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MACHADO DE ASSIS E O TEATRO BRASILEIRO 1

No documento NOVOS TEMPOS, MESMAS HISTÓRIAS (páginas 162-166)

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Scripta Alumni - Uniandrade, n. 10, 2013.

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INTRODUÇÃO

De acordo com Peixoto (1986), a palavra teatro vem do verbo grego theastai e significa ver, olhar e contemplar. Para Magaldi, a etimologia dessa palavra remete a ―lugar de onde se vê‖ (MAGALDI, 1991, p. 8), ou seja, ao local em que se assistiam as representações teatrais, denominado odeion, auditório; por sua vez, a terminologia grega, teatron, remete à plateia. Percebe-se que tais definições, mesmo tendo o ponto de partida diferente, estão ligadas à ideia de visão. Porém, desde seu nascimento na Antiguidade até os dias de hoje, vários intérpretes e teóricos dessa atividade humana situam dois pontos irrefutáveis como sendo os princípios4 do teatro: a necessidade do jogo e a ânsia de ―ser outro‖. Ambos remetem a um impulso da condição humana. O primeiro se refere à noção de representação vinculada a algum tipo de ritual mágico e religioso primitivo; o segundo, a um espírito lúdico, cuja finalidade seria representar a si mesmo, aos deuses, aos animais etc. Por certo que esses princípios estão contidos na origem da representação cênica propriamente dita, datada dos primórdios da existência humana, contudo, mesmo nos dias de hoje, esses princípios continuam presentes e motivando a permanência dessa atividade.

No Brasil, as encenações teatrais têm início com a chegada dos jesuítas, com os autos. Isto porque, em seus primórdios, o teatro brasileiro era influenciado pelo teatro português devido à colonização no século XVI. Tal influência se estendeu aos longos dos anos em nossa literatura, mesmo após a Independência do Brasil, tendo uma proposta efetiva de teatro realmente brasileiro com o Modernismo em 1922.

O teatro surge de forma pedagógica, baseado na Bíblia e com uma proposta de catequizar os índios: ―Entre nós o teatro surge como instrumento pedagógico: autos, encomendados pelo padre Manuel da Nóbrega ao padre José de Anchieta, para catequese e ensinamento da religião aos índios‖ (PEIXOTO, 1986, p. 78).

Partindo da cultura dos índios, o teatro com certeza era um meio facilitador e eficaz para uma nova educação (portuguesa). Tal educação era pautada na religião Católica e era mais fácil fazer com que fosse aceita pelos índios por meio de uma representação (imagem) do que apenas de um sermão. Assim, as peças eram escritas pelos próprios jesuítas abordando elementos de sua cultura e os dogmas da religião, fazendo uso de um esquema adaptado de teatro medieval para tratar de problemas e aspectos da cultura brasileira. No entanto, os autos praticamente não eram autos, mas

4 Não confundamos princípio com origem ou nascimento. Princípio se remete às motivações intrínsecas da condição humana e independe da época em que se vive. Origem, ou nascimento, tem seu sentido cristalizado numa determinada época histórica. Para Peixoto, ―desde muitos séculos antes de nossa era até hoje, nunca deixou de existir: há algum impulso no homem, desde seus primórdios, que necessita deste instrumento de diversão e conhecimento, prazer e denúncia‖ (PEIXOTO, 1986, p. 7).

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sim episódios preocupados em impor a religião aos índios, não tendo uma importância enquanto drama. Nas palavras de Décio Almeida Prado:

Nem chegam propriamente a ser autos, na acepção rigorosa do termo, se considerarmos a ideia de unidade que a palavra auto suscita.

Serão antes uma série de episódios esparsos, alinhavados por um fio de enredo quase inexistente, ilustrações piedosas da vida dos santos, redigidas em duas, três línguas diversas, que talvez alcançassem junto ao público os seus fins edificantes, sem possuir, em virtude disso, maior força dramática ou sabor poético. (PRADO, 2003, p. 10)

Já no século XVII, as encenações começaram a ser prejudicadas pelas lutas de invasões de outros povos europeus, como os holandeses, espanhóis, franceses. O teatro pedagógico (catequético) entra em declínio, visto que as atividades missionárias estavam praticamente consolidadas. Surgem, então, representações profanas, na maioria das vezes feitas para comemoração de alguma data. O teatro começa a ser confundido com festas populares, no caso os bailes e as cavalhadas. No século seguinte, há uma tentativa de estabelecer companhias e uma preocupação com o local para o fazer teatral. As representações, que antes aconteciam em igrejas, palácios e praças públicas sobre um palco/tablado, ganham um local específico, permanente, como a Casa da Ópera.

No entanto, em uma sociedade de senhores e escravos, calcada em preconceitos e na qual durante esses três séculos de colonização os artistas recrutados eram oriundos da plebe (índios domesticados, escravos, negros, mulatos, mamelucos, etc.), o teatro não era a atividade mais prezada à época. Não ficou uma produção teatral que possamos julgar relevante e nem escritores importantes; embora tenham se feito notar algumas influências europeias dos mestres Metastásio, Calderón, Molière. Nos fins do século XVIII, surge uma esperança em torno dos escritores inconfidentes, que convivem em um lugar/momento propício à arte, mas ainda não há produção relevante:

(...) há realmente, notícias de tragédias escritas por inconfidentes, por Cláudio Manuel da Costa e Alvarenga Peixoto, algumas das quais representadas em Ouro Preto. Ainda aqui, entretanto, não temos sorte: nenhuma das peças dos poetas arcádicos resistiu ao tempo. De novo, vemo-nos com as mãos vazias: tentamos agarrar a realidade e, no entanto, só conseguimos obter nomes e datas, sem vida, nem consistência. (PRADO, 2003, p. 12)

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Posteriormente, com a vinda da família real (1808), o Brasil obtém algumas melhorias no teatro e, por conseguinte, com a Independência (1822), um forte sentimento nacionalista nasce no povo. João Caetano, Gonçalves de Magalhães e Martins Pena são fundadores da tragédia e comédia nacionais. Mais tarde, outros seguidores como Joaquim Manuel de Macedo, José de Alencar, França Júnior, Artur Azevedo e Machado de Assis. Dessa forma, o século XIX, influenciado pelo Romantismo, empreende uma tentativa de criar realmente um teatro brasileiro, mas ainda falta um texto dramático nacional e um público consciente. Na segunda metade daquele século, teremos a importante participação de Machado de Assis no cenário teatral, criticando e identificando problemas para a formação do teatro brasileiro.

A crítica de Machado de Assis referente ao teatro é uma apresentação de um projeto teatral, ou seja, uma proposta para um teatro nacional, brasileiro.

Machado é notavelmente reconhecido como crítico, mas como dramaturgo, por vezes, a crítica julgou e julga suas peças de pouca importância. Entretanto, é inegável que Machado, na sua dramaturgia, procura não cometer os erros dos escritores mencionados em sua Crítica teatral e busca um teatro mais elaborado. Em suas peças, apresenta um discurso crítico, comentando, opinando e julgando um determinado conceito literário juntamente com elementos metaliterários: metapoesia, metaficção, metateatro. É nesse sentido que também é perceptível a sua crítica ao teatro dentro de seu próprio teatro (metateatro) e, nas peças, é possível verificar traços dessa crítica sobre o teatro de sua época.

Vale salientar que várias mudanças ocorreram na Europa durante a segunda metade do século XIX: de um lado o capitalismo passando por diversas transformações e de outro as diversas experiências da classe operária, questionando e fazendo reivindicações sociais. Nessas mudanças e transformações sociais, surgem tensões e posições ideológicas, agito de ideias e ideais filosóficos e científicos, permitindo ao homem ter um melhor e maior conhecimento sobre si. No que se refere ao contexto histórico, nas últimas décadas do século XIX, o Brasil enfrenta a crise da monarquia e ainda o aumento da urbanização.

Na literatura, em 1857 Gustave Flaubert publica, na França, Madame Bovary, obra que propõe uma literatura antirromântica, de denúncia dos valores burgueses. Pouco mais tarde, em 1859, irrompem o evolucionismo de Darwin (A origem das espécies) e, em 1865, a Questão Coimbrã, em Portugal. Em suma, fica visível que esses fatos marcam a vida de Machado, que passa a contribuir significativamente para a crítica literária do teatro brasileiro.

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