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CAPÍTULO 2. O FIM DA HISTÓRIA DA ARTE SEGUNDO HANS BELTING

2.1. A S VERSÕES DO “ FIM ”

Desde que elaborou o primeiro ensaio sobre o fim da história da arte, Hans Belting não parou de reescrevê-lo. As revisões apontam acima de tudo para o amadurecimento de suas idéias e proposições: a elaboração gradual da tese do fim da história da arte deve ser compreendida como o florescer de um conjunto imbricado de camadas conceituais, no qual só é possível que a próxima camada se revele na medida em que a anterior já se deu a conhecer. Esta maturação no percurso intelectual do historiador torna-se evidente não apenas em O fim da história da arte, mas igualmente se aclara em outras obras que dialogam com esta (direta ou indiretamente): Imagem e Culto: uma história da imagem antes da era da arte (1991) e Antropologia da imagem: esboços para uma ciência da imagem (2001). Neste sentido, para que se compreenda o pensamento beltingano é necessário refaça sua trajetória conceitual, a fim de que, compreendendo o ponto de onde principia seu percurso, seja possível compreender não apenas aonde ele chegou, mas também todos os percalços da trajetória. Lança-se, então, neste momento um olhar meticuloso sobre as várias versões do fim.

A primeira versão de O fim da história da arte? se divide em duas partes, em dois ensaios: o primeiro intitula-se O fim da história da arte? Reflexões sobre arte contemporânea e história da arte contemporânea e a segunda Vasari e seu legado: a história da arte como um processo. Tecendo suas idéias em dois momentos distintos e complementares, o historiador interpela a idéia de uma historia da arte única e universal, a qual durante longo tempo serviu tanto a artistas quanto a historiadores.

O questionamento fundamenta-se, no primeiro ensaio, em uma análise do estado atual da disciplina a partir de uma discussão da relação entre arte contemporânea e história da arte. Segundo Belting, se os artistas, por um lado, se recusam a participar do antigo curso da história da arte, apartando-se assim de uma tradição iniciada por um outro artista, Giorgio Vasari (1511-1574); por outro lado, os historiadores da arte, que entraram

em cena muito mais tarde, podem ou não aceitar um modelo de história do qual são herdeiros e esquivar-se ou assumir a tarefa de estabelecer um novo modelo. Segundo Belting, baseada em princípios e pressupostos que não são compartilhados pelos artistas, a história da arte como vinha sendo praticada cientificamente pelos historiadores seria incapaz de lidar com a arte contemporânea.

De repente revela-se estranho o compromisso com uma “história universal da arte” que havia, por longo tempo, sido tão evidente. Estranhamento causado principalmente pela percepção de que, na realidade, esta “história universal da arte” (coerente, ordenada, universalmente válida) não estava perdida: na realidade, nunca existiu enquanto tal. E afirma: “tanto o artista e historiador da arte perderam a fé em um processo racional e teleológico da história artística, um processo a ser realizado por um e descrito pelo outro” (BELTING, 1987: p.ix).

Para Belting, no entanto, o confuso estado atual não é necessariamente algo que artistas e historiadores devam lamentar-se, mas pode igualmente fomentar a busca de novos objetivos e novas perguntas. Para isso, segundo Belting, é necessário que se compreenda o empreendimento que deu origem àquelas antigas concepções de história e de arte.

Desta forma, no segundo ensaio (Vasari e seu legado: a história da arte como um processo), Belting traça um relato do desenvolvimento da história da arte a partir da publicação de As Vidas dos mais Excelentes Pintores, Escultores e Arquitetos, de Cimabue aos nossos tempos (1550) de Giorgio Vasari, verificando a influência de tal historiografia não somente enquanto método, mas igual e principalmente como nascimento daquela história da arte a qual chega ao fim, caracterizada por uma narrativa de sobreposição do novo sobre o velho, rumo ao progresso. Neste sentido, três figuras são fundamentais para que se compreenda este primeiro momento da tese: além de Giorgio Vasari, apresentam-se Johann Joachim Winckelmann (1717-1768) e Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831).

Diferentemente dos historiadores modernos, Vasari, ao mesmo tempo, participou do desenvolvimento da arte do seu tempo e escreveu sobre ela. É considerado

por Belting como figura histórica fundamental para que se compreenda a essência do modelo historiográfico que vigorou até poucas décadas (quiçá, ainda hoje).

É preciso que se tenha em mente que, como afirma Kultermann, ao contrário do que o título da obra possa sugerir, “Vasari não concebeu sua obra como uma sucessão de biografias, mas sim queria usar a história para mostrar o que deveria acontecer em seu próprio tempo e, para demonstrá-lo, ele concebeu uma evolução” (KULTERMANN, 1996: p.30). A historiografia vasariana, baseada na concepção orgânica da arte (nascimento, desenvolvimento, maturação, morte) empreende um modelo biológico cíclico para a compreensão da dinâmica histórica da arte, baseado nas três idades.

A primeira compreendia os inícios desse desenvolvimento, a infância da nova arte, na qual se fazia referência aos artistas do século XIV. O segundo período, a juventude, é aquele dos artistas do século XV, enquanto que o terceiro compreendia a verdadeira eclosão, os artistas do XVI. Esta evolução culmina na figura de Michelangelo, quem, segundo opinava Vasari, havia superado a Antiguidade. Tanto as categorias de valor como a concepção da história de Vasari são influenciadas por Michelangelo, o qual sabia ver de forma nova os precursores da arte do passado (KULTERMANN, 1996: p.30).

Assim, na representação vasariana do desenvolvimento global da arte, “o mundo antigo foi o culminar do desenvolvimento artístico. À Antiguidade se opõe a obscura Idade Média e se considera o renascimento da arte desde o século XIV como o terceiro grande ciclo” (KULTERMANN, 1996: p.30).

No entanto, de acordo Belting, “o rígido quadro dessa historiografia da arte era tão prático para Vasari quanto não prático para seus sucessores” (BELTING, 2006: p.188). Como afirma Carrier em resenha crítica sobre a tese de Belting, o problema da metodologia vasariana é que não fornece nenhuma maneira de compreender o curso da história da arte, tanto para os artistas quanto para os historiadores. E prossegue:

Para Vasari, Rafael e Michelangelo foram o ponto culminante da tradição que começou com Giotto. Mas então o que poderia restar para os artistas da geração seguinte fazerem? Este não é um problema para o próprio Vasari, seu objetivo é explicar o desenvolvimento da arte até seu próprio tempo (CARRIER, 1988: p.188).

Belting refere-se a Winckelmann como o herdeiro mais importante da tradição historiográfica vasariana. E ressalta: inclusive ele não escrevia sobre a arte do seu próprio tempo, tendo voltado-se para a Antiguidade Clássica, o que lhe evitou uma série de problemas. Ao contrário: “concentrando-se no ciclo do nascimento, desenvolvimento, maturidade e decadência da arte na antiguidade, ele não desenvolveu uma teoria para a arte de seu tempo, a qual lhe interessava menos do que a arte grega e romana” (CARRIER, 1988: p.188).

A tríade referencial de Belting se completa com Hegel. O filósofo encontra um outro caminho o qual responde e resolve o problema dos limites vasarianos. Hegel conclui que a arte acabou e explana tal afirmativa a partir de um relato da arte desde a Antiguidade, passando pelo Renascimento, até os dias a ele contemporâneos. Belting considera que “a novidade da estética de Hegel consiste, sobretudo, em fornecer uma fundamentação filosófica para o desenvolvimento histórico da arte, e isso para a arte de todos os povos e tempos” (BELTING, 2006: pp.189-190). E prossegue afirmando que a novidade deste pensamento é que pressupõe à arte um lugar temporalmente delimitado na história, apesar de ter sido “na seqüência depreciada muito frequentemente como ‘estética do conteúdo’”(BELTING, 2006: p.190). Tendo em vista o percurso histórico da arte na modernidade, a estética hegeliana torna-se obsoleta justamente pelo fato da arte não estar mais ligada “‘a um conteúdo particular’ e não possui mais a autoridade de representar uma concepção de mundo universal (...)”, ficando “à escolha do artista individual, desde então, refletir na arte a sua própria consciência”. A idéia de que a essência própria da arte já se realizou na história, segundo Belting, “foi, contudo, desmentido cabalmente pela arte moderna” (BELTING, 2006: p.191). O próprio argumento de Belting, como afirma Pariser, se coloca justamente contra a idéia hegeliana de que a arte teria uma história com um télos, um destino claramente definido, o que se revela no próprio título da sua tese: O fim da história da arte?

É necessário, no entanto, que se tenha em mente que a problematização beltingana daquela antiga história da arte não pretendia configurar-se como um tratado formal e acabado, nem naquele primeiro ensaio, bem como nas revisões posteriores. Como

afirma o historiador: para a então presente situação da história da arte não haveria respostas fáceis, estando convencido de que somente asserções provisórias ou mesmo fragmentárias seriam possíveis (BELTING, 1987: p.xii). A tentativa do historiador era de esboçar um quadro de possíveis temas para discussão, intentando não cair em nenhum tipo de pessimismo cultural apocalíptico. Considera que a dificuldade de mover-se em tal terreno sem expor-se a um número sem fim de equívocos “exige cautela ao invés de agendas heróicas” (BELTING, 1987: p.56).

Em comparação com as versões posteriores do texto, uma característica marcante do primeiro momento de anúncio da tese do fim da história da arte é o reduzido número de exemplos concretos, ou seja, a elucidação das idéias a partir de fenômenos históricos (artísticos ou não). Parece que o tempo dá ao historiador mais propriedade para tomar posse desses fenômenos e fazer uso deles como reveladores das idéias que deseja explanar. Estes exemplos se materializam em diversos momentos de forma preponderante na edição revisada dez anos depois, inclusive com a introdução da parte iconográfica (ausente nas primeiras versões do texto e que é incluída na edição revisada de 1994 e mantida na publicação de 2003). Uma década após, o próprio historiador afirmaria que a mistura de variadas referências iconográficas presentes no texto revisado, essa miscelânea imagética “é o reverso exato de uma história da arte coerente e, justamente por isso, representativa do estado das coisas” (BELTING, 2006: p.10).

Neste ensejo de estabelecimento de um quadro de diferenças entre as publicações, percebe-se que a reflexão sobre os métodos (que já se apresenta com proeminência naquele primeiro momento da tese) é reapresentada na edição revisada uma década após de forma mais amadurecida, numa discussão mais ampla. À discussão historiográfica, das metodologias da escrita da arte, será dedicada toda a segunda unidade da edição revisada, não se atendo prolongadamente à metodologia vasariana, mas incluindo-a numa trama mais complexa, trançada e entrelaçada pelo historiador.

O texto revisado na década de 1990 é ainda igualmente dividido em duas partes. A primeira delas intitula-se de A modernidade no espelho do presente: sobre mídia, teorias e museus a qual introduz questões referentes à modernidade em oposição à pós-

modernidade, delimitando o contexto em discussão, incluindo aspectos que antes não recebiam uma atenção específica e preponderante como a mídia e os museus. A segunda, O fim da história da arte? versa especificamente sobre questões historiográficas.

Este segundo momento de elaboração da tese de Belting é marcado por uma reflexão aprofundada dos métodos, da escrita da disciplina de forma a localizá-la culturalmente, refletindo sobre o lugar em que a história é construída e, por conseqüência, o ponto de observação daquele que a constrói. O historiador reflete sobre o lugar do discurso, considerando as condições, o contexto no qual está imerso aquele que constrói a história da arte – o historiador. Aquele que representa e interpreta, de alguma forma, se inscreve enquanto ser histórico (e, por isso, reduzido a um determinado contexto) em sua escrita. E, com ele, inscreve também o contexto que o conforma.

O par conceitual enquadramento-desenquadramento mostra-se fundamental para a compreensão deste momento da tese, o qual será tratado particularmente em momento posterior. No entanto, há de se ter em vista que ambos são conseqüência do entendimento da história da arte enquanto uma forma de representação da arte, do fenômeno artístico (idéia que aparece na tese de Belting já na década de 1980). Segundo o historiador, é comum a concepção de que história da arte estuda os veículos de representação, esquecendo-se frequentemente que a história da arte é um sistema, uma prática de representação (BELTING, 1987: p.57). Assim, Belting situa a história da arte como produto cultural da modernidade ocidental. A oposição entre a modernidade e a pós- modernidade já emerge, neste momento, como ponto de grande tensão da tese e se firma em definitivo na terceira versão da tese.

Ao longo dos anos, em cada uma das revisões, torna-se mais clara na obra de Belting a sua compreensão da arte e da história como construções históricas e culturais. Assim, do ponto de vista beltingano, a história da arte particularmente não é uma simples narração dos fenômenos artísticos destituída de um caráter político.

É preciso esclarecer que se compreende aqui enquanto “política” certas práticas sociais que envolvem os indivíduos em um determinado discurso o qual deve ser lido tendo como referência o contexto histórico no qual foi produzido. Logo, entende-se por

“política” exercícios e relações de poder que se manifestam não tão somente no âmbito administrativo estatal, mas igualmente em outras instâncias sociais (como no pensamento científico, nesse caso em particular).

Retomando o quadro de publicações, as diferenças entre a versão revisada de meados da década de 1990 e a de 2003, novamente com exceção do título (que se altera de O fim da história da arte: uma revisão dez anos depois para A história da arte após o modernismo) são bem menos impactantes e preponderantes. A interferência mais significativa ocorrida nesta edição é a inserção do novo capítulo Marco Pólo e outras culturas. Belting afirma que tal capítulo foi escrito originalmente para outro fim, mas considerava significativa a implicação do seu argumento para o tema do livro. Tendo em vista a importância da coexistência de arte ocidental e não-ocidental na cena artística contemporânea nas duas últimas décadas (exemplificando tal quadro com a série de Bienais de Arte emergentes ao redor do mundo neste período), “a história da arte”, segundo o historiador, “na sua aplicação mais recente, já não pode negligenciar esta situação”. E complementa com a constatação da necessidade de “um discurso atraente para lidar com tais fenômenos”, o qual “não está disponível”:

(...) não pode ser inventado à vontade, uma vez que a história da arte, a qual se pode chamar de um artefato peculiar de pensamento, tem desenvolvido ao longo de um longo período de tempo e dentro das tradições próprias. Pode ser suficiente declarar esta constelação inoportuna e assim confrontar a história da arte com o tempo presente, o que significa uma nova situação no mundo (BELTING, 2003: p.192).

Assim, Hans Belting se apropria do personagem histórico Marco Pólo25 como aquele que escreve sobre suas viagens para Veneza – o público veneziano – (a partir de um determinado enquadramento) e não sobre as suas viagens (o observado efetivamente):

25

Marco Pólo (1254-1324) foi um explorador veneziano e um dos primeiros ocidentais a percorrer a Rota da Seda. O relato detalhado das suas viagens pelo oriente, incluindo à China, foi durante muito tempo uma das

(...) ele queria impressionar seus leitores para os quais descrevia um mundo que eles não sabiam ou podiam imaginar. Mas o exotismo que já era popular na Idade Média foi apenas o outro lado da mesma moeda. O exótico, como o completamente outro [diferente], tornou possível que, visto de Veneza, tudo parecia diferente (BELTING, 2003: p.193).

O historiador considera, assim, que pouco mudou desde então na relação estabelecida entre centro e periferia, apesar de toda a experiência colonialista e pós- colonialista. Apesar do estreitamento das distâncias físicas (e, porque não, temporais), da possibilidade de viajar pelo mundo, convocando terras distantes domiciliarmente em velocidade antes inimaginável, isto não significa que se compreenda melhor o mundo. Neste sentido, Hans Belting discute o argumento a partir dos eixos temáticos: Centro e periferia; A cena artística como um produto de secularização; Modernismo e primitivismo; Novos limites e Dois cenários.

Como observado anteriormente, já no ensaio da década de 1980, Belting considera que refletir a respeito do desaparecimento de uma determinada história da arte não significava o fim da disciplina, mas sim a emancipação dos modelos de representação histórica herdados canonicamente. Segundo o historiador, tal emancipação já vinha sendo atingida na prática, mas uma reflexão a respeito dela ainda era rara (para esclarecer: no contexto da década de 1980). Modelos estes, baseados numa idéia de evolução autônoma da forma a partir de uma história do estilo, que se dava por demandas internas à arte. Tal narrativa, no entanto, confere um espaço muito limitado (por vezes, até inexiste) para a atuação dos seres humanos: a eles resta apenas aparecer nessas histórias só como artistas, ou, se necessário, como patronos (BELTING, 1987: pp.IX-X).

Se a outra narrativa findada (ou estava em processo de definhamento) acentuava o “velho antagonismo entre arte e vida”, esta relação é atenuada à medida que a arte perde as suas fronteiras seguras contra outros meios de comunicação, visual e lingüística, passando a ser entendida como um dos vários sistemas de explicar e representar o mundo. Belting adverte que a abertura dessas possibilidades traz em seu bojo novos problemas para o futuro de uma disciplina que, para se legitimar, justificou a si mesma pela delimitação, pelo isolamento de seu objeto (a arte) perante outros domínios do

conhecimento e da interpretação (BELTING, 2006: 173). No entanto, o historiador afirma que não pretende sugerir que os historiadores de arte abandonem a obra de arte como seu principal objeto de investigação. Muito menos que devam abrir mão desta mesma investigação valendo-se unicamente dos métodos e dos resultados obtidos da história social ou de outras disciplinas. Anos mais tarde, Belting afirmará que a tese do fim da história da arte publicada na década de 1980

afirmava então que o modelo de uma história da arte com lógica interna, que se descrevia a partir do estilo de época e de suas transformações, não funciona mais: quanto mais se desintegrava a unidade interna de uma história da arte autonomamente compreendida, tanto mais se dissolvia em todo o campo da cultura e da sociedade em que pudesse ser incluída (BELTING, 2006: pp.23-24).

O historiador chama a atenção para a transitividade inerente à arte e a história. Ao contrário de serem instâncias para além da história, eternas e imutáveis, devem ser vistas como episódios da história humana. Enquanto transitivas, transitórias, estão igualmente sujeitas à “morte”.

Tanto o papel da arte na sociedade humana e quanto da natureza da obra de arte individual – o seu status como uma imagem ou a sua “figuração” – estão em permanente mudança: eles, mais do que nunca, merecem atenção dos estudiosos. O papel da arte na nossa sociedade, pelo menos em suas manifestações tradicionais, é tão incerto como o seu curso ainda é imprevisível (BELTING, 1987: p.XI).

Já se revela, então, a natureza histórica tanto da arte como da história da arte, como observado aqui em momento anterior. Enquanto fenômenos históricos, arte e história da arte se situam e se definem no tempo e no espaço. Uma década depois, Belting irá afirmar que as práticas que entendemos enquanto artísticas hoje são, na realidade, “uma invenção de determinadas culturas e sociedades – um fenômeno, portanto, com o qual não deparamos a todo instante e em toda parte e que por isso também não deve sobreviver

para sempre”26 (BELTING, 2006: p.247). Sendo assim, o historiador adverte para a necessidade de se questionar, indagar ao fenômeno nomeado como artístico “como se realiza e qual o papel que desempenha na cultura”. E assegura de antemão: seguramente desempenhem funções muito distintas daquelas as quais são projetadas nesses fenômenos hoje.

A obra O fim da história da arte de Hans Belting, com ou sem interrogação, deve ser compreendida como um processo. É referida como “obra”, no singular, apesar de haver várias versões e revisões, pois se crê que as idéias fundamentais já eram presentes, mesmo que embrionariamente, desde a primeira publicação, o primeiro anúncio ainda na década de 1980. Alterações são mais ou menos perceptíveis. Como, por exemplo, o ponto de interrogação, “a modificação que primeiro salta à vista” (BELTING, 2006: p.9), cuja ausência do título a partir de um determinado momento aponta para uma mudança mais