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RAWLS E A EDUCAÇÃO UM OLHAR PARA O MODELO DE EDUCAÇÃO MOÇAMBICANA À LUZ DA TEORIA DA JUSTIÇA DE JOHN RAWLS.

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Instituto de Filosofia, Artes e Cultura Programa de Pós-Graduação em Filosofia

Dissertação

RAWLS E A EDUCAÇÃO UM OLHAR PARA O MODELO DE EDUCAÇÃO MOÇAMBICANA À LUZ DA TEORIA DA JUSTIÇA DE JOHN RAWLS

.

Romeu Ricardo Cândido

2021

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ROMEU RICARDO CÂNDIDO

RAWLS E A EDUCAÇÃO: UM OLHAR PARA O MODELO DE EDUCAÇÃO MOÇAMBICANA À LUZ DA TEORIA DA JUSTIÇA DE JOHN RAWLS.

MESTRADO EM FILOSOFIA

Dissertação apresentada à Banca Examinadora do Programa de Pós- Graduação em Filosofia da Universidade Federal de Ouro Preto, como exigência parcial em obtenção do título de Mestre em Filosofia, sob a orientação do Prof.

Dr. Mário Nogueira de Oliveira.

OURO PRETO 2021

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C217r Cândido, Romeu Ricardo.

Rawls e a educação [manuscrito]: um olhar para o modelo de

educação moçambicana à luz da teoria da justiça de Jhon Rawls. / Romeu Ricardo Cândido. - 2021.

74 f.

Orientador: Prof. Dr. Mario Nogueira Oliveira.

Dissertação (Mestrado Acadêmico). Universidade Federal de Ouro Preto. Mestrado em Filosofia. Programa de Pós-Graduação em Filosofia.

1. Justiça (Filosofia). 2. Rawls, John, 1921-2002. 3. Educação. 4.

Moçambique. I. Oliveira, Mario Nogueira. II. Universidade Federal de Ouro Preto. III. Título.

CDU 111.852(043.3) SISBIN - SISTEMA DE BIBLIOTECAS E INFORMAÇÃO

Bibliotecário(a) Responsável: Paulo Vitor Oliveira - CRB6/2551

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INSTITUTO DE FILOSOFIA ARTES E CULTURA DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA

FOLHA DE APROVAÇÃO

Romeu Ricardo Cândido

Rawls e a educação: um olhar para o modelo de educação de Moçambique à luz da teoria da Justiça de John Rawls

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade Federal de Ouro Preto como requisito parcial para obtenção do tulo de Mestre em Filosofia.

Aprovada em 26 de novembro de 2021

Membros da banca

Dr. Mário Nogueira de Oliveira - Orientador (Universidade Federal de Ouro Preto) Dr. Sérgio Henrique Neves de Miranda ( Universidade Federal de Ouro Preto) Dr. Walter Valdevino Oliveira Silva - (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro)

Mário Nogueira de Oliveira, orientador do trabalho, aprovou a versão final e autorizou seu depósito no Repositório Ins tucional da UFOP em 10/03/2021

Documento assinado eletronicamente por Mario Nogueira de Oliveira, PROFESSOR DE MAGISTERIO SUPERIOR, em 10/03/2022, às 10:25, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 6º, § 1º, do Decreto nº 8.539, de 8 de outubro de 2015.

A auten cidade deste documento pode ser conferida no site h p://sei.ufop.br/sei/controlador_externo.php?

acao=documento_conferir&id_orgao_acesso_externo=0 , informando o código verificador 0290510 e o código CRC 612237D7.

Referência: Caso responda este documento, indicar expressamente o Processo nº 23109.002689/2022-18 SEI nº 0290510

R. Diogo de Vasconcelos, 122, - Bairro Pilar Ouro Preto/MG, CEP 35400-000 Telefone: (31)3559-1728 - www.ufop.br

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Agradecimentos

Agradecimentos

A Deus por me proporcionar perseverança durante toda a minha vida.

Ao meu orientador, professor Mario Nogueira de Oliveira pela sua dedicação e, pelas valiosas contribuições dadas durante todo o processo da pesquisa.

À Universidade Federal de Ouro Preto, seu corpo docente e a todos os funcionários do IFAC que demonstraram estar comprometidos com a qualidade e excelência do ensino, em especial a Claudinéia Guimarães, secretária do Departamento de Filosofia, pela recepção, acolhimento e orientação acadêmica.

Ao Grupo Coimbra de Universidades Brasileiras por me conceder a bolsa de estudos para realizar os meus estudos na Universidade Federal de Ouro Preto.

Aos meus pais, Ricardo Candido e minha mãe Maria Chico pela motivação, incentivo e atenção dedicada quando sempre precisei.

À minha querida esposa, aos meus filhos e meus irmãos pelo seu amor incondicional e por compreender minha dedicação ao projeto de pesquisa.

A todos os meus amigos e colegas do curso que compartilharam dos inúmeros desafios que enfrentamos, sempre com o espírito colaborativo.

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Sumario

Resumo...02

Introdução...03

Capítulo I: Rawls e a justiça...10

Capítulo II: Rawls e a educação...20

Capítulo II: Educação em Moçambique...41

Capítulo IV: As leis educacionais moçambicanas e princípios de justiça de Rawls...53

Capitulo V: Considerações finais...71

Referências bibliográficas...74

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RESUMO

O presente estudo tem como objetivo relacionar os princípios, objetivos e fundamentos da educação moçambicana com valores democráticos defendidos na teoria da justiça de John Rawls. É um estudo que visa perceber se as leis que regem o sistema educativo moçambicano são ou não consistentes com os princípios de liberdade e igualdade de John Rawls. As políticas educativas moçambicanas atuais são o resultado de uma série de transformações históricas e políticas ocorridas no país, em que sua consistência encontra uma explicação na filosofia política de Rawls considerada como um dos instrumentos fundamentais para a resolução dos problemas de justiça social e econômica nas sociedades liberais democráticas. O texto desta dissertação é fruto de um trabalho baseado numa pesquisa bibliográfica e documental que objetiva demonstrar até que ponto o direito à educação, garantido através do Ato Colonial de 1930, Lei do Sistema Nacional de Educação e da Constituição da República de Moçambique, encontra respaldo nos escritos sobre justiça social de Rawls. A pesquisa nos levou ao entendimento de que a teoria de Rawls tem suas raízes no contratualismo político que objetiva demonstrar como a escolha dos princípios de justiça é importante para a resolução dos problemas das desigualdades (sociais, econômicas, políticas, culturais etc.) nas sociedades democráticas liberais. Este matiz democrático da teoria da justiça nos levou a relacioná-la às normas e diretrizes educacionais moçambicanas, no sentido de entender se estas leis respeitam os princípios democráticos defendidos por John Rawls. Em suma, buscamos entender a pertinência dos escritos de algumas partes de Uma Teoria da Justiça e O Liberalismo Políticocomo instrumentos apropriados para a explicação mais aglutinadora sobre os objetivos, os fundamentos e os princípios da educação moçambicana. Assim, notamos que há uma relação direta entre a Constituição de 1975, as leis do sistema nacional de educação 4/83 e 6/92 com as ideais de John Rawls, demonstrando, portanto, a consistência dos princípios de justiça na explicação das normativas educativas moçambicana.

Palavras-chave: Justiça como equidade. John Rawls. Sistema Nacional de Educação de Moçambique.

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ABSTRACT

This study aims to relate the principles, objectives and foundations of Mozambican education with democratic values defended in John Rawls' theory of justice. It is a study that aims to understand whether the laws that govern the Mozambican education system are or are not consistent with John Rawls' principles of freedom and equality. Current Mozambican educational policies are the result of a series of historical and political transformations that have taken place in the country, in which its consistency finds an explanation in Rawls' political philosophy, considered as one of the fundamental instruments for solving the problems of social and economic justice in liberal democracy societies. The text of this dissertation is the result of a work based on bibliographical and documentary research that aims to demonstrate the extent to which the right to education, guaranteed through the 1930 Colonial Act, the Law on the National Education System and the Constitution of the Republic of Mozambique, is supported in Rawls's writings on social justice. The research led us to the understanding that Rawls' theory has its roots in political contractualism, which aims to demonstrate how the choice of principles of justice is important for solving the problems of inequalities (social, economic, political, and cultural, etc.) in liberal democratic societies. This democratic nuance of the theory of justice led us to relate it to Mozambican educational norms and guidelines, in order to understand if these laws respect the democratic principles defended by John Rawls. In short, we seek to understand the relevance of the writings of some parts of A Theory of Justice and Political Liberalism as appropriate instruments for a more unifying explanation of the objectives, foundations and principles of Mozambican education. Thus, we note that there is a direct relationship between the 1975 Constitution, the laws of the national education system 4/83 and 6/92 with the ideals of John Rawls, thus demonstrating the consistency of the principles of justice in the explanation of Mozambican educational regulations.

Keywords: Justice as fairness. John Rawls. Mozambique's National Education System.

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INTRODUÇÃO

John Rawls (1921-2002), filósofo político norte-americano, considerado um dos maiores representantes da teoria da democracia liberal dos dias de hoje, teve como principal obra Uma Teoria da Justiça, publicada inicialmente no ano de 1971 e que teve grande repercussão no meio político e acadêmico. A publicação da Uma Teoria da Justiça (TJ) revigorou o campo da Filosofia Política do século XX, inspirando vários filósofos pelo mundo afora e impactando, de certo modo, outros campos do conhecimento como Direito, Sociologia, Economia e Educação, mesmo que o autor não tenha escritos mais longos relacionados à temática educativa em sua obra. Sua teoria, justiça como equidade, é para designar a doutrina contratualista e deontológica da justiça defendida por Rawls, a partir de 1957. Seu traço essencial é a “afirmação da prioridade do justo sobre o bem e a definição da justiça pela equidade do processo de escolha dos princípios de justiça” (RAWLS 2002, p. 13).

No entanto, ao apresentar em Uma Teoria da Justiça, uma hipótese de substituição do pacto social por uma situação hipotética de posição original, Rawls generaliza sua teoria, complementando e superando a tradicional concepção de contrato social que dominou a filosofia anglo saxônica durante muito tempo. Por essa via, ele tenta mostrar as diferenças entre as concepções clássicas de justiça e a teoria de justiça como equidade. Assim, o autor concebe a teoria da justiça como uma concepção política de justiça válida para uma democracia que se sustenta apenas pelas ideias intuitivas assente nas instituições políticas de regime democráticos e constitucionais. Assim, ao elaborar sua teoria, Rawls pretendia demonstrar que ela é uma concepção válida para uma democracia que, ao mesmo tempo, seja sistemática e razoável, e que seja também uma alternativa melhor que o utilitarismo1. Isto é, a justiça como equidade constitui um esforço na busca de princípios da justiça alternativos ao utilitarismo. Isso porque, Rawls considerou desde cedo que a doutrina utilitarista representava um sério perigo para uma democracia constitucional, pelo fato dela pregar que a sociedade está ordenada de forma correta e, portanto, justa, quando suas instituições mais importantes estão planejadas de modo a conseguir o maior saldo líquido de satisfação obtido a partir da soma das participações individuais de todos os seus membros (RAWLS, 2002, p. 25). Dessa

1 Doutrina clássica de Bentham e Mill, segundo a qual uma ação é boa se as suas consequências aumentam a felicidade do maior número de pessoas (RAWLS, 2000, p. 382)

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maneira, os utilitaristas estariam a justificar certas violações nos direitos individuais de alguns grupos minoritários, ou mesmo de pessoas em particular, em detrimento do aumento da felicidade no geral. Neste caso, consideramos o utilitarismo como uma teoria política incompatível para explicar questões ligadas à liberdade e igualdade do direito à educação em Moçambique, como uma sociedade governada por uma democracia constitucional.

No entanto, para o contexto acadêmico, a filosofia política de Rawls ganhou corpo para mim, especialmente quando abordamos temas relacionados com a disciplina Tópicos Especiais de Ética e Filosofia Política XV - Justiça, Individualidade e Intersubjetividade: a Psicologia Moral na Teoria Política de Rawls,vinculada às duas grandes obras, Uma Teoria da Justiça e O Liberalismo Político. É por isso que, das várias leituras e discussões sobre a TJ e PL notamos que sua filosofia política tem por objeto discutir questões ligadas ao igualitarismo e a justiça distributiva, sempre primando pela liberdade e prioridade aos mais desfavorecidos. Ou seja, a questão de fundo para Rawls, é poder demonstrar como a escolha dos princípios de justiça é importante para a resolução dos problemas das desigualdades (sociais, econômicas, políticas, culturais etc.) nas sociedades pautadas pelas democracias liberais.

O tema desta dissertação circunscreve-se na relação entre a justiça e a educação, mais especificamente, entre a teoria da justiça como equidade desenvolvida por John Rawls, na obra Uma Teoria da Justiça e as principais normas que regem o direito à educação em Moçambique: o Ato Colonial, a Constituição da República Popular de Moçambique e as leis do Sistema Nacional de Educação (SNE). Ao pretendermos estudar as normas que regem os fundamentos da educação em Moçambique com os princípios de justiça entendemos que as ideias que tratam da educação em Rawls justificam-se pela preocupação que o autor dá à criação das instituições sociais e à maneira como estas funcionam dentro da estrutura básica da sociedade. Ou seja, suas reflexões sobre a educação são extratos dos seus escritos sobre a justiça (TJ), pois, no caso concreto de Moçambique, o direito à educação, por exemplo, é reconhecido e garantido no texto constitucional e nas leis do Sistema Nacional de Educação. Com isso, a educação deve poder demonstrar sua relação direta com princípios de justiça que imprimam os valores de igualdade e liberdade como pensados por Rawls.

Contudo, para cotejarmos os princípios, fundamentos e objetivos da educação moçambicana com os princípios de justiça de Rawls, será fundamental primeiro analisar o cerne da sua teoria da justiça, isso porque a educação como uma instituição social faz

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parte da estrutura básica da sociedade para a qual os princípios de justiça são construídos. De fato, a escolha e aplicação desses princípios ocorrem em quatro estágios: no primeiro momento os indivíduos ainda estão cobertos pelo véu de ignorância e imersos na posição original. Já no segundo momento, as pessoas já retiraram uma pequena parcela do véu de ignorância, podendo estabelecer uma convenção constituinte pautada pelo princípio da liberdade básica igual. E no terceiro momento, com maiores conhecimentos sobre sua realidade e subsidiado pelos ideais da constituição, os indivíduos desenvolvem leis que normatizam a igualdade equitativa de oportunidades e o princípio da diferença. Parece-nos crucial considerarmos o terceiro estágio da escolha e aplicação dos princípios de justiça como o ideal para analisarmos a consistência das leis do sistema de educação em Moçambique com os princípios da igualdade de oportunidades e o princípio de diferença em Rawls. No último estágio, sem resquícios do véu de ignorância, as regras são aplicadas a casos particulares para que não haja injustiças.

Considerando que os princípios de justiça de Rawls são aplicáveis às sociedades democráticas, a escolha por Moçambique se faz necessária pelo longo caminho que o país percorreu para a construção de um estado democrático e de direito que teve seu início em 1950 com a formação de movimentos pan-africanistas e de libertação nacional até a aprovação da primeira constituição multipartidária em 1990.

No tocante às temáticas relacionadas com políticas educativas moçambicanas, importa referir que as vivências acadêmicas adquiridas durante minha graduação em ensino de História e Geografia em 2007, na Universidade Sagrada Família, auxiliadas pelas disciplinas como: Fundamentos da Pedagogia, Didática Geral, História da Pedagogia, Psicologia Pedagógica, Metodologia de Ensino em Geografia e História e Prática Pedagógica em História e Geografia, contribuíram bastante para uma maior familiarização com o tema. Adicionado a isto, os meus estágios pedagógicos em História e Geografia possibilitaram-me, de igual modo, conciliar a teoria com a prática, na área de docência – o que implicou uma ampliação dos conhecimentos sobre Didática e Pedagogia especialmente auxiliados pela obra de Paulo Freire, A Pedagogia do Oprimido e de Cândida Maria Proença, Didática de Ciências Sociais.

Como podemos notar, as experiências acadêmicas permitiram-me selecionar de forma mais criteriosa os autores que discutem questões ligadas às políticas educativas em Moçambique. Assim, como forma de construir nosso embasamento teórico, no que tange à retrospectiva histórica e política sobre a educação em Moçambique, recorremos

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à leitura do Relatório de AFRIMAP (2012), A Prestação Efetiva de Serviços Públicos no Sector da Educação e às obras de: UACIQUETE, S. Adriano (Modelos de Administração da Educação em Moçambique), AFONSO, A. (Políticas Educativas e Avaliação Educacional), MONDLANE, Eduardo (Lutar por Moçambique), MAZULA, Brazao (Educação, Cultura e Ideologia em Moçambique 1975-1985), NGOENHA, Severino (Os Missionários Suíços Face ao Nacionalismo Moçambicano) e TEODORO, Antonio. (Globalização e Educação: Políticas educacionais e novos modelos de governação).

Tomado em consideração que a história da educação em Moçambique foi sempre caracterizada por aprovação de normas, decretos e leis, é importante elencarmos e discutirmos aqueles ordenamentos jurídicos que serviram de base para o funcionamento do sistema educativo no país. Nesse contexto, para uma compreensão mais profunda sobre os princípios, fundamentos e objetivos da educação em Moçambique, valemo-nos dos textos: Diploma Legislativo nº 238 de 17 de Maio de 1930 - Ato Colonial de 1930; a Constituição da Republica popular de 1975; a Lei 4/83 de 23 de Março (Aprova a Lei Nacional de Sistema Nacional de educação e define os princípios fundamentais na sua aplicação), e a Lei 6/92 de 6 de Maio (Reajusta o quadro geral do sistema educativo e adéqua as disposições contidas na lei 4/83 ).

Diante destas leis acima citadas, é possível compreender nas interlinhas que historicamente a aprovação dos primeiros diplomas das colônias permitiu desde cedo que a educação como um direito social público fosse negado à maioria da população moçambicana, por alegações vinculadas às desigualdades sociais e econômicas entre os colonos portugueses e os colonizados. De igual modo, estas restrições do acesso ao direito à educação permitiram que o sistema educativo moçambicano, denominado (SNE), sofresse ao longo da sua história várias reformas para se adequar às condições socioeconômicas e políticas do país. Por conta disso, parece-nos crucial responder à seguinte questão central deste trabalho: até que ponto os fundamentos que regem o direito à educação em Moçambique segundo no Ato Colonial, a Constituição da República Popular de Moçambique e, as leis do Sistema Nacional de Educação 4/83 e 6/92 seriam consistentes ou inconsistentes com princípios de justiça social (liberdade e igualdade), considerados como valores democráticos defendidos por Rawls?

Para responder à questão que levantamos para a nossa pesquisa, que assume um enfoque somente qualitativo, analisamos as legislações que regem os princípios, fundamentos e objetivos da educação em Moçambique, confrontando-os com os escritos

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sobre a educação contida em algumas partes das obras Uma teoria de justiça e O liberalismo político. Assim, o objetivo geral desta dissertação é analisar a consistência ou inconsistência das normas que regem o direito à educação em Moçambique com os princípios de justiça (liberdade e igualdade) de Rawls. Como forma de delimitar ainda mais o nosso estudo, formulamos um conjunto de objetivos específicos, a saber: a) elencar os principais conceitos da teoria da justiça rawlsiana, como sociedade bem ordenada, cooperação social, estrutura básica da sociedade presentes nas obras mencionadas; b) apresentar as teses centrais de Rawls sobre justiça, seu objeto e função e princípios de justiça; c) analisar a evolução histórica do sistema nacional de educação em Moçambique, suas transformações e seus desafios; d) discutir a consistência ou inconsistência das diretrizes educacionais contidas na Lei do Sistema Nacional de Educação com princípios de justiça rawlsiano.

Para encontrarmos as possíveis respostas do problema que levantamos acima apresentamos a seguir duas hipóteses do nosso estudo:

A. Se não houver consistência entre as leis educacionais moçambicanas (Ato Colonial, Constituição de 1975 e as leis 4/83 e 6/92 do Sistema Nacional de Educação) e os princípios de justiça (liberdade e igualdade), o sistema educacional em moçambicano não será justo, democrático nem liberal e os cidadãos não poderão ter o direito a obter uma educação necessária em condições de igualdade equitativa de oportunidade para desenvolver livremente as habilidades e aptidões individuais para debater, questionar, intervir, tomar suas próprias decisões ou propor mudanças no seu meio social.

B. Se existe consistência entre as leis educacionais moçambicanas e os princípios de justiça (liberdade e igualdade) de Rawls, então a educação moçambicana é justa, democrática e liberal e a todos os indivíduos é garantido o direito a obter uma educação em condições de igualdade equitativa de oportunidades para adquirir uma autonomia ou capacidade moral, que lhe permita escolher livremente as várias concepções de vida e participar na vida política e democrática.

Já clarificadas as notas introdutórias de forma sintética, a ideia central do nosso estudo, a justificação da escolha do tema, o caminho a ser percorrido, a bibliografia básica indispensável, a metodologia de estudo, as hipóteses e os objetivos, passaremos a apresentar os capítulos que fazem parte da presente dissertação. Assim, a presente dissertação é composta por 5 capítulos, a saber:

Capítulo 1, apresentamos as teses de Rawls sobre a ideia de justiça. Nesse ponto,

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a ideia central é analisar os fundamentos da teoria da justiça como equidade, com objetivo de perceber como o autor discute a questão de construção de uma sociedade justa a partir dos princípios de justiça. Para tal, definimos primeiro os conceitos de base que sustentam a ideia de justiça de Rawls, como a cooperação social, sociedade bem ordenada, estrutura básica da sociedade. Já clarificados tais conceitos de base da teoria da justiça, analisamos a função da justiça e seu objeto e as condições necessárias para a escolha e aplicação dos dois princípios de justiça.

No capitulo 2, abordamos os escritos de Rawls sobre a educação, descrevendo a importância que o autor lhe outorga, como por exemplo, um dos bens primários sociais indispensáveis à formação do senso de justiça dos indivíduos. Demonstramos, igualmente, como a educação se encontra de certa forma atrelada aos dois princípios de justiça (liberdade e igualdade), mas especificamente quanto à igualdade de oportunidades e o princípio da diferença.

No capítulo 3, analisamos a educação em Moçambique, partindo das três leis:

Ato Colonial de 1930, uma norma que orienta os princípios da educação colonial a partir de 1930 até 1975. A Constituição da República Popular de Moçambique, um dos principais instrumentos jurídico que também orientou o sistema educacional nos primórdios da independência nacional em 1975 até a aprovação da primeira lei do Sistema Nacional de Educação 4/83. Ancorados neste capítulo, apresentamos as reformas feitas na lei 4/83 do SNE o que contribui de certa forma para a aprovação da lei 6/92 do SNE. De forma sintética, apresentamos neste capítulo as mudanças históricas e políticas que a educação atravessou desde a aprovação da primeira legislação que orientava toda a práxis pedagógica, quer nos princípios, fundamentos e objetivos até a atual fase do liberalismo e a consolidação da democracia multipartidária.

No capítulo 4, analisamos as consequências da consistência ou inconsistência das leis do sistema nacional de educação moçambicana com os princípios de justiça de Rawls. Por fim, com base em um saldo das nossas discussões procuramos responder neste capítulo o problema da nossa pesquisa: até que ponto os fundamentos que regem o direito à educação em Moçambique segundo o Ato Colonial, a Constituição da República Popular de Moçambique e, as leis do Sistema Nacional de Educação 4/83 e 6/92 seriam consistentes ou inconsistentes com princípios de justiça de Rawls?

Por fim, no 5º Capítulo, apresentaremos as considerações finais do trabalho, demonstrando o percurso da nossa pesquisa, os resultados alcançados durante o estudo e

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demonstrando o quão importante é a teoria de Rawls para o entendimento das questões educacionais em Moçambique.

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1. RAWLS E JUSTIÇA

A obra Uma teoria da justiça (TJ) de John Rawls, publicada em 1971, visa realizar a busca de princípios e critérios racionais de justiça que possam guiar a construção de instituições sociais justas. A TJ é o resultado de um esforço para esclarecer um modelo de justiça que permitiu proporcionar a quebra de antigas barreiras teóricas ocidentais se tornando um suporte para diversas teorias atuais. Isto é, “o pensamento liberal de Rawls e suas proposições contribuíram para o aprofundamento de temas relativos à justiça distributiva, à economia do bem-estar, ao comunitarismo, ao feminismo, ao multiculturalismo e ao reconhecimento, entre outros” (FERES JÚNIOR e POGREBINSCHI, 2010, p. 11).

No entanto, a construção da teoria de justiça de Rawls precede da compreensão dos conceitos básicos que sustentam a idealização do seu projeto societário que tem por fim buscar princípios que possam orientar a construção de uma sociedade justa. De forma geral esses conceitos são “a ideia de sociedade como um sistema de cooperação social”, “a ideia de sociedade bem ordenada” “a ideia de estrutura básica da sociedade”.

O primário conceito descrito por Rawls para compreendermos os elementos fundamentais que sustentam sua teoria diz respeito à ideia de sociedade como sistema de cooperação social. A sociedade, como sistema equitativo de cooperação social significa que a colaboração entre os cidadãos:

guia-se por regras e procedimentos públicos reconhecidos; que cada participante aceita a ideia de cooperação, num sentido de reciprocidade ou mutualidade, consistente em que cada cidadão que contribua para a sociedade deve se beneficiar da cooperação, segundo as regras e procedimentos estabelecidos (RAWLS 2003, p. 9).

Neste sentido, uma cooperação social justa é o ideal de uma sociedade bem ordenada porque além de guiar-se por regras e procedimentos publicamente reconhecidos, suas instituições sociais e políticas não aceitam propor regras e normas que têm por objetivo suprimir os direitos e liberdades básicas a qualquer grupo ou classe.

Sociedade bem-ordenada é uma sociedade efetivamente regulada por uma concepção política e pública de justiça (RAWLS, 2003, p. 12). Ou seja, é uma sociedade na qual todos os seus membros aceitam os mesmos princípios de justiça; onde todos os participantes sabem e acreditam que a estrutura básica da sociedade (suas principais instituições políticas e sociais e a maneira como essas instituições agem mutuamente) respeita os princípios de justiça. Neste caso, os membros de uma

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sociedade bem ordenada ao reconhecer e agir de acordo com os princípios de justiça estes têm a noção que estes princípios se alinham à estrutura básica da sociedade.

Por sua vez, a estrutura básica da sociedade, para Rawls (2003, p. 16), seria organizada por um princípio de cooperação em que as principais instituições políticas, sociais e econômicas da sociedade se articulariam para formar um sistema único de cooperação social. Assim atuariam de forma concertada para distribuírem direitos e deveres básicos, bem como determinariam a divisão das vantagens provenientes da cooperação social, no transcorrer de uma geração até a seguinte. A explicação da estrutura básica pode ser resumida da seguinte forma:

Posição original → Princípios de justiça → Estrutura básica da Sociedade

Já clarificados os conceitos de base que norteiam a teoria de justiça no ponto a seguir apresentamos a função de justiça e seu objeto na cooperação social, e posteriormente discutimos a questão da posição original e véu de ignorância considerado premissas indispensáveis para que os indivíduos na condição de cidadãos livres e iguais façam a escolha de princípios de justiça para estrutura básica da sociedade.

1.1. A função da Justiça

Rawls inicia este debate conceituando que a justiça deve ser considerada como a

“primeira virtude das instituições sociais tal como a verdade o é dos sistemas de pensamento” (RAWLS, 2002, p. 4). Partindo deste pressuposto Rawls procura estabelecer princípios e critérios racionais para a construção de sociedade uma justa, onde suas principais as instituições políticas e sociais distribuem de forma justa os direitos e deveres, vindos das vantagens e dos benefícios da cooperação social.

Contudo, o autor postula que por mais eficazes e bem organizadas que sejam as leis e as instituições, estas devem ser reformuladas ou abolidas se são injustas, pois, numa sociedade justa “as liberdades e os direitos da cidadania igual são considerados invioláveis” (RAWLS, 2002, p. 4). Isto é, os direitos já assegurados pela justiça não estão sujeitos à negociação política ou interesses pessoais, isso porque, constituem direitos escolhidos coletivamente, na posição original. Para o caso em apreço, o autor reforça sua ideia partindo do princípio de que cada membro da sociedade possui uma

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“inviolabilidade” fundamentada na justiça que nem bem-estar maior da sociedade como um todo pode ignorar, ou seja, “a justiça nega que a perda da liberdade de alguns se justifique por um bem maior partilhado por outros” (RAWLS, 2002, p. 4).

Como vimos anteriormente, uma sociedade justa2 deve estar inserida num contexto de cooperação social, onde seus membros procuram promover o bem daqueles que fazem parte, como forma de evitar possíveis conflitos de interesses entre as partes envolvidas. Rawls supõe que os conflitos podem emergir por que, cada pessoa tem uma visão diferente em relação à divisão dos benefícios sociais e aqueles que estão buscando benefícios maiores para se, acabam desencadeando um conflito em relação a objetivos comum. Para evitarmos conflitos do gênero que podem por em causa a construção de uma sociedade justa, Rawls nos propõe um conjunto de princípios (princípios de justiça social) que permite que as partes façam a escolha de várias formas de ordenação social que determinariam a divisão das vantagens dos benefícios sociais e selar um acordo sobre as partes distributivas adequadas. Em virtude disso, o princípio de justiça social forneceria [“...] um modo de atribuir direitos e deveres nas instituições básicas da sociedade e determina a distribuição dos benefícios e encargos da cooperação social”

(RAWLS 2002, p. 8).

Por isso, Rawls expõe que a maneira pela qual as instituições sociais e políticas mais importantes distribuem os direitos e deveres fundamentais e determinam a divisão de vantagens provenientes da cooperação social está implicitamente dependente da estrutura básica da sociedade, considerado como objeto primário da justiça. Assim, as principais instituições são descritas pelo autor como “constituição política, acordos econômicos e sociais, entre eles: a proteção legal da liberdade, do pensamento e de consciência, os mercados competitivos, a propriedade particular no âmbito dos meios de produção” (RAWLS, 2002, p. 8).

Resumindo, a função da justiça consiste em especificar os princípios de justiça social que possam especificar os direitos e deveres e determinar as partes distributivas quer na divisão de bens quer nas obrigações da cooperação social. Ou seja, a função dos

2 Uma sociedade justa exige instituições e dispositivos que proporcionem os bens sociais básicos a todos os cidadãos (liberdades, rendimento, propriedade, bases sociais de autorrespeito, segurança, saúde, educação, entre outros), atendendo às suas necessidades, interesses e capacidades para converter os recursos em funcionamentos: ter saúde e ser capaz de ser saudável, ter liberdades e ser capaz de exercer essas liberdades, ter rendimento e ser capaz de converter esse rendimento numa boa vida, ter recursos educativos e ser capaz de convertê-los em capacidades para exercer uma profissão, para falar em público, para exercer pensamento crítico, para escolher formas de vida dignas para participar nos processos democráticos (FREITAS, 2016, p. 101).

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princípios de justiça (como parte de concepção política de justiça), é definir os termos equitativos de cooperação social, especificando os direitos e deveres básicos que devem ser garantidos pelas instituições políticas e sociais e regular a divisão e distribuição dos benefícios provenientes desta cooperação social.

1.2. A ideia central da teoria da justiça

A ideia central de Rawls é que os princípios de justiça para a estrutura básica da sociedade são o objeto do consenso original, isto é, são estes princípios que as pessoas livres e racionais, preocupadas em promover seus próprios interesses aceitariam numa posição de igualdade como definidores dos termos fundamentais de associação e regulamentação de acordos subsequentes, especificando os tipos de cooperação social que se pode assumir e as formas de governo que se podem estabelecer. A esta maneira de considerar os princípios de justiça o autor chama de justiça como equidade (RAWLS, 2002, p. 10-12).

A justiça como equidade inicia com a escolha dos princípios de justiça que escolhidos por indivíduos na posição original. Para a escolha destes princípios é necessário que os indivíduos conjuntamente se comprometam e façam a escolha comum dos princípios que devem atribuir direitos e deveres básicos e que determinam a divisão de benefícios sociais. Durante a escolha de princípios de justiça, as partes devem a priori determinar a maneira como vão regular suas reivindicações mútuas e qual a carta constitucional que pretendem para a fundação da sociedade. Também as partes, com o uso da razão, devem buscar finalidades que determinem o que é justo ou injusto para o grupo, pois as escolhas feitas por eles de forma racional na situação hipotética de liberdade equitativa determinam os princípios de justiça a serem aplicados à estrutura básica da sociedade (RALWS, 2002).

Para melhor compreendermos as condições em que acontece a escolha dos princípios de justiça, no item abaixo analisamos a ideia de posição original e véu de ignorância considerado como ponto de partida para a idealização de uma teoria de justiça de John Rawls.

1.2.1. Posição original

Em sua teoria, Rawls estabelece que os princípios da justiça aplicados à estrutura básica da sociedade são resultantes de um contrato consensual entre membros representativos da sociedade na posição original. Os indivíduos representativos nesta

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posição original escolhem os princípios de justiça que irão nortear a estrutura básica da sociedade. Neste caso, por meio da ideia de posição original Rawls “pretende descobrir qual a concepção tradicional da justiça, ou variante dessas concepções, produz os princípios mais apropriados para a efetivação da liberdade e da igualdade – com a condição de tratar a sociedade como um sistema de cooperação entre pessoas livres e iguais” (RAWLS, 2000, p. 218). Em outras palavras, na posição original os indivíduos devem chegar a consensos sobre quais os princípios seriam adotados por eles como base para regular a estrutura básica da sociedade. Assim, a escolha livre e equitativa destes princípios acontece apenas porque seus membros representativos estão numa situação em que desconhecem informações a respeito de si mesmos. Isto é, os indivíduos na posição original estão imersos sob um véu de ignorância o que permite que os mesmos desconheçam informações estratégicas sobre seu lugar na sociedade, sua situação profissional e econômica, sua situação política, nível de civilização e cultura, suas habilidades naturais, suas crenças religiosas, grau de instrução, sexo, etnia até sua própria concepção de bem etc. No entanto, desprovidos das tais características, os mesmos fazem a escolha dos princípios de justiça porque se encontram numa situação em que ninguém seja favorecido ou desfavorecido, quer por habilidades naturais, quer pelas contingências das diferentes situações sociais. Logo, as partes estão numa situação semelhante e ninguém pode designar princípios para favorecer sua condição particular – os princípios de justiças por estes escolhidos são resultados de um consenso ou ajuste equitativo (RALWS, 2002).

Efetivamente, Rawls concebe a posição original como “um status quo inicial apropriado, pois nela os consensos fundamentais são alcançados de forma equitativa, de tal forma que a expressão justiça como equidade transmita a ideia de que os princípios de justiça são acordados numa situação inicial que é equitativa” (RAWLS, 2002, p. 14).

Logo, os indivíduos nesta situação são considerados como pessoas éticas, racionais com objetivos próprios e, se calhar, seguros de seu senso de justiça e engajadas em promover seus interesses próprios, numa posição de igualdade e equidade.

Para compreendermos a posição original, no ponto a seguir faremos uma análise do “véu da ignorância”, o que assegura que os indivíduos façam a escolha dos princípios de justiça de forma racional, livre, em uma situação de igualdade e imparcialidade.

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1.2.2. Véu de ignorância

Sabendo que a ideia da posição original é estabelecer um processo justo, Rawls usa a noção de justiça procedimental pura3 como fundamento da sua teoria. Para complementar a ideia de posição original, o autor desenvolveu o véu de ignorância considerado por ele como condição principal para que os indivíduos façam a escolha de uma concepção de justiça livre de interesses particulares, fruto da anulação dos efeitos das contingências específicas que colocam os homens em posição de disputas. Até porque, véu de ignorância torna-se assim um mecanismo teórico que propicia condições equânimes aos indivíduos na posição original, isto é, ela cria condições para que os indivíduos nesta posição desconheçam suas particularidades físicas ou sociais.

Como dito anteriormente, as partes ao se situar atrás do véu da ignorância fazem a escolha livre e racional de uma concepção de justiça, sem conhecimentos das alternativas que poderão afetar cada caso particular, permitindo desse modo, que elas possam “avaliar os princípios unicamente com base em considerações gerais” (RAWLS 2002, p. 150). Neste caso, o véu de ignorância garante que nenhum indivíduo, na posição original, utilize seus conhecimentos sobre a sua condição particular, bem como dos seus pares, como forma de obter vantagens na definição dos princípios de justiça que irão regular a estrutura básica da sociedade. Neste caso, os indivíduos não podem escolher princípios que favorecem nem sua condição particular, nem de seus grupos sociais. Isso porque os princípios de justiça resultantes dos consensos alcançados nesta situação de posição original espelham as escolhas racionais dos indivíduos, uma vez que, por força de véu de ignorância as partes se encontravam em condições iguais e se calhar dotados de um senso de justiça.

Concluindo, as restrições impostas pelo véu de ignorância às informações particulares das partes são de fundamental importância, pois, sem elas, Rawls não seria capaz de elaborar nenhuma teoria. Ou seja, sem limitações impostas a conhecimentos e vontade particular a questão da negociação entre as partes na posição original se tornaria impossível, até porque, de acordo com Nedel (apud Pinto, 2014, p. 29), sem esse

3 A justiça procedimental pura se verifica quando não há critério independente para o resultado correto;

existe um procedimento correto ou justo de modo que o resultado será também correto ou justo (RALWS, 2000 p. 92). Igualmente, na justiça procedimental pura significa que, em suas deliberações racionais, as partes não se veem obrigadas a aplicar nenhum princípio de direito e justiça determinado previamente, nem se consideram limitadas por ele. Em outras palavras, não reconhecem nenhuma opinião externa a seu próprio ponto de vista, enquanto representantes racionais, pela qual sejam limitados por princípios anteriores e independentes de justiça. Isso leva à ideia de que, quando os cidadãos estão equitativamente situados uns em relação aos outros, cabe a eles especificar os termos equitativos de cooperação social, à luz do que cada um considera seu benefício pessoal, ou seu bem. (RAWLS, 2000, p. 118).(boa nota)

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véu, as distintas vontades atrapalhariam um pacto coletivo. Nesse sentido, Rawls avança que o véu de ignorância “possibilita a escolha unânime de uma concepção particular de justiça” (RAWLS, 2000, p. 359).

Esclarecidas as condições em que acontece a escolha dos dois princípios de justiça, no ponto a seguir, faremos uma análise do significado e aplicação dos princípios de justiça para a estrutura básica da sociedade.

1.2.3. Princípios de justiça

Em sua teoria, Rawls estabelece que os princípios da justiça aplicados à estrutura básica da sociedade são resultantes de um contrato consensual entre membros representativos da sociedade na posição original. Estes princípios têm como função definir os termos equitativos de cooperação social e regular as desigualdades sociais e econômicas. Ou seja, são princípios que mostram como se distribuem os bens sociais primários, considerados por muitos como aquilo que os indivíduos na condição de pessoas livres e racionais necessitariam para perseguirem livremente seus planos de vida. Deste modo, a primeira afirmação dos dois princípios de justiça é a seguinte:

Primeiro: cada pessoa deve ter um direito igual ao mais abrangente sistema de liberdades básicas iguais, que seja compatível com um sistema semelhante de liberdades para os outros.

Segundo: as desigualdades sociais e econômicas devem ser ordenadas de tal modo que sejam ao mesmo tempo: a) consideradas como vantajosas para todos dentro dos limites razoáveis e b) vinculadas a posições acessíveis a todos.

(RAWLS, 2002, p 65.)

De fato, o primeiro princípio de Rawls postula que cada pessoa deve ter o direito igual ao sistema extenso de iguais liberdades fundamentais escolhidas pelos indivíduos na posição original cobertos por um véu de ignorância. Ou seja, decorre deste princípio que às liberdades básicas devem ser distribuídas de modo igual a todos os cidadãos para que possam ter condições necessárias para perseguirem livremente com seus planos de vida sem que isso viole os princípios de justiça. Fazem parte das liberdades fundamentais garantidas pelo primeiro princípio de Rawls: (...) liberdade política (direito de votar e ocupar um cargo político) e a liberdade de expressão e de reunião; a liberdade de consciência e de pensamento, a liberdade da pessoa, que inclui a proteção contra a opressão psicológica e contra a agressão física (integridade da pessoa); o direito à propriedade privada e a proteção contra a invasão e a detenção arbitraria. (RAWLS, 2002. p. 65). Vale salientar que as liberdades política apesar de não serem absoluta não

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passiveis de negociações, pois têm a função de orientar os cidadãos para participar na vida pública em sociedade. Ou seja, somente as liberdades políticas deverão ter a garantia de equidade.

O segundo princípio de Ralws “se aplica à distribuição de renda e riqueza e ao escopo das organizações que fazem uso de diferenças de autoridade e de responsabilidade” (RAWLS, 2002, p. 65). Na verdade, este princípio inclui dois princípios: a igualdade equitativa de oportunidades e o princípio de diferença. O primeiro refere que as desigualdades sociais e econômicas devem estar vinculadas a cargos e posições acessíveis a todos em condições de igualdade equitativa de oportunidades. Já o principio da diferença refere que as desigualdades sociais e econômicas têm de beneficiar ao máximo os membros menos favorecidos da sociedade.

Ou seja, este princípio objetiva estabelecer uma fórmula de distribuição que potencializa os benefícios recebidos pelos mais desfavorecidos, que tem consequências positivas para a justiça na estrutura social. Isto é, o princípio de diferença é um instrumento maximizador, que busca atingir o melhor esquema de contribuições positiva, pois, considera que qualquer desigualdade que não resulte de igualdade de oportunidades e que não maximize as expectativas do bem estar dos mais desfavorecidos é ilegítima.

Para Rawls, a aplicação dos dois princípios de justiça (liberdade e igualdade) deve obedecer a uma ordenação serial, isto é, o primeiro antecedendo o segundo. Esta ordenação significa que as “violações das liberdades básicas protegidas pelo primeiro princípio não podem ser justificadas nem compensadas por maiores vantagens econômicas e sociais” (RAWLS, 2002, p. 65).

Para que seja mantida esta coerência da ordem lexical dos princípios de justiça, é necessário que a estrutura básica da sociedade através das suas instituições sociais e políticas garantam uma distribuição justa de direitos e deveres, de tal forma que as liberdades básicas iguais não sejam violadas ou transgredidas, por conta dos proveitos econômicos, ou por qualquer ganho que seja distinto ao do primeiro princípio.

Neste caso, para evitar que se propicie a troca entre liberdades básicas por qualquer outro ganho, que seja distinto ao primeiro princípio, Rawls elabora um conjunto de regras de prioridade que passaremos a elencar abaixo:

Primeira Regra de Prioridade (A Prioridade da Liberdade):

Os princípios da justiça devem ser classificados em ordem lexical e, portanto as liberdades básicas só podem ser restringidas em nome da liberdade. Existem dois casos: (a) uma redução da liberdade deve fortalecer o sistema total das

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liberdades partilhadas por todos; (b) uma liberdade desigual deve ser aceitável para aqueles que têm liberdade menor.

Segunda Regra de Prioridade (A Prioridade da Justiça sobre a Eficiência e sobre o Bem-Estar):

O segundo princípio de justiça é lexicalmente anterior ao princípio da eficiência e ao princípio da maximização da soma de vantagens; e a igualdade equitativa de oportunidades é anterior ao princípio da diferença. Existem dois casos: (a) uma desigualdade de oportunidades deve aumentar as oportunidades daqueles que têm uma oportunidade menor; (b) uma taxa excessiva de poupança deve, avaliados todos os fatores, tudo somado, mitigar as dificuldades dos que carregam esse fardo. (RAWLS, 2002, p. 333-334).

Como vimos anteriormente, os princípios de justiça de Rawls, se encontram organizados lexicamente, agora explicaremos como se procede a sua aplicação na estrutura básica de sociedade. Para a justiça como equidade, a escolha e aplicação dos princípios de justiça procedem em quatros etapas fundamentais. Na primeira refere o momento em que as partes reconhecem os dois princípios de justiça sob o véu de ignorância, na posição original. O segundo momento é a fase em que, apesar dos indivíduos estarem cobertos por certas restrições de véu de ignorância, estes fazem o uso dos princípios de justiça já escolhidos para subsidiar a construção de uma constituição que possa estabelecer poderes e direitos básicos dos cidadãos. Ou seja, nesta etapa os indivíduos conseguem satisfazer os princípios de justiça e propõe questões para tornar a constituição mais justa e eficaz. (RAWLS, 2002).

O terceiro momento é conhecido como legislativo, ou seja, é a fase em que os indivíduos possuem a totalidade dos fatos sociais e econômicos. Isso, nos leva ao entendimento segundo a qual, “a prioridade do primeiro princípio de justiça em relação ao segundo se reflete na prioridade da convenção constituinte em relação ao estágio legislativo” (RAWLS, 2002, p. 216). Ou seja, os indivíduos já possuem maiores conhecimentos sobre sua realidade e subsidiado pelos ideais da constituição, desenvolvem leis que normatizem a igualdade equitativa de oportunidades e o princípio da diferença.

Por ultimo, se refere ao estagio em que as regras são publicizadas a todos os indivíduos e aplicadas a casos particulares, por administradores ou juízes, não há mais o véu de ignorância, todas as informações estão disponíveis para quem quer que seja sem maiores restrições e falseamentos (Pinto, 2014). Ou por outra, neste estagio os indivíduos não possuem mais resquícios do véu de ignorância, o que leva com que as regras sejam aplicadas em certos casos particulares para que não haja injustiças dentro da sociedade.

Assim, concluímos que os quatro estágios analisados representam um processo

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longo da escolha e aplicação dos princípios de justiça, que tem sua origem na hipotética posição original ate sua aplicação na estrutura básica da sociedade. Cientes da importância dos escritos de Ralws, e da influencia das suas ideias na construção de uma sociedade justa democrática, analisamos ate aqui os principais pontos da teoria da justiça, com intenção de relacionarmos, nos próximos capítulos as ideias de justiça como equidade com questões educacionais. Assim, no item abaixo iniciaríamos por discutir a relação entre a teoria da justiça de Ralws e a Educação.

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2. RAWLS E A EDUCAÇÃO

A educação é um dos temas mais recorrentes no campo das ciências humanas e da filosofia e, sendo assim, ela não passa despercebida pela teoria de Rawls, mesmo que o autor não tenha elaborado uma teoria específica nesta área do conhecimento. Um meio de se exercer a democracia em uma sociedade com este sistema de governação deve ser por meio do acesso à educação, visto que esta constitui uma das liberdades instrumentais inseridas nas oportunidades sociais. Ademais, hoje, a compreensão da democracia consolidada e sua evolução se devem, em certa medida, à educação, uma vez que esta objetiva acertar o rumo para que as futuras gerações não sejam marcadas por períodos de anacronismo.

Como ponto de partida para este caminho, “as ideias de Rawls acerca da educação, ou a compreensão que faz dela como uma instituição social, responsável pela formação do caráter do senso moral, é uma componente da sua ampla reflexão sobre a justiça” (ROHLING, 2012, p. 127). Assim sendo, a teoria de Ralws, ganha um maior ímpeto ao demonstrar a importância que a educação tem na promoção dos valores políticos e morais em sociedades de democracias constitucionais.

De acordo, com Gondin (2000, p. 66), a educação numa sociedade bem ordenada é de vital importância, pois, desenvolve nos cidadãos o exercício de juízo ponderado, a ideia do bem e do senso de justiça. Já Ranciere (2014), afirma que hoje em dia discutir os limites de educação como promotora das ideias democráticas (liberdade e igualdade) é tentar trazer uma solução mais adequada para a manutenção da participação democrática e assegurar a organização social, com fim único de promover a estabilidade, a justiça e o desenvolvimento. Para a teoria de justiça de Rawls, qualquer abordagem sobre a educação deve ter em conta a promoção e distribuição dos bens primários. Estes bens, segundo Rawls, seriam:

Coisas que se supõem que um homem, independentemente de quais sejam em detalhes os planos racionais de um indivíduo, supõe que ele preferiria ter mais a ter menos. Tendo uma maior quantidade desses bens os homens podem geralmente estar seguros de obter um maior sucesso na realização das suas intenções e na promoção dos seus objetivos, quaisquer que sejam eles (RAWLS, 2009, p. 98).

No sentido mais amplo, os bens primários que o cidadão necessitaria para a concretização dos seus planos são conceituados como: direitos, liberdades,

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oportunidades, assim como renda, riqueza e senso do próprio valor – autorrespeito4 (RAWLS, 2002, p. 98). Apesar de educação não fazer parte dos bens primários categorizados por Ralws, parece-nos racional afirmar o seu papel com os mesmo, uma vez que, por exemplo, o acesso a certos bens como renda, riqueza, liberdade na escolha de uma ocupação esta em certa medida dependente de quanto tempo ou como os cidadãos tiveram o acesso à educação formal. Ate porque, Zamban (2018, p. 132), olha para a educação formal como um bem primário inalienável e de direito para todos, pois, segundo o autor através dela podemos conquistar e assegurar outros direitos.

No entanto, a educação não deve apenas ser exigida como instrumento para o cultivo dos referidos bens iniciais (bens primários) mas, também como o motor do desenvolvimento do caráter deliberativos dos sujeitos, para que os mesmo possam reconhecer estes bens e garantir sua aquisição. Importa lembrar que, mesmo a escolha racional dos dois princípios de justiça na posição original, esta dependente da capacidade do raciocínio deliberativo dos sujeitos, pois, para Rawls, “o nosso bem é dirigido pelo plano de vida que adotaríamos com a plena racionalidade deliberativa, se o futuro fosse previsto com precisão e adequadamente percebido na imaginação”

(RAWLS, 2009, 521).

Em suma, para a teoria da justiça a educação deve se preocupar em oferecer oportunidades e a distribuição de todos os bens primários, como por exemplo, a autoestima, considerada por Ralws como uma condição necessária para o desenvolvimento moral.

2.1. A educação e princípios de justiça de Ralws.

Para compreendermos melhor o papel que a educação desempenha na teoria de Rawls, temos que relacioná-la diretamente com os dois principio de justiça, especificamente com o principio de igualdade equitativa de oportunidade e principio de diferença. Para Rohling, no modelo liberal de Rawls, a educação está especialmente relacionada ao segundo princípio de justiça e às suas duas partes. Para entender essa relação, é importante recordá-las: a primeira, chamada de princípio da igualdade equitativa de oportunidades, em oposição ao principio da diferença preceitua a

4 O autorrespeito é um dos bens primários mais importante que uma democracia pode garantir para seus membros. É constituído pela “noção” que o indivíduo tem do seu valor e da sua confiança em sua própria capacidade para realizar o seu objetivo para que a sociedade política contribua com uma parte essencial e, no caso ideal de maneira liberada (RALWS, 2000, p. 372).

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igualdade de oportunidades para aqueles com talentos e habilidades semelhantes, no seio de uma sociedade bem ordenada.

Neste caso, ao relacionarmos a educação com principio de igualdade equitativa de oportunidade significa que o Estado tem o dever de assegurar uma educação acessível a todos, sem discriminação de raça, gênero, etnia posição social etc.

Igualmente, o Estado deve definir critérios ou dispositivos para que a estrutura básica da sociedade possa eliminar as desigualdades que podem impedir a igualdade real de oportunidades no acesso a educação. Assim, uma educação consubstanciada ao principio de igualdade equitativa de oportunidade determina que a cada cidadão educável deve ser garantida oportunidades educativas aproximadamente semelhante. Ou seja, a todos deve ser garantida uma educação aproximadamente semelhante ou similar.

Pinto (2014, p. 16) defende que, uma educação que tenha a igualdade equitativa de oportunidades como horizonte, deve ampliar o autorrespeito para todos, orientando as potencialidades naturais individuais em favor da justiça como equidade coletiva. Isso porque:

Quando as pessoas estão impossibilitadas de desenvolver seus talentos e de acessar as posições relevantes, “os excluídos estariam certos em sentir-se tratados injustamente, mesmo que se beneficiassem dos maiores esforços daqueles autorizados a ocupá-las.” (RAWLS, 2002, p. 90).

Com efeito, pode-se considerar o principio da igualdade equitativa de oportunidades um instrumento fundamental para a democratização no acesso a educação e seus recursos. Neste caso, o ideal de uma educação democrática é quando os membros de uma sociedade aceitam que ninguém em condições educável seja impedido de ter acesso à educação e seus recursos quer por contingências econômicas ou sociais seja ela, renda, riqueza, cultura, família, região de origem ou por habilidades naturais ate o grau de inteligência.

Como se sabe, a igualdade equitativa de oportunidade, considerada também como igualdade liberal tem por obejeto prevenir o acumulo de bens e promover sustentação de oportunidades para todos. Assim, uma sociedade democrática e liberal deve “ofertar oportunidades educacionais para todos os cidadãos, mas sempre enfatizando sua ação para que os talentos inatos dos sujeitos sejam utilizados em favor daqueles que se encontra em piores posições, possibilitando assim, condições equânimes de competição pelos cargos e com maiores prestígios.” (PINTO, 2014, p.

41).

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Quanto ao principio de diferença Ralws avança que este tem por obejeto estabelecer a divisão desigual para as pessoas em condições diferentes, buscando a maximização de vantagens para os indivíduos situados nas piores posições. Relacionado este principio com a educação, Freitas afirma que as desigualdades na distribuição de recursos educativos podem-se justificar desde que não privem nenhum cidadão educável de obter a Educação democrática para adquirir autonomia ou capacidade moral e política, e desde que esta distribuição seja consubstanciada em condições de igualdade equitativa de oportunidade. Ou seja, para este autor qualquer distribuição desigual de recursos educativos é permitida depois de assegurar este fim. Ate porque:

É fundamental que a distribuição de recursos e as práticas educativas obedeçam a princípios e dispositivos impulsionadores da educação para solidariedade ou a ajuda mútua: os indivíduos numa comunidade política (e porque não numa comunidade escolar) têm deveres de solidariedade recíproca.

A solidariedade recíproca, porque é recíproca, determina a ajuda, a colaboração ou o auxílio mútuo baseado na reciprocidade racional e razoável. (FREITAS, 2016, 94).

Sabe-se que as duas partes do segundo princípio somam forças na discussão educacional, Pinto (2014, p. 23) reforça a ideia que a igualdade equitativa de oportunidades coloca a educação como instrumento que ameniza as desigualdades sociais e, por outro lado, o princípio da diferença estabelece uma fórmula de distribuição que potencializa os benefícios recebidos pelos mais desfavorecidos, que tem consequências positivas para a justiça na estrutura social.

No entanto, Freitas (2016, p. 92), conclui que na justiça como equidade, a educação deve respeitar os princípios de justiça de Ralws. Para o autor, os princípios da educação democrática destinados à estrutura básica da sociedade são as seguintes:

1. Princípio de Liberdade Moral e Política

Todos os cidadãos têm igual direito a obter uma educação necessária para adquirir autonomia ou capacidade moral e política, nomeadamente para:

a) Escolher livremente entre as concepções de boa vida.

b) Participar na comunidade política democrática, designadamente para influenciar, através de processos democráticos, os poderes públicos, em especial o poder político e para exercer os referidos poderes, de acordo com regras democráticas compartilhadas e definidas.

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Princípio de equidade.

a) Acesso à educação referida em 1) deve consubstanciar-se em condições de igualdade equitativa de oportunidades.

b) Princípio de Diferença: as desigualdades na distribuição de recursos educativos podem justificar-se apenas se beneficiarem a todos e se não comprometerem o acesso equitativo de todos a uma educação aproximadamente equivalente e similar (Educação democrática), de acordo com as exigências do princípio de liberdade moral e política.

Parece-nos lógico, afirmar que, os princípios de educação democrática proposta por Freitas se encontram organizados numa ordem lexical, ou seja, o primeiro antecede o segundo. Se não vejamos, uma sociedade justa deve primeiro garantir que seus membros tenham iguais direito a obter uma educação igual ou semelhante em condições de igualdade equitativa de oportunidades. Atingido este patamar, a desigualdades na distribuição dos recursos pode se justificar desde que garantam que ninguém em condições educáveis lhe será privado em adquirir uma educação democrática e liberal.

Igualmente, esta distribuição de recursos educativos deve consubstanciar-se ao principio de igualdade equitativa de oportunidade como forma de compensar capacidade e o esforço dos indivíduos em condições educáveis.

2.2. Rawls e a educação para a cidadania

Apesar de Ralws não ter tido explanações que retratam sobre a educação formal, Albuquerque, parte de principio de que a “educação é uma das instituições que fazem parte da estrutura básica da sociedade” (ALBUQUERQUE, 2008, P. 37). Considerada como uma instituição social que faz parte da estrutura básica da sociedade, a educação formal é assim entendida por Valle, como “aquela que deve preparar o indivíduo, principalmente para o exercício do seu papel na sociedade” (VALLE, 2010, p. 30). Até porque, os conteúdos que reforcem o valor de si mesmo e, que preparem para a cidadania e, para o senso de cooperação social e solidariedade, estão de acordo com o espírito da proposta da justiça como equidade.

Numa sociedade governada por uma democracia constitucional a educação é um instrumento que potencializa o conhecimento humano e proporciona a autonomia do indivíduo, fazendo dissipar a ignorância, ajudando-o a avaliar e ponderar melhor as ideias nas suas relações sociais, econômicas e morais, no seio da sociedade. No entanto, é razoável afirmar que, na sociedade bem ordenada como idealizada por Rawls, cada

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pessoa deve ter uma educação fundamental para ajudá-la a decidir com racionalidade e com prudência, para poder discernir o que deva ser considerado justo ou injusto. Dessa forma, a educação, na concepção de Rawls, é um veículo que habilita o indivíduo a adquirir senso moral e virtudes políticas, como a tolerância, o respeito mútuo, o senso de equidade e de civilidade, aprendendo a pensar, raciocinar e a ter uma concepção política, na medida em que fortalece sua capacidade para assumir responsabilidades por seus objetivos, fazer reivindicações junto às suas instituições e de exercer o direito de ser independente.

Não menos importante a educação deve igualmente proporcionar aos cidadãos o desenvolvimento de suas capacidades cognitivas, assim como conhecimentos necessários, para puderem compreender o seu papel na sociedade. Isso porque, a educação deve puder ajudar os indivíduos compreenderem os seus direitos e deveres, o sistema de cooperação social e seu projeto de vida como membros integrantes da sociedade. Zambam (2018, p. 132-133) considera a educação formal como aquela dos bancos escolares que deve apenas passar conhecimentos técnicos e científicos com objetivo de integrar o individuo no mercado do trabalho. Para o autor, este modelo se defere da educação informal, pois, este ultimo compreende os princípios aprendidos no seio familiares, que são reforçados pela comunidade. Zambam tenta destrinçar as diferenças entre a educação formal e a informal, mas Ralws percebe que, o valor de uma educação não pode ser avaliado apenas em termos de eficiência econômica e bem estar social. Isso porque:

O papel da educação é igualmente importante, se não mais importante ainda, no sentido de proporcionar a uma pessoa a possibilidade de apreciar a cultura de sua sociedade e de tomar parte em suas atividades, e desse modo proporcionar a cada indivíduo um sentimento de confiança seguro de seu valor próprio. Ou seja, ao apropriar-se da cultura tais como as tradições, músicas e atividades religiosas, as atividades físicas e artísticas, as produções cientificas e técnicas, entre outros – o indivíduo reforça o senso do próprio valor e mais significativamente persegue seus fins quaisquer que sejam eles (RAWLS, 2002, p. 108).

A outra função da educação numa sociedade governada por uma democracia constitucional nos é trazida ate aqui por Amartya Sen. Para o autor, a educação e outros direitos sociais, se tornam geradora de instrumentos e capacidades para o livre exercício da cidadania e liberdade. Isto é, através da educação os indivíduos podem adquirir conhecimentos sobre política, realidade social, economia, cultura, considerados requisitos necessários para debater, intervir, tomar suas próprias decisões e propor mudanças no seio social. Ate porque Goldmeir postula:

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