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VINCULAÇÃO DA PESQUISA À PRÁTICA ASSIS TENCIAL: DESAFIOS NA CRONICIDADE

CIÊNCIAS SOCIAIS

VINCULAÇÃO DA PESQUISA À PRÁTICA ASSIS TENCIAL: DESAFIOS NA CRONICIDADE

Denise G. V. Silva Betina H. S. Meirelles Mercedes Trentini Sabrina da S. de Souza Soraia D. Schöeller INTRODUÇÃO

A pesquisa em saúde enfrenta na atualidade desa- fios que requerem a utilização de uma variedade de abor- dagens metodológicas e epistemológicas. Não há um único caminho, uma única fórmula a ser seguida, o que requer a perspicácia do pesquisador em escolher entre as inúmeras possibilidades, aquela que melhor atende à necessidade de cada situação e de cada objeto de investigação.

Falar da complexidade da condição crônica já é um lugar comum ao abordarmos essa temática, mas ela se apre- senta de tantas e distintas maneiras que sempre aparece um novo desdobramento, uma nova perspectiva. O principal as- pecto da cronicidade, que evidencia essa complexidade é que não há somente um órgão ou sistema do corpo afetado, mas a condição crônica passa a fazer parte do viver das pessoas e, com isso, todos os âmbitos de sua vida podem ser afetados: trabalho e renda; relacionamentos; capacidade física; lazer; papéis sociais; apenas para citar os mais abrangentes. Cada um desses âmbitos poderia se desdobrar infinitamente, além de considerar os aspectos políticos, de gestão e de investi-

mentos financeiros necessários quando falamos de condição crônica. Essas questões também destacam a fertilidade do fenômeno da cronicidade em problemas de pesquisa, ex- pressando a necessidade de muitos novos estudos, mesmo que pesquisas acerca de algumas condições específicas já sejam inúmeras, sob determinadas perspectivas, como do ponto de vista das alterações fisiopatológicas.

Portanto, a natureza multifacetada da condição crô- nica exige a utilização de uma abordagem também multi- facetada que permita desenvolver entendimentos e percep- ções ampliadas acerca da condição (COYLE, WILLIAMS, 2000; ANDREW, HALCOMB, 2006; CASEBEER, VERHOEF, 1997). E que método de pesquisa poderia nos ajudar a captar melhor os diferentes ângulos dessa comple- xidade? Não há argumento que indique apenas um método, pois a escolha dele depende da pergunta que fazemos a res- peito do fenômeno.

Mesmo autores que trabalham com abordagens mais tradicionais da pesquisa já reconhecem que pesquisas acerca das condições crônicas requerem uma ampla gama de pers- pectivas e habilidades, evidenciando a necessidade e a re- levância da investigação qualitativa de pesquisas em saúde. Nesse sentido, nos posicionamos pela complementaridade que há entre os métodos quantitativos e qualitativos de in- vestigação (CASEBEER, VERHOEF, 1997), evitandoa di- cotomia entre estas abordagens, como perspectivas paradig- máticas mutuamente excludentes. As defesas de posições na pesquisa fortemente vinculadas a um ou outro paradigma da ciência impossibilitariam que um pesquisador qualitativo pudesse fazer perguntas cuja resposta fosse encontrada por

meio de uma pesquisa quantitativa e vice-versa, pois aí esta- ria traindo sua posição paradigmática.

Posições dicotômicas geraram verdadeiras batalhas nas décadas de 80 e 90 do século passado, quando os pes- quisadores qualitativos precisavam firmar suas posições de oposição ao método quantitativo. Do outro lado, os pesqui- sadores quantitativos tinham todo o espaço no mundo da ciência e colocavam a “pesquisa qualitativa” fora do âmbito da ciência, não reconhecendo seus resultados como cientí- ficos. Nesse percurso de 20-30anos, houve mudanças, com posições mais flexíveis de ambos os lados e uma tendên- cia de reconhecimento das contribuições que os dois mé- todos podem trazer. Porém, ainda há uma forte tendência de maior valorização das pesquisas quantitativas, expressa, por exemplo, nos editais de financiamentos e na seleção de publicações para periódicos da área da saúde.

Discussões acerca de um novo paradigma emergente vêm surgindo, mobilizadas pela necessidade de superação dessas dicotomias e da quebra de hierarquias no conheci- mento que desprestigiam alguns conhecimentos frente a outros, como por exemplo, sobre as práticas alternativas/ complementares. Porém, segundo ressaltam Andrew e Hal- comb (2009), até que um paradigma unificador seja aceito, devemos considerar a importância de remover a oposição binária entre os métodos, de modo a fornecer respostas a diferentes tipos de perguntas, com a intenção de promover benefícios para o cuidado à saúde, com maior integralidade, como a população necessita.

Apesar de considerarmos a relevância e a efetiva pos- sibilidade de utilizar métodos mistos em pesquisas sobre

condições crônicas, há que se reconhecer que o uso articula- do de diferentes abordagens ainda é problemático. Os pes- quisadores, geralmente, têm sua formação e experiências em um ou outro método, tornando mais complexo e trabalhoso articulá-los. A necessidade de parcerias entre pesquisado- res se expressa como possibilidade de superação dessas po- tenciais dificuldades, ao unir grupos que têm expertise em diferentes abordagens. A interdisciplinaridade também é colocada como implícita na realização de pesquisas usando métodos mistos, pois possibilita diferentes olhares sobre o fenômeno.

Outro aspecto que destacamos com relação às pes- quisas sobre a cronicidade é a importância de realizá-las de forma articulada com a prática assistencial e pesquisas que possam ter resultados imediatamente aplicados ou pelo menos que eles estejam implicados nessa prática. Estamos aqui nos referindo a abordagens como a Pesquisa Ação e a Pesquisa Convergente-Assistencial.

Interessante também destacar a Pesquisa Transla- cional ou Conhecimento Translacional, que vem tomando cada vez mais espaço nas discussões sobre tendências em pesquisa. A pesquisa translacional não se caracteriza como uma abordagem de pesquisa, mas é uma posição perante a produção do conhecimento. Preocupa-se, basicamente, em traduzir os achados da pesquisa básica para a prática clínica (HULLEY, 2008). É um processo que parte da medicina baseada em evidências em direção a soluções sustentáveis para problemas de saúde da comunidade (AZEVEDO, 2009). A pesquisa translacional é compreendida como um processo dinâmico e interativo que inclui síntese, difusão,

intercâmbio e aplicação ética de conhecimentos para me- lhorar a saúde da população, fornecendo serviços e produtos de saúde mais eficazes e fortalecendo o sistema de saúde. É importante destacar que o conhecimento translacional envolve desde a definição das questões de pesquisa, sendo descrita como colaborativa, orientada para a ação, incluindo interação entre pesquisadores e pessoas que irão utilizar o conhecimento produzido, até a avaliação de sua aplicação na prática em saúde (WOODS, MAGYARY, 2010).

O presente capítulo tem como objetivo discutir a vin- culação de pesquisas sobre a cronicidade coma prática assis- tencial em saúde. O capítulo está composto por três subitens: Necessidades de mudanças na prática assistencial às pessoas em condição crônica; Avaliação das práticas e políticas na atenção às pessoas em condição crônica; Pesquisa Convergen- te Assistencial como abordagem de pesquisa na cronicidade.

NECESSIDADES DE MUDANÇAS NA PRÁTICA