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Desnudando as condições para materialização da reforma psiquiátrica em Natal/RN: para além da implantação dos serviços substitutivos em saúde mental

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Academic year: 2017

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DEPARTAMENTO DE PÓS-GRADUÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL

KATIANE PEREIRA SOARES

DESNUDANDO AS CONDIÇÕES PARA MATERIALIZAÇÃO DA REFORMA

PSQUIÁTRICA EM NATAL/RN: para além da implantação dos serviços substitutivos

em saúde mental

(2)

DESNUDANDO AS CONDIÇÕES PARA MATERIALIZAÇÃO DA REFORMA

PSQUIÁTRICA EM NATAL/RN: para além da implantação dos serviços substitutivos

em saúde mental

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DESNUDANDO AS CONDIÇÕES PARA MATERIALIZAÇÃO DA REFORMA

PSQUIÁTRICA EM NATAL/RN: para além da implantação dos serviços substitutivos

em saúde mental

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Não podia ser diferente! Agradeço inicialmente a meu carinhoso

“talento branco”

(Jucian Lima) pela incansável companhia e compreensão em meus momentos de

silêncio e ausências durante o processo de construção exaustiva dessa dissertação.

Pelas risadas... Pelo afeto... Pelo desejo... Por sua segura crença em acreditar que tudo

sempre melhora... Por me ensinar a sonhar... Por amar...

Ao CAPS II- Leste e todos os sujeitos que lhe dão vida. Aos profissionais pela

disponibilidade e contribuições a minha formação profissional. Aos usuários e familiares

por permitirem dividir um pouco de suas histórias. As professoras Rita de Cássia,

Silvana Mara... Essenciais para maturação de meu processo de formação enquanto

pesquisadora. Acompanharam de muito perto as nossas primeiras inquietações,

quando ainda não havia se quer um texto construído.

Ao Programa de Pós-Graduação em Serviço Social, em especial a pessoa de

“Lucinha”, que nos acalma quando inquietos com sua voz mansa...

A geógrafa Neuma, ao bibliotecário Silvestre. A minha amiga Upa pela vitalidade

e por me ensinar a acreditar no rio da vida... Ao meu amigo Erinaldo, pelo requinte de

seu trabalho.

Em especial a minha orientadora Eliana Guerra por todo apoio incondicional em

todos os momentos que passamos nesse tortuoso processo de pesquisa e de vida,

pois, como sabemos essa não para... Por compreender minha vida de

”mestranda/trabalhadora”.

Durante grande parte de todo esse tempo participou em

minha vida para além dos âmbitos acadêmicos. Ocupando a posição muitas vezes, de

amiga, mãe, terapeuta... Eternamente grata por tudo... Não só escrevo, analiso melhor

hoje, como também posso afirmar que sou uma pessoa melhor, depois desses anos de

convivência... Registro aqui também meus pedidos de desculpas pelas agonias...

Desejo que nossos laços perdurem por toda nossa existência.

(8)

Esta pesquisa objetivou analisar a concretização da reforma psiquiátrica em natal,

partindo de um dos serviços substitutivos que compõe a rede psicossocial deste

município. A política de saúde mental tem passado por mudanças paradigmáticas,

definindo como objetivo maior o processo de desistitucionalização. Redirecionando sua

ação para os serviços substitutivos e não, mas o hospital psiquiátrico tradicional. Nesse

cenário os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) se mostram estratégicos para

materialização dos objetivos pretendidos pela reforma psiquiátrica. O estudo transcorre

dentro da perspectiva materialista dialética. A presente pesquisa teve como lócus de

investigação empírica o primeiro Centros de Atenção Psicossocial implantado em

Natal/RN. A escolha por um serviço extra-hospitalar vai ao encontro de uma postura

defendida pelo movimento de Reforma Psiquiátrica. Considerando o CAPS um serviço

substitutivo estratégico em saúde mental para a efetivação da Reforma Psiquiátrica,

neste sentido objetivamos apreender as contradições que marcam o processo de

concretização da Reforma Psiquiátrica através da vivência dos usuários e de suas

famílias, no interior de uma unidade integrante do novo modelo de atenção em saúde

mental. Partimos do pressuposto de que os usuários e seus familiares são

sujeitos-chave no processo de reforma psiquiátrica, por vivenciarem em seu cotidiano as

mudanças concretas realizadas, que acenam para um processo de re-inserção social,

mas também, contraditoriamente, os limites e entraves desse processo.

(9)

Organograma da rede de atenção psicossocial

Mapa 1- Rede de atenção psicossocial do município de natal/rn

Mapa 2- Distribuição dos usuários por tipo de modalidade de atendimento

Mapa 3- Dispositivos psicossociais localizados na zona leste

Planta Baixa do Pavimento Térreo do CAPS II- Leste

Planta Baixa do Pavimento Superior do CAPS II- Leste

LISTA DE TABELAS

Tabela 1- Ranking UF População Nº hospitais Leitos SUS % leitos SUS Leitos por 1000

hab. Leitos/1000 hab

Tabela 2- Número de Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) por tipo e UF e

Indicador CAPS/100.000 habitantes

LISTA DE QUADROS

Quadro 1- quantidade geral de usuários por tipo de atendimento e sexo

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 01 – Usuários em atendimento intensivo- Por regiões administrativas de Natal Gráfico 02 – Usuários em atendimento intensivo- Por ano de entrada

Gráfico 03 – Usuários em atendimento intensivo - Por idade

Gráfico 04 – Usuários em atendimento semi-intensivo - Por regiões administrativas de Natal Gráfico 05 – Usuários em atendimento semi-intensivo - Por ano de entrada

Gráfico 06 – Usuários em atendimento semi-intensivo – Por faixa etária

Gráfico 07 – Usuários em atendimento – não-intensivo (ambulatorial)- Por regiões administrativas de Natal

(10)

Gráfico 12 – Usuários em atendimento visita domiciliar- Por idade

LISTA DE SIGLAS

- Ações Integradas de Saúde – AIS

- SUDS – Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde - Sistema Único de Saúde - SUS

- Centro de Atenção Psicossocial – CAPS - Núcleo de Atenção Psicossocial – NAPS - Serviço de Residência Terapêutica – SRT - Serviço Nacional de Doenças Mentais – SNDM - Divisão Nacional de Saúde Mental – DINSAM - Organização Mundial de Saúde – OMS - Plano de pronta Ação – PPA

- Plano Integrado de Saúde Mental – PISAM

- Programa de Interiorização das Ações da Saúde e Saneamento - PIASS

- Sistema Único de Assistência Social – SUAS - Secretaria Municipal de Saúde – SMS

- Unida Básica de Saúde –UBS

- Movimento de Luta Antimanicomial – MLAM - Conselho Regional de Medicina – CREMERN - Secretaria Estadual de Saúde – SESAP

-Sindicato dos Trabalhadores em Saúde do Rio Grande do Norte – SINDSAÚDE - Institutos de Aposentadorias e Pensões¬¬ – IAPs

(11)

- Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN

- Escola Nacional de Saúde Pública - ENSP

- Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz - Hospital Doutor João Machado – HJM -Região Metropolitana de Natal – RMN - Programa Saúde da Família – PSF - Partido Verde – PV

- Partido Democrata – DEM

- Partido do Movimento Democrático Brasileiro ¬- PMDB

- Partido Socialista Brasileiro - PSB

- Partido da Frente Liberal Brasileiro - PFL

- Partido Verde – PV

- Termo de Ajustamento de Conduta – TAC

(12)

INTRODUÇÃO--- 11-23

CAPÍTULO 1- A CONSTRUÇÃO DE BASES PARADIGMÁTICAS NO CAMPO

DA SAÚDE MENTAL--- 24-48

1.1. DA LOUCURA AO SOFRIMENTO PSÍQUICO: A PSIQUIATRIA COMO

CONSTRUÇÃO SOCIAL --- 25

1.2.

INSTITUCIONALIZAÇÃO

X

DESINSTITUCIONALIZAÇÃO:

CONFRONTANDO PARADIGMAS E PRÁTICAS SOCIAIS --- 31

CAPÍTULO 2- POLÍTICAS DE SAÚDE MENTAL: TRANSITANDO PELA

CONSTRUÇÃO DA REFORMA PSIQUIATRICA DO ÂMBITO NACIONAL AO

MUNICIPAL --- 49-104

2.1. A AÇÃO DO ESTADO BRASILEIRO NA ÁREA DE SAÚDE MENTAL: DAS

PRIMEIRAS INICIATIVAS DE CONTROLE À CONCEPÇÃO DE UM NOVO

MODELO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL--- 49

2.2. A REFORMA PSIQUIÁTRICA NO BRASIL: EXPRESSÕES DO

MOVIMENTO SANITARISTA NA SAÚDE MENTAL--- 56

2.3. A REFORMA PSIQUIÁTRICA EM NATAL E O LUGAR DOS

CAPS--- 70

2.4. OS CAPS E A REDE DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL: LIMITES E

CONTRADIÇÕES NA CONSTITUIÇÃO DE UMA REDE DE ATENÇÃO

PSICOSSOCIAL--- 95

3. O CAPS II- LESTE EM BUSCA DA MATERIALIZAÇÃO DA REFORMA

PSIQUIÁTRICA EM NATAL/RN --- 105-173

3.1. MATERIALIZAÇÃO DA REFORMA PSIQUIÁTRICA EM NATAL:

CONTRADIÇÕES E LIMITES NA AÇÃO DO CENTRO DE ATENÇÃO

PSICOSSOCIAL (CAPS) DR. ANDRÉ LUÍS COELHO DE MELO DE LIMA-

CAPS II

LESTE ---105

(13)

3.1.2. CAPS II- LESTE: EQUIPE DE TRABALHO E SISTEMÁTICA DE

ATIVIDADES ---132

3.1.3. O PROCESSO DE ATENDIMENTO: UM LEQUE IMPORTANTE DE

ATIVIDADES, MAS CONDIÇÕES EFETIVAS NEM SEMPRE PLAUSÍVEIS...

---145

3.2. O COTIDIANO NO CAPS II- LESTE EM SEUS DIFERENTES ESPAÇOS

TERAPÊUTICOS ---151

3.2.1. OS SUJEITOS DA REFORMA PSIQUIÁTRICA EM CENA: USUÁRIOS,

FAMILIARES, TÉCNICOS... ---156

3.2.2. AS RELAÇÕES E VIDA SOCIAL: COMO TECER A TEIA DE LAÇOS

SOCIAIS A DESPEITO DAS DIFERENÇAS? --- 160

(14)

INTRODUÇÃO

Nosso interesse pela temática saúde mental não é recente. Com efeito, ainda

estudante da graduação, nos inquietávamos com relação à situação dos chamados

“loucos” e, em particular, com a condição daqueles que se encontravam nos hospitais e

hospícios, cuja existência social parecia negada ou camuflada, escondida por trás dos

muros de instituições que mais contribuíam para esta apartação do que para uma vida

social mais rica destas pessoas. Assim, escolhemos fazer nosso estágio curricular no

Hospital Casa de Saúde Professor Severino Lopes (CSPSL) e a partir desta experiência

redigimos nossa monografia para conclusão do Curso de Serviço Social na UFRN, em

2004.1.

Este contato direto com a realidade das pessoas em sofrimento psíquico nos

instigou a conhecer melhor esta área de pesquisa e atuação profissional. Assim, ao nos

prepararmos para a seleção do mestrado em serviço social na UFRN, apresentamos

como objeto de pesquisa o estudo da reforma psiquiátrica em Natal-RN, movidos pela

idéia de que uma nova forma de tratamento em saúde mental estava sendo implantada

e merecia um olhar atento de pesquisador. Indagava-me sobre a atuação do assistente

social neste novo campo.

O processo de realização do mestrado possibilitou-nos ampliar os horizontes

teórico-metodológicos e escolher uma perspectiva de análise para guiar-nos na

aventura da pesquisa. A partir do amadurecimento teórico e pela nova apreensão da

realidade que construímos ao longo do mestrado, entendemos que nossa pesquisa

ganha relevância ao ser situada no contexto atual da sociabilidade capitalista, marcada

pela super-exploração do trabalho, por precárias condições de vida, por tipos diversos

de violência e de violação de direitos propiciadoras e/ou desencadeadoras de

processos de adoecimento, em particular, de diferentes formas de sofrimento psíquico

(LOBOSQUE, 2003).

(15)

adoecimentos, dentre eles problemas que afetam a saúde mental, que agravam ou

desencadeiam adoecimentos de diversos tipos, em particular, psicossociais.

Considerando os tempos contemporâneos, os últimos 30, 35 anos, as

mudanças operadas no mundo da produção, como forma do capital enfrentar mais uma

de suas crises, caracterizando o que se designa por reestruturação produtiva, têm

afetado as diversas dimensões da vida social: temos um aprofundamento das

desigualdades, entre países e no interior destes, o crescente desemprego, a

informalidade integrando a lógica da acumulação, a perda e/ou redução de direitos

além de um apelo excessivo ao consumo. O individualismo marcando as relações, as

mais variadas formas de violência, aparecendo muitas vezes de forma naturalizada, a

descartabilidade, a “flexibilidade” adentrando nas vidas de sujeitos part

iculares e nas

suas maneiras de se relacionar. Estas são algumas das marcas do nosso tempo.

No caso brasileiro, tais mudanças na forma de operar preconizadas e impostas

pelo capital ganham maior dimensão a partir dos anos 1990, quando a economia

brasileira busca se reestruturar para inserir-se de modo mais efetivo no processo em

curso de mundialização da economia com dominância financeira, sobretudo, a partir

dos anos 1970. Vivíamos ainda processos sociais singulares decorrentes das lutas que

puseram fim ao regime militar e empenharam-se na reconstrução do Estado de Direito,

com uma perspectiva de ampliação dos direitos sociais e de maior participação social

pactuada na constituição federal de 1988 e nas leis dela decorrentes. Ainda que

reconheçamos os limites da democracia burguesa, no Brasil, pós-constituição de 1988,

alimentou-se a esperança de efetivação ampla de políticas sociais públicas e de caráter

universal no campo da saúde, da educação, da assistência social. Esta esperança

urdida nas lutas sociais apontava para perspectivas de reformas nestes variados

campos de atuação do Estado, visto então, como Estado ampliado. No decorrer dos

anos 1990, as chamadas contra-reformas do Estado (BEHRING, 2003), vão

progressivamente derruir conquistas históricas, reduzindo a ação do Estado em

especial no campo das políticas sociais.

(16)

sanitária e, dentro desta, pela reforma psiquiátrica, como as tentativas de

materialização de algumas conquistas do campo popular. Neste sentido, nosso

processo de investigação ganha dimensão e revela interesse ao buscar pôr em

evidencia os determinantes da reforma e da contra-reforma no âmbito da política de

saúde mental, evidenciando impasses e conquistas, limites e possibilidades em um

chão social fértil e favorável aos processos de adoecimento psicossociais. Neste

contexto, lutar por outra sociabilidade, por uma sociedade justa, por relações sociais

que ponham no seu centro o homem e não a mercadoria pode parecer utópico, mas

indispensável!

Compartilhamos com Iamamoto (2007) ao afirmar que:

A desigualdade entre o desenvolvimento econômico e o desenvolvimento social, entre a expansão das forças produtivas e as relações sociais na formação capitalista revela-se como reprodução ampliada da riqueza e das desigualdades sociais, fazendo crescer a pobreza relativa à concentração e centralização do capital, alijando segmentos majoritários da sociedade do usufruto das conquistas do trabalho social (p.129).

Situamos nossa pesquisa na particularidade de uma cidade

Natal

capital de

um dos estados do Nordeste do Brasil, caracterizada, por um lado, pela exuberância de

suas belezas naturais e, por outro, pela desigualdade marcante entre as camadas da

elite local e as classes trabalhadoras, que compõem o universo heterogêneo da

pobreza por vezes, invisível aos olhos dos visitantes e observadores desatentos.

(17)

questionávamos: O discurso propalado pelo Ministério da Saúde e sua atual política de

saúde mental tem trazido mudanças significativas para o setor? Em caso afirmativo,

estas são de que ordem? Quais os sujeitos envolvidos nesses processos de mudanças

paradigmáticas no cenário da saúde mental?

Antes mesmo da qualificação do projeto de pesquisa, a entrada no campo de

investigação já havia sido iniciada, devido à necessidade de aproximação com relação

à realidade dos serviços substitutivo

1

em Natal, espaços essenciais para a

concretização da reforma psiquiátrica.

Ao chegar ao campo de pesquisa, constatamos a falta de registro da própria

história do serviço: como foi implantado, que objetivos orientam a atuação de sua

equipe etc. Essa situação nos forçou a fazer um verdadeiro resgate de documentos

existentes no serviço, os quais a própria coordenação não sabia ao certo se existiam e

do que tratavam. Em uma tarde procedemos à arrumação dos armários do CAPS e

ocasião em que foram encontrados três documentos relevantes tratando das diferentes

fases do serviço. Com esses relatórios em mãos tecemos um breve histórico do serviço,

como intuito de aprofundar o conhecimento sobre a história desse CAPS.

Durante cinco meses, passamos, então, a freqüentar de modo sistemático o

serviço três vezes por semana e, em algumas ocasiões, um número maior. Nessas idas

ao serviço concentramos esforços no rico processo da observação participante

2

, na

tentativa de conhecer todo seu funcionamento, participando dos diversos espaços e

atividades propostos aos usuários e a seus familiares. Decorrida a fase inicial da

1

A expressão serviços substitutivos refere-se ao conjunto de serviços implantado a partir da lei 10.216 (06/04/2001) que: “dispões sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental”, inscreve-se nos marcos do processo de descentralização, através do qual os municípios passam, também na saúde mental, assumir responsabilidades no provimento de serviços. Estes novos serviços visam possibilitar outras formas de acompanhamento às pessoas em sofrimento psíquico evitando, deste modo, o recurso a internações, e a soluções manicomiais.

2 Processo pela qual se mantém a presença do observador numa situação social, com a finalidade de

(18)

observação (não que esta tenha sido conclusiva), freqüentamos, então, o CAPS com

visitas mais esparsas e direcionadas. Elaboramos roteiros/guias para utilizarmos em

nossas entrevistas. Estas foram realizadas entre os dias 10 de março e 10 de abril de

2009.

No processo de aproximação sucessiva com relação à realidade estudada,

confrontando leituras, questionamentos e reflexões originados a partir de nossa

presença sistemática no campo, de nossas conversas e observações, fomos compondo

um rico material de pesquisa em nosso caderno de campo, transformado em material

digitalizado. Uma vez transcritas, as entrevistas foram objeto de leitura flutuante para

identificarmos os temas recorrentes e aspectos mais relevantes nas falas de nossos

entrevistados.

O processo de elaboração da dissertação indicou a necessidade de dados

complementares que foram colhidos entre os dias 06 e 24 de julho de 2009 e

organizados em forma de quadros ( Cf. ANEXO A) e de gráficos inseridos e analisados

no capítulo 3,

através dos quais podemos ter uma visão geral dos usuários do CAPS II-

Leste quanto a sexo, idade, local de residência e tipo de atendimento recebido. Tais

quadros foram produzidos a partir de consulta direta de prontuários. Em seguida,

procedemos à sistematização e análise desses quadros para dispormos de elementos

passíveis de evidenciar alguns dos limites na ação do CAPS, com relação, em

particular, ao objetivo de facilitar ou apoiar os processos de reinserção social, através

de dinâmicas territoriais e da proximidade entre realidade/local de moradia dos usuários

e local de implantação dos serviços substitutivos.

O processo de pesquisa de campo e de elaboração da dissertação foi cotejado

sistematicamente com a leitura de documentos e textos de caráter teórico e

metodológico que nos apoiaram no aprofundamento de nossa compreensão da

realidade social brasileira e, em particular, de Natal, para situarmos neste contexto

nosso objeto de estudo e podermos problematizar nosso processo de investigação.

(19)

o caminho metodológico escolhido relaciona-se intrinsecamente com a opção

ideológica assumida pelo pesquisador e conseqüentemente com sua posição política. O

uso das técnicas está, assim, subordinado à concepção de mundo de quem faz a

intervenção: é necessária uma coerência paradigmática e teleológica. Além disso,

enfatizamos que a eficácia dos instrumentais depende das condições concretas do seu

emprego.

Nesta pesquisa, abordamos nosso objeto em uma perspectiva materialista e

dialética, concepção teórica que permite trabalhar com a categoria de totalidade,

buscando apreender a realidade social em sua complexidade. Como ressalta Minayo

esta perspectiva:

Abarca não somente o sistema de relações que constrói o modo de conhecimento exterior ao sujeito, mas também as representações sociais que constituem a vivência das relações objetivas pelos atores sociais, que lhe atribuem significados (1996, p.11).

(20)

Para teoria marxista a produção das idéias, as representações estão ligadas a

atividade material, ao intercâmbio entre os homens, a sua linguagem da vida real. O

pensar aparece como emanação direta de seu comportamento material. Os homens

produzem suas representações, mas homens ativos e reais, condicionados por um

dado desenvolvimento das forças produtivas.

Do processo de trabalho envolvendo objeto, produto e instrumental, Marx

extraiu categorias históricas como classes sociais, burguesia, proletariado e luta de

classes para explicar a sociedade. Assim, para o autor, “A historia de toda sociedade

até hoje é a história de lutas de classes” (MARX, 1988)

.

Dessa maneira, desejamos apreender nosso objeto de pesquisa de acordo com

a perspectiva dialética, analisando-o dentro de uma totalidade de determinações

econômica, político, ideológica, essas dimensões se interligam confrontando interesses

também diversos e contraditórios. Ao longo de nosso texto, ficam evidentes para o leitor

as marcas de lutas travadas entre diferentes classes nas quais se situam os sujeitos de

nossa investigação: usuários, técnicos, familiares.

(21)

Esta abordagem ganha relevância quando discutimos saúde mental, na medida

em que, este campo do saber encontra-se em constante transformação e envolve

sujeitos sociais de classes distintas, apresentando contradições quanto aos interesses

envolvidos. A concepção dialética marxiana, segundo Minayo (1996) empenha-se no

combate tanto contra as tendências que exageram na supremacia da razão como

contra o irracionalismo moderno, o que significa super valorizar o pensamento

racional/razão, em detrimento das dimensões de cunho afetivas/emocionais. Fato

condizente com as discussões atuais em saúde mental que questionam o conceito de

razão burguesa marcada pela robotização do humano.

Para análise marxista, teoria e prática são faces de um mesmo processo, fato

fundamental quando se tratam de pesquisas no campo da saúde. A categoria

mediadora das relações sociais dentro desta perspectiva é o trabalho, materializado na

práxis, envolvendo atividade prática e teleológica, reflexão e ação. A abordagem

dialética considera parte da mesma totalidade o objetivo e o subjetivo, dimensões cuja

articulação dialética reveste-se da maior necessidade na área da saúde mental.

Para Marx (1974), as categorias teóricas são entendidas como expressões, na

esfera da razão, do modo de ser, determinações da existência, dadas na realidade

efetiva. Estabelece-se, pois, como quesito fundamental a indissociável articulação entre

teoria e realidade (prática social), em que o método

não se reduzindo a pautas de

procedimentos para conhecer e/ou o agir - se expressa na lógica que organiza o

processo mesmo do conhecimento. Requer que os fenômenos e processos sociais

sejam re-traduzidos na esfera do pensamento, que procura aprendê-los nas suas

múltiplas relações e determinações, isto é, em seu processo de constituição e de

transformação, pleno de contradições e mediações.

(22)

cabe indagar os motivos que levaram à escolha deste território e não de outro para a

instalação da primeira unidade deste gênero. A escolha por um serviço extra-hospitalar

vai ao encontro de uma postura defendida pelo movimento de Reforma Psiquiátrica.

Considerando o CAPS um serviço substitutivo estratégico em saúde mental para a

efetivação da Reforma Psiquiátrica, neste sentido objetivamos apreender as

contradições que marcam o processo de concretização da Reforma Psiquiátrica através

da vivência dos usuários e de suas famílias, no interior de uma unidade integrante do

novo modelo de atenção em saúde mental. Partimos do pressuposto de que os

usuários e seus familiares são sujeitos-chave no processo de reforma psiquiátrica, por

vivenciarem em seu cotidiano as mudanças concretas realizadas, que acenam para um

processo de re-inserção social, mas também, contraditoriamente, os limites e entraves

desse processo.

A aproximação dialética da realidade estudada parte do ponto de vista dos

sujeitos sociais, de nossas observações, de leituras de documentos oficiais guiadas por

leituras teóricas. Desse modo, delimitamos como protagonistas da pesquisa os usuários

e suas famílias, partindo do pressuposto de que os mesmos são sujeitos privilegiados

do processo de Reforma Psiquiátrica. Esta proposta de pesquisa focaliza o caso de

uma unidade, seguindo uma opção pelo aprofundamento das questões pesquisadas,

através de uma maior aproximação com o cotidiano dos usuários, familiares e

profissionais por nós considerados pilares de concretização da reforma.

Seguindo as orientações de Minayo (1996), construímos instrumentos de

pesquisa, privilegiando a entrevista semi-diretiva, com roteiro predefinido contendo

questões abertas, e observação sistemática, realizada a partir de um guia elaborado

previamente. O roteiro de entrevista contém poucas questões tendo por finalidade

apreender o ponto de vista dos sujeitos sociais, de acordo com os objetivos da

pesquisa. Definimos entrevista como:

(23)

A observação participante permite ao pesquisador a vinculação dos fatos a

suas representações e a apreensão das contradições entre as leis e orientações legais

concernentes à política em foco, entendidas como “pactos”, envolvendo Estado,

Mercado e Sociedade e a realidade concreta apreendida, através das próprias

contradições vivenciadas no cotidiano do grupo objeto de estudo. As observações

foram registradas no diário de campo, que contém ainda informações provenientes de

entrevistas não formais, ou melhor, sínteses de conversas informais, de

comportamentos e expressões que indiquem aspectos importantes relacionados com a

problemática tratada.

Realizamos entrevistas com três (03) usuários e membros de suas respectivas

famílias, com duas (02) técnicas. Sendo que uma assume além de suas tarefas de arte

educadora, a coordenação do serviço. Duas outras entrevistas foram realizadas, dessa

feita, uma com a responsável pela gestão municipal da política em saúde mental, e uma

segunda com ex-representante do conselho municipal de saúde. Tentamos assim

apreender o complexo horizonte do processo de materialização da reforma psiquiátrica

em nosso município, englobando seus protagonistas: trabalhadores dos serviços

substitutivos, usuários e conseqüentemente suas famílias, gestores e representante de

entidade do campo pesquisado.

A partir de nossa observação sistemática, através da imersão e participação

nas atividades do CAPS II - Leste durante mais de três meses, identificamos três

usuários, três familiares e três técnicos de diferentes níveis (coordenadora dos serviços

de atenção básica do município de natal, coordenadora do serviço pesquisado, uma

psicóloga) que foram solicitados a conceder entrevistas semi-estruturadas (Cf. ANEXO

B,C,D,E,F).

Entendemos entrevista de acordo com Sampaio (1998):

(24)

afetam-se, beneficiam-se e prejudicam-se mutuamente (SAMPAIO, 1998, p. 47).

Indicamos acima os procedimentos utilizados para coleta e, no posterior

tratamento dos dados da pesquisa, buscamos realizar a triangulação

3

de dados, que

constitui estratégia de pesquisas qualitativas, permitindo o uso concomitante de várias

procedimentos de coleta, visando a verificação e validação dos dados obtidos.

Inicialmente, pretendíamos focar nossa pesquisa nas possibilidades e limites da

prática do serviço social no âmbito da saúde mental, tomando como campo concreto de

atuação um CAPS de Natal/RN, por considerarmos este o espaço por excelência de

materialização da reforma psiquiátrica.

Partíamos do entendimento segundo o qual as atuais propostas em saúde

mental estão a exigir do profissional do serviço social uma ampliação do seu campo de

atuação, para não se restringir apenas a interpretações psicológicas e psiquiátricas,

buscando dar conta dos determinantes sociais envolvidos nas condições de saúde e,

em particular, de saúde mental, mas também dos processos de adoecimento. Como

nos alerta Marx, a realidade é sempre mais rica e mais complexa do que nossa

capacidade de apreendê-la. Assim, em nosso processo de aproximação com a

realidade tivemos que redefinir nosso objeto de estudo.

Com efeito, baseávamos inicialmente em documentos oficiais que indicavam a

presença do profissional do serviço social nas equipes interdisciplinares dos CAPS. A

princípio, posto que estávamos cursando um mestrado em serviço social e que

pretendíamos atuar na área de saúde mental enquanto assistente social, havíamos

definido como foco de nosso trabalho analisar impasses e contradições da atuação do

assistente social no processo de materialização da reforma psiquiátrica em Natal. Com

surpresa constatamos, entretanto, que no CAPS II - Leste não havia este profissional.

Procedemos, então, a uma mudança do foco de nossa pesquisa.

Decidimos realizar um processo sistemático de observação no serviço

pesquisado. Iniciamos esse processo em 17 de julho de 2008, com presença

3 Termo utilizado nas abordagens qualitativas para indicar o uso concomitante de várias técnicas de

(25)

sistemática três vezes por semana no campo de pesquisa, durante as manhãs. Nesse

tempo, participamos das diversas atividades deste serviço. Para dar conta da totalidade

das ações e ter contato com o cotidiano dos diversos profissionais e usuários, tivemos

que incluir também em nosso programa alguns períodos de presença no turno

vespertino.

Nas idas e vindas ao serviço destacamos quão enriquecedor pode vir a ser um

processo de pesquisa de campo. Foi importante para nós o fato de ter sido possível

romper com o estranhamento da nossa presença no cotidiano, naturalizando nossa

estada como “um deles”, parte daquela comunidade. E, de fato,

durante alguns meses,

vivenciamos o cotidiano da casa, partilhando

“pedaços de vida” em comum,

compartilhando, alegrias, perdas, crises, dores, satisfações, preocupações de usuários,

famílias e profissionais. Contudo, nesse tempo, algumas cobranças nos foram feitas,

por exemplo, para exercer um papel para o qual não estávamos designadas. Insistimos

sempre em afirmar nosso papel de pesquisadora.

O CAPS II – Leste integra a rede de serviços da Secretaria Municipal de Saúde

(SMS) e tem por objetivo o tratamento de pessoas portadoras de

transtorno mental

grave

(psicose e neuroses graves)

4

. A demanda ali atendida é espontânea ou

proveniente de diferentes instituições, ou seja, referenciada

5

.

Finalmente, ressaltamos que nossa pesquisa de campo caminhou passo a

passo com o processo de reflexão crítica e de elaboração de nossa dissertação

. C

abe-nos, por fim, destacar que a realidade em sua complexidade e em suas contradições

revela-se sempre mais rica do que nossa capacidade de apreendermos. Situar a

reforma psiquiátrica, enquanto totalidade de menor complexidade, no interior do

movimento mais amplo e contraditório da totalidade mais complexa que é a realidade

brasileira atual constitui fio condutor e desafio de nossa atividade de pesquisa.

4

Segundo a psiquiatra do serviço pesquisado, a definição de gravidade dos transtornos mentais é feita de acordo com cada patologia. A mesma exemplifica que nos casos de depressão, a ideação suicida e sintomas psicóticos são critérios de gravidade. Em geral, nos transtornos graves existe um prejuízo maior ao funcionamento global do indivíduo. Segundo a psiquiatra, os mais freqüentes tipos de “sofrimentos psíquicos” acolhidos por este serviço são: esquizofrenia, transtorno afetivo bipolar e transtorno esquizoafetivo.

5 O termo “demanda referenciada” integra o linguajar cotidiano dos profissionais da área de saúde

(26)

Buscávamos deste modo, não cair em armadilhas de perspectivas individualizantes e

fragmentárias da vida social, que findam por responsabilizar indivíduos, ou mesmo

culpabilizá-los por situações que resultam de processos sociais mais amplos e

complexos que, sem dúvidas, afetam a individualidade, as singularidades, mas que não

se reduzem a estas dimensões.

Em nosso primeiro Capítulo, debruçamo-nos

sobre “

A Construção de Bases

Paradigmáticas no Campo da Saúde M

ental”

. Dissertamos sobre acontecimentos

essenciais para entendermos a política de saúde, em especial, a política de saúde

mental. Transitamos por distintos períodos históricos, reportamos a acontecimentos

que vão desde o nascimento da instituição hospital, aos tempos de luta antimanicomial

com sua proposta de desistitucionalização.

O Capítulo 2, intitulado: “Políticas de Saúde Mental: Transitando pela Construção

da Reforma Psiquiátrica do Âmbito Nacional ao Municipal

”, trata inicialmente da ação do

Estado junto às políticas de atenção em saúde mental. Em seguida escrevemos a

respeito de dois movimentos de “reforma”: sanitária e psiquiátrica. Analisamos limites e

contradições envolvidos nesses dois processos sociais interligados. Finalmente

situamos o contexto da reforma psiquiátrica e a importância dos centros de atenção

psicossociais para concretização desta.

(27)

1. A CONSTRUÇÃO DE BASES PARADIGMÁTICAS NO CAMPO DA SAÚDE MENTAL

Objetivamos traçar nas próximas linhas um breve retrospecto a respeito das mudanças ocorridas na política de atenção em saúde mental ao longo dos séculos. Desde os tempos mais remotos com a criação dos “hospitais”, passando pelo surgimento da psiquiatria e as críticas a ela atribuídas. A psiquiatria não conseguiu legitimar-se junto à sociedade, pois, sua intervenção ocasionava uma cronificação do estado do sujeito, e não em resultados positivos. Amarante (2003) destaca que as formas que a psiquiatria criou para lidar com a loucura nem sempre foram aceitas sem contestações. Em distintos períodos históricos eclodem movimentos de contestação a esse saber e a sua forma de cuidar do sujeito em sofrimento psíquico.

Desde seu nascedouro, a psiquiatria tem sido um campo profissional e de saber debatido, tanto em sua dimensão prática, quanto teórica. No plano teórico, são problematizados os conceitos de doença mental, de normalidade, de cura, de periculosidade, de incapacidade, de tutela. Com relação à dimensão prática, o hospital psiquiátrico passa a ser questionado enquanto lugar terapêutico.

Segundo Amarante (2003) a crítica institucional ao hospital psiquiátrico ganha grandes proporções a partir da última metade do século XIX. Problematizam-se também as relações entre técnicos, a sociedade e o dito louco. Conseqüentemente se constrói um terreno fértil para contestações tanto das técnicas praticadas pela psiquiatria quanto das teorias que as sustentam. Podemos citar como movimentos reformadores as Comunidades Terapêuticas, a Psicoterapia Institucional, a Psiquiatria de Setor, a Psiquiatria Preventiva, Antipsiquiatria e Psiquiatria Democrática Italiana. O cenário atual em saúde mental é marcado pelo debate acerca da Reforma Psiquiátrica que, por sua vez, apresenta novas formas de tratamento direcionado aos sujeitos em sofrimento psíquico, baseados em construções teóricas distintas daquelas que deram suporte à psiquiatria tradicional.

(28)

outros países, principalmente da reforma psiquiátrica italiana objetivando a desinstitucionalização. O processo de reforma no Brasil é marcado por singularidades. O contexto neoliberal apresenta obstáculos que dificultam a efetivação deste processo em nosso país.

1.1. DA LOUCURA AO SOFRIMENTO PSÍQUICO: A PSIQUIATRIA COMO CONSTRUÇÃO SOCIAL

A psiquiatria nasce em meio a dois acontecimentos importantes que

destacamos aqui. O primeiro refere-se à transformação do hospital - instituição

filantrópica por excelência - em instituição médica. O segundo diz respeito ao

surgimento da clínica e da anatomia patológica.

Analisando esse processo, constatamos que, nem sempre, o hospital

desempenhou função específica na cura ou tratamento do doente. Com efeito, a

origem do termo provém do latim “hospitale”, que signif

ica hospedaria, hospedagem.

Inicialmente, destaca-se enquanto instituição filantrópica, religiosa e de caridade. O

primeiro hospital que se tem registro na história da humanidade data do século IV,

tendo sido criado por São Basílio, em Cesaréia, Capadócia (entre os anos de

369-372 d.C.). O objetivo desta instituição não se centrava na cura dos enfermos e sim

na prática da caridade

e pna regação da palavra de “Deus”

(FOUCAULT, 1998). A

população que freqüentava o hospital não se constituía somente de pessoas com

algum tipo de enfermidade, mas se compunha essencialmente de pessoas

indesejadas na sociedade, indivíduos que ninguém aspirava ver, ou seja, prostitutas,

delinqüentes, pobres, desabrigados, loucos... Foucault (1979, p. 101) assim se refere

ao “personagem ideal” do hospital de então:

(29)

A criação do Hospital Geral de Paris, em 1656, representa marco

fundamental nesse processo. Na França, vivia-se à época em meio a reflexões e

intervenções baseadas na medicina do espaço urbano

6

. Apesar de ter perdido parte

de seus objetivos religiosos, o hospital ainda não adquira as características de uma

instituição de cuidados médicos. As internações, além de voluntárias (número

reduzido), podiam ser também encaminhadas por autoridades públicas. Os diretores

dos hospitais assumiam um cargo vitalício e possuíam plenos poderes tanto no

interior quanto no exterior dos mesmos. Segundo Foucault (1979),

as instituições se

caracterizavam por sua natureza semi-jurídica de controle e segregação social, com

exercício do poder oscilando entre poder de polícia e poder de justiça.

Em “História da Loucura”

, Foucault (1972) afirma que a prática de retirar

doentes mentais do convívio social para um lugar específico surge nos países

árabes, em Fez, no século VIII; em Bagdá, no século XIII e no Cairo, no século

seguinte. Estes estabelecimentos aproximam-se do que chamamos hoje de hospitais

psiquiátricos. Os primeiros hospitais psiquiátricos Europeus e Italianos datam do

século XV. A denominação destes espaços como: “asilo”, “hospício”, ”manicômio”

,

“hospital psiquiátrico”

varia de acordo com o contexto histórico (FOUCAULT, 1972).

Em verdade, razões de ordem social, econômica e política conduzem as

“autoridades”, a utilizar a instituição hospitalar para buscar “enquadrar” pessoas

economicamente “improdutivas”, que representavam ameaça à ordem vigente

(ordem burguesa em constituição), deixando-as em situação de reclusão asilar e

social, na tentativa de negar a existência das mesmas. Neste sentido, a

transformação do hospital em instituição médica adquire relevância, uma vez que a

ciência médica vem em auxílio ao discurso dominante, que busca caracterizar como

“doentes” esses indiví

duos que, de algum modo, não correspondiam aos padrões de

“normalidade” socialmente aceitos.

Compartilhamos com Rotelli (2001, p. 26) a idéia

de que:

6 No final do século XVIII, as cidades Francesas se tornaram palcos de grandes conflitos em torno de

(30)

(...) o manicômio efetivamente se constitui, sobretudo, como local de descarga e de ocultamento de tudo aquilo que, como sofrimento, miséria ou distúrbio social, resulta incoerente frente aos códigos de interpretação e de intervenção (de problema-solução) das instituições que fazem fronteira com a Psiquiatria, ou seja, a medicina, a justiça e a assistência.

De acordo com Foucault (1998), o surgimento da clínica e da anatomia

patológica representa igualmente fator de destaque na constituição da psiquiatria

enquanto disciplina médica. Três grandes transformações na área médica

favoreceram diretamente o nascimento da clínica e, por conseguinte, da psiquiatria: a

reorganização da instituição hospitalar, possibilitando as intervenções médicas com

maior constância e regularidade. Dessa forma, o hospital se tornou lugar de

observação e sistematização das experiências, permitindo um processo interventivo

de cunho científico; a redefinição do estatuto social do doente, segunda

transformação importante. Com isto, a doença não mais constitui preocupação

pessoal e sim questão política e científica; o desenvolvimento do novo uso da

linguagem científica

7

que propunha definir as causas das doenças; ainda segundo

Focault (1998), o manicômio representa a repetição do ritual da separação, em

sentido material, ou seja, como produção repetida da separação e da expropriação

do sujeito de suas condições materiais de vida, exercitada no modo capitalista de

produção.

A constituição do paradigma psiquiátrico e, conseqüentemente, do modelo

hegemônico de assistência às pessoas em sofrimento psíquico, ou seja, o sistema

asilar emergiu a partir da Revolução Francesa. Sem perder de vista os limites e

contradições desta revolução, bem como seu caráter burguês, não podemos negar

as transformações dela decorrentes, que marcam a história da humanidade, com

destaque para as mudanças no plano político, econômico e social. Esta revolução foi

responsável pela derrubada do Clero e do Estado Absolutista, superando a crença

dominante em um mundo sobrenatural e místico. O lugar da verdade mágica foi

substituído pela verdade da ciência. Nas ciências humanas e sociais, encontramos

7 Linguagem no sentido da estrutura falada do percebido englobando maneiras de ver e dizer

(31)

acirrados debates sobre cidadania e democracia, noções que têm suas origens

nessa revolução.

Em meio a novos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, as

instituições sociais exigiam uma transformação radical em suas práticas. Nesse

contexto, Philippe Pinel, médico enciclopedista, filósofo e naturalista francês é

indicado para ser o reformador do Hospital de Bicêtre, em Paris. Em 1798, torna-se

médico-chefe deste estabelecimento, entrando para história como responsável por

desacorrentar as alienadas

8

, gesto considerado símbolo da fundação da psiquiatria.

Pinel é tido ainda como responsável pela organização do primeiro hospital

psiquiátrico moderno, como também pela elaboração do primeiro livro de psiquiatria

dos tempos atuais, no qual encontramos a classificação inicial das doenças mentais

da psiquiatria como especialidade médica. Deste modo, são definidas

as bases para

o entendimento da loucura como doença mental. O isolamento terapêutico, praticado

através da reclusão asilar é definido como modo precípuo de tratamento

(AMARANTE, 2003).

As estratégias de Pinel foram denominadas por Robert Castel

(1978) como tecnologia pineliana. Tinham como princípios básicos o isolamento

9

, a

organização do espaço asilar e a relação terapêutica baseada na autoridade e no

tratamento moral

10

.

A burguesia recém chegada ao poder através da Revolução Francesa tinha

interesse na constituição do sistema clássico de assistência psiquiátrica, ou melhor,

do Hospital Psiquiátrico, como também, em estabelecer o

anormal

”, o diferente

como patológico. As elites econômicas e políticas necessitavam encontrar

explicações para o mau funcionamento da sociedade, eximindo-se de qualquer

parcela de responsabilidade, estigmatizando grupos sociais mais fracos (VELHO,

1981). Parecia necessário à burguesia isolar, afastar, eliminar, anular aqueles

segmentos que representavam ameaça à nova ordem que se constituía. A

8

Termo usado pela teoria do pensamento alienista francês sistematizado por Phillipe Pinel. Para Pinel: “O alienado seria o que se deixa dominar por paixões artificiais, distantes da realidade objetiva” (AMARANTE, 2003, p.14).

9 “Pinel enquanto naturalista acreditava na idéia de que para conhecer um objeto, é preciso isolá-lo

das interferências externas. Medida de ordem científica que possibilita o contato exclusivo com o objeto a ser estudado” (AMARANTE, 2003, p.13).

10“Política interior no âmbito da instituição efetivada com o regime disciplinar do asilo, como também

(32)

transformação da loucura em anormalidade e depois em patologia só pode ser

entendida através da análise da dimensão política da sociedade, articulada com as

dimensões econômicas e ideológicas (culturas, representações, saberes).

Assim, o nascimento do asilo satisfaz à necessidade burguesa de regulação

das liberdades. Os avanços são inquestionáveis: esse processo histórico possibilita

que a ”loucura” não se constitua objeto de atenção do poder jurídico e sim da

medicina (GONDIM, 2001). Gondim, por sua vez, ressalta que o parlamento francês

passa a estabelecer diferenças entre os “loucos” e aqueles que transgrediam as leis.

A Assembléia Revolucionária instaura as bases para o processo de medicalização e

tutelarização dos “loucos”, definind

o o regime dos insensatos

11

.

O internamento

torna-se necessidade da medicina e uma nova relação se estabelece: a tutela. O

surgimento do asilo destaca-se como fator elementar para a constituição da

psiquiatria como ciência. Desde sua origem enquanto disciplina médica, a psiquiatria

é marcada por iniciativas de reforma (GONDIM, 2001).

De acordo com Castel (1978), até meados da segunda metade do século

XIX, período marcado por avanços na medicina, notadamente, nos estudos sobre as

bases do sistema nervoso, órgãos e tecidos, a tecnologia pineliana segue fortalecida.

Para esta perspectiva, as causas das doenças mentais são atribuídas a origens

neurocerebrais. A “loucura” passa a ser objeto de medicalização, sendo descrita

seguindo modelo organogenético. O “louco”

é, então, entendido como um organismo

que funciona mal e não mais como alguém com distúrbio moral. Essa abordagem

organicista se distancia de concepções teóricas que acreditam existir causas sociais

subjacentes às doenças mentais. Para Gondim (2001), este período de

“adormecimento” finda com o término da Segunda Guerra Mundial,

cujas

conseqüências sociais foram de grandes proporções. Então, os números de

cronificação de doenças mentais e de incapacitação social pareciam assustadores,

favorecendo o questionamento da eficácia da psiquiatria tradicional. Os hospitais

psiquiátricos são, então, comparados a campos de concentração de prisioneiros,

sendo denunciados pela violência ali praticada.

11 “Através deste, o parlamento Francês diferencia os “loucos” daqueles outros que transgrediam as

(33)

Segundo Amarante (2003), após a Segunda Guerra Mundial, a história da

psiquiatria é marcada pelas experiências de reformas assim como pela descoberta

dos primeiros neurolépticos

12

. À época, os países europeus se destacavam nas

inovações “terapêuticas”, a exemplo do choque insulínico

13

e cardiazólico

14

, a

eletroconvulsoterapia (ECT)

15

e das lobotomias

16

. Podemos citar como movimentos

reformadores as Comunidades Terapêuticas

17

, Psicoterapia Institucional

18

,

Psiquiatria de Setor

19

, Psiquiatria Preventiva

20

, Antipsiquiatria

21

e Psiquiatria

Democrática Italiana

22

. Vasconcelos (1992) relata que nessa época a Europa

vivenciava um contexto de escassez de força de trabalho e esforço reabilitativo; uma

conjuntura de reconhecimento e afirmação de direitos civis; desenvolvimento de

12 Neurolépticos: Medicamentos que atuam no Sistema Nervoso Central utilizados para inibir a

atividade delirante e alucinatória. São drogas indutoras do bloqueio de receptores próprios do neurotransmissor dopamina (AMARANTE, 2003, p. 37).

13 Choque Insulínico: Indução de convulsão por hipoglicemia provocado pela aplicação do hormônio

insulina, que reduz o nível de açúcar no sangue. (AMARANTE, 2003 p. 37).

14

Choque Cardiazólico: Indução de convulsão provocado pela aplicação da cardiazol. (AMARANTE, 2003, p. 37).

15 Eletroconvulsoterapia: Indução de convulsão provocado pela aplicação de eletrochoque.

(AMARANTE, 2003, p. 37).

16

Lobotomias: incisão para seccionamento de feixes nervosos de conexão entre hemisférios cerebrais. (AMARANTE, 2003, p. 37).

17 A experiência das comunidades terapêuticas (Comunity Core) nasce em 1959 com Maxwell Jones.

A idéia central consistia em envolver todos os atores no processo terapêutico, para tal, objetivava reformar o interior das instituições. Informações complementares consultar Amarante, 1995. Ainda sobre comunidades terapêuticas, Tenório (1999) faz uma critica quanto à artificialidade dessas propostas, porém deixa claros os ganhos ocorridos a partir destas experiências, que contribuíram substancialmente para uma aproximação efetiva com os usuários, para introdução de valores democráticos nestas relações quanto para o aumento de dispositivos grupais nas práticas de assistência.

18 Este movimento surge na França, tendo como maior expoente François Tosquelles. Suas criticas se

concentravam na verticalidade das relações médico-paciente. Informações complementares consultar Amarante, 1995.

19 Esse movimento surge igualmente na França, tendo como objetivo resgatar o caráter terapêutico da

psiquiatria e contesta o asilo como espaço terapêutico. Eixo da assistência deslocar-se-ia do hospital para o espaço extra-hospitalar. A respeito ver Amarante, 1995.

20

Nasce nos Estados Unidos da América (EUA), definindo como objeto de intervenção a prevenção e erradicação das doenças mentais. Maior expoente Gerald Caplan. Em síntese, busca novos meios alternativos as instituições psiquiátricas (LOBOSQUE, 2001).

21 Surge no final da década de 1950 e início da década de 1960, com um conjunto de psiquiatras

ingleses no contexto do movimento de contracultura. Principais percussores: David Cooper, Ronald Laing e Aaron Esterson (LOBOSQUE, 2001).

22 Experiência de reforma mais radical em seus princípios. Idealizador Franco Basaglia visava

(34)

serviços sociais públicos; introdução de abordagens psicológicas e comunitárias que

conduzem a uma reforma na assistência.

Todos esses movimentos favoreceram para mudanças no campo da saúde

mental. Ao longo da história novas formas de lidar com a tradicional dita “loucura”

foram se desenvolvendo, forjados por movimentos contestadores das práticas

instituídas. A atual política em saúde mental é guiada pelas diretrizes do que

convencionou chamar-

se “Reforma Psiquiátrica”. Esse processo social nasceu junto

com o Movimento de Luta Antimanicomial (MLAM), que como o termo já expressa,

abomina todos os aspectos do modo tradicional da psiquiatria. O MLAM relaciona-se

com um sujeito e não com um “louco”. Apresenta um novo cuidar, baseado nos

moldes de atenção psicossocial. Este objetiva tratar de sujeitos em sua integralidade

e complexidade. O sujeito entendido em sua existência-sofrimento, assim nasce o

termo: sofrimento psíquico.

E no contexto nacional brasileiro como surge a psiquiatria com seu saber

teórico e prático? Como se processa o desenvolvimento das políticas de atenção à

saúde mental? Como surgem as iniciativas de reforma? As mudanças pretendidas

foram alcançadas? Quais as reais condições para concretização desse processo de

reforma?

1.2. INSTITUCIONALIZAÇÃO X DESINSTITUCIONALIZAÇÃO: CONFRONTANDO PARADIGMAS E PRÁTICAS SOCIAIS

(35)

reconstrução dos laços sociais e a desospitalização como caminho que, ao mesmo tempo, possibilitava outras perspectivas de vida, buscando inclusive desfazer o amálgama no qual eram postos todos os sujeitos em sofrimento psíquico, apostando inclusive na possibilidade de mudanças substanciais nos quadros desses sujeitos com a noção de transitoriedade de seus processos de adoecimento.

De acordo com a psiquiatri

a tradicional o “louco” era

visto como uma pessoa

incapaz de atuar produtivamente na sociedade e de se relacionar

. O “louco” não

tinha voz, sendo necessário assim, passar todos os seus direitos (civis, políticos,

econômico) para um tutor. Tradicionalmente

o dito “louco” era visto como

naturalmente perigoso, representando um perigo para si e para a sociedade. Era

considerado inimputável, ou seja, incapaz perante a lei. Assim, a principal resposta

construída socialmente para a maioria dos casos de sofrimento psíquico foi o

confinamento em instituições hospitalares ou em hospícios ou a invisibilidade e a

negação social no seio das próprias famílias. Ainda detectamos resquícios dessa

visão nos códigos civil e penal vigentes em nosso país (AMARANTE, 2003).

O campo da saúde mental é particularmente rico e complexo. Análises que

permita

m superar “certezas” e explicações sedimentadas em nossa sociedade ao

longo de décadas de prevalência de um modelo de base hospitalocêntrica

revelam-se desafios maiores, em especial, para nós profissionais do revelam-serviço social. Com

efeito, em muitos casos, as pessoas em sofrimento psíquico, apresentam, ao mesmo

tempo, demandas no âmbito da saúde mental e necessidades específicas situadas

no campo das políticas de assistência social.

(36)

As mudanças extrapolam as práticas e os saberes da psiquiatria, atingem o

plano cultural, propõem à sociedade rever sua relação com o sofrimento psíquico,

além de suscitar o diálogo de cada um com suas dimensões irracionais,

desafiando-nos a rever paradigmas e noções preconcebidas de saúde, doença, dificuldade,

sofrimento.

O modelo de atendimento aos sujeitos em sofrimento psíquico construído no

âmbito dos processos de reforma psiquiátrica, com suas particularidades nacionais e

locais, baseia-se na constituição de uma rede de

serviços substitutivos aos

serviços hospitalares, organizados segundo os tipos e a complexidades dos casos.

em articulação com a sociedade, tendo na família papel central, mas nunca

exclusivo. Deste modo, não podemos deixar de levar em conta, aspectos do contexto

socioeconômico, cultural e familiar na análise da atuação dos serviços substitutivos,

caso contrário perdemos nossa perspectiva crítica dialética, arriscando-nos a não

desvendar além dos aspectos fenomênicos da realidade concreta. Apreendemos

serviços substitutivos segundo a definição de Lobosque (2003, p.156):

“São aqueles

que se constituem enquanto rede, ou seja, como um conjunto articulado de

dispositivos e equipamentos, ações e iniciativas que possibilitem a extinção do

hospital psiquiátrico.

Inscrevem-se nas estratégias de uma política pública

comprometida com esta transformação

.

(37)

Nossa pesquisa anterior (PEREIRA, 2004) e nossas primeiras incursões no

campo para fins de elaboração de nossa dissertação de mestrado, evidenciam que a

maioria das famílias e dos usuários não se encontra preparada para exercer novo

papel no processo de tratamento. Não podemos deixar de nos indagar sobre o por

quê? Que condições são dadas pelo Estado para a efetiva concretização da reforma

psiquiátrica? O Estado promove ações amplas para sociedade em geral no sentido

de apresentar e discutir as novas propostas? Sabemos que o Estado tem o papel

chave de sustentar a estrutura de classes e as relações de produção. O Estado

também é chamado para assumir a gestão das crises econômicas com políticas

anticíclicas, isto é, com o estabelecimento de políticas voltadas para atenuar os

efeitos das crises, proporcionando garantias econômicas aos processos de

valorização e acumulação. Essa função estatal é acompanhada de uma vasta

ofensiva ideológica para integrar o trabalhador à sociedade como

“consumidor”

. Até

onde o processo de reforma psiquiátrica atende a esses preceitos? Que interesses

se confrontam nos processos de reforma e, em particular, no processo de reforma

psiquiátrica?

Em alguns casos, muitos familiares desconhecem as bases do processo da

reforma de modo mais amplo ou tomam conhecimento do mesmo abruptamente ao

tentarem internar uma pessoa e se defrontarem com a negativa e com o aceno a um

atendimento de urgência com conseqüente encaminhamento para um serviço

substitutivo, em sistema aberto.

(38)

de 2002) define CAPS I, como serviço com capacidade operacional para

atendimento em municípios com população entre 20.000 e 70.000 habitantes. Com

funcionamento de 08h00min às 18h00min, em dois turnos, durante os cinco dias da

semana. Com relação à meta de atendimento, a portaria assegura o limite máximo

de trinta (30) pacientes por dia. A assistência prestada é a mesma nos três tipos de

CAPS, incluindo atendimento individual, em grupos e oficinas terapêuticas, visitas

domiciliares, acompanhamento à família, atividades comunitárias, que enfocam a

integração do sujeito em sofrimento psíquico na comunidade e sua inserção familiar

e social.

Os CAPS II devem ter capacidade operacional para atuar em municípios com

população entre 70.000 e 200.000 habitantes, tendo como limite máximo de

atendimento quarenta e cinco (45) pacientes por dia. Devem funcionar das 08h00min

às 18h00min, em dois turnos, durante os cinco dias da semana, podendo comportar

um terceiro turno, até as 21h00min. Os CAPS III devem assegurar atendimento em

municípios com população acima de 200.000 habitantes, constituindo serviço

ambulatorial de atenção contínua, durante 24hs diariamente, incluindo feriados e

finais de semana

23

. Este último tipo de CAPS inexiste no município de Natal.

A implantação dos CAPS visa desencadear mudanças profundas na atenção

psicossocial. A ênfase no sujeito requer que sejam considerados os diversos

aspectos da problemática do seu cotidiano. Assim, gera-se uma demanda por uma

assistência que, em geral, ultrapassa os limites do serviço. Para além das questões

de saúde, a dimensão social integra o novo paradigma. Com efeito, a

desinstitucionalização provoca mudanças na rotina de atendimento aos usuários.

23 Este último tipo de CAPS inexiste no município de Natal. O Ministério Público do Estado do Rio

(39)

Concordamos com Nicácio (1989, p. 89), ao afirmar que, no caso brasileiro, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) objetivam:

Inscrever cotidianamente, na prática concreta, as novas referências afirmadas: o direito de cidadania do louco, a loucura como expressão complexa da existência humana, as interações entre os múltiplos atores do processo, realizar a tutela como direito sem seqüestrar a vida dos sujeitos e sim produzir autonomia e enriquecimento dos intercâmbios sociais.

Todavia, não podemos perder de vista que, historicamente, a instituição asilar constituiu espaço de segregação e violência, buscando “neutralizar” pessoas com modos de vida diferentes dos modelos das elites dominantes. Ao longo dos anos, as políticas destinadas às pessoas em sofrimento psíquico foram marcadas por fortes conteúdos discriminatórios, excluindo da sociedade mais ampla aqueles que apresentam alguma “anormalidade”, deixando-os no limbo de nossas sociedades. No campo da saúde mental, as políticas sociais tradicionais têm reforçado a reprodução da sociedade de classes. Em nosso país com desigualdades de proporções continentais, as políticas sociais se restringem ao atendimento às classes de grande vulnerabilidade social, políticas sociais direcionadas por uma ótica reducionista, seletiva e assistencialista. Os serviços públicos não atende a todos os cidadões. Os guerreiros da lida, os trabalhadores, lutam para pagar uma escola particular, o atendimento médico privado, aluguel da moradia. A sociabilidade capitalista submete a força de trabalho às condições desumanas de exploração. E com o suor de cada dia de trabalho os guerreiros tentam assegurar o mínimo necessário para sobrevivência, aqueles que não conseguem são postos abaixo da linha da pobreza. E o que resta desse patamar? Nada. E como diz a canção: “O de cima sobe e o debaixo desce!”.

No processo social e histórico, a psiquiatria tradicional transformou o portador de sofrimento psíquico em doente mental, alienando-o de seus direitos e saberes (AMARANTE, 1996).

(40)

encaminhadas por autoridades policiais. A estrutura física dos hospitais psiquiátricos e suas fortes grades de ferro são igualmente reveladoras da concepção de atenção do modelo dito manicomial, pautado no racionalismo refletido na lógica problema-solução, tendo como objeto de intervenção psiquiátrica a doença mental e como local privilegiado de sua prática o hospital psiquiátrico (GUJLOR, 2003). Formas prescritas de tratar o usuário dos serviços psiquiátricos, como a camisa de força e as injeções “mata leão”, o choque elétrico, dentre outras se destacam como representativas deste modelo de atenção à saúde mental. Na psiquiatria aparecem, de imediato, relações de desumanidade e violência. Evidencia-se, então, para a sociedade e, mais especificamente, para categorias profissionais diretamente envolvidas com a saúde mental, a necessidade de reformar os dispositivos tradicionais existentes.

De modo geral, observamos ainda certo

descompasso entre o que

professam os defensores da reforma, as bases de sustentação das novas

modalidades de atenção à saúde mental e as imagens e concepções transmitidas na

mídia, em particular, na televisão

24

. Com efeito, estas continuam alimentando velhas

concepções de saúde-doença, reforçando o estereótipo do “louco”, do provável

perigo que representam estas pessoas. Tais imagens e representações constituem

entraves no processo de superação do velho paradigma. Lembramos que se trata de

uma proposta de “reforma”, nos marcos de uma sociedade, originalmente marcada

por fortes desigualdades sociais e por evidentes contradições, enquanto sociedade

capitalista.

Na perspectiva adotada por Amarante (2003), a reforma psiquiátrica se

configura como um processo social complexo, por se encontrar em constante

construção, além de ser constituída por várias dimensões inter-relacionadas e

envolver sujeitos sociais concretos, portanto, com interesses, visões de mundo,

24

Imagem

Gráfico 01  – Usuários em atendimento intensivo-   Por regiões administrativas de Natal
Gráfico  02  – Usuários em atendimento intensivo- Por ano de entrada
Gráfico 03  – Usuários em atendimento intensivo - Por idade
Gráfico 04  – Usuários em atendimento semi-intensivo - Por regiões administrativas de Natal
+7

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