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Waldemar Pavão [in memorian]

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CIRCULAR SANTA LUZIA

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PAULO Meu avô tinha uma padaria em Bocaina e meu pai, às 3:00 da manhã

se levantava, arreava o cavalo, punha na carroça, pegava o pão e saia para distribuir na cidade, de casa em casa. Embora Bocaina fosse uma cidade pe- quena, era muito cansativo fazer esse trabalho e o retorno era pouco, meu avô não ganhava dinheiro. Meu pai, Paulo Vicentin, quando fez o tiro de guerra em Jaú, percebeu a falta de transporte na região e decidiu arriscar-se nesse tipo de atividade; abriu uma linha de ônibus, Jaú – Dois Córregos. O início foi difícil, ele era o motorista, o mecânico e o cobrador, as estradas eram péssimas, as vezes tinha que por corrente no pneu para travar no barro.

JOAQUIM Meu pai, Waldemar Pavão morava em Bariri e ainda criança

buscava lenha nas fazendas para vender nas padarias e bares. Quando meu avô comprou um ônibus para fazer a linha Bariri – Itaju, colocou meu pai como cobrador, para aprender a trabalhar no ônibus. Ao surgir a possibilidade de aquisição de uma nova linha, Itaju – Arealva, meu avô não quis comprar e incentivou meu pai a fazê-lo e meu pai comprou. Como ele não podia dirigir porque não tinha carteira, contrataram um motorista e ele continuou como cobrador. Depois que meu pai comprou a empresa que fazia a linha Itaju – Arealva, meu avô sugeriu que ele fi- casse também com a empresa de Bariri – Itaju. Quando meu pai acabou

de pagar a linha Arealva e comprou a linha do meu avô, ampliou a linha de Arealva até Ibitinga. Era uma empresinha pequena, devia ter apenas um horário de ida e outro de volta. Com o tempo o horário tornou-se mais regular e começaram a atender estudantes que precisavam ir para a cidade estudar e o movimento aumentou. Eu não lembro, mas acho que nessa época a empresa ainda não tinha nome. Era aquele modelo de ôni- bus que tinha uma escadinha por fora e quando ficava lotado, o cobrador ia lá em cima junto com as malas.

PAULO Em 1957, meu pai se uniu a Waldemar Pavão que já tinha sua

própria empresa. Eles já se conheciam em Jaú. Na cidade tinha um mercado central onde os ônibus entravam, era também o lugar onde eles tomavam cerveja e falavam sobre os negócios, sobre o dia a dia. Quando se comprava um ônibus, o pedido era feito em guardanapo; o preço é tanto, são essas as parcelas, acabou, acabou, e encerravam as negociações. Em 1958, a Companhia Paulista de Estradas de Ferro, quase não tinha mais horário e não tinha mais passageiros, então as empresas que tinham ônibus para fazer a linha Jaú – São Paulo cresce- ram para suprir essa demanda. Os dois, meu pai e o Waldemar, apro- veitaram o momento e colocaram uma linha de ônibus para fazer esse trajeto, deu-se então o boom, e a empresa começou a crescer. Tinha uma passagem interessante ligada a essa linha; depois que eles se estabiliza- ram no transporte, foram, durante os anos 1990, passear na Europa. Estavam no restaurante conversando e, por coincidência, tinha duas professoras no restaurante que ouvindo a conversa deles, levantaram-se e foram cumprimentá-los porque usavam os ônibus naquela época.

A Viação Jauense, nascida nessa ocasião, depois de um tempo, estendeu sua linha até Bauru, onde foi construída uma garagem. A empresa foi cres- cendo e as linhas foram se ampliando: criou-se a linha Jaú – Bauru – Bariri, Bauru – Jaú – Araraquara, Bauru – Jaú – São Carlos, sempre partindo de Bauru passando por Jaú. Todas passavam em Jaú, menos a empresa Bariri – Itaju. Bariri era uma empresa que nos anos 1960, tinha quase 60 ônibus.

Ônibus da empresa Auto-Ônibus, Paulo Vicentin e seus motoristas. Entrevistados: Paulo Antonio Vicentin e Joaquim Roberto Pavão

Paulo Antonio Vicentin | Joaquim Roberto Pavão CIRCULAR SANTA LUZIA

Naquela época se comprava empresa de ônibus com prazo de 48 a 60 meses para pagar. Apareceu então um empresário de Bauru, Alexandre Quaggio, que tinha uma empresa urbana na cidade e fez uma pro- posta à vista para comprar a Jauense. O Quagggio ficou pouco tempo com a empresa Jauense, vendeu para outra pessoa e essa pessoa vendeu para o Joaquim Constanti- no que já tinha a Reunidas em Bauru. Ele incorporou a Jauense na Reunidas e o nome Jauense desapareceu. Tem uma empresa Jauense em Jaú que pertence a uma senho- ra, mas não tem nada a ver com a empresa que era nossa.

Em 1970, depois que a Jauense foi vendida, vieram para São Paulo. Aqui tiveram a Viação Tania que fazia a linha dos estúdios do canal 7-TV Record, na Avenida Miruna, Congonhas até a rodoviária. A experiencia no transporte urbano de São Paulo, durou muito pouco. Já estava em discus- são a implantação da linha norte-sul do Metrô e como São José do Rio Preto estava crescendo, foram para São José. A Viação Tania nem aparece na nossa história. Chegamos a construir uma garagem no bairro Santa Catarina, depois do aeroporto, mas ficamos em São Paulo apenas um ano. Em São José do Rio Preto, existia uma empresa chamada Santa Luzia que pertencia a família Estrela Maia, família muito tradicional de São José do Rio Preto. Os proprietários eram três irmãos e não queriam mais a empresa. Um dos irmãos o senhor Joaquim Estrela Maia tinha perdido os dois únicos filhos que tinha num acidente na Via Dutra. A fi- lha morava em Portugal e o filho estava levando-a para o Rio de Janeiro para pegar o avião. Envolveram-se num acidente e faleceram os dois, só o neto sobreviveu. Desgostoso, seu Joaquim resolveu vender a empresa e nós compramos, menos o almoxarifado. Só depois de pagarmos tudo, re- cebemos o almoxarifado. Em setembro de 1972 assumimos a Santa Luzia. Hoje São José do Rio Preto está com 470.00 habitantes.

JOAQUIM Nossos pais, Paulo Vicentin e Waldemar Guilherme Pavão, sem

qualquer ligação de parentesco, foram sócios a vida inteira, de 1958 a 2010, até o dia que meu pai faleceu. Em 1996, comemoraram 47 anos de sociedade e, nós os filhos continuamos. O convívio entre os pais como sócios e amigos continuou.

Quando nós compramos a Santa Luzia, nossos pais não tinham di- nheiro suficiente então convidaram para entrar na sociedade, um amigo, Renner Attalah que tinha a revenda da Mercedes em Marília, onde com- právamos nossos ônibus. Hoje nossa sociedade tem quatro sócios: nós dois, Wiliam Attalah sobrinho do Renner e a viúva com os dois filhos. A família Attalah mantém uma parte da sociedade desde o início.

A nossa concessão de 20 anos em Rio Preto venceu em 2011. Como nós tínhamos 95% do sistema de transporte urbano, o prefeito na época achou que esse percentual configurava monopólio, precisava dividir. Abriu então uma licitação em 2011 para dois lotes: um lote com 68% e outro com 32%. O lote de 68% nós ganhamos e o outro de 32% ficou com o Expresso Itamarati. O que separa nosso lote do Expresso Itamarati é o rio Preto. O contrato de concessão definiu assim os lotes.

Empresas urbanas hoje estão muito deficitárias, as despesas são mui- tas, o consumidor se tornou muito mais exigente. Deixou de ser um negócio rentável como era há 20 nos atrás. São 180 ôni-

bus andando das 5 horas da manhã até meia noite. “Nós não somos donos do nosso negócio”. A tarifa depende do prefeito.

Hoje a nossa frota é 100% adaptada para portadores de necessidades especiais e além do serviço urbano cotidiano, temos três micro-ônibus que fazem um serviço, semelhante ao ATENDE de São Paulo. É uma exigência da licitação. A Ita- marati também tem. A escritório da nossa gara- gem em Rio Preto tem uma forma circular como o nome da empresa “Circular Santa Luiza” pro- jetada pelo arquiteto José Carlos de Lima Bueno.

Ônibus da empresa, Waldemar Pavão e seus motoristas.