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Vitor Jose de Mello Monteiro

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Academic year: 2019

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

Vitor José de Mello Monteiro

Da Multa no Cumprimento de Sentença para o Pagamento de Quantia Certa

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito Processual Civil, sob a orientação do Prof. Doutor DONALDO ARMELIN.

MESTRADO EM DIREITO

SÃO PAULO

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Banca Examinadora

______________________________

______________________________

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Resumo

O presente estudo objetiva analisar a multa do cumprimento de sentença para pagamento de quantia certa inserida no ordenamento jurídico processual brasileiro pela lei n.° 11.232/05 que, em pouco tempo, conseguiu ser objeto de grande controvérsia no plano doutrinário e jurisprudencial a respeito de vários aspectos a ela atinentes. Procurou-se, assim, traçar uma análise metodológica desta nova modalidade de sanção de forma a inseri-la no contexto do direito processual brasileiro sem agredir, contudo, os princípios e garantias dos jurisdicionados, especialmente os de nível constitucional. Não se deixou de lado a necessidade de extrair do instituto o máximo de efetividade possível. Assim, foram estudados desde os requisitos mais básicos para que se possa cogitar a aplicação desta sanção até os seus elementos mais específicos. Deste estudo sistematizado, emergiram conclusões sobre a incidência ou não da referida penalidade a situações, até então, pouco exploradas pela doutrina e de rara verificação nos tribunais nacionais.

Ressaltou, também, dentre outras características peculiares desta multa, a finalidade de conferir mais autoridade às decisões judiciais que condenam ao pagamento de quantia certa, na medida em que o devedor contará com um prazo de quinze dias para efetuar o cumprimento espontâneo da obrigação, sob pena de incidência da referida penalidade.

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Abstract

The study’s main purpose is to analyze the fine included in the Brazilian rules by the law nº 11.232/05 which, in a reasonable period of time, became an object of great controversy in the course of doctrinal and jurisprudential plans and regarding some attainments aspects. The point, therefore, was to sketch one methodology analysis of this new modality of form sanction in order to insert it in the Brazilian’s context of procedural law without attacking, however, the jurists’ principles and guarantees, especially the ones of constitutional level. In addition, the necessity to extract of the institute’s maximum possible effectiveness was not forgotten. In consequence, were studied since the most basic requirements so that duty application could have been cogitated until its more specific elements. Of this systemize study, conclusions had emerged on the incidence or not of the related penalty to the situations, until then, little explored by the doctrine and of rare verification in the national courts.

It mentioned, also, amongst other peculiar characteristics of this fine, the purpose to confer more authority to the sentences that condemn to the payment of certain amount, in the measure where the debtor will count on a stated period of fifteen days to effect the spontaneous obligation’s fulfillment, duly warned about the related penalty’s incidence.

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SUMÁRIO

Parte I – Teoria Geral

I - Notas Introdutórias Sobre a Tutela Executiva...09

1. A tutela jurisdicional executiva...09

2. Princípios da execução...13

i. Princípio da nulla executio sine titulo...14

ii. Princípio da autonomia e do sincretismo...16

iii. Princípio da patrimonialidade...18

iv. Princípio da disponibilidade da execução...22

v. Princípio da tipicidade dos atos executivos...24

vi. Princípio do favor debitoris...25

vii.Princípio do resultado...27

3. A multa fixada para o descumprimento de obrigação de pagar quantia certa fixada em decisão judicial – noções gerais...28

II - Decisão judicial...32

1. Tipos de decisão judicial reconhecidas no ordenamento jurídico nacional...32

i. Despacho...34

ii. Decisão interlocutória...35

iii. Sentença...38

iv. Acórdão...42

2. As modalidades de sentença no processo civil brasileiro...44

i. Sentença declaratória...44

ii. Sentença constitutiva...46

iii. Sentença condenatória...47

iv. Sentença mandamental e executiva lato sensu...48

3. A autoridade da decisão judicial como manifestação do jus imperii...50

III - Obrigação de pagar quantia certa...56

1. Das obrigações em geral...56

(6)

3. Obrigação pecuniária e dívida de valor...67

IV - Das formas de extinção das obrigações de pagar quantia...70

1. Adimplemento...74

2. Formas especiais de extinção da obrigação...77

i. Prescrição e decadência...77

ii. Pagamento em consignação...79

iii. Pagamento com sub-rogação...81

iv. Imputação do pagamento...82

v. Dação em pagamento...83

vi. Novação...85

vii.Compensação...87

viii.Confusão...89

ix. Remissão de dívidas...90

x. Transação...91

3. Mora...94

4. Inadimplemento...97

V - A sanção pelo descumprimento da obrigação de pagar quantia certa retratada em decisão judicial...100

1. Modalidades de sanção em geral...100

i. Sanção compulsória ou coercitiva...102

ii. Sanção reconstitutiva ou reintegratória...103

iii. Sanção compensatória...104

iv. Sanção punitiva...106

v. Sanção preventiva...107

2. Execução forçada e o inadimplemento como seu pressuposto...108

3. Possibilidade de aplicação de penas acessórias – Lex plus quam perfectae...113

Parte II – Parte Especial VI - Da nova sistemática do cumprimento de sentença (lei n. 11.232/05) ...116

(7)

VII - Da multa pelo não cumprimento de obrigação de pagar quantia certa

retratada em decisão judicial...126

1. Figuras afins...128

i. Astreinte...128

ii. Multa por ato atentatório ao exercício da jurisdição...130

iii. Multa por litigância de má-fé...133

iv. Multa por ato atentatório à dignidade da justiça...134

v. Outras multas sanções no ordenamento jurídico...136

VIII - Natureza jurídica da multa do art. 475-J...137

1. Importância da investigação...137

2. Natureza jurídica da multa do art. 475-J...139

i. Coerção...140

ii. Punição...144

iii. Ressarcimento...148

3. Conclusão...150

IX - Momento de incidência da Multa...153

1. Termo inicial do prazo para cumprimento espontâneo...155

i. Momento em que a decisão se torna exequível...155

ii. Prolação de decisão que determina o cumprimento do acórdão...158

iii. Transito em julgado da decisão...159

iv. Intimação do devedor na pessoa de seu advogado para cumprimento da decisão...163

v. Intimação pessoal do devedor...166

2. Regime Jurídico da intimação pessoal...171

X - Percentual e base de cálculo da multa do art. 475-J do CPC...174

1. Cumprimento parcial da obrigação...177

XI - Beneficiário e responsável pelo pagamento da multa...179

1. Responsável...180

2. Beneficiário...184

(8)

1. Modalidades de sentença que podem ensejar a aplicação

da multa...187

i. Sentença condenatória...187

ii. Sentenças declaratória e constitutiva...191

2. Os títulos executivos parajudiciais e a multa do art. 475-J do CPC...194

3. Execução provisória...199

4. “Efetivação” da antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional...202

5. Conversão de obrigação de entrega de coisa e de fazer...204

6. Ação monitória...206

7. Execução contra a Fazenda Pública...209

8. Execução de alimentos...210

XIII - Causas que impedem a incidência da multa...214

1. Iliquidez do título...215

2. Impossibilidade de conversão imediata do patrimônio em pecúnia...218

3. Nomeação de bens à penhora...220

4. Erro no cálculo do credor...222

5. Insolvência ou falência do devedor...225

6. Apresentação de impugnação ao cumprimento de sentença...226

XIV - Causas que extinguem a multa...228

1. Inexistência do crédito...229

2. Reforma, anulação ou rescisão do título executivo judicial...230

3. Julgamento de procedência da impugnação...233

4. Prescrição e decadência...234

5. Formas especiais de extinção da obrigação...236

6. Formas de oposição contra a decisão que versar sobre a multa...239

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Parte I – Teoria Geral

I- Notas Introdutórias Sobre a Tutela Executiva

1. A tutela jurisdicional executiva

A tutela jurisdicional tornou-se uma das mais importantes formas de manifestação do poder estatal nos tempos contemporâneos onde o individualismo e o egocentrismo imperam entre os membros da sociedade, especialmente nos países que adotam o regime econômico capitalista.1

A tendência de buscar para si o máximo de proveitos possíveis tem gerado situações de tensão nas mais diversas modalidades de relações sociais que, quando reguladas pelo direito, tornam-se relações jurídicas. Isto porque, ao contrário das necessidades humanas, os bens capazes de atender aos interesses dos membros de uma sociedade são limitados. 2

1 Não está aqui a fazer qualquer juízo de valor em relação ao regime capitalista, até porque o

individualismo é uma característica inerente a todos os seres humanos. O que se quer ressaltar apenas é que é no regime capitalista que esta característica tem mais condições de se manifestar porque não está sujeita à opressão que geralmente se verifica nos regimes comunistas.

2 Neste sentido, JOÃO BAPTISTA MONTEIRO bem explica que “da escassez dos bens da vida, e do seu

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Sobressalta, assim, a importância da adequada prestação da tutela jurisdicional, que consiste na função estatal de impor os ditames do ordenamento jurídico, tanto do ponto de vista da solução da lide no seu aspecto intelectual (dizer quem é o titular do direito disputado em juízo), quanto do ponto de vista material (fazer concretizar materialmente a conseqüência jurídica prevista no ordenamento). À primeira destas formas de prestação da tutela jurisdicional convencionou-se denominar tutela jurisdicional cognitiva e a segunda tutela jurisdicional executiva.3

Para este estudo, interessa, precipuamente, a tutela jurisdicional executiva,4

uma vez que a multa imposta para o não cumprimento de sentença que condena ao pagamento de quantia certa procura atuar de

3 Sobre o assunto, já se teve a oportunidade de asseverar que “Por meio da tutela jurisdicional cognitiva,

prestada, normalmente, mediante um processo declaratório lato sensu, comumente denominado processo de conhecimento, o órgão jurisdicional visa dirimir uma situação de dúvida objetiva a respeito da titularidade de um determinado direito. Em termos mais abstratos, pode-se afirmar que a tutela jurisdicional cognitiva tem por escopo a formulação de um juízo de valor a respeito da aplicabilidade ou não da norma prevista no ordenamento jurídico a uma determinada situação. Por meio do processo de conhecimento, portanto, o órgão jurisdicional proporciona a satisfação jurídica da pretensão da parte que tem razão. ...<omissis>... A tutela jurisdicional executiva tem o objetivo de satisfazer materialmente o direito retratado em um título ao qual a lei atribui força executiva. Em muitos casos, a simples declaração de titularidade do direito não é suficiente para atender adequadamente à pretensão da parte, especialmente nas hipóteses em que já houve violação ao direito, na medida em que, para que haja o exaurimento das potencialidades desse direito, vale dizer, para que a satisfação desse direito seja plena, são necessárias alterações no plano empírico. Nem mesmo a determinação judicial de cumprimento desse direito é suficiente, por vezes, para atender à pretensão do credor, na medida em que o devedor pode adotar postura recalcitrante em relação ao cumprimento da obrigação.” (VITOR J. DE MELLO MONTEIRO, Da

Impugnação ao Cumprimento de Sentença – Natureza Jurídica e Cabimento, pp. 776-779).

4 DONALDO ARMELIN explica que “a concentração dos esforços reformistas no processo de conhecimento

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forma a evitar que venham a ter que ser praticados atos de agressão ao patrimônio do devedor condenado, ou seja, procura evitar exatamente a atuação efetiva da tutela jurisdicional executiva, cujo objetivo é satisfazer materialmente o direito retratado em um título ao qual a lei atribui força executiva.5

Uma das características da norma jurídica é a sua coercitividade, que consiste na aptidão que fazer valer à força aquilo que ela preceitua.6

Diversos são os meios previstos no ordenamento jurídico que visam dar o máximo de efetividade à coercibilidade da norma jurídica. Todavia, quando a questão sai do plano abstrato e vai para o plano concreto, vale dizer, quando a norma abstrata é aplicada por uma decisão judicial a uma específica relação jurídica levada ao conhecimento do órgão jurisdicional, a forma de coerção do comando concreto emanado em razão da norma

5 Não se pode olvidar, entretanto, que, como adverte DONALDO ARMELIN, satisfazer, pela via executiva,

um direito não depende somente da atuação jurisdicional no sentido de adequar e concretizar, em favor do credor, atos de transformação no mundo empírico. Em virtude da preponderante natureza patrimonial da execução, há a necessidade de higidez do patrimônio do devedor para o fim de satisfazer o débito, fato esse que não pode ser jurisdicionalmente implementado pelo Estado, embora este possa otimizar os meios de apreensão e transformação dos bens do devedor a fim de conferir presteza à prestação da tutela jurisdicional executiva (Comentários à Execução Civil, p. 5).

6 MIGUEL REALE pontua que “o Estado, como ordenação do poder, disciplina as formas e os processos de

execução coercitiva do Direito” (Lições Preliminares de Direito, p. 76). Fazendo uma profunda análise do tema NORBERTO BOBBIO, explica claramente que “quando a norma fundamental diz que se deve obedecer

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abstrata ganha um contorno especial de jurisdicionalidade, quer dizer, a aplicação coerciva se dará mediante atuação do poder jurisdicional. 7

Seguindo um procedimento cuidadosamente arquitetado pelo ordenamento jurídico, a correta prestação da tutela executiva deve se dar através da prática de atos materiais destinados a conceder ao credor de obrigação retratada em título executivo (judicial, no caso deste estudo) a satisfação plena do seu direito. Sendo assim, tem-se que a prestação da tutela jurisdicional executiva pode se dar de duas formas, a saber, por meio da prática de atos executivos sub-rogatórios, por meio dos quais o Estado pratica o ato, ou conjunto de atos, destinados à satisfação do direito inadimplido pelo devedor (execução direta), ou mediante a imposição de medidas de pressão psicológica sobre o executado para forçá-lo ao cumprimento da obrigação retratada no título executivo (execução indireta).8

7 Atualmente, afigura-se induvidoso o caráter jurisdicional da execução, seja ela prestada em processo

autônomo destinado especificamente a este fim, seja ela prestada em outras modalidades de processo que admitem, em seu bojo, a prática de atos destinados a implementar, ainda que em caráter provisório, a satisfação fática do direito disputado em juízo. O art. 577 do Código de Processo Civil, ao prescrever que, para a prática dos atos executivos, deverá haver determinação do órgão jurisdicional, ficando a cargo dos oficiais de justiça sua efetivação material, já demonstra a natureza jurisdicional que reveste os atos de execução, que não podem ser realizados sem ordem judicial nesse sentido. CÂNDIDO RANGEL

DINAMARCO esclarece que a função da tutela executiva é a de eliminar conflitos de interesses entre

sujeitos de direito envolvidos em crise de adimplemento das obrigações, gerando, dessa forma, paz social, finalidade esta que é inerente à função jurisdicional (Instituições de direito processual civil, v. IV, p. 51-53). Nesse mesmo sentido, ver TEORI ALBINO ZAVASCKI (Processo de execução: parte geral, p. 27-28).

8 EDUARDO TALAMINI refere-se aos meios sub-rogatórios como “mecanismos de sujeitação”,

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Expostas, em linhas gerais, as principais características da tutela jurisdicional executiva, já é possível intuir que ela não tem o seu espectro de atuação restrito ao processo de execução.9 Com efeito, tanto no processo de conhecimento, quanto no processo cautelar há espaço para a prática de atos executivos, sendo certo que naquele primeiro, na forma como se encontra hoje disciplinado na legislação processual codificada, há espaço para a atuação conjunta das tutelas cognitiva, executiva e de urgência.10

2. Princípios da execução

Tratar da tutela jurisdicional executiva demanda, ainda que rapidamente, uma análise dos principais princípios que regem essa forma de atuação do Estado-juiz. Representam os princípios as diretrizes fundamentais que estruturam o ordenamento jurídico, fato esse que não é

psicológica, este autor denomina-as de “mecanismos indutivos” que se prestam a influenciar o executado, em sua psique, para que ele próprio adote a conduta prevista no ordenamento jurídico (Tutela relativa aos deveres de fazer e de não fazer. 2. ed. São Paulo: RT, 2003. p. 170-175). Há, todavia, quem defenda que a execução indireta não é propriamente uma forma de execução (Neste sentido: THEODORO JÚNIOR, Humberto. Processo de execução, cit., p. 46; DINAMARCO,Cândido Rangel. Execução civil, cit., p. 106).

9 Nesse sentido, ver:MEDINA, José Miguel Garcia. Op. cit., p. 35-40.

10 É importante ter em vista que o direito processual contemporâneo caminha no sentido de adotar um

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diferente quando se fala do microssistema da atuação do poder jurisdicional no plano executivo.

Serão tratados somente os princípios que atuam especificamente ou que são de grande relevância para o estudo particularizado da tutela jurisdicional executiva, vale dizer, princípios estruturantes de todo o ordenamento jurídico, como o da dignidade humana, da ampla defesa, do devido processo legal, não serão abordados por fugirem dos estreitos limites da análise proposta.

i. Princípio da nulla executio sine titulo

Tendo em vista a violência com a qual a tutela jurisdicional executiva atua, vale dizer, mediante a prática de atos de invasão ao patrimônio do executado ou de limitação das suas liberdades, convencionou-se que a sua efetivação não poderia se dar sem que determinados cuidados fossem tomados para garantir os direitos fundamentais do devedor.

(15)

relativa presunção certeza do direito que se pretende realizar coercitivamente no plano dos fatos. Este título recebeu na doutrina nacional e estrangeira a denominação de título executivo.11

Dá-se, assim, ao devedor a segurança de que o mesmo não será alvo de atos jurisdicionais executivos que não estejam, necessariamente calcados em um título ao qual a lei atribui força executiva. Esta exigência é decorrência lógica do devido processo legal e configura, também, a essência do princípio da nulla executio sine titulo ou da ubi executio ibi titulus, ora sob análise.12

No direito positivo brasileiro, o título executivo continua sendo pressuposto da tutela jurisdicional executiva. Note-se que o art. 583 determina que toda a “execução” tem por base um título executivo, seja ele judicial ou extrajudicial. O termo “execução” não se encontra acompanhado da palavra “processo”, razão pela qual é perfeitamente lícito entender que a lei se refere à tutela jurisdicional executiva.13

Esse princípio

11 V. sobre o assunto, VITOR JOSÉ DE MELLO MONTEIRO,

As Novas Reformas do CPC e de outras normas processuais, pp. 35-38. Embora a abordagem ali seja mais sobre a ótica da execução lastreada em título executivo extrajudicial, as idéias principais a respeito da importância do princípio valem integralmente para o presente estudo.

12 Muito esclarecedora é a lição de OVÍDIO BATISTA DA SILVA a respeito das razões que levaram ao

surgimento do princípio da nulla executivo sine titulo. Explica, o referido jurista, que a necessidade que se verificou de haver, sempre, atividade cognitiva precedente à executiva, decorre da obrigatória adstrição do juiz à lei. Com efeito, proporcionar ao órgão jurisdicional a prerrogativa de executar antes de julgar seria equivalente a conceder a alguém um direito que pode se verificar depois não lhe pertencer, ou seja, seria permitir uma execução injusta (Jurisdição e Execução na Tradição Romano Canônica, pp. 129-135), sendo que, nas precisas palavras de MAURO BOVE “... l’esecuzione forzata ingiusta è un fatto produttivo di consequenza contraria al diritto sostanziale, quinde un fenomeno che nei rapporti tra privati no à altro che un fatto illecito” (L’Esecuzione Forzata Ingiusta, p. 282).

13 Ver o que se falou Cap. I, item i,

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consolidou-se na doutrina de diversos países onde o direito tem formação romano-canônica, nos termos nulla executio sine titulo.

É forte, todavia, a corrente doutrinária que propugna pela mitigação desse princípio, sob o argumento de que, com a introdução da ação monitória, da tutela antecipada e da adoção gradual e crescente das ações denominadas sincréticas, o art. 583 do Código de Processo Civil está a merecer uma releitura ou, até mesmo, uma alteração ou supressão.14

ii. Princípio da autonomia e princípio do sincretismo

O princípio da autonomia da execução vem sendo encarado pela doutrina sob diversos aspectos. Uma das acepções deste princípio diz

14 V., sobre o assunto, JOSÉ MIGUEL GARCIA MEDINA (

Execução civil. Teoria geral. Princípios fundamentais, p. 94-260). ATHOS GUSMÃO CARNEIRO,por sua vez, entende que “implicou a antecipação

de tutela, pois, em superação do princípio da nulla executio sine titulo, superação da ‘dicotomia’ processo de conhecimento/processo de execução, de milenar raiz romanística e que, embora seu sólido arrimo doutrinário e lógico-formal, importava com freqüência em prêmio ao réu inadimplente, e em castigo ao autor que, embora favorecido com sólida aparência do bom direito, se via obrigado a suportar os ônus da demora processual.” (Da Antecipação de Tutela no Processo Civil, p. 9). Neste mesmo sentido, LUIZ

GUILHERME MARINONI afirma que “as novas exigências de tutela jurisdicional, responsáveis, inclusive,

pela transformação da tutela cautelar em técnica de sumarização, transformaram o princípio da nulla executio sine titulo em mito. Recorde-se que a tutela antecipatória, em diversos casos, antecipa a execução forçada. Como já disse OVÍDIO BAPTISTA DA SILVA: ‘A introdução em nosso direito de uma

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respeito à autonomia da tutela executiva em relação à cognitiva do ponto de vista estrutural. Sob esta ótica, tinha-se que a atividade jurisdicional executiva deveria ser desenvolvida exclusivamente em um processo especialmente formatado para tal fim. Falava-se, assim, na “pureza” do processo de execução.15

Atualmente, essa concepção do princípio da autonomia está completamente superada, especialmente quando se trata de execução lastreada em título executivo judicial. Como já se disse,16

o processo civil moderno caminha para uma concentração das diversas modalidades de prestação da tutela jurisdicional em uma única relação jurídica processual. Desta forma, atos de cognição, urgência e execução são praticados em um único processo. Essa nova tendência de estruturação da prestação jurisdicional levou a doutrina a reconhecer o surgimento do princípio do sincretismo, em oposição à autonomia estrutural.

Para se adequar à nova realidade, o princípio da autonomia é visto hodiernamente sob o ponto de vista funcional. Tal acepção visa deixar claro que os atos executivos, ainda que praticados em processos que não propriamente de execução, têm finalidade e regime próprios, o que quer dizer que o ato executivo não deverá observar os princípios do processo de conhecimento ou do processo cautelar, por ter sido efetivado no seu bojo.

15 Ver, sobre o assunto, ENRICO TULLIO LIEBMAN,

Processo de Execução, pp. 65-72.

16 Ver Cap. I, item 1,

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Compatibiliza-se, desta forma, a sobrevivência do princípio da autonomia com o do sincretismo processual.

Outra forma de analisar o princípio da autonomia da execução diz respeito à desnecessidade desta ser precedida de um processo de conhecimento, especialmente quando se trata de título executivo extrajudicial. A idéia que vigorou durante muito tempo de que a execução somente poderia ocorrer após o exercício da atividade cognitiva vem perdendo força continuamente. É possível verificar este fenômeno não só no caso dos títulos extrajudiciais, como ocorre na antecipação de tutela onde a execução do direito postulado em juízo pode vir a ser efetivada antes mesmo de se ouvir o réu.

iii. Princípio da patrimonialidade

O advento do princípio da patrimonialidade representou um considerável avanço na forma de prestação da tutela jurisdicional executiva na medida em que, sob os seus auspícios, foram estipulados limites à atuação executiva estatal em relação à pessoa do executado devedor.17

Com

17 Passou-se a verificar, portanto, uma acentuada tendência humanizadora da atividade jurisdicional,

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efeito, a responsabilidade executiva apresenta-se sob dois aspectos: patrimonial e pessoal.

No primeiro caso, o patrimônio do executado é que é o alvo das investidas jurisdicionais para o fim de se obter a satisfação do crédito pecuniário do exeqüente. É o que se extrai do disposto no art. 591, do CPC, e 391, do CC.18

Realiza-se, por esta forma de atuação da tutela jurisdicional executiva, a alienação do patrimônio do devedor para gerar o bem a que faz jus o credor, qual seja, o dinheiro. Está-se, neste caso, diante de uma execução específica (execução direta), vale dizer, que concederá ao credor exatamente o mesmo bem que ele obteria com a satisfação voluntária da dívida.19

Vale a pena ressaltar que a responsabilidade patrimonial não se verifica somente nos casos de execução direta, mas também nos casos de

18 Perdeu-se, ao redigir a disposição contida no referido artigo 391, do Código Civil vigente, uma

excelente oportunidade de corrigir o equívoco cometido no artigo 591, do Código de Processo Civil. O resultado da nova normatização da matéria foi, na verdade, um retrocesso, na medida em que dá a impressão de que a totalidade do patrimônio do devedor poderia ficar sujeita aos efeitos de uma execução forçada da obrigação, não só os bens presentes e futuros. Tal assertiva, entretanto, não é correta, em virtude das diversas normas já citadas que estabelecem exceções ao princípio geral da responsabilidade patrimonial e que não foram revogadas pela nova norma do Código Civil, que é de caráter geral (artigo 2°, § 2°, da Lei de Introdução ao Código Civil). Nesse mesmo sentido, ver: TEORI ALBINO ZAVASCKI.

Processo de Execução: Parte Geral, P. 192.

Ao que parece, entretanto, o artigo 391, do Código Civil, revogou o artigo 591, do Código de Processo Civil, na medida em que regulou integralmente da matéria nele versada, incidindo, nessa hipótese, o disposto no artigo 2°, § 1°, da Lei de Introdução ao Código Civil.

Muito mais adequada parece ser a redação, v.g., do Código de Processo Civil Português, que, em seu artigo 821°, determina que “estão sujeitos à execução todos os bens do devedor susceptíveis de penhora que, nos termos da lei substantiva, respondem pela dívida exeqüenda”.

19 Importante ter em vista, todavia, que a execução direta não é prerrogativa das execuções de créditos

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execução indireta. 20 É perfeitamente possível, desta forma, a sujeição do patrimônio do executado para compeli-lo ao cumprimento específico de obrigações de dar coisa diversa de dinheiro, fazer e não fazer, especialmente quando há cominação de astreintes.

Não se pode olvidar, ainda, a possibilidade de conversão destas modalidades de prestação em perdas e danos quando não for possível o adimplemento na forma específica por ato ao qual o devedor deu causa (artigos 234, in fine, 236, 239, 247, 248 e 251, in fine, do Código Civil),

ressalvando-se que, para que seja possível tal conversão, deve haver pedido expresso do exeqüente ou impossibilidade absoluta de cumprimento da obrigação na forma específica ou de obtenção do resultado prático correspondente (artigo 461, § 1°, do Código de Processo Civil).

Há casos, entretanto, em que a responsabilidade executiva extrapola o limite da esfera jurídica patrimonial do executado e atinge outros direitos não dotados de conteúdo patrimonial imediato. Trata-se, nesse caso, da responsabilidade pessoal do devedor pela satisfação do direito que está sendo executado e que, via de regra, é consubstanciado por obrigação de prestação de um fato, positivo ou negativo.

20 ARAKEN DE ASSIS demonstra que, para a execução, os bens do devedor podem representar tanto o

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Diz-se via de regra, pois, em alguns casos específicos de tutela jurisdicional executiva de direito patrimonial, o ordenamento permite a adoção de medidas de caráter pessoal para compelir o devedor renitente a adimplir a sua obrigação. É o caso da execução de obrigação de prestar alimentos (artigo 733, do Código de Processo Civil), ou da específica de obrigação de entrega de coisa, onde se pode adotar qualquer uma das medidas previstas no artigo 461, § 5, do Código de Processo Civil, por força do disposto no artigo 461-A, § 3°, do mesmo dispositivo.21

Não obstante, a maioria dos ordenamentos jurídicos dos países civilizados adota como princípio geral da tutela executiva, especialmente no que diz respeito às obrigações pecuniárias, a responsabilidade patrimonial (executio in rem).22-23

21 Sobre o assunto, ver: JOSÉ MIGUEL GARCIA MEDINA.

Execução Civil: Teoria Geral – Princípios Fundamentais, p. 46-51. CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO trata responsabilidade executiva e responsabilidade patrimonial como fenômenos paralelos (Execução Civil, p. 254-256).

22 Alguns doutrinadores levaram a aplicação desse princípio às últimas conseqüências. É o caso de

HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, que, alicerçado nas lições de Lopes da Costa e de James Goldschmidt,

afirma, peremptoriamente que “toda a execução é real, porque incide sobre o patrimônio e não a pessoa do devedor” (Processo de execução, p. 60).

23 Não é por outra razão que o art. 646 do Código de Processo Civil, que não foi revogado pela Lei

11.232/2005, preceitua que “a execução por quantia certa tem por objeto expropriar bens do devedor, a fim de satisfazer o direito do credor (art. 591)”. CASSIO SCARPINELLA BUENO afirma, com inteira razão,

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iv. Princípio da disponibilidade da execução

Salvo os casos de insolvência do devedor, a execução existe para satisfazer o interesse do credor,24

razão pela qual a lei coloca à sua inteira disposição a possibilidade de utilização da tutela jurisdicional executiva, podendo o mesmo, inclusive, desistir da execução já instaurada sem qualquer necessidade de anuência do executado, ao contrário do que ocorre no processo de conhecimento.25

Tem-se tratado o princípio da disponibilidade mais sob a ótica dessa faculdade que a legislação processual codificada concede ao devedor de desistir da execução no todo ou em parte. Não obstante, o advento da lei n. 11.232/05, que instituiu o regime do cumprimento de sentença tem suscitado algumas discussões a respeito da possibilidade de instauração ex officio do procedimento executivo, o que configuraria clara mitigação do

princípio da disponibilidade.

24 É o que determina o art. 612, do CPC.

25 Art. 569, do CPC. O STJ vem decidindo reiteradamente nesse sentido: “(...)II- O legislador assegurou a

livre disponibilidade da execução. Assim, pode o exeqüente desistir da ação de execução (CPC, art. 569), sem que isso importe em renúncia ao seu direito de crédito. III- Se a desistência ocorre antes do oferecimento dos embargos, desnecessária é a anuência do devedor. Precedentes.(...)” (STJ, REsp 263.718/MA, rel. Min. ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, Terceira Turma, j. 16/04/2002, DJ 20/05/2002, p.

135) “(...) I – Constitui princípio, albergado na legislação vigente (CPC, Art. 569), que o exeqüente tem a livre disponibilidade da execução, podendo desistir a qualquer momento, em relação a um, a alguns ou a todos executados, mesmo porque a execução existe em proveito do credor, para a satisfação do seu crédito. (...)” (STJ, REsp 7370/PR, rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, Quarta Turma, j.

01/10/1991, DJ 04/11/1991, p. 15688). Todavia, “(...) Se a desistência ocorrer antes do oferecimento dos embargos, desnecessária é a anuência do devedor. (...)” (STJ, AgRg no Ag 538.284/RS, rel. Min. JOSÉ

(23)

Com efeito, tem-se verificado certa tendência doutrinária26

que defende a possibilidade de instauração oficiosa da execução, especialmente quando o título executivo é judicial. O reavivamento do princípio vigente no direito medieval segundo o qual sententia habet paratam executionem (a

sentença contem a execução preparada) que impôs o fim da dicotomia entre o processo de conhecimento e o processo de execução lastreado em título judicial fez desaparecer o principal obstáculo à defesa da oficiosidade da execução.

Sem prejuízo, a verdade é que, apesar de terem sido superados diversos dos princípios que inspiraram a elaboração do Código de Processo Civil de 1973, atualmente vigente, o princípio da disponibilidade da

26 ATHOS GUSMÃO CARNEIRO é um dos principais defensores desta tese. Argumenta o referido autor que

“em sinopse, a Lei nº 11.232 consagra o abandono do sistema de inspiração romana da actio judicati, com o retorno ao sistema medieval pelo qual a sentença habet paratam executionem. Em última análise, haverá necessidade de reelaborar no plano teórico o polêmico tema das “cargas de eficácia” da sentença condenatória. Escreveu ROGÉRIO LICASTRO TORRES DE MELLO que as modificações constantes da Lei nº

11.232/05 vieram a consolidar ‘uma tendência que tomou corpo como um dos grandes alicerces na construção de um processo executivo expedito e realizador de direitos: a supressão da execução de título judicial como um processo autônomo, passando a ser fase do processo de conhecimento, em que a própria sentença proferida pelo órgão jurisdicional contém ordem de cumprimento.’... (omissis)... ‘a decisão judicial deixará de ser mero convite ao sucumbente para que este a cumpra, passando a trazer consigo, além de uma disposição jurídica, uma determinação para que se faça cumprir’ (estudo na coletânea Processo de Execução Civil – Modificações da Lei 11.232/05, cit., p. 283.” (Cumprimento da Sentença Civil, p. 12). HUMBERTO THEODORO JÚNIOR,por sua vez, foi pioneiro na matéria, expondo que“enquanto

(24)

execução continua presente no direito brasileiro, mesmo no regime do cumprimento de sentença.27

v. Princípio da tipicidade dos atos executivos

Para que a esfera jurídica do executado não seja indevidamente invadida pela atuação da tutela jurisdicional executiva, é necessário que, além da existência de título executivo, sejam praticados somente os atos executivos que estejam expressamente previstos na lei, como é o caso da penhora, da astreinte, da busca e apreensão etc.. Esta exigência, que

decorre diretamente do princípio constitucional do devido processo legal, tem recebido o nome de princípio da tipicidade dos atos executivos e vigorou com bastante intensidade no direito brasileiro.

Atualmente, o princípio da tipicidade dos atos executivos tem sofrido sérias mitigações em prol da prestação célere e efetiva da tutela jurisdicional executiva. Com efeito, a riqueza de situações que a dinâmica das relações jurídicas materiais e processuais proporciona impede a previsibilidade legal de todos os atos executivos que seriam capazes de responder adequadamente a cada caso concreto. Assim, deixa-se uma

27 Tanto é assim que o art. 475-J,

(25)

parcela de liberdade ao órgão jurisdicional para determinar a adoção das medidas que forem necessárias para garantir a satisfação do interesse do exeqüente. Ganha força, nesta senda, o princípio da atipicidade dos atos executivos.28

Convém ressaltar, todavia, que, apesar de o princípio da atipicidade dos atos executivos estar ganhando cada vez mais importância no direito nacional, quando se trata de tutela jurisdicional executiva das obrigações pecuniárias, o princípio da tipicidade dos atos executivos continua sendo um dos principais limites à atuação do órgão jurisdicional, permitindo, assim, ao executado a previsibilidade dos atos de agressão que serão praticados contra o seu patrimônio, impedindo, desta forma, o vilipêndio de direitos e garantias individuais fundamentais garantidos na Constituição Federal (dignidade da pessoa humana, ampla defesa, contraditório, devido processo legal, direito de propriedade etc.).

vi. Princípio do favor debitoris

O fato de a execução ser uma forma de prestação da tutela jurisdicional direcionada ao atendimento exclusivo do interesse do credor

28 Com efeito, tem-se defendido que “...na execução da decisão que antecipa efeitos da tutela,

(26)

não quer dizer que ela possa ser efetivada de forma a prejudicar o devedor em proporção superior àquela necessária ao cumprimento coercitivo da obrigação. Tendo o credor a disponibilidade da execução, inclusive no que diz respeito à forma como ela deve ser efetivada, impõe-se, também, o dever de não proceder à execução pela forma mais gravosa ao devedor quando por outros meios ela puder ser realizada.

Estas são as linhas gerais do princípio da menor onerosidade ao devedor, ou do favor debitoris, expressamente previsto no art. 620, do

CPC, cuja observância é obrigatória, tanto pelas partes, quanto pelos próprios órgãos jurisdicionais, uma vez que se trata de norma de ordem pública29

que visa a humanização do processo. Em última análise, portanto, o princípio do favor debitoris é uma decorrência lógica e imediata do

princípio da dignidade humana.30

29 SÉRGIO SAHIONE FADEL defende que o princípio do favor debitoris “é de ordem pública, de forma que a

não observância acarreta sanções para o credor, que responderá pelas custas da onerosidade a que deu causa”(Código de Processo Civil Comentado, Kofino, 1974, t. III, p. 302).

30

Neste sentido, CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO assevera que “constituem também limite político à

execução o disposto no art. 620 do Código de Processo Civil e o conjunto de disposições que gravitam em torno da idéia fundamental de torná-la tão suportável quanto possível ao devedor e ao seu patrimônio. Pode-se mesmo dizer que existe um sistema de proteção ao executado contra excessos, um favor debitoris inspirado nos princípios da justiça e da equidade, que inclusive constitui uma das linhas fundamentais da história da execução civil em sua generosa tendência de humanização.

(27)

vii. Princípio do resultado

Como se pôde ver, muitas são as limitações ao exercício da tutela jurisdicional executiva. Entretanto, a verdade é que ela se destina a uma finalidade específica que não pode, em momento algum ser olvidada, qual seja, a obtenção de um resultado que atenda aos interesses do credor que se apresenta munido de um título executivo.

Vige, assim, na execução o princípio do resultado, que, em última análise, apresenta-se sob dois aspectos: o primeiro segundo o qual a execução deve se realizar para atender o interesse do exeqüente e o segundo que impõe a proibição da prática de atos executivos que não produzam um resultado significativo em busca do obtenção da finalidade da execução.

Deve a execução, portanto, ser efetiva, vale dizer, conceder ao exeqüente, no plano empírico, tudo aquilo que lhe foi concedido no título executivo, seja ele judicial ou extrajudicial. A obtenção de resultado na execução em favor do exeqüente é a própria razão da existência desta,31

tornando-se, assim, ao mesmo tempo, a finalidade e o limite da atuação da atividade jurisdicional executiva. Tanto é assim que a lei determina

31 Por esta razão, CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO esclarece, com razão, que é inadmissível que o processo

(28)

expressamente, por exemplo, a suspensão (rectius: interrupção) da hasta

pública quando o produto dos bens alienados for suficiente para pagar o credor, ainda que haja outros bens regularmente penhorados e submetidos à alienação judicial.32

Por outro lado, o princípio do resultado também tem a finalidade de garantir a utilidade do exercício da atividade jurisdicional executiva, evitando, assim, a prática de atos que em nada contribuirão para a obtenção do resultado que dela se espera obter. É o caso, por exemplo, da proibição legal de penhora de bens cujo valor for evidentemente insuficiente para suportar montante superior ao das custas da execução.33

3. A multa fixada para o descumprimento de obrigação de pagar quantia certa fixada em decisão judicial – noções gerais

Traçadas algumas diretrizes básicas a respeito da tutela jurisdicional executiva, impõe-se agora delimitar o tema central deste estudo, que é a multa imposta ao réu condenado ao pagamento de quantia certa que não cumpre o comando judicial no prazo de 15 dias, conforme prevê o art.

(29)

J, do Código de Processo Civil, inserido pela lei n.° 11.232, de 22 de dezembro de 2005.34

O regime do cumprimento de sentença surgiu no cenário jurídico processual nacional com a pretensão de imprimir mais celeridade e efetividade à execução lastreada em título executivo judicial.35 Com efeito, tendo o credor percorrido o longo e moroso trâmite do processo de conhecimento para poder ver reconhecido judicialmente o seu direito, afigura-se inadmissível submetê-lo a outro processo judicial, que era igualmente moroso em razão do efeito suspensivo e da ordinariedade dos embargos do devedor, para o fim de obter a satisfação fática do direito que lhe foi assegurado no plano jurídico.

Assim, o cumprimento de sentença foi idealizado para viabilizar a prestação da tutela jurisdicional de forma mais célere que aquela que era prestada no regime originário previsto no Código de Processo Civil, onde imperava a separação entre o processo de conhecimento e o processo de execução como se dois compartimentos estanques e praticamente incomunicáveis fossem.

34 Publicada no

Diário Oficial da União, de 23 de dezembro de 2005.

35 ARRUDA ALVIM demonstra claramente que a tentativa de imprimir uma regulamentação menos

(30)

Sem prejuízo, criou-se também um instituto que se destina a evitar que o cumprimento de sentença sequer tenha início, qual seja, a multa pelo não cumprimento da obrigação de pagar quantia certa determinada na sentença judicial. Trata-se de medida efetivamente inovadora no direito processual brasileiro na medida em que a tradição processualista sempre consagrou a expropriação como a única forma de forçar o devedor a cumprir a obrigação de pagar quantia certa.

Não se desconhece que, há muito tempo, já se acolheu a figura das

astreintes no direito brasileiro; entretanto, esse meio de apoio executivo

não se confunde com a nova figura jurídica criada pela lei n.° 11.232/2005. A própria redação da disposição legal que disciplina a multa no cumprimento de sentença é suficiente para demonstrar que o regime jurídico e a finalidade dessa nova cominação não se coadunam com a multa diária prevista para o descumprimento das obrigações de fazer, não fazer e dar retratadas em título judicial, conforme será devidamente demonstrado em momento oportuno.36

Esta multa tem inegável caráter pedagógico, uma vez que, reconhecido por sentença o crédito pecuniário do credor, impõe-se ao devedor o cumprimento espontâneo da obrigação retratada naquela decisão judicial, que foi precedida de procedimento permeado pelo devido processo

36 Ver Cap. VII, item 1, i,

(31)

legal e que é fruto do legítimo exercício do poder estatal jurisdicional, o que torna inconcebível a renitência do condenado ao seu cumprimento.

O regime do instituto imposto pelo art. 475-J, do CPC, é de aparente simplicidade. Não efetuado, no prazo de quinze dias, o pagamento de quantia certa ao qual o devedor foi condenado, o montante da condenação é automaticamente acrescido de multa que incide no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação. A partir daí, faculta-se ao credor requerer a expedição de mandado de avaliação e penhora devendo, contudo, instruir tal requerimento com a planilha de cálculo atualizado do débito (incluindo a parcela referente à multa ora mencionada), conforme determina o art. 614, II, do CPC.

(32)

II- Decisão judicial

1. Tipos de decisão judicial reconhecidas no ordenamento jurídico nacional

Sendo a decisão judicial um pressuposto básico para a aplicação da multa pelo não cumprimento da sentença que condena ao pagamento de quantia certa, é necessário analisar, dentre os atos passíveis de serem praticados pelo órgão jurisdicional, quais são os que contêm cunho decisório suficiente para ensejar a aplicação desta sanção. Nessa senda, vale a pena destacar que o órgão jurisdicional pratica, via de regra, duas modalidades de atos jurisdicionais, os decisórios e os não decisórios. Estes últimos são aqueles praticados no exercício de mera função administrativa ou de polícia judicial37 e não interessam no momento, uma vez que a multa no cumprimento de sentença para pagamento de quantia certa só pode ser cogitada em caso de condenação do réu, condenação essa que, obviamente, pressupõe atividade decisória por parte do órgão jurisdicional.

A atividade jurisdicional tem um escopo político de extrema importância para a vida em sociedade, qual seja, a consecução do bem estar social através da garantia, aos seus cidadãos, dos direitos considerados

37 HUMBERTO THEODORO JÚNIOR,

(33)

essenciais para uma vida com a liberdade e a dignidade que se espera do chamado welfare state.38 Para garantir o bem estar geral através da garantia

destes valores tão importantes para a sociedade civilizada, faz-se necessário que a atividade jurisdicional resolva as questões diretamente ligadas aos interesses dos cidadãos, isolada ou conjuntamente considerados.39

Diante dos interesses em conflito retratados no processo, o órgão jurisdicional tem, portanto, a obrigação legal de resolver as questões postas em juízo, mesmo que não haja expressa previsão legal que regulamente a situação fática sub judice.40 Para solucionar estas questões, o órgão

jurisdicional vale-se, precipuamente, de atos jurisdicionais decisórios denominados decisões interlocutórias e das sentenças,41 aos quais podem ser acrescentados o despacho e o acórdão.

38 CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO destaca que a jurisdição predispõe-se a influir politicamente na vida do

cidadão sob três aspectos: “primeiro, afirmar a capacidade estatal de decidir imperativamente (poder), sem a qual nem ele (Estado) mesmo se sustentaria, nem teria como cumprir os fins que o legitimam, nem haveria razão de ser para o seu ordenamento jurídico, projeção positivada do seu poder e dele próprio; segundo, concretizar o culto ao valor liberdade, com isso limitando e fazendo observar os contornos do poder e do seu exercício, para a dignidade dos indivíduos sobre os quais ele se exerce; finalmente, assegurar a participação dos cidadãos, por si mesmos ou através de suas associações, nos destinos da sociedade política” (A Instrumentalidade do Processo, p. 233/234).

39 Conforme ensina JOÃO BAPTISTA MONTEIRO, “... colocado perante as questões processuais, o juiz é

obrigado a dirimi-las. Pratica um ato de vontade, pelo qual examina a questão, atribui a prevalência a um dos interesses em conflito, escolhendo aquele que merece a proteção legal. Depois, impõe ao interesse que não foi protegido, a aceitação da hierarquização que estabeleceu. O fenômeno da aceitação, manifestado pela resistência à pretensão, é coercitivamente imposto ao interesse dominado, em benefício do interesse dominante. Mediante a decisão é vencida a resistência que o direito material não foi capaz de assegurar. Ao decidir, o juiz aplica o direito à questão. Estabelece a hierarquia dos interesses e assegura ao interesse prevalente a utilização do bem da vida sobre o qual se manifestou o conflito.” (O Conceito de Decisão, p.72-73).

40 Art. 4°, da LICC, e art. 126, do CPC.

41 ARRUDA ALVIM pontifica que “As sentenças e as decisões interlocutórias são, tipicamente, atos

(34)

i. Despacho

A inércia da jurisdição impõe aos jurisdicionados o dever de dar início ao processo, caso pretendam obter a tutela jurisdicional de suas pretensões. Contudo, uma vez iniciado o processo, ele se desenvolve por impulso oficial, conforme determina o art. 262, do CPC. Isto se dá porque, levada a pretensão a juízo, passa a existir um interesse social na resolução do conflito, razão pela qual ao órgão jurisdicional resta a incumbência de, em colaboração com as partes, promover o regular andamento do feito até o desfecho que o mesmo merecer.

Para dar andamento ao processo, é necessária a prática de diversos atos, como determinar a intimação de peritos e testemunhas, designar audiências, abrir vista às partes quando lhes competirem falar nos autos

etc.. Estes atos jurisdicionais não se destinam a solucionar diretamente

nenhuma das questões postas pelas partes em juízo, mas sim apenas dar o regular impulso ao processo para que ele possa alcançar a sua próxima fase. Estes atos são denominados pela lei de despachos (art. 162, § 3°, do CPC) e classificados pela doutrina como de mero expediente ou ordinatórios.

(35)

conteúdo decisório, o ato jurisdicional acabou resolvendo uma questão, incidental ou não, dentro do processo. Quando se dá tal fato, o ato perde imediatamente a natureza de despacho e passa a ser considerado decisão interlocutória.

ii. Decisão interlocutória

A decisão interlocutória é o ato decisório por meio do qual o órgão jurisdicional resolve questões incidentais no feito.42 Destinam-se, portanto,

as decisões interlocutórias a preparar a solução final do feito sem, todavia, versar diretamente sobre o mérito da demanda ou determinar a sua extinção sem a resolução do mérito.

O critério que parece ser o mais adequado para identificar o caráter interlocutório de um determinado pronunciamento judicial é o do conteúdo, segundo o qual o importante é analisar se a decisão resolve uma questão incidente no processo.43 Questão incidente é aquela que surge

42 Decisão interlocutória é pronunciamento próprio do juízo de primeiro grau de jurisdição. No âmbito

dos tribunais, questões incidentais também são objeto de decisão, tanto no processamento de recursos, quanto no processamento de questões de competência originária dos tribunais. Entretanto, essas decisões, quando colegiadas, não são meras “decisões interlocutórias”, mas sim acórdãos (artigo 163, do Código de Processo Civil).

43 Sobre o conceito de questão incidente,MARCELO ABELHA RODRIGUES,expõem que “trata-se de um

(36)

acidentalmente no feito. Não diz respeito ao mérito, propriamente dito, mas sim a algum aspecto acessório, como, v.g., a antecipação dos efeitos da

tutela jurisdicional, a realização de provas, o acolhimento de qualquer defesa processual dilatória (conexão, incompetência etc.).44

Antes de decidir diretamente sobre o mérito da causa, ou sobre a impossibilidade de sua análise, o órgão jurisdicional deve analisar uma série de questões precedentes. Primeiramente, deve o magistrado analisar se estão presentes os pressupostos de existência do processo. De nada adianta analisar o pedido do autor se este não for veiculado através de uma relação jurídica processual, tendo em vista as exigências legais do Estado de Direito.

Em segundo lugar, são analisados os pressupostos processuais de validade da relação jurídica processual. Com efeito, não basta que a relação processual exista, é necessário que ela seja eficaz, vale dizer, que seja apta a produzir efeitos jurídicos. Em seguida, é preciso verificar a inexistência de pressupostos processuais negativos (litispendência e coisa julgada), bem como a inocorrência de quaisquer outras das hipóteses

processual possuir natureza jurídica de questão, isto é, quando, no curso normal do processo, surgir uma controvérsia ou dúvida sobre aquilo que se afirma na razão da pretensão (ponto), de modo que pode tratar-se de uma questão incidental relativa ao mérito, ao processo ou até mesmo à ação. Exemplos de questões incidentais são as que surgem na admissão ou não do assistente, na impugnação do valor da causa, na verificação da aceitação da nomeação à autoria etc.” (Suspensão de Segurança, pp. 26-28).

44 Desta forma, “não é o conteúdo específico que elas apresentam que as distingue dos demais

(37)

previstas no artigo 297, do Código de Processo Civil. O último passo a ser dado antes de adentrar propriamente no mérito é a análise das condições da ação uma vez que estes elementos apresentam-se como requisitos para que se possa proferir uma decisão sobre o mérito da lide.

Reconhecida a existência de algum ou alguns elementos que impedem a análise do mérito, deve o órgão jurisdicional proferir, desde logo, decisão terminativa do feito que terá a natureza jurídica de sentença. Todavia, a decisão que reconhece a inexistência de qualquer dos fatores impedientes da análise do mérito acima apontados tem a nítida natureza de decisão interlocutória, vale dizer, de decisão dada no curso do processo que resolve questão incidente preparando, assim, a decisão final a respeito do litígio.

(38)

iii. Sentença

Resolvidas as questões incidentais surgidas no curso do processo, este se encontra em condições de ter solução final, que é a sentença. 45 Desde o advento do atual Código de Processo Civil, para o direito positivo brasileiro, sentença era “o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não o mérito da causa”. O acerto ou falha da legislação em adotar esse conceito essencialmente pragmático, foge aos limites deste estudo.46

Com o advento da lei n.° 11.232/05, sentença passou ser “ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269” (art. 162, § 1°, do CPC). Deixou-se de lado, portanto, a classificação da sentença pelo critério meramente pragmático para se adotar o critério do conteúdo, segundo o qual o ato decisório denominado sentença é todo aquele que resolver o mérito do processo47 ou que atestar a impossibilidade de o fazer, decretando a extinção do processo.48

45 Valendo-se novamente dos ensinamentos de ARRUDA ALVIM, tem-se que “a sentença é o ato

culminante do processo de conhecimento. Na sentença, o juiz, na qualidade de representante do Estado, dá, com base na lei e no direito, uma resposta imperativa ao pedido formulado pelo autor, bem como à resistência oposta a esse pedido, pelo réu, na defesa apresentada.” (Sentença no Processo Civil: as diversas formas de terminação do processo em primeiro grau, p. 20).

46 Não se pode deixar de ressaltar, todavia, que a sentença nunca pôs fim efetivamente ao processo, mas

sim ao procedimento, mormente, ao procedimento em primeiro grau de jurisdição.

47

O Projeto só usa a palavra ‘lide’ para designar o mérito da causa.” (ALFREDO BUZAID. Exposição de Motivos do Código de Processo Civil. Capítulo III, II, 6).

48 “É, portanto, o conteúdo do ato sentencial que o distingue dos demais pronunciamentos judiciais e não

(39)

Para fins de análise do ato jurisdicional que pode dar ensejo à aplicação da multa prevista no art. 475-J, do CPC, pouco interessa a sentença que decreta a extinção do processo sem resolução do mérito, a não pela condenação acessória do vencido ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios. Desta forma, será centrada a atenção na sentença que resolve o mérito da causa.49

A sentença de mérito é o meio por excelência pelo qual o Estado-juiz presta a tutela jurisdicional. Ao proferir uma sentença, o magistrado não

critério que as distingue das decisões interlocutórias. ...<omissis>... Ter ou não aptidão para extinguir o processo não é, efetivamente, critério hábil a definir se está ou não diante de sentença, já que, nas ações executivas lato sensu, a sentença antes de dar cabo ao processo, dá início a uma nova fase processual, voltada à atuação executiva do direito, cuja existência foi reconhecida. ...<omissis>... Em tais situações, o pronunciamento pode ter conteúdo de sentença, mas assim não será considerado, para fins de recorribilidade. É que, em casos como os ora exemplificados, será necessário que o procedimento continue, para que o juiz examine os pedidos – rectius, as ações - que ainda não foram julgados, e, por tal razão, os autos devem permanecer perante o juízo de primeiro grau. Somente se considerará sentença o pronunciamento que resolver a lide (CPC, art. 269) ou declarar que isso é possível (CPC, art. 267) em relação à integralidade das ações ajuizadas ou daquelas que remanesceram, depois que parte delas tiver sido julgada, no mesmo processo. O fato de restar alguma ‘porção’ da lide pendente de julgamento demonstra que o pronunciamento proferido antes da sentença ‘final’ não atendeu, integralmente, ao objetivo da ação de conhecimento, ou não esgotou totalmente a finalidade da fase cognitiva na ação executiva lato sensu. Assim, mesmo nos casos em que o pronunciamento judicial tem conteúdo encartável em uma das hipóteses referidas nos arts. 267 e 269 do CPC, não será cabível apelação, se parte do objeto do processo ainda depender de julgamento. A apelação somente será admissível se o pronunciamento jurisdicional, conquanto fundado no art. 267 ou no art. 269 do CPC tiver esgotado a atividade cognitiva que deveria ter-se realizado perante o juízo de primeira instância, seja porque não há mais mérito a ser julgado, seja porque o mérito não poderá ser julgado” (TERESA ARRUDA ALVIM

WAMBIER, Os Agravos no CPC Brasileiro, p. 109-113). BARBOSA MOREIRA, por sua vez, é pontual ao

afirmar que “...o conceito de sentença, à luz da nova sistemática, deixa de fundar-se em critério topológico para ligar-se ao conteúdo do ato. Nessa perspectiva, a dualidade de referencias, aos arts. 267 e 269, reflete a variação possível desse conteúdo.” (JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA, A nova definição de

sentença, p. 172).

49 Importante ressaltar, todavia, que o novo conceito de sentença trouxe importantes reflexos no âmbito

recursal e na possibilidade de formação gradual da coisa julgada, como bem esclarece JOSÉ HENRIQUE DE

MOUTA ARAÚJO: “...havendo capítulos de mérito já maduros e outros, não, sendo desacumuláveis, não há

(40)

exerce uma atividade somente técnica, mas também uma atividade política e social. O que não se pode perder de vista, todavia, é que estes dois aspectos, não podem, jamais, suplantar o aspecto eminentemente jurídico da prestação jurisdicional.

Não obstante, é através da sentença que o Estado-juiz soluciona a lide levada pelo autor a juízo. Sua função transcende a esfera jurídica, tem relevância política e social de primordial importância para as sociedades civilizadas na medida em que representa o ato mediante o qual o órgão jurisdicional põe fim aos diversos conflitos intersubjetivos de interesses submetidos à sua apreciação. 50

A dinâmica dialética do processo, cuja estrutura basilar funda-se na ação (tese), na jurisdição (antítese) e no processo (síntese),51 tem sua

50 PONTES DE MIRANDA afirma que “extingue-se o processo com o julgamento do mérito sempre que a

extinção resulta de algo que atinge o direito, a pretensão e a ação, ou a pretensão e a ação, ou a pretensão, ou a ação” (Comentários ao Código de Processo Civil, Tomo III, p. 449).

51 A idéia de que a estrutura basilar do processo estaria calcada na ação como tese, na defesa como

antítese e no provimento jurisdicional como síntese é equivocada, pois não atenta para o fato de que a dialética é uma característica do processo como um todo, vale dizer, da relação jurídica processual, e não simplesmente do provimento jurisdicional. Com efeito, em todas as suas fases, o processo desenvolve-se dialeticamente.

A ação, considerada esta como a afirmação de direito feita pelo autor em juízo, é que caracteriza a tese porque é nela que se põem a descoberto as pretensões das partes, ou seja, é através do exercício do direito de ação e de defesa que se exteriorizam as teses das partes.

Por sua vez, o processo não é um instrumento pelo qual as partes fazem valer a sua vontade própria, mas sim, o instrumento pelo qual se efetiva a atividade jurisdicional, vale dizer, o instrumento que o Estado-juiz utiliza para dizer o direito. Sendo assim, a jurisdição apresenta-se, claramente, como antítese, uma vez que se contrapõe à aplicação arbitrária da vontade das partes.

Esclarecido que o processo é o meio pelo qual são equilibradas as forças entre a ação e a jurisdição, evitando que o Estado-juiz venha a cometer arbítrios, claro fica que é nele que se encontra a síntese que forma o trio de características que definem a dialética processual.

No sentido do que aqui se propugna, vale a pena atentar para a as palavras de FERNANDO LUSO SOARES:

(41)

expressão máxima no momento da prolação da sentença de mérito que, ao analisar a pretensão do autor e a defesa do réu, confronta-os com os ditames do ordenamento jurídico, utilizando, para tanto, da forma determinada pela lei.

O aparato jurisdicional está estruturado para que, através do processo, seja possível a prolação de uma sentença de mérito quando presentes os pressupostos necessários à válida formação e desenvolvimento da relação jurídica processual, bem como quando presentes as condições da ação.

A atividade jurisdicional só se realiza, em sua plenitude, quando é possível, ao órgão jurisdicional, resolver a questão de fundo retratada no processo. Somente nesse momento é que está cumprida, por completo, a função jurisdicional do Estado.52

produto do trabalho desenvolvido, este corresponde à existência concreta do processo. E é desde logo evidente que aquelas três ordens de entidades (o juiz, as partes, o processo) se reduzem à chamada ‘trilogia estrutural’ – acção, jurisdição, processo. A acção (o direito de acção), de que são titulares (opostamente) as partes, e a jurisdição, que pertence ao juiz, constituem no seu encontro dinâmico as forças que fazem com que o processo nasça e se desenvolva a partir do seu modelo normativo. Têm os autores falado, a tal propósito, em dialéctica do processo – por exemplo, os professores MANUEL

RODRIGUES,MANUEL DE ANDRADE,CASTRO MENDES e muito explicitamente EDUARDO COUTURE: ‘O

que constitui a estrutura do processo – escreveu COUTURE – é a ordem dialéctica. O processo judiciário e

o processo dialéctico aparecem-nos assim ligados por um vínculo profundo. Atinge-se a verdade por meio de oposições e refutações; por teses, por antíteses e por sínteses. A justiça serve-se da dialéctica porque o princípio da contradição é que permite, pela confrontação dos opostos, chegar à verdade’.” (Processo Civil de Declaração, pp. 105-106).

52 Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito, não parece ser correto afirmar que não

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