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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

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Academic year: 2018

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SÃO PAULO PUC-SP

Marjory Fornazari

A tributação por meio das contribuições previdenciárias sob o enfoque da semiótica

MESTRADO EM DIREITO TRIBUTÁRIO

(2)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Marjory Fornazari

A tributação por meio das contribuições previdenciárias sob o enfoque da semiótica

MESTRADO EM DIREITO TRIBUTÁRIO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito Tributário, sob a orientação do Prof. Doutor Paulo de Barros Carvalho

(3)

Banca Examinadora:

________________________________

________________________________

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AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, agradeço a DEUS por me conceder forças todos os dias da minha vida e, assim, me tornar apta a realizar um trabalho de tamanha importância. Ao professor, amigo, “pai” e orientador, PAULO DE BARROS CARVALHO, que tornou real meu sonho: o ingresso no mundo acadêmico.

Ao meu querido professor, ROQUE ANTONIO CARRAZZA, por ter me ensinado a amar Direito Tributário com tamanha simplicidade.

Aos meus três grandes amigos e professores, TÁCIO LACERDA GAMA, ROBSON MAIA LINS e FABIANA DEL PADRE TOMÉ, que muito me auxiliaram na produção desse trabalho.

Ao grande tributarista e professor, JOSÉ EDUARDO SOARES DE MELO, que também contribuiu na produção desse trabalho e, ainda, por seu apoio e amizade. Ao professor e amigo PAULO AYRES BARRETO que me inspirou muitas idéias para esse trabalho.

Ao ilustre professor, WAGNER BALERA, por toda a sua atenção comigo e pelos ensinamentos valiosos acerca de Direito Previdenciário.

Ao professor, filósofo e amigo, CELSO FERNADES CAMPILONGO, que me abriu os horizontes, por seu conhecimento brilhante nas questões jurídicas, históricas e sociológicas.

Ao professor EURICO MARCOS DINIZ DE SANTI e a toda a equipe do IBET, responsáveis pelo meu aprofundamento em Direito Tributário e, também, nas questões filosóficas.

A todos os meus professores de graduação na FMU (1997-2001), responsáveis pela minha formação jurídica.

(6)

“Há, sem dúvida, muitos tipos de vozes no mundo, nenhum deles, contudo, sem sentido. Se eu, pois, ignorar a significação da voz, serei estrangeiro para aquele que fala; e ele, estrangeiro para mim”. (1 Cor 14, 10-11).

Chega de mal-dizer a incerteza e a

insegurança! Vamos construir critérios para reduzi-las a partir das normas constitucionais postas, atendendo à complexidade que resulta do próprio Direito Positivo”. (Marco Aurélio Greco)

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RESUMO

FORNAZARI, Marjory. A tributação por meio das contribuições previdenciárias sob o enfoque da semiótica. São Paulo: Dissertação apresentada à banca examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito Tributário, 2010.

O presente trabalho, tomando por base a teoria da linguagem como constitutiva de realidade e do direito enquanto texto, realiza uma análise semiótica e dialógica das normas atinentes à tributação das contribuições previdenciárias; isto é, as analisa sob os três planos da linguagem – sintática, semântica e pragmática – e busca oferecer um modelo teórico de controle de validade, vigência e eficácia dentro do sistema jurídico brasileiro com o intuito de realizar um controle mais rígido na instituição, fiscalização, arrecadação e na gerência do produto da arrecadação das contribuições previdenciárias.

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ABSTRACT

FORNAZARI, Marjory. Tax by the contribution for the social insurance under the semiotics focus. São Paulo: Dissertation presented to the Examining Board of the Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, as a partial exigency to the obtainment of the Master’s Degree Certificate in Tax Law, 2010.

The present approach, based in a theory of language as constituted of the reality and the law as a text, achieves a semiotic and dialogic analysis of the rules related to the tax by the contribution for the social insurance; that is, analyses them under the three language’s degrees – syntactic, semantics and pragmatics – and try to offer a theoric model of validity, legality and efficacy inside the Brazilian law system in order to accomplish a more strict control in the institution, inspection, tax revenue and management in the product of the tax revenue of the contribution for the social insurance.

(9)

SUMÁRIO

Introdução 12 Capítulo I Fundamentos para uma análise semiótica do texto e do

discurso

16

1. O homem, a linguagem e o fenômeno comunicacional 16

2. Semiótica 19

2.1. Sintática 20

2.2. Semântica 20

2.3. Pragmática 23

3. Linguagem e realidade 25

4. Fundamentos semióticos do texto e do discurso 28

Capítulo II Análise semiótica do direito e da ciência do direito 34

1. O direito como linguagem 34

2. Análise semiótica do direito positivo 40

2.1. Sintática 40

2.2. Semântica 45

2.3. Pragmática 47

3. Análise semiótica da ciência do direito 52

3.1. Sintática 52

3.2. Semântica 53

3.3. Pragmática 55

(10)

5. Importância lingüística do Texto Constitucional de 1988: seu caráter dialógico e polifônico

58

Capítulo III Plurivocidade dos termos “previdência social”, “contribuições previdenciárias” e “solidariedade social”

67

1. Da plurivocidade 67 2. Da previdência social 68

2.1. Na ciência do direito 68

2.2. No direito positivo 69

3. Contribuições previdenciárias 70

3.1. Na ciência do direito 70

3.2. No direito positivo 71

4. Solidariedade social 73

4.1. Na ciência do direito 73

4.2. No direito positivo 75

5. A plurivocidade dos termos estudados e a importância da análise semiótica

76

Capítulo IV Análise semiótica da previdência social 79

1. Histórico da proteção social 79

1.1. No mundo 79

1.2. No Brasil 82

2. Análise semiótica da seguridade social e seus princípios informadores

86

2.1. Sintática 86

2.2. Semântica 91

2.3. Pragmática 102

3. Análise semiótica da previdência social e seus princípios particulares

(11)

3.1. Sintática 106

3.2. Semântica 107

3.3. Pragmática 112

Capítulo V Análise semiótica das contribuições previdenciárias 119

1. Do conceito de tributo 119

2. As classificações das espécies tributárias na doutrina brasileira

125

3. A classificação tributária proposta pelo trabalho 131

4. As contribuições e suas espécies 135

5. Análise sintática das contribuições previdenciárias 139 6. Análise semântica das contribuições previdenciárias 151 7. Análise pragmática das contribuições previdenciárias 171

8. O modelo constitucional teórico 175

8.1. Sintática 176

8.2. Semântica 177

8.3. Pragmática 190

9. Da teoria à prática 198

Conclusões 201

(12)

INTRODUÇÃO

O presente trabalho pretende analisar semioticamente as contribuições previdenciárias de forma a construir um modelo teórico de controle de validade, vigência e eficácia das normas atinentes à atribuição de competência, instituição e destinação do produto da arrecadação das exações.

Deve-se esclarecer, inicialmente, que as contribuições previdenciárias são as exações geridas pelo Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS e que se destinam especificamente ao financiamento da Previdência Social (um dos elementos da chamada ‘Seguridade Social’).

Dissertar sobre um modelo teórico para tais contribuições significa analisá-las apuradamente dentro do ordenamento jurídico constitucional como um todo e verificar suas delimitações de validade, vigência e eficácia.

A análise semiótica consiste no estudo dos enunciados (signos/símbolos) concernentes às contribuições previdenciárias sob os três níveis da linguagem: sintática, semântica e pragmática.

A sintática está relacionada com a estrutura interna do enunciado; a semântica com a relação do enunciado com outros enunciados; já a pragmática, com a relação entre o enunciado e seus destinatários.

O ponto de partida dessa análise é o Texto Constitucional de 1988, todavia, há outros comandos que não poderão ser esquecidos, tal como a Lei nº 8.212/91.

A análise semiótica busca alcançar o sentido da tributação por meio das contribuições previdenciárias para que elas sejam utilizadas conforme os objetivos da CF/88. Por sentido da tributação entende-se a significação da utilização dos tributos pelos órgãos do Estado. A utilização das contribuições previdenciárias conforme os objetivos da CF/88 significa tributar por meio delas observando-se os valores e princípios estabelecidos pelo poder constituinte no Preâmbulo do Texto Constitucional, quais sejam, justiça social, fraternidade, liberdade, segurança, desenvolvimento e igualdade.

(13)

a abstração e a concreção do contexto de um enunciado textual e, assim, estabelecer uma interpretação muito próxima da que o enunciatário (construtor do texto) quis transmitir através da mensagem emitida.

DANIEL PULINO1 observa que: “qualquer que seja o uso do modelo semiótico adotado para o trato das questões jurídicas, seu caráter será meramente instrumental e analítico, pois a realidade a ser analisada, salvo raras exceções, apresentar-se-á de modo complexo, a envolver, concomitantemente, as dimensões sintáticas, semânticas e pragmáticas”.

Para o controle da validade, vigência e eficácia das normas, a análise semiótica é importante no sentido de que se pode alcançar a interpretação do enunciatário das normas, então posso descobrir se essa norma é pertinente com o direito positivo, quando e como ela vai ser aplicada e também se ela vai funcionar perante seus destinatários. O que até então parecia impossível aos estudiosos de Direito.

Há carência de estudos que se proponham a criar modelos teóricos de controle de validade, vigência e eficácia das normas atinentes às contribuições previdenciárias.

Ademais, há uma confusão entre contribuições previdenciárias e contribuições sociais. Muitos cientistas as tratam como sinônimas, mas, na verdade, não são.

Há, ainda, a confusão entre os doutrinadores sobre a natureza jurídica das contribuições previdenciárias. Autores como WLADIMIR NOVAES MARTINEZ, MARCUS ORIONE GONÇALVES CORREIA, ÉRICA PAULA BARCHA CORREIA, HAMILTON DIAS DE SOUZA, MARCO AURÉLIO GRECO, BRANDÃO MACHADO, LUIZ MÉLEGA e VALDIR DE OLIVEIRA ROCHA acreditam que elas não possuem natureza tributária, todavia, autores como WAGNER BALERA, MIGUEL HORVATH JUNIOR, CARLOS PEREIRA DE CASTRO, JOÃO BATISTA LAZZARI, SERGIO PINTO MARTINS, AMÉRICO MASSET LACOMBE, SACHA CALMON NAVARRO COELHO, PAULO DE BARROS CARVALHO, FABIANA DEL PADRE TOME, PAULO AYRES BARRETO, JOSÉ EDUARDO SOARES DE MELO, NICOLAU

1 “Diferentes usos da linguagem na interpretação do direito previdenciário: uma análise pragmática” in

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KONKEL JUNIOR e LEANDRO PAULSEN acreditam que elas possuem natureza tipicamente tributária.

O que justifica também esse trabalho é a falta de observância do Texto Constitucional como um todo por parte de cientistas e dos órgãos competentes para aplicar as normas, inclusive dos princípios relativos ao sistema tributário para a instituição, arrecadação, fiscalização, destinação e administração do produto da arrecadação das contribuições previdenciárias.

Há que se ressaltar que o tema das contribuições previdenciárias é bastante importante, posto que se relaciona com direitos e garantias fundamentais sociais previstas no Texto Constitucional, logo, é tema merecedor de uma análise mais acurada.

O paradigma a ser utilizado é o da linguagem como constitutiva de realidade e, portanto, tudo o que é considerado real é texto. Dessa forma, sendo o direito uma realidade, ele é texto.

Se o direito é texto, deve ser, primeiramente, analisado segundo as regras gerais de texto; ou seja, deve-se realizar uma interpretação dos enunciados jurídicos como signos (análise semiótica) e, então, analisá-lo sintática, semântica e pragmaticamente.

Esse percurso entre o plano da expressão e a finalidade acaba oferecendo um sentido para o texto que está sendo interpretado, sentido esse que gera uma significação às palavras, frases, períodos e orações do discurso jurídico.

E isso é bastante oportuno no tema das contribuições previdenciárias, posto que as normas que as veiculam são formadas por palavras e expressões eivadas de vícios de linguagem, tais como polissemia e ambigüidade.

Assim, esse trabalho pretende esclarecer qual a natureza jurídica das contribuições previdenciárias, bem como seu respectivo regime jurídico e, ainda, verificar suas materialidades e validação constitucionais, além de outros elementos importantes, sob o plano da semiótica.

(15)

O capítulo II tratará da análise semiótica do direito positivo, bem como da ciência do direito, esmiuçando-se sintática, semântica e pragmaticamente as normas jurídicas (relações com validade, vigência e eficácia) e as proposições descritivas (relações de verdade e falsidade) dos cientistas do direito, de forma a oferecer subsídios para uma análise específica de um dado tema jurídico.

O capítulo III tratará da polissemia que comporta os termos “previdência social”, “contribuições previdenciárias” e “solidariedade social” na ciência do direito e no direito positivo.

O capítulo IV tratará da análise semiótica da previdência social, passando, logicamente, pela análise semiótica da seguridade social, de maneira a deixar claro que ambas as expressões estão relacionadas, todavia, não são sinônimas. Referida análise inclui refletir sobre os princípios gerais da seguridade social, bem como sobre os específicos da previdência social e, ainda sobre validade, vigência e eficácia das normas atinentes à previdência social.

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CAPÍTULO I

FUNDAMENTOS PARA UMA ANÁLISE SEMIÓTICA DO TEXTO E DO DISCURSO

1. O homem, a linguagem e o fenômeno comunicacional

Afirmava ARISTÓTELES que o Homem é um “politikon zoon”; isto é, um ser gregário que vive constantemente em contato com outros homens como fator imprescindível para sua existência. É uma necessidade vital.

O professor JOSÉ GERALDO BRITO FILOMENO2 pondera que: “as

mencionadas necessidades são evidentemente de ordem não apenas biológica, mas sobretudo cultural, a começar pela constituição do grupo familiar, que evolui, até chegar-se ao Estado, mas não necessariamente, pois, enquanto que a nação – grupo social mais evoluído e organizado – caracteriza-se por vínculos eminentemente sociológicos, a sociedade política por excelência (Estado) caracteriza-se pela existência de vínculos políticos e jurídicos”.

Os seres humanos, portanto, permanecem em constante interação, seja ela de natureza familiar, seja ela de natureza política e jurídica. Essa interação ocorre por meio de linguagem; ou seja, através de um conjunto de signos, os quais são repassados para cada uma das pessoas por meio da comunicação (processo de transmissão de uma mensagem).

Nos dizeres de JUAN E. DÍAZ BORDENAVE3: “A comunicação confunde-se, assim, com a própria vida. Temos tanta consciência de que comunicamos como de que respiramos ou andamos. Somente percebemos a sua essencial importância quando, por um acidente ou uma doença, perdemos a capacidade de nos comunicar. Pessoas que foram impedidas de se comunicarem durante longos períodos, enlouqueceram ou ficaram perto da loucura. A comunicação é uma necessidade básica da pessoa humana, do homem social”.

Cada pessoa, enquanto produtora de linguagem, terá a sua maneira particular de expressar o seu ato de comunicação. Essa maneira específica de se comunicar é

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chamada de atos de fala, enquanto que a materialização desses atos é simplesmente chamada de fala.

Temos, portanto, o seguinte esquema:

LINGUAGEM > LÍNGUA > ATOS DE FALA > FALA

Os atos de fala são um “modo particular e individualizado pelo qual o utente exercita a língua. A fala é o exercício material da língua levado a cabo por este ou

aquele indivíduo pertencente a uma comunidade lingüística específica” 4.

Os atos de fala foram denominados por J.L.AUSTIN5, um filósofo britânico, como “atos ilocucionários”. Tais atos ilocucionários foram definidos por JOHN SEARLE6 como “a menor unidade completa possível da comunicação lingüística

humana. Sempre que falamos ou escrevemos para outra pessoa, realizamos atos ilocucionários”.

O ato ilocucionário é um ato de comunicação e todo ato de comunicação é constituído por remetente, contexto, mensagem, contacto, código e destinatário, consoante a teoria comunicativa de ROMAN JAKOBSON7; ou seja, para a ocorrência do fenômeno comunicacional, é imprescindível que haja a pessoa (remetente) que irá emitir um texto (mensagem), sob a forma verbal, musical, escrita, gestos, pinturas, gráficos ou números (código) sob determinadas circunstâncias de tempo, espaço e de pessoas (contexto) e através de um canal, tais como ondas sonoras, partituras musicais, revistas, jornais, códigos de leis, televisão, cinema, partes do corpo e quadros (contato) para um grupo determinado ou não de pessoas (destinatários).

Esse fenômeno de troca de informações entre pessoas chamado de “comunicação” ocorre por meio da linguagem.

4 Cleverson Leite Bastos e Kleber B.B. Candiotto inFilosofia da linguagem. p. 15. 5How to do things with wordsapud John Searle, Mente, linguagem e sociedade. p. 127. 6Ibid. p. 127.

7Lingüística e comunicação. p. 123. “cada um desses seis fatores determina uma diferente função da

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Assim, os homens se socializam por meio da utilização da linguagem para a troca de informações e obtenção de conhecimento. Essa linguagem se manifesta graças à capacidade comunicativa dos humanos e ocorre por meio de signos (ícones, índices e símbolos). Assim, percebe-se que a linguagem e a comunicação estão intimamente ligadas.

Confirmando tal assertiva, CRISTIANO CARVALHO8 afirma que: “A relação entre linguagem e comunicação não é uma causalidade linear, mas um processo circular. Ao passo que a comunicação pressupõe linguagem, esta só desenvolve-se com a interação comunicacional. Em verdade, linguagem e comunicação são duas dimensões de um mesmo fenômeno, qual seja, a capacidade humana de processar e conceitualizar abstratamente os dados vindos da realidade”.

Os signos normalmente se manifestam no âmbito de uma língua (código de signos em um determinado grupo cultural) e se particularizam através do ato de fala e, conseqüentemente, da fala.

FERDINAND DE SAUSSURE9 ensina que “o exercício da linguagem repousa numa faculdade que nos é dada pela Natureza, ao passo que a língua constitui algo adquirido e convencional, que deveria subordinar-se ao instinto natural em vez de adiantar-se a ele”.

A língua, portanto, é um código artificial instituído por um grupo de pessoas, tal como a língua dos surdos-mudos e, sempre se refere à linguagem humana, a qual é inerente à natureza do homem.

Sobre a imanência da linguagem para o Homem, explica ENI PULCINELLI ORLANDI10 que: “Ao procurar explicar a linguagem, o homem está procurando explicar algo que lhe é próprio e que é parte necessária de seu mundo e da sua convivência com outros seres humanos”.

A partir da linguagem, o homem é capaz de refletir e de adquirir conhecimento sobre o mundo físico que o circunda (dados brutos) e assim os transforma em realidade ao descrevê-los. Dentre toda a imensidão dos objetos presentes no mundo físico, o homem escolhe algo que considera relevante e reduz à linguagem, de modo

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a criar realidade. Ele faz o mesmo com os incontáveis eventos sociais que ocorrem: verte em linguagem somente o que lhe aprouver e, assim, cria os fatos sociais.

LEONIDAS HEGENBERG11 explica que o ser humano quando nasce é

literalmente ‘jogado’ no meio de uma porção de coisas, transformando a “circunstância em mundo. Dando sentido às coisas que o cercam, interpretando-as, o ser humano pode viver (ou, no mínimo sobreviver). Quer dizer, o ser humano, reconhece as coisas, ‘entende-as’, sabe valer-se delas, para seu benefício”.

Em suma, a linguagem é imprescindível para o homem e sua dinâmica ocorre através da comunicação; ou seja, o processo comunicativo pressupõe ao menos duas pessoas. Cada pessoa ao se comunicar utiliza um modo particular da linguagem conforme a língua do espaço em que se encontra e segundo seu ato de fala (produto do perfil do emissor e da situação em que se encontra ao realizar um ato de enunciação).

2. Semiótica

Todo esse fenômeno comunicacional composto, segundo ROMAN JAKOBSON, por remetente, contexto, mensagem, contacto, código e destinatário que se manifesta através dos atos de fala e da fala para expressar uma linguagem, que é um conjunto de signos, ao ser analisado, apresentará três instâncias: sintática, semântica e pragmática. Essas três instâncias, nada mais são do que os “níveis dos

signos”, conforme os ensinamentos de DÉCIO PIGNATARI12 e, mais ainda, são os

planos a serem percorridos pelo intérprete da mensagem para encontrar seu respectivo sentido (percurso gerador de sentido).

Na busca do sentido de um texto, esses planos praticamente se confundem; isto é, durante o processo interpretativo esses planos se entrelaçam constantemente, de forma que o intérprete deve transitar várias vezes por esses três planos – sintática, semântica e pragmática – até atingir o sentido do texto.

Qualquer um desses planos analisados isoladamente não faz qualquer sentido: para se analisar a sintática, é necessária a pragmática e para se analisar a pragmática é necessária a semântica e assim esses planos transitam circularmente o tempo todo. A percepção do plano sintático, inclusive, está relacionada com a

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posição pragmática do intérprete. É o que defende o professor MARCELO NEVES13

ao afirmar que: “A própria questão sintática da descaracterização do functor deôntico só pode ser compreendida a partir dessa variável pragmática”.

É impossível, portanto, dissecar esses três planos num processo interpretativo. Aqui nesse trabalho, os planos serão separados apenas para fins didáticos.

2.1. Sintática

A sintática ou sintaxe diz respeito à estrutura interna dos signos lingüísticos; ou seja, à gramática de uma língua e, portanto, diz respeito ao plano da expressão: as formas geométricas dos objetos (círculo, quadrado, retângulo, triângulo, oval, cilindro, cone, cubo), partes do corpo, marcas de tinta, figuras, gráficos, números, ondas sonoras, partituras musicais, imagens televisivas, imagens em películas de cinema, letras, palavras, frases, orações e períodos.

Essa gramática é explicada por NOAM CHOMSKY14 como “uma descrição da competência intrínseca do falante-ouvinte ideal”. Para CLEVERSON LEITE BASTOS e KLEBER B.B. CANDIOTTO15, “a análise lingüística em nível sintático tem por finalidade a descrição dos sistemas lingüísticos que são encarados como produto de convenções e valores sociais, de onde derivam as regras que tornam compreensíveis as intercomunicações ao nível da fala”.

Trata-se, na verdade, da primeira instância do enunciado lingüístico e, portanto, do nível que norteia o percurso gerador de sentido; isto é, a sintática funciona como uma “moldura” do processo interpretativo: todos os significados e significações obtidos pelo trabalho do intérprete devem estar contidos dentro dessa estrutura sintática, de forma que ela própria acaba sendo o limite da atividade interpretativa. Quer se dizer com isso que terá um momento em que todos os significados e significações começarão a transbordar dessa moldura.

2.2. Semântica

Trata-se do plano lingüístico em que há a compreensão do significado do signo lingüístico.

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A semântica, consoante JULIA KRISTEVA16, é “o estudo da função das palavras enquanto portadoras de sentido”; isto é, é o estudo dos significados das palavras, das frases e dos textos.

O objetivo da semântica é estar constantemente buscando dentro de uma palavra (ou texto) todos os elementos que ela comporta, os quais sempre estarão representados por palavras também. Isso porque com o passar dos tempos e, com a dinâmica da sociedade, as palavras poderão adquirir novos significados e a semântica deverá sempre estar acompanhando isso.

Segundo ALAÔR CAFFÉ ALVES17, esse nível do signo é explicado da seguinte forma: “a dimensão semântica diz respeito ao conteúdo dos conceitos e das proposições em sua relação com o mundo real ou ideal, isto é, ao que eles significam, e não apenas em relação a sua forma (sintaxe)”.

Há muitas formas para se encontrar os significados de uma palavra (ou de um texto), seja através do próprio léxico das palavras – denotação e conotação (semântica lexical), seja através das formas lógicas (semântica formal), seja através do contexto (semântica textual) e até através de traços peculiares que buscam manipular a conclusão do leitor (semântica argumentativa).

Segundo apontamentos de IRVING M. COPI.18 “Compreender um termo é saber como aplicá-lo corretamente (...)”. Esse autor também esclarece que os signos poderão ter significados intensivo ou conotativo e extensivo ou denotativo.

ANTONIO VICENTE SERAPHIM PIETROFORTE e IVÃ CARLOS LOPES19

afirmam que “tanto a denotação como a conotação são construções discursivas” fundando-se na seguinte assertiva: “Se é da linguagem que emana o sentido, é a partir de mecanismos de linguagem que se constrói efeitos de sentido tanto de denotação quanto de conotação”.

A denotação refere-se ao significado constante dos dicionários; ou seja, ao sentido usual; o difundido socialmente. OSWALD DUCROT e TZVETAN TODOROV20 explicam que “a relação de denotação concerne, por um lado, aos

16História da linguagem. p. 48.

17Lógica: pensamento formal e argumentação. p. 59. 18Introdução à lógica. p. 119.

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signos-ocorrências e não aos signos-tipos; e que, por outro lado, ela é muito menos freqüente do que se acredita: fala-se antes das coisas em sua ausência que em sua presença; ao mesmo tempo é difícil conceber qual seria o ‘referente’ da maioria dos signos”.

E a conotação, nos dizeres de RODOLFO ILARI21, “é o efeito de sentido pelo

qual a escolha de uma determinada palavra ou expressão dá informações sobre o falante, sobre a maneira como ele representa o ouvinte, o assunto e os propósitos da fala em que ambos estão engajados etc. A conotação opõe-se à denotação, que é o efeito de sentido pelo qual as palavras falam ‘neutramente’ do mundo”. Ele ainda acrescenta que: “As conotações relativas ao falante dizem respeito, mais geralmente à faixa etária, à profissão, às condições sociais e, à procedência geográfica”.

Esse estudioso também esclarece que “Os dois efeitos de sentido da conotação e denotação estão presentes em diferentes medidas em qualquer ato de fala e não é fácil dizer onde termina um e onde começa outro”.

É esse nível da linguagem, portanto, o ponto de partida do caráter dialógico da linguagem, afinal, graças ao diálogo infinito que existe entre as palavras que se pode sempre extrair significados. Como já dito, a vida em sociedade é dinâmica, os significados das palavras estão em constante mudança, e palavras sempre deverão dialogar não somente com outras palavras, mas também com o seu objeto.

O dialogismo é a capacidade que as palavras e os textos possuem de dialogar uns com os outros e também com o seu próprio objeto; isto é, o dialogismo tem a ver com o fato das palavras serem sempre referentes a algo.

Assim, é dessa função inter-relacional das palavras que se busca a semântica ora de uma palavra, ora de uma frase, de uma oração e ora de um texto e de um discurso.

Portanto, a semântica é a instância lingüística em que o intérprete busca o significado das formas contidas no plano da expressão, significado esse que consiste na denominação a ser dada àquelas formas, e que deverá sofrer mutações no decorrer dos tempos.

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2.3. Pragmática

Já a pragmática é o plano mais dinâmico da linguagem, posto que é o estudo da relação dos signos com os seus próprios utentes. Para alguns estudiosos, a pragmática deveria ser definida como a ciência do uso lingüístico em contexto, daí acreditarem que esse plano deveria ter outra denominação: contêxtica.

Ousa-se, afirmar, inclusive, a contragosto dos positivistas lógicos, que a pragmática é o nível mais importante para o processo interpretativo. Sem o “contexto” (situação fática e valorativa em que o texto é proferido), não é possível a sua percepção sintática e semântica.

Nos dizeres de ALF ROSS22, “a interpretação não tem ponto de partida lingüístico independente, mas que desde o início é determinada por considerações pragmáticas sob a forma de senso comum”.

Sem a instância pragmática, o texto tornar-se-ia algo extremamente abstrato, remoto de qualquer carga psicológica. E isso jamais pode acontecer porque um texto sempre é uma construção humana e ao elaborar um texto o homem impinge a ele uma série de valores e ideologias que comprometem seu próprio sentido. Negar a pragmática é negar o caráter humano do texto.

A pragmática, portanto, está relacionada com as convicções pessoais do usuário do signo; ou seja, a forma como um signo será utilizado pelos seus destinatários será determinada pelos seus valores, ideologia e experiências.

Vale dizer que, em termos pragmáticos, o destino do signo é incerto, tudo depende do livre arbítrio dos destinatários; isto é, seja qual for seu conteúdo sintático e semântico, sua finalidade sempre dependerá da carga psicológica de cada um de seus destinatários.

Logo, é graças a esse nível de linguagem que se pode afirmar que a linguagem jamais tocará a realidade e que o dever-ser jamais se confunde com o ser, afinal, a dinâmica dos signos depende da livre iniciativa de cada um de seus destinatários.

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A semiótica, portanto, é o estudo desses signos lingüísticos com o intuito de encontrar um sentido, uma interpretação para eles. LUCIA SANTAELLA23, adepta da semiótica peirceana, explica que: “As linguagens estão no mundo e nós estamos na linguagem. A semiótica é a ciência que tem por objeto de investigação todas as linguagens possíveis, ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de todo e qualquer fenômeno como fenômeno de produção de significação e sentido”.

Essa estudiosa também esclarece que24: “Não apenas a vida é uma espécie

de linguagem, mas também todos os sistemas e formas de linguagem tendem a se comportar como sistemas vivos, ou seja, eles reproduzem, se readaptam, se transformam e se regeneram como as coisas vivas”.

Um signo, portanto, segundo CHARLES PEIRCE25 é: “qualquer coisa que

conduz alguma outra coisa (seu interpretante) a referir-se a um objeto ao qual ela mesma se refere (seu objeto), de modo idêntico, transformando-se o interpretante, por sua vez, em signo, e assim sucessivamente ad infinitum”. Esse autor acrescenta que: “Um signo é um ícone, um índice ou um símbolo. Um ícone é um signo que possuiria o caráter que o torna significante, mesmo que seu objeto não existisse, tal como um risco feito a lápis representando uma linha geométrica. Um índice é um signo que de repente perderia seu caráter que o torna um signo se seu objeto fosse removido, mas que não perderia esse caráter se não houvesse interpretante. Tal é, por exemplo, o caso de um molde com um buraco de bala como signo de um tiro,

pois sem o tiro não teria havido buraco; porém nele existe um buraco, quer tenha

alguém ou não a capacidade de atribuí-lo a um tiro. Um símbolo é um signo que perderia o caráter que o torna um signo se não houvesse um interpretante. Tal é o caso de qualquer elocução de discurso que significa aquilo que significa apenas por força de compreender-se que possui essa significação”.

Um trovão seria um exemplo de índice; uma fotografia, um exemplo de ícone e, as palavras, de símbolos. Cada um deles guarda uma relação com o objeto: o índice é o que mantém uma relação de extrema proximidade com o objeto (tal como o trovão em relação à chuva; a fumaça em relação ao fogo; a febre e a dor em

23O que é semiótica. p. 13. 24Ibid. p. 14.

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relação à doença); o ícone é o que mantém uma relação de similaridade com o objeto (fotos, filmagem, desenhos, pinturas, gráficos e planilhas); o símbolo é o signo que não mantém qualquer relação de proximidade ou similaridade com o objeto, ele apenas representa o objeto por convenção entre seus utentes.

Abaixo, esquematiza-se a relação triádica (triângulo semiótico) estabelecida por CHARLES PEIRCE e elaborada por OGDEN e RICHARDS para os signos em geral:

Referência (significado)

Símbolo Referente (objeto)

DECIO PIGNATARI26 explica que: “OGDEN e RICHARDS o estabeleceram principalmente tendo em vista o problema do significado nos signos verbais: a linha pontilhada indica que não há ligação direta entre signo e referente, ou melhor, que a relação é apenas convencional e que só adquire significado em função do intérprete”.

Os signos, em suma, representam, de uma forma ou de outra, um objeto da realidade (dado bruto), o qual poderá ser percebido por uma série de interpretantes e, assim, ser analisado e interpretado sob óticas diversas.

3. Linguagem e realidade

A partir do estudo semiótico é possível perceber que somente através dos signos apreende-se a realidade; isto é, somente quando o ser humano em contato com os objetos do mundo empírico (dados brutos) produz um signo através da linguagem é que se verifica a realidade, de modo que sem linguagem não é possível haver realidade. Portanto, a linguagem é que constitui a realidade e somente através dela é que se adquire o conhecimento de dado objeto (seja ele natural, ideal,

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metafísico ou cultural), logo linguagem e conhecimento são redutores de complexidades e criadores de realidade.

A jurista FABIANA DEL PADRE TOMÉ27, em poucas linhas, explica esse

fenômeno: “As coisas não precedem o discurso, mas nascem com ele, pois é exatamente o discurso que lhes dá significado”.

Não existe qualquer conhecimento sem a utilização da linguagem. Somente através dela é que se poderão captar os fenômenos do mundo físico circundante; isto é, somente o ser humano com suas capacidades sensorial e intelectiva poderá comunicar a existência de “algo” para os membros da sociedade através da utilização da linguagem (gestos, desenhos, atos de fala, frases e textos escritos).

DARDO SCAVINO28, nesse sentido, chega a dizer que: “El mundo se vuelve fabula, el mundo tal cual es, solo es una fábula: fábula significa algo que se cuenta y que no existe sino en el relato; el mundo es algo que se cuenta, un acontecimiento contado y por eso mismo una interpretación: la religión, el arte, la historia son otras tantas variantes de la fábula”.

Conforme MANFREDO ARAÚJO DE OLIVEIRA29 “não existe mundo totalmente independente da linguagem, ou seja, não existe mundo que não seja exprimível em linguagem. A linguagem é o espaço de expressividade do mundo, a instância de articulação de sua inteligibilidade”.

Nesse sentido o professor PAULO DE BARROS CARVALHO ensina que: “O ‘mundo da vida’, com as alterações ocorridas no campo das experiências tangíveis, é submetido a nossa intuição sensível, naquele ‘caos de sensações’ a que se referiu Kant. O que sucede neste domínio e não é recolhido pela linguagem social não ingressa no plano por nós chamado de ‘realidade’, e, ao mesmo tempo, tudo que

30dele faz parte encontra sua forma de expressão nas organizações lingüísticas com

que nos comunicamos; exatamente porque todo o conhecimento é redutor de dificuldades, reduzir as complexidades do objeto da experiência é uma necessidade inafastável para se obter o próprio conhecimento.”.

27A prova no direito tributário. p. 06.

28La filosofía actual: pensar sin certezas, p. 37.

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Já o estudioso VILÉM FLUSSER31 explica a realidade da seguinte forma: “Se definirmos realidade como ‘conjunto de dados’, podemos dizer que vivemos em realidade dupla: na realidade das palavras e na realidade dos dados ‘brutos’ ou ‘imediatos’. Como os dados ‘brutos’ alcançam o intelecto propriamente dito em forma de palavras, podemos ainda dizer que a realidade consiste de palavras e de palavras ‘in statu nascendi’”.

A importância da linguagem para o homem está consignada em toda nossa História: todas as conquistas e avanços se deram em razão da linguagem – o avanço do Império Romano, o crescimento do Cristianismo pelo mundo, a proclamação da República do Brasil, a abolição dos escravos, o voto feminino, o movimento “Diretas Já”, a promulgação da Constituição Federal de 1988, a informática e as descobertas da biogenética. Todavia, somente agora é que se percebe sua efetiva importância nas relações intersubjetivas em quaisquer dos sistemas sociais (política, religião, economia, direito, ciência).

Com muito acerto afirmou o professor JOSÉ SOUTO MAIOR BORGES32 que: “nada existe onde faltam palavras”.

Como bem assinala o professor TÉRCIO SAMPAIO FERRAZ JUNIOR33, “os homens comunicam-se, quer queiram quer não (é impossível não se comunicar, pois não se comunicar é comunicar que não se comunica). Essa comunicação admite várias linguagens (falada, por gestos, pictórica, musical etc.). Em conseqüência, a descrição da realidade depende da linguagem usada, e em casos como o da música pode-se até dizer que a linguagem (musical) e a realidade (musical) se confundem”.

Nesse sentido o filósofo LUDWIG WITTGENSTEIN34 traz os seguintes

ensinamentos: “A Lógica enche o mundo; os limites do mundo são também os seus limites”; “Que o mundo é o meu mundo revela-se no facto de os limites da linguagem (da linguagem que apenas eu compreendo) significarem os limites do meu mundo”; “O mundo e a vida são um”; “Eu sou o meu mundo (O microcosmos).”.

Com todas essas assertivas, portanto, não há que se olvidar que a linguagem reduz as complexidades dos “objetos do mundo da experiência” e constrói

31Língua e realidade. p. 40. 32Ciência feliz. p. 123.

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realidades para poder alcançar um dado conhecimento, o qual, ressalte-se, somente tomará corpo com a carga psicológica que o estudioso deverá impregnar no texto.

Sublinhe-se que de acordo com o enfoque que o intérprete fizer do objeto, ele poderá construir vários tipos de realidade; quer se dizer com isso que a realidade não é uma só. É possível verificar a existência de tecidos lingüísticos correspondentes à realidade social, à realidade jurídica, à realidade política, à realidade econômica, etc.

A realidade, portanto, é um recorte que o intérprete realiza do mundo físico por meio da linguagem. Assim, a realidade nunca será algo estanque, posto que o mundo físico está em constante mudança, ela sempre será alterada por meio de outras linguagens.

Novas descobertas, novos hábitos, costumes, cultura, ideologia são as principais causas de tantas alterações no mundo físico que deverão refletir nas novas realidades construídas.

Foi graças a esse dinamismo que GALILEU GALILEI construiu uma nova realidade: de que a Terra, assim como outros planetas, girava em torno do Sol (teoria heliocêntrica), fazendo cair por terra a realidade de que era a Terra o centro de tudo (teoria geocêntrica).

Portanto, quando se fala em linguagem e realidade não se está fazendo referência a fatos imutáveis, mas, sim, a fatos em constante transformação em decorrência das complexidades e contingências do mundo físico.

O sociólogo NIKLAS LUHMANN é que defendia que a sociedade é complexa e contingente. Complexa porque é composta por inúmeros elementos e situações de coisas e pessoas que nem sempre são apreensíveis pela linguagem, e contingente porque existe um leque de possibilidades, às vezes, até inimaginadas, que poderão ocorrer35.

E a linguagem deverá estar constantemente dialogando com essa sociedade complexa e contingente e, assim, sempre construindo novas realidades.

4. Fundamentos semióticos do texto e do discurso

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Se a linguagem está sempre apta a reduzir as complexidades e contingências do mundo empírico e, assim, construir a realidade para que se torne de conhecimento de todos, então o texto é um recorte da realidade.

Um texto é um conjunto de signos munidos de sentido. Sentido esse que somente será conhecido com a análise dos três níveis dos signos: sintática, semântica e pragmática. De posse desse sentido, segundo ensinamentos do professor TACIO LACERDA GAMA36, podemos: “i. precisar o sentido de certas

expressões; ii. superar problemas de ambigüidade, evitando com isso, discussões verbais; iii. evitar falácias de ambigüidade e vaguidade; iv. compreender e manejar formas de definição dos conceitos; e v. identificar formas de legitimar a definição de sentido”.

Paralelamente, o professor PAULO DE BARROS CARVALHO37 explica que: “... o plano das unidades lógicas constitui um sistema comunicacional, com suas dimensões sintática, semântica e pragmática: uma autêntica linguagem, com a particularidade de ser formalizada. Os recursos semióticos, por sua vez, permitem a análise das três dimensões que esta linguagem apresenta, cada qual analisando de acordo com as respectivas bases: (i) as estruturas frasais e as regras lógico-gramaticais nela contidas; (ii) os tipos de linguagem; e (iii) as funções da linguagem no discurso. De um lado, a referida formalização contemplará os vínculos associativos que ligam os vários signos de um mesmo sistema, expondo à carne viva o plano sintático daquele conjunto, e, na instância semântica, encontrando-se a significação que é inerente àquela estrutura formal. De outro, a pragmática da comunicação humana indicará a trajetória imprescindível para a determinação do tipo de lógica com que devemos trabalhar.”.

A realidade sempre estará representada por um texto. Esse texto poderá ser um gesto, uma pintura, uma escultura, um desenho, uma música, uma fotografia, uma encenação, um gráfico, uma planilha, um programa de televisão, uma propaganda, uma novela e um documento escrito (cartas, certidões, textos de livros e revistas, peças jurídicas, decisões jurídicas, atos normativos, entre outros) os quais estão constantemente sujeitos à interpretação do leitor-destinatário.

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Nesse sentido, PAUL RICOEUR38 afirma que: “O texto, objectivado e

desistoricizado – torna-se a mediação necessária entre o escritor e o leitor”. Esse

estudioso ainda explica que: “A interpretação no seu último estágio quer igualizar, tornar contemporâneo, assimilar, no sentido de tornar semelhante. Este objectivo consegue-se na medida em que a interpretação actualiza a significação do texto para o leitor presente”.

O filósofo DARDO SCAVINO39 afirma que “interpretar significa crear; el

interprete es un poeta”.

A capacidade interpretativa do ser humano é ilimitada; ou seja, existe um enorme leque de possibilidades semânticas e pragmáticas no intelecto de cada pessoa, todavia, empreender uma interpretação segundo as regras gramaticais e textuais, significa que haverá limitações no corpo do próprio texto a ser interpretado; ou seja, segundo as construções estruturais de um texto, é possível encontrar a interpretação adequada a ele.

Nesse sentido, explica a professora LEONOR LOPES FAVERO40 que: “todo e qualquer texto possui uma multiplicidade de significações, não sendo possível considerar-se uma única leitura como verdadeira; o interlocutor fará aquela que estiver mais de acordo com as ‘intenções do texto’ que se fazem presentes através de marcas lingüísticas que vão funcionar como pistas que permitirão perceber o sentido global do texto”.

Sobre essas marcas, o professor JOSE LUIZ FIORIN41 explica que o

enunciado é um simulacro do processo de enunciação (de produção de texto), posto que o enunciado é composto por marcas de espaço, tempo e pessoa que tentam simular tal processo. Essas marcas são denominadas de “enunciação-enunciada” e podem ser facilmente identificadas num dado texto (enunciado) e serão elas o ponto de partida para qualquer processo interpretativo-gerador de sentido.

É oportuno, nesse momento, apontar a diferença entre o texto bruto elaborado pelo enunciador (enunciado-enunciado) que é denominado de texto e o

38Teoria da interpretação. p. 103. 39 Op. cit. p. 37.

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texto contextualizado segundo as marcas da enunciação que é denominado discurso.

Enquanto texto (enunciado-enunciado), o enunciador possui infinitos modos de criação de sua estrutura sintática (sujeitos, tempos verbais, adjetivos, advérbios, preposições, adjuntos adnominais, frases exclamativas, interrogativas, negativas, afirmativas, orações coordenadas e orações subordinadas). Enquanto discurso e a partir da estrutura sintática que produziu, o enunciador promove uma série de articulações e recursos (funções da linguagem, figuras de linguagem e figuras de pensamento, metalinguagem, polifonia – ancoragem e desembreagem, intertextualidade ou intratextualidade, interdiscursividade ou intradiscursividade) para melhor emitir sua mensagem e, assim, “dar pistas” para o destinatário daquele discurso sobre a interpretação que deve ser dada àquele.

Isso porque, mesmo sendo a capacidade interpretativa do leitor-destinatário completamente infinita, o enunciador, ao construir um discurso, certamente não quer ser “mal interpretado”. Através das construções semânticas e pragmáticas, ele oferece elementos para o leitor empreender a interpretação coerente com a mensagem que queria passar.

E o destinatário ao empreender a análise do texto, especialmente do texto escrito, deverá primeiramente se ater às três instâncias do signo: sintática, semântica e pragmática. É o que ensina também o professor TÉRCIO SAMPAIO FERRAZ JÚNIOR42 ao afirmar que: “para interpretar, temos de decodificar os símbolos no seu uso, e isso significa conhecer-lhes as regras de controle e da denotação e conotação (regras semânticas), de controle das combinatórias possíveis (regras sintáticas) e de controle das funções (regras pragmáticas).”.

No que tange às regras pragmáticas do texto e do discurso, não se pode esquecer o caráter dialógico da linguagem; isto é, a capacidade que a linguagem de um texto ou discurso possui de dialogar com outros textos ou discursos.

“Dialogar com outros textos ou discursos” significa que um texto ou discurso ao ser elaborado está se referindo a um outro de forma implícita ou explícita. Um bom exemplo desse tipo de dialogismo são as paródias (textos que satirizam um outro texto).

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Já dialogar com o próprio destinatário-leitor significa que o enunciador se vale de alguns recursos, segundo um sistema de valores, para manipular o destinatário e, assim, promover uma determinada interpretação (“fazer-interpretativo”). Essa manipulação poderá ocorrer sob as formas de: tentação, intimidação, provocação e sedução.

Segundo a professora DIANA LUZ PESSOA DE BARROS43, “O dialogismo é a condição de sentido do discurso”.

Mais do que o dialogismo, a polifonia (várias vozes dentro de um mesmo discurso), a intertextualidade (diálogo entre textos), a interdiscursividade (diálogo entre discursos), a intratextualidade (diálogo entre frases num mesmo texto) e a intradiscursividade (diálogo entre frases num mesmo discurso) também auxiliam no processo gerador de sentido do texto.

Intratextualidade e intertextualidade estão relacionados ao contexto do próprio texto; ou seja, referem-se à coesão total do texto enquanto tecido uno de linguagem (semântica). Já a intertextualidade e a interdiscursividade estão relacionadas com a função do texto enquanto manipulador de valores e ideologias (pragmática).

A professora DIANA LUZ PESSOA DE BARROS44 explica resumidamente como ocorre esse processo gerativo de sentido: “a) o percurso gerativo do sentido vai do mais simples e abstrato ao mais complexo e concreto; b) são estabelecidas três etapas do percurso, podendo cada uma delas ser descrita e explicada por uma gramática autônoma, muito embora o sentido do texto dependa da relação entre os níveis; c) a primeira etapa do percurso, a mais simples e abstrata, recebe o nome de nível fundamental ou das estruturas fundamentais e nele surge a significação como uma semântica mínima; d) no segundo patamar, denominado nível narrativo ou das estruturas narrativas, organiza-se a narrativa, do ponto de vista de um sujeito; e) o terceiro nível é o do discurso ou das estruturas discursivas em que a narrativa é assumida pelo sujeito da enunciação”.

Em suma, qualquer objeto cultural suscetível de interpretação será denominado texto e de discurso quando esse texto for contextualizado e, para tanto, deverá se ater a todas as regras semióticas de texto e discurso e percorrer todo o

43 “Dialogismo, polifonia e enunciação”in Dialogismo, polifonia, intertextualidade: em torno de Bakhtin.

p. 02.

(33)

processo gerativo de sentido desde a estrutura fundamental até a estrutura discursiva e, assim, apreender a interpretação mais adequada com o real sentido do enunciado.

Assim, dada todas essas explicações, verifica-se que o processo gerativo de sentido de um dado enunciado é complexo. Há muitas articulações com a linguagem dentro de um enunciado que devem ser identificadas para se atingir a interpretação adequada àquele dado discurso: os três níveis dos signos devem ser muito bem explorados para se exaurir o processo gerador de sentido e a adequada interpretação seja imputada a um dado discurso. Com atenção especial para o nível pragmático, pouco explorado ainda pelos estudiosos: como foi apontado no início desse capítulo, cada enunciador possui uma forma particular de se expressar (ato de fala), conforme seus valores, ideologia, sentimentos e até conforme a situação em que se encontra, tal fato implica uma enorme complexidade da análise pragmática. Para esse nível de linguagem todas as marcas deixadas pelo enunciador são importantes: as marcas de sua própria pessoa, o tempo e o espaço em que enuncia o texto ou discurso. Aliás, quanto a esse plano MIKHAIL BAKHTIN45 dá uma grande importância ao afirmar que: “tudo que é ideológico possui um valor semiótico”.

O filósofo MARTIN HEIDEGGER46, de forma sucinta, explica como deve ser o contato do intérprete diante de um texto: “Fazer uma experiência com a linguagem significa portanto: deixarmo-nos tocar propriamente pela reivindicação da linguagem, a ela nos entregando e com ela nos harmonizando. Se é verdade que o homem, quer o saiba ou não, encontra na linguagem a morada própria de sua presença, então uma experiência que façamos com a linguagem haverá de nos tocar na articulação mais intima de nossa presença. Nós, nós que falamos a linguagem, podemos nos transformar com essas experiências, da noite para o dia ou com o tempo. Mas talvez fazer uma experiência com a linguagem seja algo grande demais para nós, homens de hoje, mesmo quando essa experiência só chega ao ponto de nos tornar por uma primeira vez atentos para a nossa relação com a linguagem e a partir daí permanecermos compenetrados nessa relação”.

De posse de todas essas ferramentas gramaticais, passa-se a analisar o direito enquanto texto e discurso.

(34)

CAPÍTULO II

ANÁLISE SEMIÓTICA DO DIREITO E DA CIÊNCIA DO DIREITO

1. O direito como linguagem

Da leitura do primeiro capítulo, é possível inferir que o sistema jurídico enquanto realidade é constituído pela linguagem. Todavia, não basta ao jurista afirmar que o Direito é texto, isto é, que ele é constituído pela linguagem, é preciso saber destrinchar todas as conseqüências dessa afirmação. É preciso rememorar os ensinamentos gramaticais e de interpretação de textos adquiridos nos bancos escolares e trazê-los para o mundo do Direito.

Como bem afirma JOSÉ ARTUR LIMA GONÇALVES47, “não é possível proceder à análise de questão jurídica sem considerar a circunstância de que o ordenamento jurídico é composto por normas jurídicas, cuja organização em sistema é efetuada pelo jurista, visando a sua compreensão global, a partir de sua coerência interna de sentido”.

É preciso, antes de apelar para qualquer técnica de interpretação jurídica, analisar os textos jurídicos sob as regras gramaticais semióticas. Se o Direito é texto, ele é suscetível de interpretações segundo as regras gramaticais semióticas de texto ensinadas pelos lingüistas.

Ensina o professor LUIS ALBERTO WARAT48 que “a interpretação da lei é uma especificação de seu sentido. O legislador ao estabelecer uma norma jurídica, prescreve uma conduta, fixa pautas para a ação humana. A disposição legal emanada do órgão competente, desde o ponto de vista semiótico, constitui uma mensagem com intencionalidade inerente, destinada a diversos protagonistas, dos quais cada um interpreta sua funcionalidade. Especificar seu sentido implica distinta significação, segundo seja de que se trate o protagonista”.

Sobre esse aspecto, A.J. GREIMAS49 afirma que:

47A imunidade tributária do livro, p. 01. 48Semiotica y derecho. p. 172.

(35)

“A análise de um texto jurídico particular, (...), pressupõe uma reflexão sobre o estatuto semiológico do discurso jurídico tomado no seu conjunto. Só de posse de um certo número de conceitos operacionais, precisando suas propriedades e seu modo de existência lingüística, é que se poderá determinar um ‘objeto’ ou ‘lugar’ discursivo específico (...). A própria expressão discurso jurídico já comporta um certo número de pressupostos que é preciso explicitar:

1. Ela sugere que por discurso jurídico deve-se entender um subconjunto de textos que fazem parte de um conjunto mais vasto, constituído de todos os textos manifestados numa língua natural qualquer.

2. Isso indica também que se trata de um discurso, quer dizer, de um lado a manifestação sintagmática, linear da linguagem e, de outro lado, a forma de sua organização que é levada em consideração e que compreende, além das unidades frásicas (lexemas, sintagmas, enunciados), as unidades transfásicas (parágrafos, capítulos ou, enfim, discursos-ocorrências).

3. A qualificação de um subconjunto de discursos como jurídico implica, por sua vez, tanto a organização específica das unidades que o constituem, como a existência de uma conotação particular subentendida a esse tipo de discurso, ou, ainda, as duas coisas ao mesmo tempo.”.

Nesse mesmo sentido, o professor CARLOS MAXIMILIANO50 explica que: “As leis positivas são formuladas em termos gerais; fixam regras, consolidam princípios, estabelecem normas, em linguagem clara e precisa, porém ampla, sem descer a minúcias. É tarefa primordial do executor a pesquisa da relação entre o texto abstrato e o caso concreto, entre a norma jurídica e o fato social, isto é, aplicar o Direito. Para o conseguir, se faz mister um trabalho preliminar: descobrir e fixar o sentido verdadeiro da regra positiva; e logo depois, o respectivo alcance, a sua extensão. Em resumo, o executor extraí da norma tudo o que na mesma se contém: é o que se chama interpretar, isto é, determinar o sentido e o alcance das expressões do Direito”.

A norma jurídica é o discurso (a estrutura textual; uma frase) utilizado pelo jurista. E esse discurso deverá ser submetido a todas as regras de interpretação de texto, seguindo todo o caminho do percurso gerador de sentido que se inicia com a análise sintática das normas e finaliza-se com a análise pragmática do discurso jurídico.

(36)

O precursor dessas idéias no campo jurídico é o professor PAULO DE BARROS CARVALHO51 ao explicar que: “Seguindo esta construção exegética e partindo da premissa da unicidade do texto jurídico-positivo que se pode alcançar os quatro subsistemas pelos quais se locomovem obrigatoriamente todos aqueles que se dispõem a conhecer o sistema jurídico normativo: a) o conjunto de enunciados, tomados no plano da expressão; b) o conjunto de conteúdos de significação dos enunciados prescritivos; c) o domínio articulado de significações normativas; e d) os vínculos de coordenação e de subordinação que se estabelecem entre as regras jurídicas”.

Nessa esteira, a professora DIANA LUZ PESSOA DE BARROS52 ensina que: “A semiótica, (...), procura hoje determinar o que o texto diz, como o diz e para que o faz. Em outras palavras, analisa os textos da história, da literatura, os discursos políticos e religiosos, os filmes e as operetas, os quadrinhos e as conversas de todos os dias, para construir-lhe os sentidos pelo exame acurado de seus procedimentos e recuperar, no jogo da intertextualidade, a trama ou o enredo da sociedade e da história”.

Sublinhe-se também que, como já explanado no capítulo anterior, as realidades sempre devem acompanhar as transformações do mundo físico e, se a realidade social reflete tais mudanças, o direito enquanto texto que é, deve estar em constante dialogismo (que é característica da linguagem) com a realidade social; o que significa dizer que o direito não é somente texto; o direito é uma metalinguagem que dialoga com sua linguagem objeto: a realidade social. Assim, deverá estar constantemente digitalizando os novos elementos da realidade social.

Nesse raciocínio, REINALDO PIZOLIO53 aduz que o direito positivo “deve acompanhar a sociedade e a evolução de seus interesses; deve acompanhar as transformações e a elevação crescente da complexidade das relações sociais, o que implica visualizar e compreender o ordenamento jurídico de uma perspectiva dinâmica, superando o apelo excessivamente normativista, ou, ainda melhor, levando a regra jurídica ao grau máximo de sua potencialidade normativa”.

51 Op. cit. 183.

52Teoria semiótica do texto. p. 83.

(37)

É nessa esteira que se afirma que o direito é dialógico, posto que é formado por um tecido lingüístico que deve estar sempre dialogando com outros tecidos lingüísticos.

O sistema jurídico é um sistema social parcial formado por uma rede de comunicações; ou seja, por enunciados lingüísticos adequados com a sua programação interna (Constituição Federal, leis ordinárias, leis complementares, decretos, medidas provisórias, portarias, circulares, instruções normativas, decisões judiciais, contratos, testamentos, entre outros – direito positivo – manuais e cursos doutrinários, artigos, consultas e pareceres jurídicos – ciência jurídica). A unidade dessa programação interna é a norma jurídica cuja estrutura transita desde o plano de expressão (sintática) até a pragmática de seu discurso para adquirir um dado sentido e, assim, ser aplicada aos fatos social-jurídicos.

Esclarece a professora CLARICE VON OERTZEN DE ARAÚJO54 que: “A linguagem inclui-se entre as instituições humanas resultantes da vida em sociedade. O direito é apenas uma das formas sociais institucionais que se manifesta através da linguagem, a qual possibilita e proporciona a sua existência. A linguagem é o veículo do qual se utiliza o homem para comunicar-se. O Direito, sendo a disciplina dos comportamentos sociais intersubjetivos, é suscetível de mudanças sob a pressão das diferentes necessidades, com vistas a adaptar-se ao modo mais econômico e racional de satisfazer o bem-estar social. Ou seja, os sistemas jurídicos utilizam a linguagem natural (língua, vernáculo) como verdadeira substancia de sua constituição. Para qualquer fenômeno ingressar dentro do sistema normativo ele deve estar expresso em algum tipo de linguagem.”.

GREGORIO ROBLES MORCHON55 também ressalta que: “sin normas, no hay Derecho; pero sin acción, no hay normas”.

Numa outra oportunidade, esse mesmo estudioso ensina que56: “A prova palpável de que o direito é texto está em que todo ordenamento jurídico é suscetível de ser escrito, isto é, de ser convertido em palavras. (...). O direito é linguagem no sentido de que sua forma de expressão consubstancial é a linguagem verbalizada suscetível de ser escrita. Isto aparece no direito moderno, que já nasce escrito. Esta

54Semiótica do direito. p. 19.

(38)

afirmação não implica uma tese ontológica forte, mas se limita a apontar o modo universal de apresentação do direito na comunicação humana, que como tal pode servir de ponto de partida para um enfoque teórico. Não é incompatível com teses ontológicas fortes, como aquela que afirma que o direito é o justo, ou a que sustenta que é fato social. Em qualquer dos casos, o certo é que o direito sempre se manifesta em linguagem. A linguisticidade é sua forma natural de ser. Como texto, o direito é suscetível das análises típicas de qualquer outro texto. Por essa razão, a teoria do direito pode ser caracterizada como uma teoria hermenêutico-analítica, ou, para empregar uma palavra mais simples, comunicacional. Pragmática, semântica e sintática são as três operações possíveis do texto jurídico.”.

O discurso jurídico, portanto, seja ele do direito positivo, seja da ciência do direito, é um discurso composto por signos, mais especificamente de símbolos, os quais são denominados de enunciados, posto que decorrem de um processo de enunciação e, assim, está sujeito à análise gramatical baseada nos três níveis dos signos: sintática, semântica e pragmática.

E, como já explicado no capítulo anterior, a sintática refere-se à forma do signo (relação do signo com o próprio signo), a semântica, ao significado desse signo (relação do signo com outros signos) e a pragmática, à relação dos signos com os seus usuários.

A sintática, sob o ponto de vista jurídico, é explicada pelo professor LUIS ALBERTO WARAT57 da seguinte forma: “Uma linguagem é formada sintaticamente a partir de um alfabeto finito, um conjunto de instruções para a construção do léxico da linguagem; para a construção de linguagens especializadas (sintaxe pura) deve-se acrescentar um conjunto inicial de palavras chamadas axiomas. Do ponto de vista jurídico, podemos afirmar que uma expressão está sintaticamente bem formada quando o enunciado acerca de uma ação encontra-se deonticamente modalizado.”.

Já a semântica está relacionada com os significados das normas jurídicas, os quais serão apreendidos pelo jurista. Assim, partindo-se da estrutura lógica (sintática), que é texto, o cientista do Direito iniciará a construção semântica de cada um dos enunciados normativos.

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