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Como já se mencionou antes,139 a lei exige que o cumprimento das obrigações pecuniárias, como, de resto, acontece com todas as outras espécies de obrigações, se dê na data na data do vencimento (art. 315, do CC). A penalidade para a inobservância desta norma é a constituição ipso

jure do devedor em mora, conforme determina o art. 397, do CC, quando o

vencimento tem dia certo para ocorrer.

Via de regra, as obrigações pecuniárias apresentam data certa para o seu vencimento, razão pela qual a regra que se lhes aplica é a dies

interpellat pro homine, vale dizer, o advento do vencimento é suficiente,

por si só, para constituir o devedor em mora, independentemente de qualquer outra formalidade. Nos casos em que não há data certa para o vencimento da obrigação, é necessária a interpelação, judicial ou extrajudicial, do devedor para constituí-lo em mora (hominem interpellat

pro homine).140

139 Ver Cap. III, item 2, e Cap. IV, item 1, supra.

140 Art. 397, do CC. É por esta razão que o art. 219, do CPC, determina que um dos efeitos da citação

válida é a constituição do devedor em mora. Segundo ARRUDA ALVIM, “a citação inicial válida produz os

seguintes efeitos: a) completa a formação do processo, agora em relação ao réu, pois o mesmo já existia entre o autor e o juiz, como relação bilateral (art. 263, primeira fase); ou, então, triangulariza a relação jurídica processual; b) e, especificamente, produz os efeitos discriminados no art. 219 do CPC, quais sejam, previne a competência, induz litispendência, faz litigiosa a coisa, constitui o devedor em mora e interrompe a prescrição (estes dois efeitos podem preceder à citação, conforme tenha sido o caso)”

Conceitua-se mora como o atraso culposo141 no adimplemento da obrigação.142 Pode ela ser do devedor (mora solvendi) ou do credor (mora

accipiendi). No primeiro caso, fica o devedor responsável pelos prejuízos

que a sua mora der causa, aos quais são acrescidos juros, correção monetária e honorários advocatícios,143 bem como pelo risco de impossibilidade superveniente da prestação, ainda que decorrente de caso fortuito ou força maior, se aquela sobrevier durante o período de atraso. A

(Manual de Direito Processual Civil, v. II, p. 279). ANDRÉ DE LUIZI CORREIA, por sua vez, esclarece bem

que “os efeitos de natureza processual da citação são a prevenção, a litispendência e a litigiosidade da coisa. E os de natureza material são a constituição em mora do devedor e a interrupção da prescrição. Mas os efeitos da citação não são apenas aqueles encartados no art. 219 do Código de Processo Civil. Existem autores, como Milton Sanseverino e Roque Komatsu, que apontam a existência, no campo processual, de uma série de outros efeitos da citação: ‘impede a modificação do pedido ou da causa de pedir (art. 264, 1.ª parte); acarreta a estabilização das partes, que só podem ser substituídas nos casos permitidos em lei (art. 264, 2.ª parte); estabelece o termo a quo do prazo para resposta ou embargos (arts. 297 e 241; combinados; art. 738, n. IV; 802, parágrafo único, n. I etc), completa a relação processual, que se iniciara com a ação proposta pelo autor (art. 263, 1.ª parte), tornando o processo apto a desenvolver-se validamente (art. 214)’. A esses exemplos acrescentamos: a impossibilidade de o autor desistir da ação, sem a anuência do réu. Dentre os efeitos da citação, Arruda Alvim destaca, ainda, a triangularização da relação jurídica processual, isto é, a formação do processo com relação ao réu, pois o mesmo já existia entre o autor e o juiz, como relação bilateral.” (A Citação no Direito Processual Civil Brasileiro, p. 51- 52).

141 A culpa é elemento essencial da mora. Tanto é assim que o art. 396, do CC, isenta o devedor de

responsabilidade pela mora quando esta não deriva de fato ou omissão a ele imputável, embora, conforme

alerta ORLANDO GOMES, “não é pacífica a exigência da culpa do devedor como elemento indispensável

da mora. Para alguns, deve ser dispensado, seja qual for a natureza da divida, enquanto outros o reclamam somente nas dívidas pecuniárias. Prevalece, no entanto, a opinião contrária. Assim, na doutrina, como nas legislações, a mora é tida como injusto retardamento no cumprimento da obrigação. Na sua conceituação, é imprescindível o elemento subjetivo, que se configura pela culpa. Nem pode ser de outro modo. Quem não paga no tempo devido já por isso mesmo revela culpa, não incorrendo o devedor em mora se não houver fato ou omissão que lhe seja imputável” (Obrigações, p. 202). Já SILVIO RODRIGUES é mais

categórico ao afirmar que “a culpa é elementar na mora do devedor – Da conjunção dos arts. 394 e 396 do Código Civil se deduz que sem culpa do devedor não há mora. Se houve atraso, mas este não resultou de dolo, negligência o imprudência do devedor, não se pode falar em mora. (...) O atraso no pagamento cria uma presunção de culpa, que pode ser ilidida pelo devedor provando que não a teve, ou porque o retardamento adveio de caso fortuito” (Direito Civil: parte geral das obrigações, p. 245).

142 Segundo LUIZ DÍEZ-PICAZO eANTONIO GULLON: “Según el artículo 1.100 del Código civil, «incurren

en mora los obligados a dar o hacer alguna cosa desde que el acreedor les exija judicial o extrajudicialmente el cumplimiento de la obligación». Por tanto, hay que conectar la mora con la idea de tiempo en que la prestación ha de cumplirse. Si illegado el mismo el deudor no cumple, no hay duda de que infringe, por ese merro retardo, su deber jurídico, pero no surge la mora. Mora y retardo son conceptos que no coinciden automáticamente, y por eso se ha dicho que la mora es um retardo

cualificado” (Sistema de Derecho Civil, p. 204). No mesmo sentido é a lição de WASHINGTON DE BARROS

MONTEIRO, in verbis: “mora é o retardamento na execução da obrigação. Imputável tanto ao devedor

como ao credor, denomina-se debitoris vel solvendi, no primeiro caso, e creditoris vel accipiendi, no segundo” (Curso de Direito Civil: Direito das Obrigações, p. 320).

única hipótese excepcionada pela lei é a de isenção de culpa ou de impossibilidade de prevenir o dano, mesmo que a obrigação tivesse sido tempestivamente adimplida.144

Pode o credor incidir em mora quando não cumpre as diligências previstas para viabilizar o adimplemento pelo devedor, caracterizando, assim, a mora accipiendi. Neste caso, para além de ficar aberta ao devedor a possibilidade de fazer o pagamento por consignação,145 fica ele, também, isento de responsabilidade pela conservação da coisa, sujeitando o credor a ressarcir eventuais despesas de conservação feitas pelo devedor durante o período de atraso e a aceitá-la pela estimação mais favorável ao devedor, caso este venha a oscilar neste período.146

A lei prevê a possibilidade de purgação da mora tanto do devedor quanto do credor. Com efeito, oferecendo o devedor a prestação devida acrescida dos prejuízos verificados até a data da oferta, purga ele a sua mora. Já o credor pode purgar sua mora colocando-se à disposição para o recebimento da prestação devida e sujeitando-se aos efeitos da mora até essa data.147

Não obstante, é importante verificar que a mora, em si mesma considerada, já configura descumprimento da obrigação, uma vez que esta

144 Art. 399, do CC. 145 Ver Cap. IV, 2, ii, supra. 146 Art. 400, do CC. 147 Art. 401, do CC.

deve ser cumprida no seu vencimento, como já se disse. Verificada a mora, portanto, o adimplemento da obrigação só pode ser realizado se ainda interessar ao credor. Caso contrário, fica facultado a este enjeitar o cumprimento e exigir indenização por perdas e danos.148 Nas obrigações pecuniárias, entretanto, o cumprimento da obrigação é sempre de interesse do credor, ou de quem o suceder, a quem assistirá o direito de perceber juros, correção monetária e honorários advocatícios, conforme já se afirmou (art. 395, do CC).

No documento Vitor Jose de Mello Monteiro (páginas 94-97)