi a enclítica, como se pode observar nos exemplos abaixo:

17) ● Porque a mulher já tinha visto – ela e a mãe – mas ele não. E eu lá fui […] a um senhor que chamam-lhe o Arlindo […] [OUT-Astreia-M]

18) ● Depois foi então lá uma rapariguinha que chamam-na a Etelvina – que é solteirona, coitadinha –, e foi-me atalhar com o azeite [...] [GRJ-Ercília-M]

19) ● INF2 É azul. A gente chama azul ou reimosos porque faz mal a nós. INQ1 Pois. Portanto o azul é o mesmo que reimoso?

INF2 Pois. A gente disse que chama-lhe…É a cavala, que é um peixe muito mau, o charro, o negrão… O garapau é muito bom, não faz mal a pessoa nenhuma também. [ALV-Ápio-H]

20) ● INQ2 Como é que é essa moída na máquina?

INF Moía, que é só torresmos. Tiro o torresmo da vasilha, aqueço […] e passo na máquina. E o meu marido faz sanduíches e gosta. E se sirvo-lhe assim inteiro, ele não gosta do torresmo. E moído, dá. Come. [CRV-Filomena-M]

21) ● INF1 Cá da nossa costa, pois eu quase todos os peixes tenho apanhado. Às vezes, uma pessoa não vem-lhe à cabeça o que possa ser. [ALV-Ápio-H]

22) ● INF1 Pois. Chama-se-lhe uma loisa de pedra. Isso é que é uma loisa. INF2 Não chama-se uma armadilha?

INF1 Não. É uma loisa. Isso é que é uma loisa. Isso é que é… […] Isso é que é mesmo uma loisa. [LUZ-Cloé-M]

23) ● INQ1 Rhum-rhum. E quando era um enxame assim pequenino? INF Não era uma toca?

INQ2 Uma toca?

INF Quando é aquelas pequeninas que fazem na terra […], INQ1 Ah!

INF aí é que chama-se a toca. [STE-Idalécio-H]

24) ● Mas os automóveis são já muitos e os vizinhos são também muitos, e quando a gente dá-se notícia, ao domingo é um silêncio! [ALJ-Herodiano-H]

É importante salientar que Mira Mateus et alii (2003: 850) registra que

as primeiras produções com pronomes clíticos das crianças portuguesas exibem generalizadamente o padrão enclítico, contrariamente ao que está descrito para outras línguas românicas.

Essa tendência revelada em dados de aquisição é utilizada como argumento em defesa de que a ênclise seria o padrão básico de colocação na variedade europeia do Português. Entende-se que os dados do presente trabalho colaboram com essa interpretação, enfatizando que a fala de portugueses não escolarizados também apresenta variados exemplos de natureza semelhante aos registrados na fala infantil.

Em relação aos advérbios, verificou-se leve favorecimento à próclise (.53). Curiosamente, constatou-se que a forma já é a responsável pela maioria dos dados em

próclise. Dos 48 dados com essa variante, 32 têm como antecedente o advérbio já. Veja alguns exemplos com a variante proclítica abaixo:

25) ● INF Não, mas […] isso é brincadeira. Às vezes, ainda está no começo e já vão e dizem: "Ah, já se está quase pronto que o rabo já veio"! […] Isso agora é uma brincadeira, porque a gente não escolhe e não põe assim no fundo. [CRV-Filomena-M]

26) ● INF1 Olhe, eu, a do meu casamento foi cor-de-vinho. Uma saia cor-de- vinho toda empregueada. Era. Já se usava naquele tempo empregueado. [GRJ-Ercília- M]

27) ● INF1 Ouve lá, a [irmã] do Epicuro – o Epicuro já tem trinta e tal… INF2 Havia só calças era para os homens!

INF1 Espera aí, eu já te calo! Do Epicuro eu já […]… O Epicuro já tem trinta e tal anos e eu já não andava sem elas.

INF2 Mas isso foi há trinta anos. [GRJ-Ercília-M]

Em todo o corpus, há apenas um dado de ênclise com o verbo antecedido de já, exemplificado a seguir:

28) ● INF1 Porque eu sei conhecer essas coisas todas. INQ1 Pois.

INF1 Desde gaiato pequeno fui logo… Achava uma espiga de trigo, eu semeava-a! Se se criava aquele triguinho, no outro ano experimentava a semear. Já

dava-me quase meio litro. [MLD-Galeno-H]

Pode-se constatar, de acordo com o exemplo anterior, que não é a distância que propicia a utilização da ênclise, pois não há qualquer elemento entre o advérbio já e o grupo verbo-clítico.

Registrou-se, no entanto, certa oscilação no comportamento do advérbio lá. Apesar de a maioria dos dados que tem como antecedente esse advérbio realizar a variante proclítica, há dados enclíticos também, como se verifica nos exemplos abaixo:

29) ● INQ1 Por onde é que largava fogo? INF1 Largava fogo por essa porta. INQ2 Pela porta.

INF1 Lá punha-se lá fogo, aquilo depois [ele] começava a arder; estando ardido, estando bem, bem, bem [alado] lá dentro, fechava-se aquela porta com terra outra vez, metia-se-lhe mato, tapava-se com terra edepois dali é que começava a tomar fôlego […] por os ouvidos – que era os ouvidos que estavam pela parte da rés do chão.

INQ2 Rhum-rhum. [LUZ-Cirilo-H]

30) ● INQ1 Quem é que lha fez, foi o seu pai?

INF […] Não, o meu pai não. Lá lhe ofereceram a ele. […] Até já estava em cor de vinho de ser tão velha, a roca.

INQ1 Devia ser lindíssima! [OUT-Astreia-M]

Na presença dos demais advérbios encontrados no corpus, como depois, antigamente, cá, aqui, amanhã, aí e agora, a variante utilizada foi a enclítica. Destaca- se o fato de o advérbio depois ser o mais utilizado em todo o corpus. De 80 dados com advérbios realizando a variante enclítica, 59 desses dados têm como antecedente o advérbio depois. Para efeito de ilustração, observem-se os exemplos abaixo:

31) ● INF Se não gosta com o pimento, não deite. E depois de estar […] as sopas migadas, deita-se água, mexese muito bem e prova se está bom de sal. Depois

deita-se o pão, que o pão já tem sal. Tem que provar é o caldo. Depois tapa-se ali um

bocadinho. Depois serve-se. É o uso cá do Alentejo. [ALJ-Iolanda-M] 32) ● INQ E depois então tirava-se e secava-se, é isso?

INF1 Depois tirava-se fora e depois deitava-se assim às carreirinhas, estendido num prado, num terreno, que tivesse ervas, muito estendidinho e estava ali. [FIS- Crescência-M]

33) ● Eu gosto de tudo do linho! –, até que cai o tasco deste lado. Depois vira-

se para o outro. Depois vira-se ele o que tenho na mão para baixo. Tem que se virar

umas quantas vezes até que fica só a febra. Cai o tasco e, depois de cair o tasco, fica aquelas mãozinhas de febra que parecem cabelos. Assim, muito amorozinho. [OUT- Astreia-M]

Pode-se constatar que a produtividade da forma adverbial depois se relaciona à natureza dos dados; no contexto de narração de fatos, comum no corpus, o entrevistado utiliza amplamente essa forma para a marcação da sequencialidade de episódios.

Do levantamento dos advérbios empregados no material sob análise, pode-se aferir o comportamento proclisador, embora não categórico, das formas já, em primeiro plano, e lá, secundariamente. Os demais advérbios não demonstraram exercer efeito proclisador. Ao que parece, esse comportamento está vinculado à constituição de unidades sintagmáticas independentes em termos entoacionais. A esse respeito, gramáticos tradicionais advertem apropriadamente que apenas alguns advérbios – “curtos e sem pausa” – atuariam como “partículas atratoras”. Mateus et alii (2003: 853) declaram – com base na proposta de Frota e Vigário (1996) – que os elementos proclisadores devem figurar no mesmo sintagma entoacional.

Os outros elementos analisados – sintagmas nominais sujeito, sintagmas preposicionais (complementos antepostos), elementos discursivos e conjunções coordenativas – desfavorecem a próclise, como se pode verificar nos exemplos a seguir:

34) ● Eu conheço aqui um rapaz em Outeiro". "Então, como é que se chama o rapaz"? "[…] Foi meu colega". "Chama-se Arcidres". "É meu filho"! Olhe, o senhor

agarrou-se a mim, beijou-me ele e ela também. Mas eu, eu arrebentaram-me as

lágrimas por ver ali seis crianças, seis crianças! A mais velha podia ter alguns –sei lá – , alguns doze anos – se os tivesse –, doze a treze anos. Todos pequenos! Metiam alegria aquelas criancinhas! [OUT-Astreia-M]

35) ● INQ1 Portanto, quando se faz a, quando se faz a matança do porco, o, o porco é todo ele aproveitado?

INF Todo! Fazem-se as morcelas… Do sangue faz-se as morcelas […]. Depois o molho é o fígado e o coração, e mais carne; ele faz-se um molho de fígado. A carne dos pés e outra, faz-se chouriço. Depois é o lombo de porco, é a costeleta… É tudo aproveitadinho, menos o cabelo! [CRV-Filomena-M]

36) ● INF […] Até a casa do imperador. Quando chega a casa do imperador, os bezerros quando chegam à porta, os criadores pegam na cabeça aos bezerros e eu vou buscar a coroa do Senhor Espírito Santo e, com o ceptro, eu benzo os bezerros todos. Quer dizer, faço-lhe uma cruz na testa – não é? – e em cima […] da suã, depois vou arrumar e vai-se arrumar os bezerros. Nessa altura, há ali também uma distribuição de pão e vinho a toda a gente. [TRC-Brás-H]

37) ● INQ E depois de estar morto, o que é que fazem?

INF Depois fazem [aí] uma fogueira com palha e chamuscam-nos e rapam-nos com uma navalha. Depois de estarem chamuscados, rapam-nos. Põem-nos em cima de um banco, rapam-nos bem rapadinhos, depois abrem-nos, tiram-lhes as tripas [e penduram]… [OUT-Astreia-M]

De acordo com a tabela 1, mesmo nos contextos que desfavorecem a variante proclítica, alguns casos de próclise também são registrados. A título de curiosidade, observem-se os exemplos da variante pré-verbal mediante a conjunção coordenativa e alguns SN sujeito a seguir:

38) ● INQ1 Não há nada mais grosso que a estopa?

INF Há o tasco. Depois, sabe o que nós fazíamos às vezes? […] Claro, sempre cai uma febra do linho ao estar a espadar, e se enche a fiteira… Olhe, a minha mãe […] fazia colchões até […] dos tascos. Claro, urdia com o linho mas, o tasco, aproveitava-o… E às vezes fazia os fiadeiros, até se juntava a mocidade a fazer fiadeiros… [OUT-Astreia-M]

39) ● Ora, cá não há casas […] de esgoto. Não há casas de nada disso. É uns para aqui, outros para ali, para onde se escapam, ao esconderijo. E o homenzinho deu- lhe vontade – é assim mesmo, pois dá a todos – de ir dar de corpo, e vai num instante ao pé da igreja, escapa-se ali […] a um sítio esconderijo. E lá, depois, foi limpar […] – para lhe pedir licença –, vai limpar o rabito e enrodilha as suas urtigas. Nós lhe

chamamos urtigas. Enrodilhou-as… O homem era manco, fugiu, ele fugiu, que: "Ai

Jesus"! "Ai, que ervas aqui há"! [Risos]

40) ● INF Mas a ocasião da matança… Chegou a matança – não é? –, o dia da matança.

INQ Pois.

INF Vem […] o 'matachim', o matador dos porcos – o matador dos porcos. Chamou-se o pessoal. De manhã toca […] a porem-se à lareira, ao lume, logo de manhã, […] a matar, nós lhe chamamos matar o bicho. Toca a beber aguardente e a comer nozes ou figos ou bolachas. [STA-Gotardo-H]

585. INF2 A criada foi a correr: "Ai, vem ali um senhor"… INF1 "Está ali um senhor".

INF2 "Vem ali um senhor muito asseado. Vem ali um senhor muito asseado"! INF1 "Está ali um senhor. Que entre"!

41) ● Não foi que eu então tomasse coisas para… Às vezes diz que tomam pílulas… Eu isso mesmo […] nunca vi. Mesmo quando a gente era pequena, quando eu me casei, não havia disso.

INQ Não havia. Não havia não.

INF E eu mesmo não tomava. Porque você sabe, aquilo se evita aquilo, faz também mal muito a uma pessoa. [CLH-Idalina-M]

42) ● INF2 "Diga-lhe que entre, que entre"! Todos lhe davam já as cadeiras melhores, a puxarem-lhe a cadeira. [GRJ-Ercília-M]

43) ● INQ Não é… Não davam às pessoas para?…

INF Davam. Davam às pessoas conhecidas. Meu sogro – Deus lhe dê o céu […] –, […] ele só receava era a dá-lo no outro dia. A gente levava metade do dia: "Olha [ele]! Olha uma postinha de peixe. Olha uma postinha"… Dava a toda a vizinhança e às pessoas conhecidas. [CRV-Filomena-M]

44) ● INF1 E eles [a botarem] e eu com a pressa – era eu e a mãe que Deus tenha –, Deus Nosso Senhor me perdoe. Eu com tanta lide, toca a chamar – [e mesmo] agora, está aqui assim, assim o dentista, o tal, e um doutor assim, assim. Ai Jesus, o que me custou! "Mas vamos lá embora"! "[Tu sabes]"… Eles a meterem-se comigo porque foi um desafio que tivemos. [STA-Gotardo-H]

Como se pode observar, os exemplos registram a próclise mediante a conjunção coordenativa e – em apenas uma ocorrência (exemplo 38) – e alguns SN como nós, todos, aquilo, Deus e Deus Nosso Senhor. Em relação aos tipos de SN, destaca-se o fato de a maioria dos dados de próclise mediante sujeito (10 dos 19 dados) ser composta pelas estruturas do tipo Deus, em estruturas que podem ser consideradas formulaicas (como Deus me perdoe). Das formas nominais com próclise encontradas, o pronome todos é descrito, em gramáticas como a de Mateus et alii (2003:855), como proclisador: “quantificadores distributivos e grupais como todos, ambos e qualquer induzem próclise.”. Deve-se ressaltar, entretanto, que dados de próclise diante de pronomes como nós e aquilo surpreendem, visto que esses elementos não são citados como elementos atratores na variedade europeia do Português.

II) Forma verbal .98 .96 .47 .24 0 0,2 0,4 0,6 0,8 1 P e s o R e la ti v o Subjuntivo Gerúndio Indicativo Infinitivo

Gráfico 4: Aplicação da próclise (peso relativo) segundo a forma verbal

Forma verbal

Valor Absoluto Percentual Peso Relativo

Subjuntivo 79/83 95% .98

Gerúndio 2/3 67% .96

Indicativo (exceto futuro) 759/1631 46% .47

Infinitivo 149/199 75% .24

Imperativo 0/3 0% _

Fut. do presente do indicativo 0/1 0% _

Tabela 2: Aplicação da próclise segundo a forma verbal

No que diz respeito à forma verbal, cujos resultados se apresentam no gráfico 4 e na tabela 2, verifica-se que as formas verbais no subjuntivo (.98) e no gerúndio (.96) tendem a favorecer significativamente a próclise, enquanto as formas verbais no indicativo (.47) e no infinitivo (.24) não a favorecem, como se mostrará mais adiante.

Quando o verbo se encontra no subjuntivo, há, como já foi mencionado, o favorecimento da próclise. Tal fato se associa à inserção dessa forma em estruturas subordinadas, as quais contêm elementos que atuam como proclisadores do clítico pronominal. Para efeito de ilustração, observe-se o seguinte exemplo:

45) ● INQ1 Mas depois como é que conseguiam falar? Eras-, nas, ali nos caminhos?

INF Nas ruas. Em qualquer uma rua. Aqui […] não há namoros particulares, é ao público. Em qualquer local que se encontre podia um estar com o outro. [STA- Hortense-M]

Em relação ao gerúndio, pode-se observar que tal favorecimento deve ser relativizado em função do baixíssimo número de ocorrências, uma vez que, em todo o corpus, se encontraram apenas três dados, sendo dois com a variante pré-verbal e um com a pós-verbal, como se pode observar a seguir:

46) ● INF1 Era só aquela… É, é. São umas regalonas. Elas podem durar outro tanto tempo. Eu criei muito filhinho! […] E iam para a feira, por exemplo, estava aqui uma senhora que chamavam a Eulália Justino, não tinha leite. Os filhos dela… A Encarnação – olhe, essa Encarnação que aqui esteve, já vinha atrás de mim; em me

vendo, já vinha: "A mãe! A mãe! A mãe"! De lhe eu dar o peito. [GRJ-Ercília-M]

47) ● Que eu não gostava de arroz de bacalhau, e em ela o fazendo até cheirava! Então e uma carne que ela arranjava?! Uma galinha, fazia umas poucas de

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