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Ruas livres: insurgências do uso, desvios do espaço e direito à cidade na Belo Horizonte contemporânea

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS. Carlos Eduardo Frankiw de Andrade. Ruas Livres: Insurgências do Uso, Desvios do Espaço e Direito à Cidade na Belo Horizonte Contemporânea. Versão Corrigida São Paulo 2019.

(2) Carlos Eduardo Frankiw de Andrade. Ruas Livres: Insurgências do Uso, Desvios do Espaço e Direito à Cidade na Belo Horizonte Contemporânea. VERSÃO CORRIGIDA. Tese apresentada à Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, para obtenção do título de Doutor em Ciências.. Área de Concentração: Humanidades, Direitos e Outras Legitimidades. Orientadora: Profa. Dra. Zilda Márcia Grícoli Iokoi.. São Paulo 2019.

(3) Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte..

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(5) Nome: ANDRADE, Carlos Eduardo Frankiw de Título: Ruas Livres: Insurgências do Uso, Desvios do Espaço e Direito à Cidade na Belo Horizonte Contemporânea Tese apresentada à Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo para obtenção do título de Doutor em Ciências. Aprovado em:. Banca Examinadora Prof. Dr. ______________________________________________ Instituição: ______________________________________________ Julgamento: ______________________________________________ Profa. Dra. ______________________________________________ Instituição: ______________________________________________ Julgamento: ______________________________________________ Prof. Dra. ______________________________________________ Instituição: ______________________________________________ Julgamento: ______________________________________________.

(6) Para as companhias que tive nas ruas, suportando os estrondos de bombas, ensaiando desajeitados passos de dança.

(7) AGRADECIMENTOS. Nunca é fácil sintetizar em poucas linhas a imensidão e a multiplicidade de pessoas e gestos que tornaram as páginas que seguem materiais: são muitas, são muitos, e sempre há o risco de lacunas nas recordações. Ainda assim, vale o esboço, e as desculpas antecipadas a quem aqui, por venturas das desmemorias, injustamente não estiver. Agradeço aos meus pais, José Antonio e Vera Lúcia, cujo apoio logístico ao continuar de meus estudos foi imprescindível para que este trabalho fosse realizado. A eles, devo incontáveis gestos de estímulo e carinho que me permitiram prosseguir. Grato igualmente ao Zé, meu irmão, cujas discotecagens nestes anos todos em muito serviram para incorporar leveza ao transcorrer dos dias de estudo e pesquisa. Aos meus tios Fernando, Iara e Maria Helena, e aos meus primos Fernando, Ana e Sérgio, pelos convívios legados nos meses que perpassei em Paulicéia Desvairada. Aos companheiros antitarifários, anarcos e carnavalescos Thiago, Otávio, Jéssica, Fabi, Sara, Pabs, Kaíque, Henrique, João, Paulo, Clessio, Luiza Max, Luiza B., Hugo, Maria, Guto, Rafa, Jana e Milene: no gás lacrimogêneo ou no confete, foram vocês que ajudaram a criar as (u)topias que aqui esbocei narrar. Aos diversitaníssimos Luiz, Roberta, Fabiana, Cássia, Fábio e Cleiton: nas amizades forjadas, nos cafés e nas cabeças trituradas de nosso grupo de estudos, se encontra aqui muito do que cada uma destas irredutíveis e rebeldes subjetividades partilhou, na escrita, e no coração. Aos comparsas Igor, João Rafael e Márcio, pelos toques, cachaças, risadas e insights (não necessariamente nesta desordem) que desvelaram tantos horizontes. À Bia (flor), cuja companhia transtornou em poéticos muitos dos dias pregressos. À Mariana (pequena ornitorrinca), de cujas danças e ajudas uspianas tudo isso também foi possível. À Cassinha, pela escuta de tanto dessa vida que nos últimos anos percorri. Aos. inestimáveis. Ricardo,. Miguel,. Maria,. Pedro. e. Paulinha, pelos. descompassos, pelo suporte, pelas biritas, pelos sorrisos. Ciça, Zizi, Aninha, Boca,. 6.

(8) Fênix, Tércio, Breno, Jaburu, Bords, Larah (Larica) e enturmados, cujos churrascos, aventuras rpgísticas e festas semearam tantos alívios, tantos delírios. À Bela Arquiduquesa dos Unicórnios Cíntia Vieira da Silva, pelos inebriantes da companhia, pelo compreensivo incontável do afeto e da escuta, pelas mãos dadas em toda a trajetória de escrita: sem a ti ao lado, nada teria de tanto inspirar naquilo que aqui esbocei. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), uma inestimável gratidão pela bolsa que tudo isso possibilitou. Ao Diversitas-USP, seus professores e funcionários, incansáveis em compreensão com meus desvios, inspiradores em tantos horizontes abertos.. 7.

(9) RESUMO ANDRADE, Carlos E. F. Ruas Livres: Insurgências do Uso, Desvios do Espaço e Direito à Cidade na Belo Horizonte Contemporânea. 2019. 622 f. Tese (Doutorado em Humanidades, Direitos e Outras Legitimidades) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, Universidade de São Paulo, 2019.. Ao longo da década de 2010, a cidade de Belo Horizonte se tornou palco do aparecimento de numerosas movimentações políticas de caráter emancipatório, tendo por eixo a constituição de intervenções urbanas sobre seus espaços públicos. Atuando em meio a uma cidade marcada por uma paisagem profundamente segregada, decorrência de um histórico de desenvolvimento desigual e contraditório de seu tecido urbano, tais coletividades constituíram todo um arcabouço de práticas sócio-espaciais de contestação, diretamente direcionadas a se contrapor a tal cenário. Em meio às singularidades imersas em tais práticas, se encontra um arcabouço comum, fundamentado em confluências de coletividades atuantes em favor de efêmeras insurgências de usos diversificados de suas espacialidades públicas, que se interligam diretamente a formas de reivindicação do Direito à Cidade. Pelo seu caráter singular, concomitantemente efêmero e potencialmente transformador que se atrelam a tais usos, em sua relação para com as funções predominantes destas espacialidades, designam-se aqui suas práticas na qualidade de Desvios do Espaço. Dentre os cenários aqui investigados aonde tais práticas e confluências se materializaram, se encontram, respectivamente: as Praias da Estação, em 2010; a Assembleia Popular Horizontal, em 2013; a renovação do ativismo em favor da mobilidade urbana; a reinvenção do carnaval de rua da cidade. Em seu conjunto, as práticas e confluências estabelecidas em tais cenários apontavam para múltiplas formas de democratizar o deslocamento e o acesso à cidade, assim como permanências e convívios coletivos como formas de uso de seus espaços.. Palavras-chave: Direito à Cidade – Práticas Sócio-espaciais – Contestações Contemporâneas - Insurgência do Uso - Desvio do Espaço. 8.

(10) ABSTRACT ANDRADE, Carlos E. F. Free Streets: Use Insurgencies, Deviation of Spaces and Right to the City in the Contemporary Belo Horizonte. 2019. 622 f. Tese (Doutorado em Humanidades, Direitos e Outras Legitimidades) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, Universidade de São Paulo, 2019.. In the course of the 2010 decade, the city of Belo Horizonte became the stage of the emergence of numerous emancipatory political movements, based on the constitution of urban interventions in its public spaces. Acting amidst a city marked with a landscape of profound segregations, as an outcome of an inequal and contradictory historical development of its urban texture, these colectivities formed an understructure of challenging socio-spatial practices, directly driven to counterpose these scenery. Between the singularities of those practices, lies a common understructure, based on the confluencies of colectivities acting in favour of ephemeral insurgencies of diversified uses of its public spaces, directly interlinked with forms of claiming the Right to the City. Because of the singular characteristics of these usages, concomitantly ephemeral and potentially transformative, as well as linked in a challeging relation with the predominant functions of these spaces, these practices are here designated as Deviation of Spaces. Among the scenarios investigated where these practices and confluences materialized, the following were selected for study: the Praias da Estação, in 2010; the Assembleia Popular Horizontal, in 2013; the renewal of the urban mobility activism; the reinvention of the city street carnival. In its conjunct, the practices and confluences established in these scenarios were pointed towards multiple forms of democratizing the fhe collective displacing and the access to the city, as well as the collective permanency and living together, as shapes of the usages of the public spaces by them.. Keywords: Right to the City – Socio-spatial Practices – Contemporary Challenges – Use Insurgency – Deviation of Spaces. 9.

(11) LISTA DE IMAGENS IMAGEM 1: Praia da Estação, 2010. ............................................................................. 44 IMAGEM 2: Vista aérea da Praça da Estação. ............................................................... 46 IMAGEM 3: Faixa em Ato de Protesto durante as Jornadas de Junho de 2013 em Belo Horizonte. ....................................................................................................................... 51 IMAGEM 4: Flyer virtual do ato de protesto Vá de Branco. ......................................... 62 IMAGEM 5: Primeira Praia da Estação, 2010. .............................................................. 71 IMAGEM 6: Banhistas na Praia da Estação, 2010. ........................................................ 76 IMAGEM 7: Banhista da Praia da Estação, 2013. ......................................................... 86 IMAGEM 8: Passeata do Movimento Fora Lacerda, 2012. ........................................... 91 IMAGEM 9: Ato de protesto na Praça Duque de Caxias em solidariedade aos manifestantes turcos em favor da manutenção do Parque Gezi, em Istambul. .............. 95 IMAGEM 10: Primeiro Ato de Protesto em Belo Horizonte durante as Jornadas de Junho de 2013. .............................................................................................................. 110 IMAGEM 11: Sessão da Assembleia Popular Horizontal de Belo Horizonte, 2013 (a). ...................................................................................................................................... 113 IMAGEM 12: Sessão da Assembleia Popular Horizontal de Belo Horizonte, 2013 (b). ...................................................................................................................................... 123 IMAGEM 13: Bandeirão estendido durante a Ocupação da Câmara Municipal de Belo Horizonte, 2013. ........................................................................................................... 131 IMAGEM 14: Ato de Protesto em Belo Horizonte durante a Copa do Mundo de 2014. ...................................................................................................................................... 141 IMAGEM 15: Panfleto da Frente Única Contra o Aumento durante a campanha de 2015. ............................................................................................................................. 160 IMAGEM 16: Flyer virtual do Aulão ―O Aumento é ilegal e a gente prova‖, 2015. .. 176 IMAGEM 17: Pichação da Frente Única Contra o Aumento, 2015. ............................ 178 IMAGEM 18: Mapa do município de Belo Horizonte, dividido por suas regionais administrativas. ............................................................................................................. 195 IMAGEM 19: Mapa da trajetória do Primeiro Ato da Frente Única Contra o Aumento. ...................................................................................................................................... 196 IMAGEM 20: Faixa de Frente da passeata do Primeiro Ato de Protesto da Frente Única Contra o Aumento. ....................................................................................................... 198 IMAGEM 21: Repressão ao Primeiro Ato da Frente Única Contra o Aumento. ......... 203 IMAGEM 22: Mapa da trajetória do Segundo Ato da Frente Única Contra o Aumento. O trajeto percorrido se encontra pontilhado. ................................................................ 205 10.

(12) IMAGEM 23: Passeata do Segundo Ato da Frente Única Contra o Aumento............. 209 IMAGEM 24: Terceiro Ato da Frente Única Contra o Aumento................................. 214 IMAGEM 25: Mapa do local onde ocorreu o Terceiro Ato da Frente Única Contra o Aumento. ...................................................................................................................... 216 IMAGEM 26: Ocupação da Câmara Municipal de Belo Horizonte, 2015. ................. 222 IMAGEM 27: Duelo de MCs durante a ocupação da Câmara Municipal de Belo Horizonte, 2015. ........................................................................................................... 226 IMAGEM 28: Adesivos colados durante a ocupação da Câmara Municipal de Belo Horizonte, 2015. ........................................................................................................... 233 IMAGEM 29: Planta original da cidade de Belo Horizonte. ....................................... 241 IMAGEM 30: Desfile do Bloco Leões da Lagoinha em Belo Horizonte durante o carnaval de 1957. .......................................................................................................... 245 IMAGEM 31: Desfile do Bloco Mamá na Vaca em Belo Horizonte durante o carnaval de 2010. ........................................................................................................................ 260 IMAGEM 32: Bloco da Praia da Estação em frente à sede da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, 2010. ................................................................................................... 263 IMAGEM 33: Estandarte do Bloco Filhos de Tchá Tchá. ........................................... 270 IMAGEM 34: Mapa do percurso do Bloco Filhos de Tchá Tchá pelo bairro de Santa Tereza durante o carnaval de 2010. .............................................................................. 276 IMAGEM 35: Desfile do Bloco Filhos de Tchá Tchá no Alto dos Piolhos, durante o carnaval de 2010. .......................................................................................................... 279 IMAGEM 36: Desfile do Bloco Filhos de Tchá Tchá em Santa Tereza durante o carnaval de 2011. .......................................................................................................... 285 IMAGEM 37: Estandartes de blocos carnavalescos de Belo Horizonte durante o Bloco Vira o Santo, na Praça da Estação, 2013. ..................................................................... 297 IMAGEM 38: Flyer virtual de ensaio de blocos para marcha do Movimento Fora Lacerda, 2012. .............................................................................................................. 305 IMAGEM 39: Desfile do Bloco Filhos de Tchá Tchá durante o carnaval de 2012. .... 310 IMAGEM 40: Concentração do Bloco Filhos de Tchá Tchá em frente à sede do Centro Espírita São Sebastião, durante o carnaval de 2013. .................................................... 320 IMAGEM 41: Cortejo do Bloco Filhos de Tchá Tchá em meio às ruas da Vila Dias, durante o carnaval de 2013. .......................................................................................... 331 IMAGEM 42: Bloco Filhos de Tchá Tchá entrando no campo de futebol do Inconfidência Esporte Clube, durante o carnaval de 2013. .......................................... 333 IMAGEM 43: Bloco Filhos de Tchá Tchá no campo de futebol do Inconfidência Esporte Clube, durante o carnaval de 2013. ................................................................. 335 IMAGEM 44: Cortejo do Bloco Filhos de Tchá Tchá durante o carnaval de 2018. .... 339 11.

(13) IMAGEM 45: Mapa dos locais de realização dos desfiles do Bloco Filhos de Tchá Tchá desde sua fundação. ...................................................................................................... 340 IMAGEM 46: Flyer virtual de convocação da Semana de Mobilização contra o aumento da tarifa de ônibus em Belo Horizonte, 2019. .............................................................. 346 IMAGEM 47: Caminhão pipa durante edição da Praia da Estação em 2016............... 347 IMAGEM 48: Desfile do Bloco Vira o Santo, durante o carnaval de 2018. ................ 349. 12.

(14) SUMÁRIO INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 14 CAPÍTULO 1 – CONTESTAR, CONSTITUIR: PRAIAS DA ESTAÇÃO, ASSEMBLEIA POPULAR HORIZONTAL E AS POTÊNCIAS DEMOCRÁTICAS EM BELO HORIZONTE ............................................................................................................................ 43 A. 1.1 – ―E TINHA UM CARTAZ ESCRITO ‗OCUPE A CIDADE‘‖ .............................. 43 B. 1.2 – JANEIRO DE 2010: ―A PRAÇA É DE TUDO E DE TODOS – A PRAÇA É A NOSSA PRAIA!‖.................................................................................................................... 55 C. 1.3 – JUNHO DE 2013: ―É COMO SE AQUELE VIADUTO FOSSE UMA ÁGORA, SABE?‖ ................................................................................................................................... 90 CAPÍTULO 2 – DESVIAR, INSURGIR: A FRENTE ÚNICA CONTRA O AUMENTO E A LUTA PELO ACESSO À CIDADE EM BELO HORIZONTE (2015) .......................... 137 D. 2.1 - ―DESCOBRIMOS MUITO RÁPIDO QUE NÃO IA SER ASSIM‖ ................... 137 E. 2.2 - JULHO-AGOSTO DE 2015 - INSTIGAÇÕES: ―ERA ONDE AS PESSOAS FICAVAM E ERAM ESSAS PESSOAS QUE A GENTE QUERIA ATINGIR‖ ............... 153 F. 2.3 - AGOSTO DE 2015 – INTERRUPÇÕES: ―CAUSAR O DESCONFORTO‖ ...... 187 G. 2.4 - SETEMBRO DE 2015 - SUSTENTAÇÕES: ―A GENTE TINHA QUE MANTER O MÁXIMO POSSÍVEL NA MÍDIA, NA IMPRENSA, O FATO DE QUE O AUMENTO ERA INACEITÁVEL‖ ......................................................................................................... 217 CAPÍTULO 3 – DESVIAR, FESTEJAR: OS CORTEJOS DO BLOCO FILHOS DE TCHÁ TCHÁ E A REINVENÇÃO DO CARNAVAL DE BELO HORIZONTE (2010 – 2013) ......................................................................................................................................... 238 H. 3.1 – ―O QUÃO SEGREGADORA É A CIDADE DE BELO HORIZONTE‖ ........... 238 I. 3.2 – CARNAVAL DE 2010 – EXPERIMENTAÇÕES: ―A ONDA DE OCUPAR A CIDADE, VIVENCIAR A CIDADE‖ .................................................................................. 255 J. 3.3 – CARNAVAIS DE 2011 E 2012 – CONSOLIDAÇÕES: ―COMO ASSIM VOCÊS JUNTARAM, E TÃO ANDANDO NA RUA TOCANDO?‖ .............................................. 284 K. 3.4 – CARNAVAL DE 2013 – COMUNHÕES: ―HOMENAGEAR O BAIRRO CONCÓRDIA, QUE É UM BAIRRO TÃO AFETIVO: UM BAIRRO TÃO NEGRO, UM QUILOMBO GRANDE, UM QUILOMBAÇO!‖ ................................................................ 311 CONCLUSÃO ......................................................................................................................... 342 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................. 351 ANEXO 1 – FRAGMENTOS ETNOGRÁFICOS ............................................................... 366 ANEXO 2 – METODOLOGIA DE PREPARAÇÃO E ROTEIRIZAÇÃO DE ENTREVISTAS....................................................................................................................... 390 ANEXO 3 – RELATOS SOBRE A FRENTE ÚNICA CONTRA O AUMENTO DE 2015 ................................................................................................................................................... 401 ANEXO 4 – RELATOS SOBRE A TRAJETÓRIA DO BLOCO FILHOS DE TCHÁ THCÁ DURANTE A RETOMADA DO CARNAVAL DE RUA DE BELO HORIZONTE (2010 – 2013) ............................................................................................................................ 520. 13.

(15) INTRODUÇÃO. ”A rua? É o lugar (topia) do encontro, sem o qual não existem outros encontros possíveis nos lugares determinados (cafés, teatros, salas diversas). Esses lugares privilegiados animam a rua e são favorecidos por sua animação, ou então não existem. Na rua, teatro espontâneo, torno-me espetáculo e espectador, às vezes ator. Nela efetua-se o movimento, a mistura, sem os quais não há vida urbana, mas separação, segregação estipulada e imobilizada. Henri Lefebvre. A Revolução Urbana. Em determinado momento de seu relato, o professor e historiador Augusto Borges se dedicou a tecer considerações diretamente concernentes à geração à qual pertenceu em sua juventude, nos anos 1990:. Existe uma geração aí que encarna muito propriamente esse inferno mesmo, que foi ser jovem nos anos 1990 no Brasil: o fato de ser da classe média, classe média baixa, não salvava a gente de viver uma experiência aterradora. Existia um projeto dessa época, que incluía essa redução de horizonte muito drástica: não há espaço, não há muito pra onde você ir. Era um corredor muito curto, que é o que o mundo liberal abertamente coloca: do formar, ter um emprego. Um corredor curto de expectativa, de horizonte de exercício humano: a questão da Tatcher de que não existe mundo social, o que existe é o mundo privado. Então, a gente viveu isso: o Brasil era isso.. O panorama traçado em sua fala traduz muito do que foram algumas das primeiras experiências desta geração para com o mundo público e seus limitados horizontes de então. Retratando o prisma das angústias partilhadas por uma geração perante as perspectivas sociais redutoras que lhes eram apresentadas como ideais de vida, suas recordações também contextualizam, em parte, o próprio cenário inicial perpassado por muitas das trajetórias individuais abordadas neste estudo, em sua primeira relação com a cidade de Belo Horizonte ao seu redor – incluindo a do autor desta pesquisa. Um cenário ao qual, cumpre afirmar, despertou tanto angústias, quanto inquietações, sobre esta geração e sobre aquelas com a qual a mesma entrou em contato: foi perante o deserto de realidade apresentado nos anos 1990 para indivíduos como o próprio autor que se situam algumas das origens mais remotas do nascimento das disposições insubordinadas de encarar, e intentar transformar a capital mineira, que perfazem o corpo daquilo que este estudo recupera e dialoga. 14.

(16) Nesse ângulo, o estudo aqui apresentado também é um reflexo situado num entrecruzamento de fragmentos, por vezes descontínuos, de aspectos da trajetória pessoal do autor, seja numa perspectiva política, seja no percurso acadêmico individual que caminhou, desde sua juventude: há, como um pano de fundo da leitura aqui tecida, um entrelaçamento entre dispersas experiências de sociabilidade insubordinada na e pela cidade de Belo Horizonte por sua geração, cujas origens individuais remontam a fins da década de 1990. Dessa maneira, as narrativas aqui tecidas são um retrato dos resultantes. desses. fragmentos. de. vivências. insubordinadas,. individuais. ou. interconectadas com a geração ao qual o autor pertence: não são nem pretendem ser um retrato exclusivo de uma geração, mas sim dos resultados de contatos de parte de seus integrantes com outros espaços, outros cenários, outras gerações. Foi em meio a tais vivencias, entre shows punks e incontáveis manifestações políticas e culturais de rua, que floresceu o interesse e a simpatia para com o anarquismo enquanto corrente política, bem como o desejo de estudar seu desenvolvimento histórico no Brasil, a partir de um prisma acadêmico. Dessa trajetória, resultou uma dissertação de mestrado, tendo por tema uma análise centrada na produção colaborativa de saberes e práticas em jornais da militância anarquista no Brasil, no início do século XX. Do ponto de vista de suas origens acadêmicas, pode-se dizer que o trabalho agora apresentado também tem suas raízes em descobertas e inquietações surgidas à época: os capítulos a seguir formam narrativas que, até certo ponto, espelham o entendimento e a vivência de um anarquista, em Belo Horizonte, ao longo das últimas duas décadas. Nesse percurso, pode-se dizer que, de um lado, foi dentre os textos escolhidos para debate no grupo de estudos coordenado pela professora Zilda Márcia Grícoli Iokói, nesse período, que se deu o primeiro contato com o livro O Direito à Cidade, de Henri Lefebvre (LEFEBVRE, 2001). Ainda que sem relações diretas para com a dissertação então apresentada, sua leitura, assim como as discussões suscitadas à época, serviu como ponte de abertura a inspirar uma progressiva imersão na cena ativista existente em Belo Horizonte e, com esta imersão, a explorar, interagindo com suas diversas nuances. De sua leitura, gravou-se um entendimento e uma disposição de deparar com a cidade como espaço a reunir, simultaneamente, camadas de conflitos e de contradições, assim como de encontros e esperanças marginalizadas de transformação, que em muito guiam as narrativas aqui apresentadas.. 15.

(17) O outro lado dos legados desse período de estudos em fins da década de 2000 se encontra nas inquietações surgidas diretamente do tema pesquisado, particularmente quanto à pertinência no tempo presente das concepções que guiaram, 100 anos antes, os sujeitos investigados ao longo do mestrado. De maneira informal e despretensiosa, este trabalho é também, em parte, um perscrutar na contemporaneidade aquilo que Francisco Foot Hardman (HARDMAN, 2002) poeticamente denominou como os indícios de um vulcão extinto, outrora formado pelos magmas transformadores e em erupção das polissêmicas formas como aqueles militantes, nas mais adversas condições, ousavam lutar para mudar seu mundo. Foi como simpatizante e apoiador eventual que o autor passou a se inserir, a partir do início da década de 2010, em alguns dos cenários aqui estudados: como banhista das primeiras Praias, folião de alguns dos primeiros blocos surgidos durante a reinvenção do carnaval belo-horizontino, e participante de grupos de estudos e intervenções de coletivos autonomistas à época existentes na capital mineira. Esse conjunto de experiências serviu como verdadeira instância de transformação pessoal de formas de relacionar, e viver, em Belo Horizonte: além de revelar o quão agudo eram e são suas desigualdades, tais vivências igualmente permitiram vislumbrar e adentrar em algumas das múltiplas cidades e territórios que compõem sua paisagem social e cultural, assim como admirar suas dinâmicas e suas lutas. Tal se deu paralelamente ao acompanhamento de disciplinas ofertadas pelos programas de pós-graduação em História e em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Minas Gerais: além do aprofundamento em outras obras de Henri Lefebvre voltadas ao pensamento urbano crítico, tais disciplinas igualmente legaram a primeira aproximação com outras leituras voltadas para a problemática urbana na contemporaneidade, em particular quanto a Milton Santos, Raquel Rolnik (ROLNIK, 1999), Otília Arantes, Carlos Vainer (ARANTES; MARICATO; VAINER, 2000) e David Harvey. Até certo ponto, pode-se dizer que os diálogos aqui traçados com as obras de alguns desses autores tiveram seu início nesses anos: a leitura de suas reflexões foi fundamental para as interpretações aqui tecidas. No caso, particularmente no que tange à transposição de perspectivas teóricas gerais do pensamento lefebvriano para a compreensão das lutas urbanas contemporâneas, em suas multifacetadas dinâmicas específicas: seja na influência dos desdobramentos recentes do capitalismo sobre este cenário (SANTOS, 1997; SANTOS, 2000), seja na interligação de sua contestação para com prismas orientadores voltados à criação de instâncias e práticas de 16.

(18) radical democratização coletiva do viver na cidade (HARVEY, 2006; HARVEY, 2012). Num contexto aonde irrompiam mundialmente diversas iniciativas contestatórias urbanas, interconectadas pelo que foi designado como Movimentos Occupy (HARVEY, et. al., 2012; CASTELLS, 2013; GRAEBER, 2015), tais leituras e debates foram fundamentais não só na compreensão de tais acontecimentos, como igualmente na inspiração para florescer a ideia de investigar tais temáticas num doutorado. Nesse ângulo, pode-se dizer que, em parte, os fenômenos aqui estudados também são compreendidos como formas de irrupção de todo um arcabouço contemporâneo de contestação: seja nas formas de ocupação dos espaços, ou nas tessituras estabelecidas de confluências em favor do florescer de instâncias de poder comum (NEGRI, 2002; HARDT; NEGRI, 2002; HOLLOWAY, 2003; HARDT; NEGRI, 2005; VIRNO, 2008), tais eventos aqui são enquadrados como prospecções de outros horizontes de funcionamento, gestão e produção do cotidiano urbano contemporâneo, com múltiplas e ambivalentes reverberações espaciais e temporais. Dessa maneira, também é possível afirmar que o estudo agora apresentado procura se inserir e contribuir diretamente para com discussões e investigações voltadas aos campos do urbanismo crítico, e das contestações em torno das cidades, na contemporaneidade. Também não foi menor a influência exercida nos caminhos investigativos aqui traçados a eclosão das Jornadas de Junho de 2013, e os desdobramentos singulares surgidos, à época, em Belo Horizonte, em meio a este processo de lutas. Como um entre milhares de manifestantes em suas passeatas de rua, ou tomando parte em algumas das primeiras sessões da Assembleia Popular Horizontal e nas reuniões do coletivo Tarifa Zero em 2014, os impactos do testemunhar tais experiências foram determinantes para a seleção de um recorte investigativo contextual que contemplasse e dialogasse direta ou indiretamente com este cenário, em seus antecedentes e desdobramentos posteriores mais imediatos. Nesse aspecto, o contato e a leitura de toda uma bibliografia e todo um debate sobre este fenômeno (JUDENSNAIDER, et. al., 2013; ARANTES, 2014; CAVA; COCCO, 2014; ALVARENGA, 2016), foram fundamentais para inspirar uma investigação tendo por pano de fundo compreender as reverberações locais desse processo de lutas, assim como as origens de sua dinâmica singular nas circunstâncias recentes de Belo Horizonte. O estudo de tais investigações e debates permitiu em muito traçar instâncias de condensação num sentido comum de experiências dispersas de carnavais, Praias, atos de rua, e militância agora apresentadas: partilham perspectivas de. 17.

(19) se relacionar de maneira contestatória para com a cidade, seu cotidiano, seus espaços e seus ordenamentos predominantes. Se tal condensação era uma junção de experiências e inquietações individuais, políticas e acadêmicas, do autor, o processo de investigação conduzido tornou possível igualmente perceber que os eventos investigados se interligavam, num prisma amplo, a toda uma dinâmica histórica de contestação existente na capital mineira. São, portanto, desdobramentos atuais, diretos e indiretos, de lutas organizadas visando reivindicar diversas formas de democratização da cidade, cujas origens remontam ao contexto situado entre fins dos anos 1970 e início dos anos 1980 (SOMARRIBA, 1984; NEVES; DULCI, 1996; VELOSO, 2015). Nesse cenário amplo, uma das características mais singulares dos processos aqui investigados se situa na perspectiva de que os mesmos seriam reverberações da incorporação de todo um conjunto de influências e concepções de ativismo e contestação disseminadas no país, a partir da década de 1990: conjugando democratização organizacional com a aglutinação de temas de reivindicação de dimensões locais, e por vezes nacionais e internacionais (VINÍCIUS, 2014; SOUZA, 2015), se instaurou nesse período todo um processo de profunda renovação de perspectivas contestatórias que também teve seus desdobramentos em Belo Horizonte (OLIVEIRA, 2012). Dessa maneira, pode-se dizer que a introdução desses elementos nas circunstâncias presentes no início do século XXI em Belo Horizonte culminou por materializar radicais formas de contraposição a um histórico institucional recente, pautado seja pela atrofia das perspectivas de democratização da cidade, seja pela profunda mercantilização de sua vivência cotidiana. Neste conjunto polissêmico de resistências e de transgressões que também marcam a história recente da cidade, não foram poucos os conflitos inspirados por tais concepções que tiveram por lócus de expressão suas ruas e suas praças: nas mais variadas formas e em favor de diversas demandas, tais espaços públicos foram palcos de inúmeras práticas contestatórias, fundadas na articulação de encontros, moleculares e anônimos ou de grande vulto, em defesa de transformações democratizantes em seu cotidiano. Em meio a este arcabouço histórico transgressor, são algumas de suas expressões contemporâneas ocorridas em Belo Horizonte ao longo da década de 2010 que perfazem o foco do que aqui será investigado. Nesse sentido, a hipótese geral que norteia este estudo se encontra na perspectiva de que os cenários e coletividades a serem investigados teriam se revestido de uma relação contestatória singular, e inovadora, para 18.

(20) com as ruas, praças e territórios da capital mineira, em suas intervenções: conjugariam contraposições fundadas na articulação entre expressividade de demandas, e a politização dos usos destas espacialidades enquanto modalidade de territorialização1 das mesmas, como característica imersa em suas atuações. No último aspecto, parte-se aqui do prisma de que tal politização envolveria uma relação pautada pela explícita diversificação efêmera dos usos possíveis de tais territórios, que transgrediriam suas prescrições regulatórias institucionais: desestabilizariam suas funções predominantes de circulação, no caso das ruas, assim como a preponderância dada ao mercado como mediador de seu acesso para fins de sociabilidade coletiva na cidade, no caso de praças e demais espaços públicos. Na leitura aqui efetuada, associa-se igualmente a tal hipótese a perspectiva de que, nas alterações efêmeras decorridas dessa diversificação de usos, também se encontrariam elementos que permitiriam delineá-las como práticas voltadas a transformações, que teriam por pano de fundo uma ampla democratização de Belo Horizonte. A partir desse ângulo, o estudo aqui efetuado se dedicou a retraçar os cenários e coletividades selecionadas tendo por foco suas intervenções, suas características singulares, e de que maneiras elementos presentes em suas práticas, e nas relações tecidas por estas com os espaços públicos e territórios da cidade, permitiriam atestar sua pertinência como perspectiva interpretativa. Dentre as expressões contestatórias estabelecidas em suas ruas e espaços públicos recentemente em Belo Horizonte, foram selecionados os seguintes eventos, a serem recuperados e interpretados nesse estudo: o surgimento das mobilizações contestatórias da Praia da Estação, em 2010; sua interconexão com o aparecimento da Assembleia Popular Horizontal, durante as Jornadas de Junho de 2013; os desdobramentos e influências, diretas e indiretas, das questões levantadas por estes dois acontecimentos, no panorama político da cidade. Numa perspectiva geral, estes cenários recentes e seus desdobramentos se articulam entre si precisamente tanto pelas. 1. O entendimento do termo territorialização é inteiramente tributário da compreensão adotada por Marcelo Lopes de Souza (SOUZA, 2013), quando assevera que ―o essencial, conceitualmente, é que uma territorialização ou desterritorialização é, sempre e em primeiro lugar, um processo que envolve o exercício de relações de poder e a projeção destas relações no espaço‖ (SOUZA, 2013, p.102). Nesse prisma, mais do que um substrato puramente material, entende-se aqui a ideia de espacialidade e território como igualmente lócus de um feixe de relações socialmente instauradas ou contestadas, incluindo nessa delimitação aspectos políticos e culturais-simbólicos predominantes ou dissidentes em meio às interações constituídas por diversos agrupamentos sociais coexistentes num dado espaço. Considerando o enfoque desta pesquisa em práticas de ocupação espaciais contestatórias, os usos dos termos território e territorialização se referem, acima de tudo, à caracterização dos efeitos dissidentes de cunho democratizante das práticas sócio-espaciais das coletividades e cenários estudados sobre as dimensões simbólico-materiais predominantes nos espaços públicos ocupados de Belo Horizonte em sua atuação.. 19.

(21) abrangências daquilo que contestariam – a cidade e suas contradições, decorrentes da postura institucional de reiterado antagonismo perante os fazeres de seus habitantes -, quanto pelas formas com as quais o teriam feito: ocupariam espaços públicos, por meio de práticas interconectando expressividade política e livre diversificação coletiva de seus usos possíveis, em sentido de explícita extrapolação das prescrições existentes de suas funções, delineando em comum também o aparecimento de um arcabouço de concepção contestatória singular em Belo Horizonte. Será neste último prisma que esta investigação dialoga, e procura contribuir para com outras pesquisas produzidas sobre estes eventos. Diferentemente de abordagens que evocam o fenômeno das Praias a partir de uma perspectiva de confluência de ativismo geracional (OLIVEIRA, 2012), de sua perspectiva de sociabilidade performática (MELO, 2014) ou de suas dinâmicas referentes ao uso singular da ambiência virtual (ALBURQUE, 2013; GONZAGA, 2017), o prisma aqui estabelecido busca investigar este fenômeno como detonador de encontros de distintas cenas e coletividades, e aglutinador de práticas de contestação tendo por foco os espaços públicos da cidade, e seus ordenamentos, como eixo de narrativa. A escolha deste eixo também tem implicações no que tange à confecção de um recorte que contempla as Jornadas de Junho de 2013, e a eclosão da Assembleia Popular Horizontal naquele contexto, como desdobramentos indiretos das dinâmicas surgidas a partir deste primeiro fenômeno: nesse prisma, as Assembleias aqui são vislumbradas não tanto em relação a eventos similares ocorridos à época em outras cidades (CAVA, 2013; ALVARENGA, 2016), nem em suas interligações para com o ativismo em favor da moradia urbana (MAGALHÃES, 2015), mas sim também como formas de aperfeiçoamento e direcionamento de confluências que inicialmente se tornaram presentes a partir das Praias. Desse modo, parte-se aqui da perspectiva de que as Praias e as Assembleias impulsionaram e tornaram possível a continuidade do florescer de práticas contestatórias alicerçadas na ocupação de espaços públicos de Belo Horizonte, em outras circunstâncias. Em meio aos cenários aonde recentemente teriam se dado tal continuidade da articulação contestatória influenciada por estes eventos, dois são aqui de particular importância: o renovar do ativismo em torno da mobilidade urbana e dos transportes públicos na cidade, e a reinvenção do carnaval de rua da capital mineira. No que tange a estes, a reconstituição de suas dimensões e de suas dinâmicas se dará a partir da recuperação e interpretação das trajetórias tecidas por dois agrupamentos: a Frente 20.

(22) Única Contra o Aumento, confluência de coletividades da cena ativista de Belo Horizonte, em sua campanha contra o reajuste de tarifas de ônibus, entre julho e setembro de 2015; o Bloco Filhos de Tchá Tchá e seus cortejos carnavalescos entre os anos de 2010 e 2013, em meio ao cenário de retomada do carnaval de rua belohorizontino. Quanto ao primeiro cenário, a perspectiva alicerçada no eixo das intervenções contestatórias imprime diálogo distinto para com a bibliografia que se debruçou, em planos gerais ou locais, com o tema do ativismo em torno da mobilidade urbana: ao considerar aqui a atuação da Frente Única Contra o Aumento a partir desse prisma de recuperação de sua história, importa aqui vislumbrar de que maneiras tanto ela articulou legados do histórico recente de ativismo nesta cena na cidade (VELOSO, 2015) em torno de sua campanha, quanto de que maneiras seus participantes reelaboraram, naquele contexto, todo um arcabouço de concepções militantes nesse tema disseminadas no país, desde a década de 2000 (VINÍCIUS, 2014). Já no que tange ao carnaval, a perspectiva de recuperação da trajetória de uma de suas coletividades foi o que permitiu perceber como, a partir deste eixo geral, todo um conjunto de significados e práticas contextualmente estabelecidas nesta cena como um todo foi reformulado nos anos 2010 (DIAS, 2015), visando precisamente intensificar suas perspectivas de contestação às concepções predominantes na cidade, quanto ao uso de seus espaços públicos para fins de convívio. Dessa maneira, no entrelaçamento dos cenários selecionados, uma primeira forma de legitimar o recorte temporal e de exposição aqui adotado, quanto à seleção de eventos e de coletividades, se atém diretamente à consideração de que formam um panorama contra hegemônico singular na história recente da cidade: articulam coletividades, concepções, práticas e cenas inteiramente dedicadas a questionar e transformar diretamente seu cotidiano, tendo por eixo não somente a ocupação de espaços públicos, como sua conjugação para com a diversificação de seus usos, como uma de suas características mais marcantes (OLIVEIRA, 2012; MAGALHÃES, 2015). Além de tal eixo, tais coletividades teriam adquirido tanto um relativo grau comum de nuances de entendimento da capital mineira e seu funcionamento, quanto dos papéis atribuídos à sua atuação, que propiciam aberturas para seu delineamento em prismas mais abrangentes de compreensão de ambos. No que tange ao primeiro ponto, pode-se dizer, em linhas gerais, que se enfocarão as formas de compreensão de sua atuação, a serem aqui recuperadas, a partir de um prisma de que revelariam um entendimento de Belo Horizonte como uma 21.

(23) espacialidade regida por uma institucionalidade que, em seus cenários específicos, adotava uma postura que instaurava dimensões tanto contraditórias, quanto particularmente antagônicas às relações que teciam com a cidade. Tal antagonismo se faria, nas suas cosmovisões, seja perante as contestações que instauravam, seja, no limite, em sentido contrário a qualquer forma de autoprodução de usos de seus espaços públicos fora de seu controle: desse modo, suas compreensões, forjadas ou aprofundadas em meio aos seus cenários de atuação, tanto apontariam para a mercantilização da cidade como fator de desagregação e limitação da existência de instâncias comuns de vivência citadina, quanto à necessidade de seu combate direto. Nesse último ângulo, no recorte de compreensão aqui adotado, parte-se da ideia de que tais entendimentos igualmente carregariam consigo uma espécie de contraface, quanto aos significados atribuídos à sua própria atuação: se interligariam a prospecção de horizontes de transformação democrática da capital mineira, seu funcionamento, e seu cotidiano. De modo a aprofundar o entendimento dos significados singulares aqui atribuídos à suas intervenções, em seu caráter contestatório, pode-se dizer o realce de compreensão adotado parte do prisma de que compartilhavam um imaginário dotado de pontos de diálogo para com aquilo que Henri Lefebvre (LEFEBVRE, 1999) designa como pensamento urbanístico:. O pensamento urbanístico (não estamos dizendo: o urbanismo), isto é, a reflexão acerca da sociedade urbana, reúne os dados estabelecidos e separados pela história. [...] Ele não pode colocar-se senão do ponto de vista do encontro, da simultaneidade, da reunião, ou seja, dos traços específicos da forma urbana. Consequentemente, ele reencontra, num nível superior, numa outra escala, após a explosão (negação), a comunidade, a cidade. Ele recupera os conceitos centrais da realidade anterior para restituí-los num contexto ampliado: formas, funções, estruturas urbanas. O que se constituí é um espaço-tempo renovado, topologia distinta do espaço-tempo agrário (cíclico; que justapõe as particularidades locais), como do espaço-tempo industrial (que tende para a homogeneidade, para a unidade racional e planificada das coações). O espaço-tempo urbano, desde que não seja mais definido pela racionalidade industrial – por seu projeto de homogeneidade -, aparece como diferencial: cada lugar e cada momento não tendo existência senão num conjunto, pelos contrastes e oposições que o vinculam aos outros lugares e momentos, distinguindo-o (LEFEBVRE, 1999, p.44).. Dos parâmetros delineados por Lefebvre, importa sobremaneira ao entendimento aqui adotado de que as contraposições, interpostas pelas intervenções das coletividades a serem investigadas, buscariam transcender imperativos homogêneos e redutores de funcionamento da cidade, disseminados pelo poder estatal local. Num sentido amplo, tal se faria a partir de uma conjugação singular, imersa em suas compreensões da cidade: 22.

(24) entende-se aqui que partilhariam de um imaginário portando aspectos comuns, que se situaria na ideia de seus espaços públicos enquanto mananciais potenciais de multifacetadas sociabilidades não somente desatreladas de um prisma mercantil, como também, nas interações decorrentes dos encontros possibilitados em suas ruas e praças, profundamente democratizantes, quanto à vivência da capital mineira. Diante dessas considerações, a opção nesse estudo pelos cenários e coletividades enfocados como temas de investigação também ganha dimensões específicas. Ao enfocar a atuação do ativismo entorno dos transportes e da mobilidade urbana na capital mineira, busca-se aqui resgatar, e traçar um prisma concernente à sua importância no que tange ao deslocar por Belo Horizonte, como fator de democratização do acesso à vivência de suas múltiplas espacialidades. Já ao abordar a reinvenção de sua cena carnavalesca de rua, a partir de uma das coletividades que nela se inseriu, procura-se destacar a relevância qualitativa dos usos destes espaços, a partir de sua compreensão como agente a materializar formas de sociabilidade voltadas às permanências, encontros e convívios, tecidos a partir deste relacionar. Nessa dimensão ampla de entendimento de contestações sobre o panorama da capital mineira, conjugando circulação e permanência, busca-se precisamente investigar e destacar de que maneira suas intervenções trariam igualmente a compreensão do próprio papel político de suas contraposições aos antagonismos e contradições instauradas pelo poder estatal local, na contemporaneidade. Nesse último sentido, numa perspectiva geral, o enfoque de compreensão aqui adotado procura articular a dimensão política de suas intervenções a partir de um prisma que as situa enquanto práticas urbanas de contestação. Nesse caso, busca-se aqui, primeiramente, traçar uma perspectiva de leitura de que suas intervenções não somente interagiriam para com a esfera política existente na cidade, como igualmente o fariam a partir de um relacionar atinente à politização contestatória de seus territórios, materializada através de sua ocupação como eixo de atuação singular. De modo a aprofundar tal entendimento, cumpre colocar que o mesmo se inspira nas seguintes considerações de Henri Lefebvre (LEFEBVRE, 1999), sobre contestações citadinas:. Na contestação manifestam-se as ideologias próprias aos grupos e às classes que intervêm, aí compreendida a ideologia ou as ideologias dos que contribuíram para a elaboração dos projetos, o urbanismo ideológico. A intervenção dos ‗contestadores‘ introduz conflitos nas lógicas sociais (na sócio-lógica, que não passa da ideo-lógica). A possibilidade de contestação faz essas lógicas aparecerem enquanto ideologias e permite sua confrontação,. 23.

(25) o que mensura o grau de democracia urbana. A passividade dos interessados, seu silencio, sua prudência reticente quanto ao que lhes concerne, dão a medida da ausência de democracia urbana, isto é, de democracia concreta. Em poucas palavras, a revolução urbana e a democracia concreta (desenvolvida) coincidem. Só por essa via a prática urbana, a dos grupos e das classes, ou seja, sua maneira de viver, a morfologia da qual dispõem, pode confrontar-se com a ideologia urbanística. Assim, a contestação se transforma em reivindicação [...] (LEFEBVRE, 1999, p 124).. O panorama tramado acima por Lefebvre se encontra diretamente atrelado à compreensão do uso do termo contestação, ao longo desse trabalho. Parte-se aqui, portanto, da perspectiva de que, em dimensões abrangentes, a atuação das coletividades a serem investigadas se fundamentaria no tipo singular de relação que teciam para com os antagonismos e contradições predominantes na capital mineira e seus espaços públicos. Nesse último aspecto, coloca-se aqui que a perspectiva de abordagem se situa no entendimento de que sua atuação tanto revelaria, quanto instauraria conflitos atinentes a tais contradições e sua reiteração, através da politização explícita de seu uso. No entorno deste relacionar com tais contradições, compreende-se aqui que, no articular sua atuação em direções que as transfigurariam em reivindicações coletivas, se encontraria igualmente uma perspectiva exploratória: buscariam igualmente as extrapolar, a partir da incorporação de prismas transformadores em suas intervenções, fundados em efêmeras alterações dos funcionamentos cotidianos desses espaços, que se interligam a um horizonte de ampla e radical democratização da vivência da cidade. Dessa maneira, torna-se importante delinear aqui os significados que articulam, em perspectivas amplas, essa orientação contestatória para com os prismas de democratização inseridos nas intervenções das coletividades aqui investigadas. No caso, uma primeira dimensão dos parâmetros de entendimento aqui tecidos diz respeito ao caráter de interconexão dessa articulação para com mobilizações contemporâneas atinentes a reivindicações de transformação citadina. Nesse ângulo, compreende-se aqui que o teor do que seria reivindicado pelas coletividades aqui investigadas possui pontos de diálogo direto para com alguns dos sentidos que David Harvey (HARVEY, et. al., 2013) atribui às contestações em favor do Direito à Cidade, na atualidade:. O direito à cidade não pode ser concebido simplesmente como um direito individual. Ele demanda um esforço coletivo e a formação de direitos políticos coletivos ao redor de solidariedades sociais. No entanto, o neoliberalismo transformou as regras do jogo político. A governança substituiu o governo; os direitos e as liberdades têm prioridade sobre a democracia; a lei e as parcerias público-privadas, feitas sem transparência, substituíram as instituições democráticas; a anarquia do mercado e do. 24.

(26) empreendedorismo competitivo substituíram as capacidades deliberativas baseadas em solidariedades sociais. Culturas oposicionistas tiveram, portanto, de se adaptar a essas novas regras e encontrar novas maneiras de desafiar a hegemonia da ordem existente. Elas podem ter aprendido a inserir-se em estruturas de governança, por vezes com poderosos efeitos (tal como em numerosas questões ambientais). Recentemente, toda sorte de inovações e experimentações com formas coletivas de governança democrática e de decisão comunal têm emergido na cena urbana (HARVEY, et. al., 2013, p.29).. Diante do prisma traçado acima por Harvey, busca-se aqui enfocar, numa dimensão ampla, a interligação tecida pelas coletividades investigadas entre suas reivindicações e a democratização da vivência em Belo Horizonte. Nesse aspecto, tal interligação aqui é abordada a partir de uma perspectiva de que, no redor de suas intervenções, se encontraria também um conjunto de articulações em um prisma inteiramente voltado para a elaboração, a defesa e a ampliação dos direitos coletivos de seus habitantes. Dessa maneira, compreende-se aqui que um dos pontos específicos de suas atuações em que tal se faria presente se daria na elaboração de âmbitos inclusivos, situados em suas intervenções e nas instâncias de diálogo que teceram, ou se inseriram: seriam perpassadas por um prisma amplo de preocupação para com a incorporação, o envolvimento e a participação seja dos públicos ao redor do transcorrer de suas práticas, seja com outras searas do ativismo local. Em seu conjunto, tais âmbitos inclusivos são aqui entendidos como experimentações que abrangeriam um pano de fundo, situado numa ampla e radical democratização generalizada da própria gestão da capital mineira. Nesse sentido, as narrativas que perfazem o escopo deste estudo procuram articular a compreensão do termo democratização a partir de um enfoque holístico: inspirando-se nas perspectivas traçadas por Antonio Negri e Michael Hardt (HARDT; NEGRI, 2005) acerca do prisma político da multidão, o uso deste termo se associa diretamente à constituição de perspectivas autônomas de colaboração ativa entre contestadores, voltadas para a produção de instâncias de gestão democrática da cidade. De acordo com estes autores, tal prisma teria por eixo fundamental a construção do comum: O comum que compartilhamos, na realidade, é menos descoberto que produzido. [...] Nossa comunicação, colaboração e cooperação não se baseiam apenas no comum, elas também produzem o comum, numa espiral expansiva de relações. [...] Esta produção biopolítica e a expansão do comum que acarreta é um dos principais pilares em que se assenta hoje a possibilidade da democracia global. A segunda característica da multidão que pode ser considerada particularmente importante para a democracia é sua organização 'política'. 25.

(27) (não esquecendo que político rapidamente se amalgama com o econômico, o social e o cultural). Podemos ter um primeiro vislumbre desta tendência democrática ao contemplarmos a genealogia das modernas resistências, revoltas e revoluções, que evidencia uma tendência para a organização cada vez mais democrática, das formas centralizadas de comando ou ditadura revolucionária para organizações em rede que deslocam a autoridade para relações colaborativas. Esta genealogia revela uma tendência das organizações de resistência e revolucionárias não só para se constituírem em meios para alcançar uma sociedade democrática como para criar internamente, dentro de sua estrutura organizacional, relações democráticas. Além disso, a democracia vem-se tornando uma exigência cada vez mais disseminada em escala global, às vezes explícita mas não raro implícita nas inúmeras queixas e resistências manifestadas contra a atual ordem global. A moeda comum que circula hoje em dia em tantos movimentos e lutas de libertação através do mundo - no nível local, no regional e no global - é o desejo de democracia. Nem é preciso lembrar que desejar e reivindicar a democracia global não assegura sua concretização, mas não devemos subestimar o poder que essas demandas podem ter. (HARDT; NEGRI, 2005, p.14, 15). Do entendimento traçado acima por Hardt e Negri, cumpre, visando a compreensão da atuação das coletividades abordadas neste estudo, fundamentalmente reter. a. amplitude. daquilo. que. designam. como. demanda. democrática. na. contemporaneidade. No caso, primeiramente a relação entre concepções de incentivo à participação e instâncias colaborativas de experimentação democrática: ambas se articulariam a partir de uma perspectiva reflexiva abrangente, entre estruturação interna de coletividades e prospecção de potenciais cenários de transposição destas experiências, enquanto fonte comum de poder coletivo. Em segundo lugar, pela ótica de conjugação entre tais formatos de poder comum e seu exercício enquanto democracia: associam gestão coletiva e perspectivas de partilha e pulverização de autoridade entre seus participantes, reforçando mecanismos de incentivo à sua expansividade inclusiva. Desse modo, ainda que como pano de fundo, o olhar com o qual se contemplará as práticas de ocupação contestatória de espaços públicos, nos cenários a serem abordados, parte de um escopo de compreensão de que, em suas circunstâncias específicas, a atuação das coletividades aqui recuperadas igualmente constituem vislumbres de constituição de instrumentos de gestão coletiva participativa destas searas, enquadrada como um de seus aspectos intrínsecos mais fundamentais. Para os propósitos aqui delineados, também é importante enfatizar que tais parâmetros de compreensão se forjaram a partir do diálogo com o conjunto de dados obtidos durante o processo de pesquisa que subsidia este estudo. Nesse sentido, para este processo de coleta e interpretação de dados, o trabalho aqui apresentado optou pela utilização de uma metodologia de aproximação perante o recorte investigado, que se 26.

(28) fundamenta na fusão entre a Observação Participante, procedimentos da História Oral e o Método Progressivo-Regressivo. Já a construção da constelação de noções apresentadas ao longo da tese, oriundas do contato entre dados e conceituação pertinente, se embasa em princípios da Sociologia do Conhecimento. Como método de obtenção de dados, a Observação Participante traça suas origens em todo um conjunto de trabalhos sociológicos realizados, ao longo das primeiras décadas do século XX, pela chamada Escola de Chicago (MINAYO, 1996; HAGUETTE, 1997; VELHO, 1999). À época, essa metodologia tinha por objetivo o estudo de aspectos da sociedade estadunidense, através da inserção direta do pesquisador em meio às comunidades enfocadas. Ao longo do século XX, este instrumento foi ressignificado e utilizado no campo da antropologia para a confecção de registros etnográficos, tendo destaque sua recuperação crítica para os propósitos de estudos em antropologia urbana (VELHO, 1999; CARDOSO, 2004; BRANDÃO; STRECK, 2006). Em linhas gerais, a pesquisa que busca essa modalidade de interação pode ser estabelecida a partir da premissa de que. este tipo de contato precisa valorizar a observação tanto quanto a participação. Se a última é condição necessária para um contato onde afeto e razão se completam, a primeira fornece a medida das coisas. Observar é contar, descrever e situar os fatos únicos e os cotidianos, construindo cadeias de significação. Este modo de observar supõe, como vimos, um investimento do observador na análise de seu próprio modo de olhar. Para conseguir esta façanha, sem se perder entrando pela psicanálise amadorística, é preciso ancorar as relações pessoais em seus contextos e estudar as condições sociais de produção dos discursos. Do entrevistador e do entrevistado. Este esforço não pode ser feito se não se coloca entre parênteses os grandes paradigmas interpretativos assim como os parâmetros usados pelos entrevistados para explicar o mundo. A teoria do conhecimento nos oferece um caminho para compreender a realidade e não uma série de 'verdades' a serem comprovadas. O encontro com desconhecidos, com que se pode cultivar uma relação de alteridade, é que permite conhecer o modo de operar de sistemas simbólicos diversos que são postos em movimento por esta interlocução. O objeto do conhecimento é aquilo que nenhum dos dois conhece e que, por isso mesmo, pode surpreender. Logo, a novidade está na descoberta de alguma coisa que não foi compartilhada e não - como que a noção usual de empatia - na comunhão (CARDOSO, 2004, p.103).. Nesta pesquisa, tal modalidade de interação entre pesquisador e sujeitos investigados foi utilizada como ferramenta de aproximação e delimitação do campo de estudos2. Partindo desse método, foram desenvolvidas as seguintes atividades: inserção 2. Para o aprofundamento do entendimento das dimensões específicas da pesquisa de campo efetuada neste estudo, foi adicionado o Anexo 1 ao mesmo, aonde se encontram considerações inteiramente dedicadas a retraçar, em linhas gerais, os parâmetros em que esta experiência se deu.. 27.

(29) no Movimento Passe Livre – Belo Horizonte (MPL-BH), no período compreendido entre fevereiro de 2015 e junho de 2016, para a confecção de um diário de campo; observação direta e confecção de diário de campo dos desfiles do Bloco Filhos de Tchá Tchá, durante os carnavais dos anos de 2015, 2016, 2017 e 2018. Ainda que os dados concernentes a tais pesquisas de campo não serão utilizados aqui como fonte documental direta, é importante situar que parcela significativa tanto do que subsidia a recuperação e interpretação apresentada ao longo deste estudo advém da trajetória percorrida nessa experiência participante, quanto que o recorte de cenários escolhido se deve à mesma. Dessa maneira, essa modalidade de inserção foi crucial para a apreensão das atividades conduzidas por estas coletividades, em suas intervenções urbanas em Belo Horizonte, bem como para a delimitação dos contextos específicos escolhidos para estudo: a mobilização das Praias da Estação em 2010, como ponto fundador de dinâmicas contestatórias tendo por eixos a ocupação de espaços públicos, e a convergência diversas de coletividades dela participantes, durante as Jornadas de Junho de 2013, na Assembleia Popular Horizontal; a campanha conduzida pela Frente Única Contra o Aumento, que contou com o MPL-BH como um de seus integrantes, entre julho e setembro de 2015; os desfiles do Bloco Filhos de Tcha Tcha durante os feriados carnavalescos, entre os anos de 2010 e 2013. A demarcação específica desses contextos como privilegiados para essa investigação se justifica pela importância relativa destes acontecimentos seja na circunscrição dos cenários próprios de inserção dessas coletividades, seja pelas singularidades de sua atuação contestatória nos mesmos. No que tange à Frente Única Contra o Aumento, a pesquisa de campo realizada permitiu situar a relevância da campanha que conduziu, entre julho e setembro de 2015, a partir de dois prismas: a diversidade de coletividades que nela se inseriu, que possibilita enfoca-la como instância de atuação conjunta a recuperar, e singularizar, formatos organizatórios surgidos na capital mineira em 2013, durante o aparecimento da Assembleia Popular Horizontal; a pluralidade de modalidades de intervenção contestatória, tendo por eixo a ocupação de espaços públicos, que permite situar sua presença também como um desdobramento específico a esta cena das concepções de atuação surgidas na cidade a partir das Praias, em 2010. Considerando a singularidade organizacional e de atuação da Frente nessa campanha, a pesquisa de campo teve papel determinante nesse recorte, particularmente em assinalar a necessidade de se debruçar. 28.

(30) num foco que procurasse retraçar os caminhos de origem recente na capital mineira desses dois fatores, e de suas especificidades que ali se fizeram presentes. Já no que concerne à escolha de recorte referente à atuação do Bloco Filhos de Tchá Tchá entre os carnavais de 2010 e 2013, por vias distintas, a pesquisa de campo foi crucial em sua seleção, pelos reordenamentos de foco contextual que propiciou. No caso, este redirecionamento se deu fundamentalmente em virtude de uma característica específica dos desfiles dessa coletividade, que se fez presente durante as pesquisas de campo realizadas entre 2015 e 2018: a variação ininterrupta dos territórios de realização de seus cortejos a cada ano, ao longo desse período. A percepção desta característica singular se desdobrou, primeiramente, na necessidade de situar e compreender as origens de tais deslocamentos, aonde se tornou possível perceber que as dinâmicas existentes no carnaval de rua de Belo Horizonte, entre 2010 e 2013, foram determinantes para a incorporação desse elemento. No caso, durante a pesquisa realizada, pôde-se perceber que este fator revestiu-se de importância ainda maior, ao se ter em vista que tanto nos primeiros três carnavais desde sua fundação, entre 2010 e 2012, esse bloco realizou seus cortejos centralizados num mesmo território, quanto que, a partir de 2013, se inicia na agremiação um processo itinerante singular pela cidade. Em segundo lugar, tal reordenamento de foco também permitiu a percepção e a articulação de dois fatores: um mapear das origens da agremiação, e do ressurgir da cena carnavalesca de rua na capital mineira, como desdobramentos específicos da mobilização contestatória das Praias da Estação, em 2010; situar determinadas interconexões tecidas entre o carnaval e o ativismo na cidade, de importância especial para a compreensão do aparecimento das Assembleias Populares Horizontais, durante as Jornadas de Junho de 2013. Dessa maneira, foi precisamente o conjunto de indagações surgidas, na pesquisa de campo efetuada nos dois cenários, o que igualmente determinou a incorporação de uma ênfase e de um aprofundamento inteiramente em específico sobre os acontecimentos concernentes às Praias da Estação, e sobre a Assembleia Popular Horizontal. Tal se deu a partir da compreensão adquirida sobre esses dois cenários como pontos temporais formadores e disseminadores de todo um conjunto de concepções organizacionais, de interações e de práticas contestatórias na cidade: se tornaram fundamentais para o entendimento das dinâmicas que se deram nos contextos recuperados sobre o ativismo em torno da mobilidade e dos transportes, e no desenvolvimento da cena carnavalesca da capital mineira. Nas interconexões tecidas 29.

Referências

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