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Jurisdição democrática e a teoria dos precedentes judiciais: uma crítica à generalidade e hegemonia na aplicação dos precedentes judiciais e o dever de fundamentação analítica das decisões

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO

LIANA CARINE FERNANDES DE QUEIROZ

JURISDIÇÃO DEMOCRÁTICA E A TEORIA DOS PRECEDENTES JUDICIAIS: uma crítica à generalidade e hegemonia na aplicação dos precedentes judiciais e o dever de fundamentação analítica das decisões

NATAL/RN 2017

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LIANA CARINE FERNANDES DE QUEIROZ

JURISDIÇÃO DEMOCRÁTICA E A TEORIA DOS PRECEDENTES JUDICIAIS: uma crítica à generalidade e hegemonia na aplicação dos precedentes judiciais e o dever de fundamentação analítica das decisões

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito (PPGD) do Centro de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito. Orientador: Prof. Dr. Ricardo Tinoco de Goes.

NATAL/RN 2017

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Queiroz, Liana Carine Fernandes de.

Jurisdição democrática e a teoria dos precedentes judiciais: uma crítica à generalidade e hegemonia na aplicação dos

precedentes judiciais e o dever de fundamentação analítica das decisões / Liana Carine Fernandes de Queiroz. - 2017.

110f.: il.

Dissertação (Mestrado em Direito) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Programa de Pós-Graduação em Direito. Natal, RN, 2019. Orientador: Prof. Dr. Ricardo Tinoco de Goes.

1. Jurisdição democrática - Dissertação. 2. Precedentes Judiciais - Dissertação. 3. Decisão judicial - Dissertação. I. Goes, Ricardo Tinoco de. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.

RN/UF/Biblioteca do CCSA CDU 347.91/.95 Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN

Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas - CCSA

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LIANA CARINE FERNANDES DE QUEIROZ

JURISDIÇÃO DEMOCRÁTICA E A TEORIA DOS PRECEDENTES JUDICIAIS: uma crítica à generalidade e hegemonia na aplicação dos precedentes judiciais e o dever de fundamentação analítica das decisões

Dissertação aprovada em ______.

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________________ Prof. Dr. Ricardo Tinoco de Goes – Presidente

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

__________________________________________________ Prof. Dr. Leonardo Freire – 1º Examinador

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

__________________________________________________ Prof. Dr. Paulo Sérgio Rocha – 2º Examinador

Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN)

Natal/RN 2017

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Ao bem mais precioso que conheço na vida: à minha família, com todo o meu amor.

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AGRADECIMENTOS

Devo agradecer, primeiramente, ao meu orientador, o Professor Ricardo Tinoco de Goes, autor do trabalho que me inspirou maior interesse pelo tema objeto do estudo; o meu obrigada pela destacada atenção que recebi desde a manifestada intenção em Cursar o Mestrado em Direito, ainda quando da apresentação de meu trabalho de especialização em Direito Constitucional nesta mesma Universidade; por ter em mim acreditado e me incentivado, desde o primeiro momento; pela confiança e apoio generosamente ofertados; todo o meu respeito e manifesta admiração e apreço!

Registro o meu agradecimento também à Banca de Qualificação, integrada pelos Profs. Drs. Leonardo Freire e José Orlando Ribeiro Rosário, desde logo, pela disponibilidade na leitura deste trabalho e pela contribuição com esse estudo.

Gratidão também expresso aos professores do Programa de Pós-Graduação Sricto Sensu da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, por todos os seus ensinamentos.

Em especial, à Prof. Maria dos Remedios Fontes Silva, pela presteza e eficiência sempre demonstrada na coordenação do Programa, por ser a maior responsável por fazê-lo sempre melhor, em constante aperfeiçoamento.

Aqui devo também fazer destacado agradecimento ao professor Otacílio dos Santos Neto, quem foi o primeiro a me encorajar e propor um aprofundamento nos estudos acadêmicos, logo após o encerramento do curso da Graduação em Direito nesta Universidade, e de cujo incentivo resultou a publicação de trabalho na seara do direito econômico liberal, especificamente a respeito dos limites da intervenção do estado sobre a e na economia.

Ao professor José Orlando Ribeiro Rosario, exemplo para todos de dedicação, disponibilidade e presteza no desempenho das diversas atividades universitárias; ao sr., digo da minha alegria por ter sido sua aluna de graduação no Curso de Direito da UFRN, bem como nos de Especialização em Direito Constitucional e nas aulas de Mestrado da mesma Universidade; agraciada que fui também pela assunção da atividade de Professora Colaboradora da

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Disciplina de Direito Ambiental estando o sr. à frente da Chefia do Departamento de Direito Público e Processual.

À professora Cristina Foroni Consoni, dotada de destacada didática, educação e elegância; lucidez filosófica revelada na pausada colocação de cada palavra, pronunciadas num tão bem concatenado de ideias; docente de olhar atento e ouvido respeitoso; partilha generosa e humilde do conhecimento; na preparação roteirada de cada aula, revelou o seu “acreditar” de que cada um de sua plateia poderia dialogar, debater e apreender a partir de suas provocações filosóficas; esteja certa de que muito me inspira no desempenho da minha atual atividade de docência.

Ao professor Artur Cortez Bonifácio também consigno meu sincero agradecimento; ao professor e magistrado que sempre esboçou coerência e simplicidade na sua condução profissional e pessoal, a minha gratidão pelo conhecimento legado desde os bancos da graduação e, igualmente, pela cordialidade e incentivo sempre a mim devotados, em todas as ocasiões.

Ao professor Walter Nunes da Silva Júnior, o meu obrigada com especial afeto e apreço! O reecontro acadêmico feliz e profícuo deste Curso de Mestrado me conferiu a honra do enorme aprendizado e da coautoria de nosso livro, que em breve estará finalizado.

Devo agradecer destacadamente ao professor e Desembargador Virgílio Macedo Jr., com quem eu aprendi nos bancos da academia e aprendo diariamente em seu gabinete, devotando-lhe a sempre manifestada lealdade e compromisso no desempenho das tarefas profissionais; ao sr. também dedico meu esforço pelo crescimento acadêmico, profissional e pessoal, a ampliação de meus horizontes; minha gratidão, respeito e grande estima!

Agradecimento especial também desejo fazer à servidora da Coordenação do Programa de Pós-graduação da Universidade, por mim muito querida Lígia, terna e serena, profissional de destacada competência e que não encontra obstáculos para realizar com a maior eficiência e tamanha atenção o que lhe é demandado pelos discentes e docentes; o meu carinho, a minha fraternidade!

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partilha com cada um dos meus colegas de turma, que fizeram esses dois últimos anos mais alegres e tornaram mais leve o nosso compromisso. Me refiro em especial os amigos Arthur Fialho, Luís Filipe Ribeiro, Daniel Guedes, Abraão Lopes, Hermano Faustino, Gabrielle Riberio, Christiane Alli e Higor Kalliano, este que é atualmente meu colega docente do Programa de Pós-graduação da Estácio Natal.

Manifestada a minha gratidão àqueles que comigo partilharam desse momento da minha vida acadêmica, quero agradecer carinhosamente à minha família.

À minha mãe que, com seu exemplo de superação e de dedicação à pesquisa, por seus invulgares dotes culturais, espírito inquieto pelo conhecimento e inclinado à produção acadêmica, é a maior responsável pelo meu apreço artístico, literário, musical e poético. A sua positividade e a suas “bênçãos e luz” tocam em mim, mãe, em uma imposição perfeita como das mãos maternais da devoção à Mãe Rainha!

Ao meu pai que, ostentando como baluarte e orgulho as conquistas dos seus filhos, nos devotando muito amor e dedicação, sempre me fez querer ser mais e melhor, desde a primeira infância, havendo cultivado em mim a vontade de estudar Direito.

A minha irmã Luiza e às minhas sobrinhas, minhas Beatriz e Maria, a alegria no meu coração pelo amor da nossa família e porque vocês me completam!

Ao meu irmão “Ninho”, tão dedicado às leituras e à pesquisa, dono de uma grande biblioteca lida, mesmo tão jovem. Obrigada por toda a ajuda na construção deste trabalho e porque desperta em mim um amor maternal que me edifica!

Ao meu esposo Valério, pela compreensão da minha ausência nos tantos momentos que dedico do meu dia ao trabalho e aos estudos, não somente por uma realização pessoal, mas pela prosperidade da nossa família. A partilha do nosso amor torna os desafios mais leves e a vida mais feliz!

De forma igualmente importante, aos meus amigos da vida que com muito otimismo acreditaram nesse projeto de estudos, compreenderam a minha

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ausência e me deram, com um gesto ou uma palavra, uma injeção de ânimo e coragem. Cito, por todos, Fátima Bezerra, minha grande guia no desempenho das minhas atividades diárias, torcida sempre sincera por esse sucesso e incentivadora dos meus estudos; ainda, aos amigos com quem partilho a rotina diária de estudos: Manu, Karla, Renatinha, Tati, Igor, Flávio e Bruno, não seria para mim possível perseverar com afinco não fosse por ter vocês.

Por fim, minha gratidão à Deus e ao amor de Maria, pela saúde e pela parresia que, despertada em mim, fez nascer a vontade da pesquisa e perseverar na escritura desse trabalho; deixo meu testemunho de fé e gratidão especial pela habilitação para estudar o Direito, com o ousado projeto de querer viver/participar/promover um contexto de maior justiça e democracia!

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A atividade decisória

(Liana Queiroz)

Um convite a outrar-se: Outras interpretações

Outras percepções (um dissenso?) Ou coisa outra (plural).

Contextos nascidos (de dentro) de uma mesma moldura (ideal).

Nesse processo (em) contraditório, Encetados os debates,

manifestações (des)ordenadas, de lados opostos (em antiteses), toda a dialética culmina

na produção da decisão: conclusão pelo meu (justo) eu, a revelar (o) justo

que irá concretizar-se na vida de outro(s).

Decisão-produto

Do passado de precedentes Vinculada às consequências Pragmáticas de um futuro

Dotada de uma intersubjetividade Tão ao (meu) gosto

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RESUMO

Neste trabalho, propõe-se uma crítica à aplicação generalizada e hegemônica dos precedentes judiciais na elaboração da decisão judicial, destacando a imprescindibilidade de que o ato decisório seja dotado de justificação analítica, adequada ao atual modelo cooperativo de processo, em que se revaloriza o diálogo processual e o exercício do contraditório substancial, por imperativo da jurisdição constitucional que se pretenda democrática. Concebe-se, para tanto, que o exercício democrático da jurisdição exige mais do que instrumentos racionais para o procedimento justificador do ato decisório, abrangendo a própria trajetória de formação da convicção do julgador – sob uma perspectiva procedimentalista –, a sua aproximação ao problema posto, a ser objeto de acuidado exame, a projeção ao caso das decisões possíveis e suas respectivas consequências, inclusive o dimensionamento do alcance a outros sujeitos não envolvidos no processo. Procura-se compatibilizar a incorporação de um sistema de precedentes judiciais ao ordenamento jurídico pátrio, sobretudo pelo atual Código Processual Civil (Lei n. 13.105/2015), com o exercício democrático e dialógico da jurisdição, que não deve por fim ao debate ensejado quando da propositura da ação, mas, ao tornar pública a decisão, sugerir um novo debate a partir dela nos contextos da sociedade, de modo a se ter o aprimoramento da própria jurisdição na concreção da justiça. Infere-se, assim, que a compreensão sobre a formação da decisão judicial é essencial ao entendimento do próprio fenômeno jurídico, como resultante dos influxos de todos os atores que estão envolvidos, direta ou indiretamente, na sua elaboração, sejam as partes e seus advogados, os tribunais e sua jurisprudência, a academia e seus doutrinadores, e, também, a sociedade civil organizada, com participação destacada na função, por exemplo, de amicus curiae. Evidencia-se, portanto, a necessidade da legitimação da decisão judicial, para a concreção de um processo justo e democrático, por meio da racionalidade discursiva e da fundamentação analítica do ato decisório, elaborado após fomentado diálogo processual e a efetiva consideração, pelo

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julgador, de todas as manifestações processuais das partes para a elaboração da decisão, sendo inservível a aplicação pura e simples de precedente judicial a um dado caso concreto, sem o rebate adequado às teses construídas pelas partes. Entende-se que deflui do processo cooperativo um novo condicionamento ao exercício da jurisdição, que é justamente a consideração da argumentação de todos os sujeitos processuais. Sugere-se repensar a sistemática de aplicação atual de um modelo de sistema de precedentes mal arremedado para o processo brasileiro, o qual se propõe à garantia de segurança jurídica, previsibilidade e confiabilidade fundada na verticalização da decisão judicial e na sujeição do magistrado aos precedentes judiciais, sejam vinculantes ou persuasórios. Adota como metodologia a pesquisa bibliográfica, com a análise da doutrina correlata, da legislação e da jurisprudência.

Palavras-chaves: Jurisdição democrática. Teoria dos Precedentes Judiciais.

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ABSTRACT

In this paper, we propose a critique of the generalized and hegemonic application of precedents in the elaboration of the judicial decision, emphasizing the indispensability that the decision-making act be endowed with analytical justification, adequate to the current cooperative process, in which the dialogue is revalued procedural and the exercise of substantial adversary, by imperative of the constitutional jurisdiction that is intended to be democratic. It is conceived, therefore, that the democratic exercise of jurisdiction requires more than rational instruments for the procedure justifying the decision-making, covering the very trajectory of forming the conviction of the judge - from a proceduralist perspective - its approach to the problem, to be subject to careful examination, the projection to the case of possible decisions and their consequences, including reaching other subjects not involved in the process. It seeks to make compatible the incorporation of a system of judicial precedents to the legal order of the country, above all by the current Civil Procedure Code (Law 13.105 / 2015), with the democratic and dialogical exercise of jurisdiction, which should not end the debate when of the proposition of the action, but, in making the decision public, to suggest a new debate from it in the contexts of the society, in order to have the improvement of the own jurisdiction in the concretion of justice. It is understood that the formation of the judicial decision is essential to the understanding of the legal phenomenon itself, as a result of the influences of all actors who are involved, directly or indirectly, in its elaboration, whether the subjects and their lawyers, the courts and their jurisprudence , the academy and its doctrines, and also organized civil society, with a prominent role in the function, for example, amicus curiae. Therefore, it is necessary to legitimize the judicial decision, in order to establish a fair and democratic process, through the discursive rationality and the analytical basis of the decision-making process, after having fostered procedural dialogue and the effective consideration, by the judge, of all the procedural manifestations of the

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parties for the elaboration of the decision, being unnecessary the pure and simple application of judicial precedent to a given concrete case, without the adequate rebate to the theses constructed by the procedural subjects. It is understood that a new conditioning on the cooperative process arises from the exercise of jurisdiction, which is precisely the consideration of the arguments of all procedural subjects. It is suggested to rethink the system of current application of a model of a system of precedents that is imperfect for the Brazilian process, which proposes to guarantee legal certainty, predictability and reliability based on the verticalization of the judicial decision and on the subjection of the magistrate to precedents, whether binding or persuasive. It adopts as methodology the bibliographical research, with the analysis of the related doctrine, of the legislation and the jurisprudence.

Keywords: Democratic jurisdiction. Theory of Judicial Precedents. Judicial

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RÉSUMÉ

Cet article propose une critique de l'application généralisée et hégémonique des précédents judiciaires dans l'élaboration de la décision judiciaire, en soulignant la nécessité de doter l'acte décisionnel d'une justification analytique, adéquate au modèle coopératif actuel, dans lequel le dialogue est réévalué procédurale et l'exercice d'un adversaire substantiel, par l'impératif de la compétence constitutionnelle qui se veut démocratique. Il est entendu que l'exercice démocratique de la compétence nécessite plus que des instruments rationnels pour la procédure de justification de l'acte décisionnel, englobant la trajectoire même de former la conviction du juge - d'une perspective procéduraliste - son approche du problème posé, d'être objet d'un examen attentif, la projection au cas des décisions possibles et de leurs conséquences, y compris l'extension du champ d'application à d'autres sujets non impliqués dans le procedure. L'objectif est de faire intégrer un système de précédents judiciaires dans le système juridique du pays, notamment à travers le Code de procédure civile actuel (Loi 13.105 / 2015), avec l'exercice démocratique et dialogique de la compétence, qui ne devrait pas mettre fin au débat de la proposition de l'action, mais, en rendant la décision publique, de proposer un nouveau débat à partir de celui-ci dans les contextes de la société, afin d'avoir l'amélioration de la propre juridiction dans la concrétion de la justice. Il est donc déduit que la compréhension de la formation de la décision judiciaire est essentielle à la compréhension du phénomène juridique lui-même, à la suite des afflux de tous les acteurs impliqués, directement ou indirectement, dans son élaboration, que les parties et leurs avocats, les tribunaux et leur jurisprudence, l'académie et ses doctrines, ainsi que la société civile organisée, avec une participation importante dans la fonction, par exemple, d'un amicus curiae. Par conséquent, il est nécessaire de légitimer la décision judiciaire, afin d'établir une procédure juste et démocratique, au moyen d'une rationalité discursive et d'un fondement analytique du processus décisionnel, élaboré

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après avoir encouragé le dialogue procédural et l'examen effectif, par le juge, de toutes les manifestations procédurales des parties pour l'élaboration de la décision, étant ingérable l'application pure et simple du précédent judiciaire à un cas concret donné, sans le rabais adéquat aux thèses construites par les sujets. Il est entendu qu'un nouveau conditionnement du processus coopératif résulte de l'exercice de la compétence, ce qui est précisément la considération des arguments de tous les sujets de procédure. Il est suggéré de repenser le système d'application actuel d'un modèle antérieur du système imparfait du processus brésilien, qui vise à garantir la sécurité juridique, la prévisibilité et la fiabilité fondée sur l'intégration verticale de la décision du tribunal et le sujet de magistrat à la jurisprudence, contraignant ou persuasif. Il adopte comme méthodologie la recherche bibliographique, avec l'analyse de la doctrine connexe, de la législation et de la jurisprudence.

Mots clés: Juridiction démocratique. Théorie des précédents judiciaires.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 13 2 O EXERCÍCIO DA JURISDIÇÃO NO ESTADO BRASILEIRO ... 16

2.1 A LEGITIMIDADE DEMOCRÁTICA DO EXERCÍCIO DA

JURISDIÇÃO ... 29 2.2 O PROCESSO DE TOMADA DA DECISÃO JUDICIAL ... 36 2.3 O CONTROLE DA DISCRIONARIEDADE JUDICIAL POR MEIO

DA ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA ... 42 2.4 A JUSTIFICAÇÃO RACIONAL DAS DECISÕES JUDICIAIS NO

PROCESSO EM CONTRADITÓRIO ... 49 2.5 A CRIATIVIDADE DECISÓRIA JUDICIAL NO SISTEMA DE

CLÁUSULAS ABERTAS E NOS CASOS DE ANOMIA ... 57

3 O MODELO DE PRECEDENTES BRASILEIRO ... 66

3.1 A “COMMOLOWRIZAÇÃO” DO DIREITO BRASILEIRO NA ADOÇÃO

DO SISTEMA DE PRECEDENTES JUDICIAS ... 69 3.2 O PRECEDENTE COMO DISCURSO DA DECISÃO JUDICIAL ... 72 3.3 OS INSTRUMENTOS PROCESSUAIS DE APLICAÇÃO DOS

PRECEDENTES NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015 ... 81

4 CONCLUSÃO: UMA PROPOSTA DE EXERCÍCIO DEMOCRÁTICO DA JURISDIÇÃO COMPATIBILIZADA COM O MODELO DE PRECEDENTES JUDICIAIS BRASILEIRO ... 98 REFERÊNCIAS ... 104

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1 INTRODUÇÃO

O Poder Judiciário assume, no Estado Democrático Constitucional de Direito brasiliero, o papel destacado de responsável último, entre os poderes republicanos, pela preservação do princípio democrático e pela efetivação dos direitos fundamentais, individuais e sociais, consagrados na Constituição Republicana de 1988.

Certo que, ao exercer a função defensiva de preservação da higidez da Constituição, o Poder Judiciário assegura a vontade democrática do povo, patenteada no texto constitucional, sobretudo para que não venha a ser deturpada por maiorias eventuais, que ultrapassem os limites admissíveis do uso público da razão e estejam em busca de seus interesses próprios.

Entretanto, o contemporâneo protagonismo assumido pelos juízes nesse mister enseja uma importante reflexão a respeito do déficit de legitimidade da sua atuação, que deflui especialmente do caráter contramajoritário de sua investidura, de modo que há a necessidade de que o exercício da jurisdição reforce, por outra via que não é a eleição popular, a própria assunção desse desiderato constitucional.

Assim, se adere a ideia de que o papel essencial e legítimo da jurisdição, relativo à promoção da pacificação social, revelando a justiça para o caso concreto, é realizado por meio da justificação e da fundamentação racional das decisões judiciais, produzidas a partir de um amplo debate produzido no processo em contraditório.

Esse dever de fundamentação das decisões judiciais deve levar em consideração critérios analíticos e hermenêuticos na compreensão, interpretação e aplicação do direito, de modo que sabidamente não basta, nesse contexto pós-positivista, que o juiz promova, pura e simplesmente, a aplicação da norma geral e abstrata ao caso concreto, para a formulação da jurídica individualizada.

A atuação democraticamente legítima do juiz pode ser pensada, portanto, como aquela que, além de atentar-se à lei e às particularidades do caso concreto, resulta da apreciação/conformação dialética das teses construídas pelas partes na defesa dos seus interesses. A decisão judicial deve

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ser analiticamente fundamentada e produto dos influxos de todos os atores que estão envolvidos, direta ou indiretamente, na sua elaboração, sejam eles as partes e seus advogados, os tribunais e sua jurisprudência, a academia e seus doutrinadores, e, ainda, a sociedade civil organizada.

Desse modo, adota-se uma perspectiva de decisão judicial argumentativa, construída a partir dos discursos das partes do processo, afastando uma lógica meramente subsuntiva do caso à lei e, também, aos precedentes judiciais, legitimando-se o ato decisório por ser dotado de uma fundamentação adstrita ao debate processual, na concreção de um processo justo e democrático.

Reforça-se que a construção da norma para o caso concreto, além de não resultar de uma imediata subsunção à lei, também não se restringe ao enquadramento do caso a uma moldura delineada pelos precedentes judiciais, o que fica evidente em vista da própria anomia e da insuficiente adequação casuística do que produziu o Legislativo e o próprio Poder Judiciário, considerando-se, sobremaneira, a complexidade e pluralidade social da modernidade, que revela, não raras vezes, ao magistrado, a tarefa de decidir casos difíceis e/ou inéditos.

Mais que isso, a contemporânea sistemática processual de observância dos precedentes judiciais não pode importar no perfazimento de uma jurisdição ao gosto antidemocrático, simplesmente aderindo-se às decisões pretéritas e de órgãos jurisdicionais superiores, sem preocupação cognitiva adequada às particularidades do caso, à semelhança do que fazia o moderno magistrado “la bouche de la loi” no contexto de aplicação subsuntiva da lei, agora o fazendo em relação aos precedentes – o que pode ser democraticamente ainda pior, tendo em vista que a norma-premissa é a produzida pelo próprio Poder Judiciário, apartada das discussões parlamentares de representação popular.

É necessário, portanto, um exame crítico da conformação da segurança jurídica e da tutela da previsibilidade e confiabilidade, que foi objetivada pelo atual Código Processual Civil a partir da verticalização da decisão judicial e da indesejável sujeição irrefletida do magistrado aos

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precedentes judiciais, como conteúdo decisório aplicável a uma infinidade de casos, em prejuízo do necessário estabelecimento do diálogo processual entre as partes e entre estas e o juiz.

Importante também considerar a relação existente entre a fundamentação das decisões judiciais e a dimensão política que a jurisdição assume no Estado Democrático. Nesse sentido, a decisão judicial é dotada de um duplo compromisso: o primeiro deles que pode ser identificado numa perspectiva interna ao processo, volta-se à prestação de uma tutela jurisdicional tempestiva, adequada e efetiva; o segundo, com pertinência à uma vocação externa ao ato decisório e ao processo em si, é relativa à unidade do direito através da preservação da coerência e integridade do ordenamento jurídico, à interlocução com a sociedade e contemplando uma preocupação contemporânea de uniformização e estabilidade da jurisprudência.

O debate é fomentado pelas disposições normativas do atual Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/15), que orientam o magistrado à observância de precedentes judiciais, de eficácia persuasória e, até mesmo, vinculante do exercício da jurisdição, dispondo, por exemplo, sobre a súmula impeditiva de recursos, o funcionamento de Turmas de Uniformização de Jurisprudência, sobre a possibilidade de reforma da decisão monocraticamente pelo Relator de recursos nos Tribunais quando contrariar a jurisprudência dos órgãos jurisdicionais hierarquicamente superiores ao prolator da decisão, entre outros. Também importa o destaque das normas processuais contempladas na referida lei que pretendem o exercício mais democrático e participativo das partes, do juiz e da sociedade civil no curso de um procedimento em contraditório, como a atuação destacada do amicie curiae e a criação dos incidentes de assunção de competência e de resolução de demandas repetitivas.

Uma reflexão se propõe, então, sobre a sistemática de aplicação atual de um modelo de sistema de precedentes, mal arremedado para o processo brasileiro, e que objetive equivocadamente garantir segurança jurídica, previsibilidade e confiabilidade fundada na verticalização da decisão judicial e na sujeição do magistrado aos precedentes judiciais.

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Espelha-se uma preocupação, ainda, com a própria trajetória de formação da convicção do julgador, a sua aproximação do problema posto, seu acurado exame, a ponderação das outras decisões possíveis e suas respectivas consequências, o dimensionamento de seu alcance, inclusive para além dos sujeitos processuais.

Essas reflexões encontram aporte em uma pesquisa bibliográfica, analítica da doutrina correlata, da legislação e da jurisprudência, a respeito da necessidade de uma maior legitimação democrática da decisão judicial, que se conforme com o exercício democrático da jurisdição brasileira, fazendo valer mais do que instrumentos racionais para o procedimento justificador do ato decisório.

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2 O EXERCÍCIO DA JURISDIÇÃO NO ESTADO DEMOCRÁTICO CONSTITUCIONAL DE DIREITO BRASILEIRO

A Constituição Republicana de 1988 inaugurou um Estado Constitucional Democrático de Direito comprometido com o ideário de legitimidade no exercício do poder político, arraigado da concepção de que o ser humano é o centro da organização política democrática e a estrutura de poder estatal deve servir à promoção de sua dignidade.

Esse novo modelo constitucional de Estado rechaça as restrições de outrora às liberdades públicas e prestigia um extenso rol de garantias individuais e coletivas, com a qualidade de serem cláusulas pétreas e que devem ser compreendidos como as condições jurídicas de institucionalização do processo legislativo democrático e de exercício das atividades próprias de cada um dos poderes republicanos.

A emergência desse Estado Constitucional Democrático de Direito trouxe, indeclinavelmente, significativas transformações sociais e os direitos fundamentais passaram a ser os pilares ético-jurídico-políticos da organização estatal, do poder e da sociedade, servindo de parâmetros para a interpretação dos fenômenos jurídico-constitucionais, além de ter conferido merecido destaque à força normativa dos princípios.

A normatividade que deflui dos princípios no contexto pós-positivista ou constitucionalista contemporâneo passa a informar toda ordem de ideias no exercício e proteção dos direitos constitucionais, individuais, sociais e coletivos, revelando-se temperamento para o exercício da atividade dos poderes e, notadamente, na atuação do Poder Judiciário, que assume um papel protagonista na função protetiva dos direitos e interesses constitucionalmente assegurados.

Sobre esse momento transicional pós-positivista em que exsurge com destaque a força normativa dos princípios e o desfazimento da distinção clássica entre princípios e normas, esclarece Paulo Bonavides que essa nova

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compreensão, após a transição crucial do seu locus enunciativo da ordem jusprivatista dos Códigos para a órbita juspublicística das Constituições, importa na consolidação da passagem dos princípios da especulação metafísica e abstrata, próprio dos estudos jusfilosóficos, para o campo concreto e positivo do Direito, no campo da Ciência Jurídica, e, a despeito do baixo grau de densidade normativa, tem por ˜mais significativo de seus efeitos: a total hegemonia1 e preeminência dos princípios”2.

O novo modelo de Estado Constitucional Republicano contempla, ainda, uma nova compreensão ao princípio da separação de Poderes, que não deve mais ser entendido como um meio a proporcionar, tanto quanto possível, uma separação rígida de funções, mas sim uma coordenação, colaboração ou um entrosamento entre as distintas funções estatais, numa relação de interdependência, de modo a permitir que cada poder, além de suas funções típicas, possa, em caráter secundário, colaborar com os demais poderes, ou mesmo desempenhar funções que, teoricamente, não pertencem ao seu âmbito de competência, tendo em vista o fim marcadamente dirigente da nossa lei fundamental.

No seio desse novo paradigma, não obstante se deva reconhecer a independência orgânica de cada um dos poderes, de modo que não se admita qualquer relação de subordinação ou dependência entre uns e outros no que tange ao exercício de suas funções3, há uma contemporênea dicção de que a Constituição Federal de 1988 instituiu um mecanismo de controle mútuo, que enseja interferências de uns em outros no estabelecimento de um sistema de

1

A respeito da hegemonia dos princípios, interessa o destaque de trecho do voto do Ministro Relator Eros, no julgamento da ADI 246 pelo Supremo Tribunal Federal: “Não há falar em quebra do pacto federativo e do princípio da interdependência e harmonia entre os Poderes em razão da aplicação de princípios jurídicos ditos "federais" na interpretação de textos normativos estaduais. Princípios são normas jurídicas de um determinado direito, no caso, do direito brasileiro. Não há princípios jurídicos aplicáveis no território de um, mas não de outro ente federativo, sendo descabida a classificação dos princípios em "federais" e "estaduais". (STF, ADI 246, rel. min. Eros Grau, j. 16-12-2004, DJ de 29-4-2005). Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/ constituicao.asp> Acessado em: 20 dez. 2017.

2 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 294. 3 Em consagração dessa não subordinação, preservando hígida a separação de poderes,

pertine o destaque do enunciado sumular n. 649 do Supremo Tribunal Federal: “É inconstitucional a criação, por Constituição estadual, de órgão de controle administrativo do Poder Judiciário do qual participem representantes de outros Poderes ou entidades”, bem assim da Súmula Vinculante n. 37: “Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob o fundamento de isonomia.”

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freios e contrapesos, à busca do equilíbrio necessário à realização do bem da coletividade e indispensável para evitar o arbítrio e os desmandos de um poder em detrimento do outro, o que operaria em prejuízo da sociedade em geral, contrariando os próprios ideais republicanos.

Vê-se, dessa forma, que a mencionada Constituição inovou profundamente no que concebe como função do Poder Judiciário, especialmente no âmbito do Estado Social, em que os poderes Legislativo e Executivo não cumprem adequadamente a incumbência constitucional ou nada fazem para criar as condições materiais necessárias à efetividade dos direitos sociais.

Dessa constatação deflui que o juiz passa a ser o responsável, também, em certa medida, pelo sucesso político das finalidades impostas aos demais poderes4, por uma exigência do Estado do bem-estar social, de modo

que, não obstante ao mencionado poder não se atribua a função de criar políticas públicas5, cabe-lhe a irrenunciável tarefa de impor a execução daquelas políticas previstas e comandadas pela Constituição, de acordo com os postulados da justiça social, que é a base de legitimação de todos os Estados contemporâneos, notadamente dos estados subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, como é o caso do Estado brasileiro.

Destaca-se o Poder Judiciário, nesse sentido, a partir da superação da ideia de que se trata de um poder politicamente neutralizado por força do princípio da legalidade e do princípio da subsunção racional-formal, orientador da aplicação do direito por um mecanismo de subsunção lógica de fatos a normas, desprovidas totalmente de referências sociais, éticas ou políticas.6

4 Nesse sentido é que Antoine Garapon antevê no juiz o

“guardador das promessas” e visualiza na justiça o “muro das lamentações da cena contemporânea”. (ABREU, Pedro Manoel. Magistratura como justiça cidadã: juiz cidadão como paradigma de uma justiça humanizada. Seminário apresentado na Academia Judicial CEJUSC, Florianópolis, 2013).

5 As restrições impostas ao exercício das competências constitucionais conferidas ao Poder

Executivo, incluída a definição de políticas públicas, importam em contrariedade ao princípio da independência e harmonia entre os Poderes.” (STF, ADI 4.102, rel. min. Cármen Lúcia, j. 30-10-2014, P, DJE de 10-2-2015) Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/ constituicao.asp> Acessado em: 20 dez. 2017.

6 SANTOS, Boaventura de Sousa; MARQUES, Maria Manuel Leitão; PEDROSO, João. Os

tribunais nas sociedades contemporâneas. Disponível em <http://www.anpocs.org.br /portal/publicacoes/rbcs_00_30/rbcs30_07.htm>. Acesso em 23 mar. 17.

(26)

O próprio princípio da inafastabilidade da prestação juridisdicional (ou judicial review norteamericano) enunciado no artigo 5o, inciso XXXV, da Constituição Republicana7, já determina que nem o direito posto pelo Estado, na forma da lei, poderá afastar da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, o que confirma a ideia da possibilidade aberta ao magistrado para promover o reequilíbrio acima apontado.

Certamente que o Poder Judiciário não pode vir a intervir em esfera reservada a outro Poder para substituí-lo em juízos de conveniência e oportunidade, querendo controlar as opções legislativas e executivas no atendimento das demandas sociais, usurpando e tomando para si toda a atuação constitucionalmente repartida aos outros poderes8; contudo, quando

os órgãos de direção política, relativos aos poderes legislativo e executivo, falham ou se omitem na implementação de políticas públicas destinadas à efetivação dos direitos sociais e dos objetivos fundamentais9, especialmente

7

“Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;”

8 “Não cabe, ao Poder Judiciário, em tema regido pelo postulado constitucional da reserva de lei, atuar na anômala condição de legislador positivo (RTJ 126/48 – RTJ 143/57 – RTJ 146/461-462 – RTJ 153/765, v.g.), para, em assim agindo, proceder à imposição de seus próprios critérios, afastando, desse modo, os fatores que, no âmbito de nosso sistema constitucional, só podem ser legitimamente definidos pelo Parlamento. É que, se tal fosse possível, o Poder Judiciário – que não dispõe de função legislativa – passaria a desempenhar atribuição que lhe é institucionalmente estranha (a de legislador positivo), usurpando, desse modo, no contexto de um sistema de poderes essencialmente limitados, competência que não lhe pertence, com evidente transgressão ao princípio constitucional da separação de poderes.” (STF, MS 22.690, rel. min. Celso de Mello, j. 17-4-1997, P, DJ de 7-12-2006 e MI 708, rel. min. Gilmar Mendes, j. 25-10-2007, P, DJE de 31-10-2008)

9 Nesse sentido, destacam-se relevantes julgados do STF: “É lícito ao Judiciário impor à

administração pública obrigação de fazer, consistente na promoção de medidas ou na execução de obras emergenciais em estabelecimentos prisionais. Supremacia da dignidade da pessoa humana que legitima a intervenção judicial.” (STF, RE 592.581, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, j. 13-8-2015, DJE de 1º-2-2016, Tema 220), “O Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a administração pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais, sem que isso configure violação do princípio da separação dos poderes, inserto no art. 2º da CF” (STF, RE 669.635 AgR, Relator Ministro Dias Toffoli, j. 17-3-2015, 2ª Turma, DJE de 13-4-2015), “A controvérsia objeto destes autos – possibilidade, ou não, de o Poder Judiciário determinar ao Poder Executivo a adoção de providências administrativas visando à melhoria da qualidade da prestação do serviço de saúde por hospital da rede pública – foi submetida à apreciação do Pleno do STF na SL 47 AgR, rel. min. Gilmar Mendes, DJ de 30-4-2010. Naquele julgamento, esta Corte, ponderando os princípios do mínimo existencial e da reserva do possível, decidiu que, em se tratando de direito à saúde, a intervenção judicial é possível em hipóteses como a dos autos, nas quais o Poder Judiciário não está inovando na ordem jurídica, mas apenas determinando que o Poder Executivo cumpra políticas públicas previamente estabelecidas.”

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elencados no art. 3º da Constituição Federal10, cumpre ao Poder Judiciário adotar uma posição dinâmica na realização das finalidades do Estado Social, desenvolvendo e efetivando diretamente os preceitos constitucionais definidores desses direitos sociais11.

Em outras palavras, o princípio da supremacia da lei, amplamente influenciado pelos valores do Estado liberal, que enxergava na atividade legislativa algo perfeito e acabado, atualmente deve ceder espaço à crítica judicial, no sentido de que o magistrado, necessariamente, deve dar à norma geral e abstrata aplicável ao caso concreto uma interpretação consentânea com as normas e valores constituinalmente encetados, inclusive exercendo o controle de constitucionalidade da norma, bem como viabilizando a melhor forma de tutelar os direitos fundamentais.12

A atividade judicial também não deve descurar, nesse desiderato interpretativo, do condicionamento recíproco que há entre a Constituição (STF, RE 642.536 AgR, Relator Ministro Luiz Fux, j. 5-2-2013, 1ª Turma, DJE de 27-2-2013) e “Embora resida, primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo, a prerrogativa de formular e executar políticas públicas, revela-se possível, no entanto, ao Poder Judiciário, determinar, ainda que em bases excepcionais, especialmente nas hipóteses de políticas públicas definidas pela própria Constituição, sejam estas implementadas pelos órgãos estatais inadimplentes, cuja omissão – por importar em descumprimento dos encargos político-jurídicos que sobre eles incidem em caráter mandatório – mostra-se apta a comprometer a eficácia e a integridade de direitos sociais e culturais impregnados de estatura constitucional. A questão pertinente à "reserva do possível". (STF, RE 436.996 AgR, Relator Ministro Celso de Mello, j. 22-11-2005, 2ª Turma, DJ de 3-2-2006).

10 “Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir

uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”

11A cláusula da reserva do possível

– que não pode ser invocada, pelo poder público, com o propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria Constituição – encontra insuperável limitação na garantia constitucional do mínimo existencial, que representa, no contexto de nosso ordenamento positivo, emanação direta do postulado da essencial dignidade da pessoa humana. (...) A noção de "mínimo existencial", que resulta, por implicitude, de determinados preceitos constitucionais (CF, art. 1º, III, e art. 3º, III), compreende um complexo de prerrogativas cuja concretização revela-se capaz de garantir condições adequadas de existência digna, em ordem a assegurar, à pessoa, acesso efetivo ao direito geral de liberdade e, também, a prestações positivas originárias do Estado, viabilizadoras da plena fruição de direitos sociais básicos, tais como o direito à educação, o direito à proteção integral da criança e do adolescente, o direito à saúde, o direito à assistência social, o direito à moradia, o direito à alimentação e o direito à segurança. Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana, de 1948 (art. XXV)”. (STF, ARE 639.337 AgR, 2ª Turma, Relator Ministro Celso de Mello, j. 23-8-2011, DJE de 15-9-2011)

12 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: teoria geral do processo. vol. 1. São

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jurídica e a realidade social – na esteira do que teorizou Konrad Hesse a respeito da força normativa da constituição –, conferindo-lhe uma pretensão de eficácia que não se confunda com as condições históricas e axiológicas de sua realização, mas que a elas se associe como elemento autônomo, como expressão não apenas do "ser”, mas também do "dever ser".

Dessa forma, a coexistência de valores e princípios sobre os quais hoje deve basear-se necessariamente uma Constituição – para não renunciar a seus atributos de unidade e integração e, ao mesmo tempo, não se fazer incompatível com a sua base pluralista –, exige que cada um desses valores e princípios se assuma com caráter não absoluto, compatível para convivência harmoniona de todos eles, por meio da interpretação jurisdicional.

É nesse cenário político-jurídico constitucional que se reconhece o exercício da jurisdição como atividade criativa de normas jurídicas, mais das vezes de forma individualizada, capaz de dar densidade ao texto constitucional, sobretudo no seio de uma sociedade pluralista, em que tem a Constituição não a tarefa de estabelecer diretamente um projeto predeterminado de vida em comum, mas sim de realizar as condições de possibilidade para essa vida.13

Importa também considerar que nenhuma democracia proporciona a igualdade genuína de poder político aos seus cidadãos, embora se preconize estar centrado o poder nas mãos do povo, haja vista muitos deles, por um motivo ou outro, são inteiramente destituídos de privilégios, como bem teoriza Dworkin, nas primeira e quarta parte de sua obra “Uma questão de princípio”, ao tratar sobre o fundamento político do Direito e sobre a visão econômica desse mesmo Direito14.

Dessarte, alguns indivíduos terão a possibilidade de exigir direitos dos quais são carentes por uma omissão legislativa na sua proteção, ao

13 NUNES, Jorge Amaury Maia; NÓBREGA Guilherme Pupe da. Processo e Constituição: um casamento necessário. Disponível em <http://www.migalhas.com.br /ProcessoeProcedimento/ 106,MI270929,101048-Processo+e+Constituicao+um+ casamento+ necessario> Acessado em 15 dez. 2017.

14 DWORKIN, Ronald. Uma questão de Princípio. Luís Carlos Borges (trad). São Paulo:

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Poder Judiciário, assuntor de papel relevantíssimo para a promoção de um bem comum, ainda que tenham, para isso, que tomar decisões políticas em casos difíceis, com vistas ao equilíbrio entre os direitos individuais e o bem da comunidade, escorado em uma visão de igualdade atinente a qualquer estrutura de justiça social.

Há de se reconhecer, então, a existência de uma tensão dialética entre democracia, representatividade política e atuação jurisdicional, a respeito do que elucida Alexy15, que, embora o faça tendo por pano de fundo a atuação do Tribunal Constitucional alemão, se pode tomar por empréstimo no estudo da factualidade dessa interação no Brasil; destaca Emerson Garcia que:16

Segundo ele, ‘[...] a chave para a resolução é a distinção entre a representação política e a argumentativa do cidadão”. Estando ambas submetidas ao princípio fundamental de que todo o poder emana do povo, é necessário compreender ‘[...] não só o parlamento mas também o tribunal constitucional como representação do povo’. Essa representação, no entanto, se manifesta de modo distinto: ‘[...] o parlamento representa o

cidadão politicamente, o tribunal constitucional argumentativamente”, o que permite afirmar que este, ao

representar o povo, fá-lo de forma mais idealística que aquele. Ao final, realça que o cotidiano parlamentar oculta o perigo

de que faltas graves sejam praticadas a partir da excessiva imposição das maiorias, da preeminência das emoções e das manobras do tráfico de influências, concluindo que ‘[...] um tribunal constitucional que se dirige contra tal não se dirige contra o povo, senão, em nome do povo, contra seus representantes políticos’ (grifos nossos)

Especialmente que toca à dialeticidade entre o exercício da jurisdição e o contexto da democracia, normalmente facetada na limitação aos ímpetos da maioria e na disciplina do exercício da vontade majoritária, importa destacar a

15 Diego Werneck Arguelhes esclarece que Alexy tem sua obra destacada no estudo da teoria

argumentativa do Direito a partir da abertura de horizontes resultante do chamado ‘constitucionalismo brasileiro da efetividade’ e que o Brasil tem sido pródigo em reconstruções de modelos republicanistas, comunitaristas, liberais em mais de uma matriz, guardadas as diferenças que o contexto nacional impõe em relação aos países onde se originaram tais correntes. (ARGUELHES, Diego Werneck; LEAL, Fernando. Pragmatismo como [Meta] Teoria Normativa da Decisão Judicial: Caracterização, estratégias e implicações. In: Filosofia e Teoria Constitucional Contemporânea. Rio de Janeiro: Lumen Jurir Editora, 2009).

16 GARCIA, Emerson. Jurisdição constitucional e legitimidade democrática: tensão

dialética no controle de constitucionalidade. Disponível em: <https://bdjur.stj.jus.br/ jspui/bitstream/2011/32490/jurisdi%C3%A7%C3%A3o_constitucional_legitimidade_garcia.pdf> Acessado em 20 dez. 2017.

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proposição teórica de democracia procedimental kelseneana, segundo a qual é necessária a conformação de um discurso jurisdicional constitucional e democrático em que sobrevivam as minorias17, sem que haja fragilização da separação de poderes, preocupação outrora prenunciada por Montesquieu18.

Essa necessidade de conformação proposta emerge do problema típico das sociedades democráticas plurais da pós-modernidade, em que salta aos outros o seguinte paradoxo: de um lado, as constituições contemplam uma manifesta declaração de direitos fundamentais, de aplicabilidade direta e imediata, que ensejam uma especial proteção por parte do Estado; de outro lado, essas democracias são frutos de uma visão quantitativa do exercício do direito de escolha, mediante a qual vencem as propostas e as ideias que contam com o beneplácito da maioria da população.

Tal contexto revela um impasse: ao tempo em que a Constituição assegura direitos fundamentais, que dizem respeito tanto à maioria como às minorias, a tutela e a proteção a tais direitos restam entregues exclusivamente à quantificação resultante do interesse majoritário19.

17 Kelsen nomeou de democracia procedimental um método capaz de criar a ordem social

coletiva, que tem por maior característica a preservação da liberdade do maior número de indivíduos da sociedade. “A visão relativista de mundo justifica a democracia kelseniana, que é fundada na liberdade, já que o indivíduo é livre (autônomo) para criar suas verdades e seus valores.” (FRANÇA, Patrícia da Silva. Os Fundamentos da Democracia: Análise das Teorias Democráticas de Aristóteles, Kelsen e Bobbio. Disponível em: <http://www3. pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/graduacao/tcc/tcc2/trabalhos2007_2/Patricia_Silva.pdf>. Acessado em 21 jan. 2017).

18 Montesquieu, em diversas passagens, evidencia enorme preocupação com o Poder de

Julgar, com o que constitui, hoje, a atividade do Poder Judiciário, e busca, cautelosamente, neutralizá-lo, num exercício premonitório do que viria a acontecer mais tarde, por exemplo, nos Estados Unidos, onde se pretendeu estabelecer o chamado governo dos juízes: “O Poder de Julgar não deve ser entregue a um Senado permanente, mas exercido por pessoas tiradas do seio do povo, em certas épocas do ano, da maneira prescrita em lei, para formar um tribunal que não durará senão o quanto o exigir a necessidade. Deste modo, o Poder de Julgar tão terrível entre os homens, não estando ligado nem a um certo Estado, nem a uma certa profissão torna-se, por assim dizer, invisível e nulo. Mas, se os tribunais não devem ser fixos, devem-no os julgamentos. A tal ponto que não sejam estes jamais senão um texto preciso da lei. Fossem eles a opinião particular dos juízes, e viver -se-ia na sociedade sem saber precisamente quais os compromissos assumidos.”

19 Não se pode permitir que a lei faça uso de expressões pejorativas e discriminatórias,

ante o reconhecimento do direito à liberdade de orientação sexual como liberdade existencial do indivíduo. Manifestação inadmissível de intolerância que atinge grupos tradicionalmente marginalizados.” (STF, ADPF 291, Relator Ministro Luis Roberto Barroso, Plenário, j. 28-10-2015, DJE de 11-5-2016)

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Para Ricardo Tinoco de Goes, a superação desse paradoxo é considerada como irremediavelmente dependente da superação do próprio princípio majoritário, sendo preciso encontrar fundamento outro para a democracia do novo milênio, que, desta feita, resulte de uma visão contramajoritária; a solução estabeleceria bases devotadas à criação de um verdadeiro projeto de emancipação do cidadão brasileiro, razão porque, para o autor, seria mesmo “difícil pensarmos numa democracia participativa para o Brasil, o que, por outro lado, não nos impede de falar, de propor, de acreditar...”20.

Certo, ainda, que o paradigma do Estado Democrático de Direito pode aportar ao constitucionalismo uma nota de processualidade para a proteção efetiva dos direitos, concebendo o processo legislativo como instrumento de democracia que busque propiciar a mais ampla discussão quando do processo de criação da norma jurídica, de maneira que se reconhece ao parlamento uma destacada importância enquanto instância institucional encarregada de mediatizar a vontade popular por meio do embate político e das divergentes correntes ideológicas, as mais diversas, durante a discussão das propostas legislativas.

Entretanto, o Direito que encontra fundamento no princípio democrático, não mais compreendido como mecanismo liberal de decisão majoritária ou a partir de uma pretensa vontade geral republicana, alberga a institucionalização de processos estruturados por normas que garantam a possibilidade de participação discursiva dos cidadãos no processo de tomada de decisões.21

Exsurge daí um importante desafio à jurisdição democrática, reconhecendo-se a relevância da atividade dos juízes para a concretização das previsões constitucionais, em uma atuação que deve estar atrelada não apenas à contemplação dos fenômenos sociais, como às diretrizes éticas e morais,

20 GOES, Ricardo Tinoco de. Jurisdição democrática: uma visão procedimentalista para a tutela

substancial dos direitos. Disponível em <https://bdjur.stj.jus.br/jspui/bitstream/2011/49007/ jurisdicao_democratica_uma_goes.pdf> Acesso em 21 Out. 2017.

21 OLIVEIRA, Marcelo Andrade Cattoni de. Devido processo legislativo: uma justificação

democrática do controle jurisdicional de constitucionalidade das leis e do processo legislativo. 3. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2015.

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considerando a necessidade de proteção também dos direitos de minoria em uma sociedade plural, em exercício permanente de ponderação de valores – para o que lança mão, mais das vezes, também da hermenêutica jurídica22.

É inerente ao Estado democrático o reconhecimento de uma normatividade constitucional de proteção das minorias, expressada a partir da conjugação dos valores da fraternidade e da igualdade, que, numa sociedade marcada pelo pluralismo, só pode ser igualdade com igual respeito às diferenças, temporizadas por todos os poderes da república no exercício de suas funções.

A jurisdição constitucional brasileira não está afastada dessa perspectiva; exemplo é o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal da ADI 3.330, da relatoria do Min. Carlos Britto, envolvendo o polêmico tema das ações afirmativas de inclusão de minorias no sistema educacional superior, mais especificamente a constitucionalidade de programa governamental voltado à concessão, a indivíduos afro-descendentes, indígenas e deficientes, de bolsas de estudo em instituições privadas de ensino superior.

É inarredável que, nessa perspectiva, o Poder Judiciário assume um papel demasiadamente político, seja como legislador negativo, na hipótese do controle de constitucionalidade pela via, por exemplo, da ação direta de inconstitucionalidade por ação e a ação declaratória de constitucionalidade, ou como uma espécie de legislador positivo, como ocorre no julgamento da ação de inconstitucionalidade por omissão e do mandado de injunção.

Ressalve-se, oportunamente, que, como advertiu o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento da ADPF 153/DF, “No Estado Democrático de direito o Poder Judiciário não está autorizado a alterar, a dar outra redação, diversa da nele contemplada, a texto normativo. Pode, a partir dele, produzir distintas normas.”23

Nesse contexto, ao mesmo tempo em que a Constituição brasileira de

22 Embora esteja colocado com maior evidência neste trabalho os estudos de argumentação

jurídica e procedimentalismo discursivo, devem ser lembrados os estudos da hermenêutica filosófica na ciência do direito, que são devidos, em grande parte, à escola formada por Lenio Luiz Streck, a partir das contribuições de Ernildo Stein e da leitura conjunta que realizada de autores como Heidegger e Gadamer, aliada, ainda, à concepção de direito como integridade desenvolvida por Ronald Dworkin.

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1988 justicializa o fenômeno político, também procede à politização da justiça, à semelhança do que fizeram as Constituições do México em 1817 e da República de Weimar em 1919, ao incorporar em seus textos diversos objetivos e diretrizes políticas, transformando em questões jurídicas as questões até então marcadamente políticas.

A força do neoconstitucionalismo ora delineado é ainda maior quando se confere ao Poder Judiciário o controle da constitucionalidade das leis e da efetividade dos valores constitucionais pela via da concretização dos princípios, função judicial que ultrapassa os limites previstos na partilha das funções entre os poderes.

A enunciação dessa vocação nobre do Judiciário traz à clara lembrança a analogia de embate trazida por Ihering em seu “A luta pelo direito”, quando, pensando a reivindicação do direito como que em um campo de batalha, argumenta que a defesa de um direito subjetivo é a defesa de todo o direito, assim como o seu abandono significaria a ruína de todo o Direito. Desse modo, para ele, o caminho a seguir, quando o direito esteja ameaçado pelos ataques da injustiça, deve ser que o interessado "mova o aparelho coativo do Estado, sobretudo o judiciário, a fim de garantir o seu direito".

A relevância do papel que se atribui à jurisdição na guarda da Constituição não afasta o reconhecimento de que o Estado Democrático Constitucional confere às demais esferas do poder constituído papéis também fundamentais à normalidade democrática desejada, delegando inclusive a toda a sociedade civil a tarefa de aplicação e interpretação da Lei Maior – à semelhança de uma legítima sociedade aberta de intérpretes edificada pelas lições de Peter Häberle24 – sempre à luz dos princípios e valores fundamentais, elevados ao patamar normativo constitucional.

24 Sustenta Häberle que a interpretação constitucional não se encontra limitada à atividade dos

juízes, pois deve ser conjugada com a ideia de democracia; portanto, além dos órgãos estatais, outras pessoas influenciam na interpretação da Constituição, sejam os partícipes não estatais do processo de controle de constitucionalidade (como são os legitimados ativos, amici curiae e os peritos ouvidos pela Corte), sejam aqueles que, não envolvidos em tal processo, emitem sua opinião sobre a interpretação da Constituição, como fazem os estudiosos do direito e a opinião pública. Pode-se inferir que tal ideia encontra-se atualmente materializada na Lei nº 9.868/99, atinente ao processo de controle abstrato de constitucionalidade.

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Com efeito, sustenta Häberle que a interpretação constitucional não se encontra limitada à atividade dos juízes25, já que deve ser conjugada com a ideia de democracia e, portanto, além dos órgãos estatais, outras pessoas influenciam na interpretação da Constituição, sejam os partícipes não estatais do processo de controle de constitucionalidade, como são os legitimados ativos, amici curiae e os peritos ouvidos pela Corte, sejam aqueles que, não envolvidos em tal processo, emitem sua opinião sobre a interpretação da Constituição, como fazem os doutrinadores, estudiosos do direito, e a opinião pública; essa ideia haberleana encontra-se destacadamente materializada na Lei n. 9.868/99, atinente ao processo de controle abstrato de constitucionalidade e ecoa na preocupação dialógica com a sociedade que esboça o Código de Processo Civil atual, sobretudo para o processo decisório das demandas repetitivas.

Pode-se falar, inclusive, em um hodierno marco teórico de diálogos constitucionais que repudia a adoção de concepções juriscêntricas no campo da hermenêutica constitucional, preconizando, descritiva e normativamente, a inexistência de instituição detentora do monopólio do sentido e do alcance das disposições supremas, além de atrair a gramática constitucional para outros fóruns de discussão, que não apenas os das Cortes de Justiça.

Ademais, inexiste um sistema de supremacia judicial em sentido material que assuma uma feição definitiva, de maneira que os pronunciamentos judiciais devem ser compreendidos como última palavra provisória, vinculando formalmente as partes do processo e finalizando uma rodada deliberativa acerca da temática, sem, em consequência, fossilizar o conteúdo constitucional por determinada interpretação.

25 É plausível, em face do ordenamento constitucional brasileiro, o reconhecimento da

admissibilidade das leis interpretativas, que configuram instrumento juridicamente idôneo de veiculação da denominada interpretação autêntica. As leis interpretativas – desde que reconhecida a sua existência em nosso sistema de direito positivo – não traduzem usurpação das atribuições institucionais do Judiciário e, em consequência, não ofendem o postulado fundamental da divisão funcional do poder. Mesmo as leis interpretativas expõem-se ao exame e à interpretação dos juízes e tribunais. Não se revelam, assim, espécies normativas imunes ao controle jurisdicional.” (STF, ADI 605 MC, Relator Ministro Celso de Mello, j. 23-10-1991, P, DJ de 5-3-1993 e RE 566.621, Relatora Ministra Ellen Gracie, j. 4-8-2011, P, DJE de 11-10-2011, Tema 4) Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/constituicao.asp > Acessado em 20 dez. 2017.

(35)

A propósito, recentemente, no julgamento da ADI 4.640/DF, o Supremo Tribunal Federal reconheceu que a reflexão e deliberação a respeito de um modelo constitucionalmente adequado de financiamento de campanhas políticas não prescindia da abertura dos canais de diálogo com os demais atores políticos, quais sejam o Poder Legislativo, Executivo e as entidades da sociedade civil, valorizando os chamados diálogos institucionais constitucionais de interpretação da constituição.

Destaque-se que, no sistema de controle de constitucionalidade previsto no ordenamento jurídico vigente, o juiz de primeiro grau de jurisdição e os tribunais ordinários têm poder para deixar de aplicar norma que considerem inconstitucional, assim como para adotar as técnicas de controle da constitucionalidade denominadas de ‘interpretação conforme à Constituição’26 e

de ‘declaração parcial de nulidade sem redução de texto’27. O Judiciário,

nesses casos, contrapõe-se à produção do Legislativo, exercendo atividade criadora e dita contramajoritária.

Corroborando o que ora se afirma, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da PET 4.656, em voto relatado pela Ministra Cármen Lúcia, reconheceu que os órgãos administrativos autônomos, como são o Conselho

26 Vale destacar o emblemático julgado do Supremo Tribunal Federal a respeito da

constitucionalidade de dispositivos da Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/06) em que lançou mão da técnica da interpretação conforme à Constituição, valendo destaque o seguinte trecho de conclusão do julgado: “Deve-se dar interpretação conforme à Carta da República aos arts. 12, I; 16; e 41 da Lei 11.340/2006 – Lei Maria da Penha – no sentido de não se aplicar a Lei 9.099/1995 aos crimes glosados pela lei ora discutida, assentando-se que, em se tratando de lesões corporais, mesmo que consideradas de natureza leve, praticadas contra a mulher em âmbito doméstico, atua-se mediante ação penal pública incondicionada. (...) Representa a Lei Maria da Penha elevada expressão da busca das mulheres brasileiras por igual consideração e respeito. Protege a dignidade da mulher, nos múltiplos aspectos, não somente como um atributo inato, mas como fruto da construção realmente livre da própria personalidade. Contribui com passos largos no contínuo caminhar destinado a assegurar condições mínimas para o amplo desenvolvimento da identidade do gênero feminino.” (STF, ADI 4.424, Relator Ministro Marco Aurélio, j. 9-2-2012, DJE de 1º-8-2014 e ARE 773.765 RG, Relator Ministro Gilmar Mendes, j. 3-4-2014, DJE de 28-4-2014, Tema 713) Disponível em: <http://www.stf.jus. br/portal/ constituicao/ constituicao.asp> Acessado em 20 dez. 2017.

27 Mais recentemente, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da PET 4.656, em voto

relatado pela Ministra Cármen Lúcia, reconheceu que os órgãos administrativos autônomos, como são o Conselho Nacional de Justiça, o Conselho Nacional do Ministério Público e o Tribunal de Contas da União, podem deixar de aplicar leis que considerem inconstitucionais; para a relatora, tal conclusão é fruto do ideal de sociedade aberta de intérpretes descrito por Häberle: “A interpretação constitucional é, em realidade, mais um elemento da sociedade aberta, que envolve todas as potências públicas, participantes materiais do processo

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