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PROCESSO DE FORMAÇÃO DOS TRATADOS E SUA

Nesse momento é necessário analisar-se qual o processo de formação dos tratados internacionais, visto que para serem dotados de eficácia, precisam passar por um processo constituído por várias fases, desde a adoção do texto a confirmação de sua entrada em vigor.

Nessa senda, conforme Cachapuz de Medeiros, são utilizados dois processos básicos para a celebração de tratados internacionais no Brasil:

O processo solene e completo: pode transcorrer de duas formas: a) inicia com a negociação e a adoção do texto, prossegue com a avaliação interna de suas vantagens ou inconvenientes e, no caso de ser aprovado, ocorre a manifestação da vontade do Estado em obrigar-se pelo tratado, o aperfeiçoamento jurídico-internacional dessa vontade e a incorporação do texto do tratado à ordem jurídica interna (negociação - assinatura – mensagem ao Congresso – aprovação parlamentar – ratificação – promulgação); b) o Executivo solicita ao Congresso autorização, é remetido o instrumento de adesão à autoridade depositária do tratado, que leva ao conhecimento das partes a decisão do Brasil de também assumir as obrigações do tratado. Entrando o ato de adesão em vigor no plano internacional, o tratado é incorporado à ordem jurídica interna (mensagem ao Congresso - autorização parlamentar - adesão promulgação); e o processo simples e abreviado que é o rito dos acordos em forma simplificada: negociação – assinatura (ou troca de notas diplomáticas) – publicação.126

125 MACHADO, Patrícia Ferreira. A constituição e os tratados internacionais. Rio de Janeiro:

Forense, 1999. p. 18.

126 CACHAPUZ DE MEDEIROS, Antônio Paulo. O poder de celebrar tratados: competência dos poderes constituídos para a celebração de tratados, à luz do direito internacional, do direito comparado e do direito constitucional brasileiro. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1995. p.

457-458

Para uma melhor acepção desse processo é necessário vislumbrar paulatinamente cada uma das fases de formação e incorporação de um tratado internacional.

2.3.1 Negociação e Assinatura

Como visto, a formação de um tratado tem seu início pela negociação dos agentes signatários habilitados, sendo este o momento para a discussão sobre o conteúdo ou objeto que versará o tratado, ao fim do qual é elaborado o texto escrito. Nas palavras de Varella:

Um tratado nasce a partir da manifestação da vontade de um sujeito de direito internacional (Estado ou Organização Internacional) em regular juridicamente determinada situação no âmbito internacional.

O representante do Estado ou da Organização Internacional comunica aos demais sujeitos de direito internacional, com quem tem a intenção de firmar o futuro tratado, para que manifestem seu interesse em participar da regulação internacional e enviem seus representantes para a negociação. Os negociadores constroem o texto, que é adotado ao final da reunião.127

Assim, findadas as negociações e tendo o texto do tratado sido avaliado pelas equipes negociadoras, ocorre à assinatura, que autentica o texto convencional, dando fim à negociação e exteriorizando o interesse das partes em firmar o tratado. Conforme esclarece Rezek:

Fala-se aqui daquela firma que põe termo a uma negociação, fixando e autenticando, sem dúvida, o texto do compromisso, mas, acima disso, exteriorizando em definitivo o consentimento das pessoas jurídicas de direito das gentes que os signatários representam. 128 Nas palavras de Varella, a assinatura do tratado internacional gera as seguintes conseqüências:

a) autenticar o texto do tratado, que se torna imutável a partir de então;

b) reafirmar que os negociadores estão de acordo com o texto do tratado;

127 VARELLA, Marcelo D. Direito internacional público. 2009, p. 27.

128 REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público. 2002. p. 46.

c) iniciar a contagem dos prazos para a troca ou depósito dos instrumentos de ratificação;

d) gerar a obrigação de não fazer atos que afetem substancialmente o valor do instrumento assinado ou frustrar sua aplicação;

e) demonstrar um valor político que indica que o Estado estará engajando-se em determinado tema;

f) significar que o Estado aceita as normas costumeiras presentes no documento.129

Ainda, este autor, esclarece que no Brasil, a negociação e a assinatura de tratados internacionais, são competências privativas do Presidente da República, conforme determina a Constituição Federal, art. 84, VIII, sendo que esse inciso não faz parte das exceções do parágrafo único do mesmo artigo, onde disciplina quais atribuições podem ser delegadas aos Ministros de Estado.130

Assim, poder-se-ia entender que o Presidente da República não poderia delegar poder ao Ministro das Relações Exteriores ou mesmo aos diplomatas para participarem das negociações. Não obstante, apesar de essa questão não encontrar solução jurídica na Constituição, na prática, o Brasil segue a tradição típica de direito costumeiro, conforme já elucidado, na habilitação dos agentes signatários, para negociar e assinar tratados internacionais.131

2.3.2 Decreto Legislativo

Conforme elucida Alberto Amaral Júnior132, frente ao que disciplina a Constituição Federal Brasileira, após as fases de negociação e assinatura, a incorporação dos tratados internacionais à ordem jurídica interna necessita da conjugação de duas vontades, quais sejam, a do Congresso Nacional e a do Presidente da República.

129 VARELLA, Marcelo D. Direito internacional público. 2009, p. 44-45.

130 VARELLA, Marcelo D. Direito internacional público. 2009, p. 44.

131 VARELLA, Marcelo D. Direito internacional público. 2009. p. 44.

132 AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. São Paulo: Atlas, 2008. p. 55.

Nessa senda, o mesmo autor, elucida que o art. 49, inciso I, da Constituição Federal, determina que são da competência do Congresso Nacional os tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional.133

Assim, com a exceção dos acordos executivos que possuírem como requisitos a reversibilidade e a preexistência de cobertura orçamentária, podendo ser desconstituídos por intermédio de retratação expressa e podendo ser absorvidos exclusivamente pelos recursos orçamentários destinados ao Ministério das Relações Exteriores, todos os tratados internacionais necessitam ad referendum do Congresso Nacional para que o governo brasileiro possa gerar no plano externo o seu consentimento acerca do tratado.134

Dessarte, compete ao Presidente da República enviar ao Congresso Nacional, para ser apreciado, o texto do acordo e a exposição de motivos elaborada, sendo a discussão da matéria realizada em ambas as casas do Congresso, iniciando pela Câmara dos Deputados e depois pelo Senado, necessitando o quórum mínimo de maioria absoluta do número total de deputados e senadores para ser votado, sendo que sua aprovação requer o voto favorável da maioria absoluta dos presente.135

Nessa vereda, aprovado o tratado, a promulgação será feita por decreto legislativo do presidente do Senado, a ser publicado no Diário Oficial, sendo, posteriormente, submetido ao Executivo para decidir sobre a conveniência da ratificação, tomando as medidas necessárias para concretizá-la.136

Portanto, os tratados, acordos e convenções internacionais, para que sejam corretamente incorporados ao ordenamento jurídico brasileiro, necessitam de prévia aprovação do Poder Legislativo, que exerce a função de controle e fiscalização dos atos do Executivo.

133 AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. 2008. p. 56.

134 AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. 2008. p. 56-57.

135 AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. 2008. p. 56-57.

136 AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. 2008. p. 57.

2.3.3 Ratificação

Rezek137 conceitua ratificação como o ―ato unilateral com que o sujeito de direito internacional, signatário de um tratado, exprime definitivamente, no plano internacional, sua vontade de obrigar-se‖.

Elucidando o que seria a ratificação, Varella discorre:

A ratificação é ato formal do Estado pelo qual indica seu consentimento em estar submetido a um determinado tratado.

Também é conhecida por aceitação, aprovação ou ato formal de confirmação. Nos tratados bilaterais, a ratificação é realizada com a troca de notas diplomáticas entre sujeitos envolvidos. Nos tratados multilaterais, para ser considerada válida, a ratificação precisa ser registrada no secretariado da Convenção ou do respectivo órgão depositário.138

Por sua vez, para Accioly e Nascimento e Silva139, ―a ratificação é o ato administrativo mediante o qual o chefe do Estado confirma tratado firmado em seu nome ou em nome do Estado, declarando aceito o que foi convencionado pelo agente signatário‖.

O mesmo autor, ainda, esclarece que a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados140, em seu artigo 11, estipula que ―o consentimento de um Estado em obrigar-se por um tratado pode manifestar-se pela assinatura, troca dos instrumentos constitutivos do tratado, ratificação, aceitação, aprovação ou adesão, ou por quaisquer outros meios, se assim acordado‖. Deste modo, muito embora anteriormente a convenção, a prática internacional admitisse que alguns tratados de somenos importância não necessitassem de ratificação, a nova

137 REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público. 2002. p. 53.

138 VARELLA, Marcelo D. Direito internacional público. 2009, p. 45.

139 ACCIOLY, Hildebrando e; NASCIMENTO e SILVA, Geraldo Eulalio do. Manual de Direito Internacional Público. 2002. p. 34.

140 BRASIL. Decreto n. 7.030, de 14 de dezembro de 2009. Promulga a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, concluída em 23 de maio de 1969, com reserva aos Artigos 25 e 66. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Decreto/D7030.htm>.

Acesso em 25 de julho de 2010.

orientação passou a estipular que a regra para todos os tipos de tratados é a ratificação.141

Continua o autor, dizendo, que muito embora o tratado só entre em vigor após a sua ratificação, enquanto isso não ocorre, o Estado não deve praticar nenhum ato que seja capaz de frustrar o seu objeto e finalidade, sendo necessário destacar que alguns tratados estipulam em seu próprio texto a dispensa da ratificação.142

Por fim, conclui, esclarecendo que caso algum Estado que não tenha participado da negociação, nem tenha assinado o tratado, decidir tornar-se parte dele, não poderá ratificá-lo, mas sim aderir a ele, isso se o tipo de tratado permitir, sendo que no caso do tratado bilateral não existe essa possibilidade por ser de natureza fechado.143

É necessário frisar, como visto anteriormente, que no Brasil, a ratificação é o ato facultado ao Presidente da República, após ser devidamente autorizado pelo Congresso Nacional, de confirma um tratado, concluído por seus mandatários.

2.3.4 Promulgação e Publicação

Conforme esclarece Amaral Júnior144, ―arraigou-se no Brasil, desde a independência, a prática de promulgar, por decreto do Executivo, o tratado internacional já ratificado‖, assim, a promulgação se destina a tornar executável o tratado no ordenamento jurídico interno.

Sobre a questão, esclarece João Hermes Pereira de Araújo:

O fato de ter sido o tratado aprovado PR decreto legislativo não exime da promulgação, uma vez que um ato aprovado poderá nunca

141 ACCIOLY, Hildebrando e; NASCIMENTO e SILVA, Geraldo Eulalio do. Manual de Direito Internacional Público. 2002. p. 33-34.

142 ACCIOLY, Hildebrando e; NASCIMENTO e SILVA, Geraldo Eulalio do. Manual de Direito Internacional Público. 2002. p. 34.

143 ACCIOLY, Hildebrando e; NASCIMENTO e SILVA, Geraldo Eulalio do. Manual de Direito Internacional Público. 2002. p. 34-35.

144 AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. 2008. p. 69.

entrar em vigor, pois, se a aprovação legislativa condiciona a ratificação, não a torna obrigatória e, muito menos, pode ter efeito junto à outra parte contratante que, até o momento da troca de ratificações, é livre de fazer.145

Isso, conforme se verificará, é reflexo do sistema de internalização adota pelo Brasil, que apenas reconhece a existência de uma norma obrigatória no plano interno, que já era obrigatória no âmbito internacional, após a promulgação e publicação.

Sobre esse assunto, Rezek se pronuncia da seguinte forma:

No Brasil, se promulgam, por decreto do presidente da República, todos os tratados que tenham feito objeto de aprovação congressional. Publicam-se apenas, no Diário Oficial da União, os que hajam prescindido do assentimento parlamentar e da intervenção confirmatória do chefe de Estado. No primeiro caso, o decreto de promulgação não constitui reclamo constitucional: ele é produto de uma praxe tão antiga quanto a independência e os primeiros exercícios convencionais do Império. [...] Publica-os, pois, o órgão oficial, para que o tratado se introduza na ordem legal, e opere desde o momento próprio.146

Nesse diapasão, conclui-se que a partir da promulgação e publicação do decreto legislativo é que o tratado começa a vigorar no território nacional, sendo em nosso ordenamento jurídico a publicação condição essencial para que a lei, proveniente do tratado internacional, seja aplicada no âmbito interno, com eficácia e poder de executoriedade.

Assim, seu objetivo é introduzir o tratado no ordenamento jurídico nacional, transformando-o em uma norma com a mesma hierarquia das leis ordinárias internas, sendo mister ressalta a exceção a essa regra, qual seja, os tratados que versem sobre direitos e garantias fundamentais, visto o que disciplina a Constituição Federal em seu artigo 5º, parágrafos 1º e 2º, que garante a sua aplicação imediata.

2.3.5 Reserva

145 ARAÚJO, João Hermes Pereira de apud AMARAL JÚNIOR, Alberto do. Introdução ao direito internacional público. 2008. p. 69.

146 REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público. 2002. p. 84.

É mister ressaltar, nesse momento, o que seria a reserva, que segundo Alberto Amaral Júnior147, poderá ocorrer no momento da assinatura do tratado ou quando o Poder Executivo, após aprovação do Parlamento, efetuar a ratificação.

Conceituando reserva, Varella discorre:

Reserva é uma declaração unilateral, feita por um sujeito de direito internacional ao assinar, ratificar, aceitar ou aprovar um tratado ou a ele aderir, com o objetivo de excluir ou modificar o efeito jurídico de certas disposições do tratado em sua aplicação nesse Estado ou Organização Internacional.148

Este autor, ainda elucida, que as reservas são possíveis apenas em tratados multilaterais, quando o tratado expressamente não a impossibilita, quando o tratado não as prevê apenas sobre determinadas questões preestabelecidas ou quando o tratado não prevê reservas, mas estas se referem a questões essenciais do tratado, cuja reserva é incompatível com o objeto ou com a finalidade do tratado.149