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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO SILVANA DE ALENCAR SILVA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

SILVANA DE ALENCAR SILVA

A REFORMA CURRICULAR DOS CURSOS DE PEDAGOGIA EM MATO GROSSO A PARTIR DAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS (DCNP) DE 2006

Cuiabá-MT 2015

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SILVANA DE ALENCAR SILVA

A REFORMA CURRICULAR DOS CURSOS DE PEDAGOGIA EM MATO GROSSO A PARTIR DAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS (DCNP) DE 2006

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso como requisito para a obtenção do título de Mestre em Educação na Área de Concentração Educação, Linha de Pesquisa: Organização, Formação e Práticas Pedagógicas.

Orientadora: Prof.ª Dra. Ozerina Victor de Oliveira

Cuiabá-MT 2015

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho ao meu pai Cicero Nunes da Silva in memoriam, obrigada pelas histórias contadas e pelos livros compartilhados.

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AGRADECIMENTOS

A Deus por ter me sustentado firme diante de tantos desafios. A minha família e, em especial ao meu filho Antônio Alencar Alves Santos, minha inspiração de viver e, ao meu companheiro, parceiro, amigo, namorado e esposo Renderson Alves Santos, obrigada por compartilhar os meus sonhos! Ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso, e, em especial aos amigos da Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação, obrigada pelo carinho

e apoio. A minha querida e estimada orientadora Prof.ª Dra. Ozerina Victor de Oliveira, obrigada pela oportunidade de proporcionar-me aprendizagens que jamais imaginei ter. E também, pela amizade, pelo respeito, por me ensinar os caminhos da pesquisa e por ter acreditado em mim, tornando possível a realização deste sonho. A banca examinadora interna e externa Prof.ª Dra. Filomena Maria de Arruda e Prof.ª Dra. Ruth Pavan obrigada pelas contribuições para que este trabalho pudesse ser aprimorado. Ao Programa de Pós-Graduação em Educação da UFMT. Aos servidores técnicos da UFMT pelo atendimento profissional e humanizado. Aos colegas de mestrado, em especial a Ana Claúdia e ao Everton Neves, obrigada pelos apontamentos, pela parceria e companheirismo. A minha querida amiga Poliana Fernandes, obrigada pelo apoio nos momentos mais difíceis. As Instituições de Ensino Superior de MT que colaboraram na disponibilização dos

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“Não acredito de forma alguma na objetividade do conhecimento. Mas também não acredito que o conhecimento é simplesmente partidário. Não acredito também que o

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LISTA DE ABREVIATURASE SIGLAS

ANFOPE- Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação ANPAE- Associação Nacional de Política e Administração da Educação ANPED- Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação BDTD- Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações

CEDES- Centro de Estudos Educação e Sociedade

CAPES- Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CH- Carga Horária

COESP- Comissões de Especialistas de Ensino

DCNP- Diretrizes Curriculares Nacionais de Pedagogia EJA- Educação de Jovens e Adultos

ENADE- Exame Nacional de Desempenho de Estudantes

FORUMDIR- Fórum de Diretores das Faculdades/Centros de Educação das

Universidades Públicas Brasileiras

ISE- Instituto Superior de Educação IES- Instituição de Ensino Superior

IFMT-Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso

LIBRAS- Língua brasileira de sinais

MEC- Ministério da Educação MT - Mato Grosso

NSA- Nova Sociologia da Educação ONG- Organização não-governamental PPC- Projeto Pedagógico de Curso PPCs- Projetos Pedagógico de curso PCN- Parâmetros Curriculares Nacionais SUS- Sistema Único de Saúde

TCC- Trabalho de conclusão de curso

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LISTA DE QUADROS

QUADRO 1-Identificação: IES; cursos; PPCs de Pedagogia.

QUADRO 2- Caracterização: IES; cursos; PPCs e integralização curricular.

QUADRO 3- Caracterização: diploma; turno de oferta; nº de vagas; nota do ENADE.

QUADRO 4- Caracterização: distribuição da CH; disciplinas obrigatórias e optativas;

atividades complementares; estágio supervisionado e TCC.

QUADRO 5- Caracterização: estrutura curricular- núcleos/eixos e CH.

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RESUMO

A pesquisa problematiza a reforma curricular dos cursos de Pedagogia de Mato Grosso (MT) a partir das Diretrizes Curriculares Nacionais de Pedagogia (DCNP) de 2006. Para isso, delimita-se como objeto de estudo a tradução das DCNP realizada por seis cursos de Licenciatura em Pedagogia de MT. O objetivo principal foi compreender o processo de tradução produzido nos cursos de Pedagogia de MT a partir das DCNP, no que diz respeito, em especial, aos sentidos e significados enunciadores da Pedagogia. Os objetivos específicos foram: identificar os agentes políticos e suas demandas curriculares articuladas na construção do PPC; analisar os PPCs de Pedagogia no que diz respeito a sua política de currículo e, caracterizar o discurso produzido a partir da tradução das DCNP no conjunto dos cursos. Os aportes teórico-metodológicos foram ancorados no Ciclo de Políticas de Bowe e Ball (1994:2001); Mainardes (2006); Lopes (2010); e na noção de tradução da Teoria do Discurso em Laclau (2011); Lopes, Cunha e Costa (2013); e nas contribuições de Hall (1997; 2003). A pesquisa ancora a noção de currículo em Macedo (2006; 2011) Lopes (2010) e Silva (2011); de Política de Currículo em Ball (1994; 2001; 2011) e Macedo (2011) e de reforma em Lopes (2006); Oliveira (2004: 2009) e na noção de formação inicial de professores em Tardif (2002); Garcia (1999), e Garcia, Hypólito e Vieira (2005). Trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa que toma como fonte de dados à pesquisa bibliográfica (OLIVEIRA, 2007) e a analise documental (CELLARD, 2008; SANTIAGO, 2008) dos PPCs dos cursos de Pedagogia. Considera-se que a tradução das DCNP pelos cursos de Licenciatura em Pedagogia em MT foi um processo de negociação, marcado por dissensos e acordos provisórios entre o perfil profissional, a noção de currículo e o significado de Pedagogia, pois, os cursos precisaram estabelecer o diálogo entre a sua identidade originária com a identidade proposta nas DCNP. Nesse sentido, o processo de tradução dos cursos de Pedagogia de MT indica que os dissensos demonstram a instabilidade de sentidos o que enfatiza o caráter híbrido do PPC, atravessado por demandas contraditórias entre a formação do pedagogo voltada para o magistério na Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental e para a gestão empresarial. Além disso, as noções de modelos de formação de professores dos cursos investigados basearam-se na epistemologia da prática tradicional e crítica. Sendo que os cursos situados na perspectiva crítica propiciam à construção da gestão democrática na escola e fora dela. Portanto, a tradução das DCNP pelos cursos de Pedagogia envolveu os agentes do contexto da prática, e sofreu influências da outras legislações, principalmente da Resolução CNE/CP nº 01/02, a qual institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica.

PALAVRAS-CHAVE: Pedagogia; Diretrizes Curriculares; Tradução; Política de

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ABSTRACT

He research discusses the curriculum reform of Mato Grosso Education courses (MT) from the National Curriculum Guidelines for Education (DCPN) 2006. For this, it defines itself as an object of study the translation of DCPN held for six degree courses MV Pedagogy. The main objective was to understand the process of translation produced in MT Pedagogy courses from DCPN, with regard in particular to the senses and meanings enunciadores Pedagogy. The specific objectives were to identify the politicians and their curriculum demands articulated in the construction of PPC; analyze Pedagogy PPCs regarding its curriculum policy and characterize the discourse produced from the translation of DCPN in all the courses. The theoretical and methodological contributions were anchored in Bowe and Ball Policy Cycle (1994: 2001); Mainardes (2006); Lopes (2010); and the notion of Discourse Theory of translation Laclau (2011); Lopes Cunha and Costa (2013); and the contributions of Hall (1997; 2003). Research anchors the curriculum notion in Macedo (2006; 2011) Lopes (2010) and Silva (2011); of Curriculum Policy Ball (1994; 2001; 2011) and Macedo (2011) and reform in Lopes (2006); Oliveira (2004: 2009) and the initial training of teachers notion Tardif (2002); Garcia (1999) and Garcia, Hypólito and Vieira (2005). This is a qualitative research that takes as a source of data to the literature (OLIVEIRA, 2007) and documentary analysis (Cellard, 2008; SANTIAGO, 2008) of PPCs of Pedagogy. It is considered that the translation of DCPN by Degree courses in Pedagogy in MT was a negotiation process, marked by disagreements and Interim Agreements between the professional profile, the notion of curriculum and the meaning of pedagogy, because the courses needed to establish dialogue between its original identity with the identity proposed in DCPN. In this sense, the process of translation of the TM teaching courses indicates that disagreements demonstrate the instability of meaning which emphasizes the hybrid character of the PPC, crossed by contradictory demands between the formation of dedicated teacher for teaching in kindergarten and early years Elementary education and business management. In addition, teacher training models of notions of the investigated courses were based on the epistemology of traditional and critical practice. Since the courses situated in the critical perspective provide the construction of democratic management in school and beyond. Therefore, the translation of DCPN by teaching courses involved the context of the practice of agents, and suffered influences of other legislation, particularly the CNE / CP No. 01/02, which establishes the National Curriculum Guidelines for Training Education Teachers Basic.

KEYWORDS: PEDAGOGY; CURRICULUM GUIDELINES; TRANSLATION;

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...13

1 FUNDAMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS: NOÇÕES CONFIGURADORAS PARA A ANÁLISE DA TRADUÇÃO DAS DCNP NOS CURSOS DE PEDAGOGIA DE MATO GROSSO...19

1.1 A ABORDAGEM DO CICLO DE POLÍTICAS...21

1.2 A NOÇÃO DE TRADUÇÃO A PARTIR DA TEORIA DO DISCURSO E DOS ESTUDOS CULTURAIS...24

1.3 A NOÇÃO DE CURRÍCULO E DE POLÍTICA DE CURRÍCULO...24

1.4 A NOÇÃO DE FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES...33

1.5 A ABORDAGEM QUALITATIVA DE PESQUISA...41

1.6 A PESQUISA BIBLIOGRÁFICA...43

1.7 A ANÁLISE DOCUMENTAL...48

2 PROBLEMATIZANDO O CURSO DE PEDAGOGIA: ENTRE DISSSENSOS E ACORDOS PROVISÓRIOS...50

2.1 SEÇÃO I- A TRADUÇÃO DAS DCNP: UM RECORTE DA REFORMA CURRICULAR DOS CURSOS DE PEDAGOGIA...74

3 CONTEXTUALIZAÇÃO E PROBLEMATIZAÇÃO DOS CURSOS DE PEDAGOGIA DE MATO GROSSO A PARTIR DAS DCNP...77

3.1 A CARACTERIZAÇÃO DOS CURSOS DE PEDAGOGIA...78

3.1.1 CURSO DE PEDAGOGIA A...88

3.1.2 CURSO DE PEDAGOGIA B...100

3.1.3 CURSO DE PEDAGOGIA C...109

3.1.4 CURSO DE PEDAGOGIA D...116

3.1.5 CURSO DE PEDAGOGIA E...120

3.1.6 CURSO DE PEDAGOGIA F...128

3.2 SEÇÃO I-OS MODELOS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES A PARTIR DA NOÇÃO DE CURRÍCULO DOS CURSOS DE PEDAGOGIA...132

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES...140

REFERENCIAS...144

ANEXOS...160

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INTRODUÇÃO

Não utilizo fronteiras [...] fixas em minha discussão; devo introduzir certa imprecisão e um caráter vago, mas isso é provavelmente inevitável. (BALL, 2011, p. 22) Fruto de uma escolarização bancária1 (FREIRE, 1984), por vezes, estive presa às tentativas de encaixar supostas compreensões em teorias capazes de esmiuçar e compreender o ‘todo’ do fenômeno educativo.

Contrário a isso, procurei com esta pesquisa trazer nuances de entendimentos paradoxais, precários, contingenciais, deslizantes e provisórios. Entendo, a partir da Teoria do Discurso, que o acesso ao ‘real’ é algo impossível, na medida em que essas são características inerentes do social.

Nesse horizonte, o ponto de partida da investigação apresentada é a minha formação inicial no curso de Licenciatura em Pedagogia (2003-2007). Durante essa formação, teci questionamentos que pairavam, sobretudo, em torno da importância atribuída aos documentos legalmente constituídos por discursos propagadores de mudanças nas práticas educacionais, que nem sempre podem ser consideradas positivas. Esse ponto de partida não significa, de qualquer modo, que a minha construção identitária profissional não tenha relações com as experiências construídas na infância. Tal como afirma Freire (2001), desconsiderar a experiência de ‘menino’ da atividade profissional:

É como se a atividade profissional dos homens e das mulheres não tivesse nada que ver com suas experiências de menino, de jovem, com seus desejos, com seus sonhos, com seu bem-querer ao mundo ou com seu desamor à vida. Com sua alegria ou com seu mal-estar na passagem dos dias e dos anos. (FREIRE, 2001, p. 80).

Na minha trajetória profissional como docente em escolas privada e pública, no papel de coordenadora pedagógica do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso (IFMT) e, mais recentemente, como integrante do grupo de trabalho responsável pelo fomento de políticas destinadas à formação continuada de servidores do IFMT, apreendi que as determinações legais não são simplesmente postas em prática; contrário a isso, elas passam por um processo de ressignificação, de ‘tradução’, para só então serem praticadas ou não.

1

A educação bancária se caracteriza pelo conteudismo, exercícios de fixação e memorização, sem qualquer consideração pela realidade do aluno. Nesse modelo de educação os alunos são condicionados a se adaptem ao mundo, aceitando a opressão sem se revoltar contra quem os oprime. Ou seja, para que trabalhem, cumpram as leis, sem questionar o próprio papel que ocupam na sociedade (FREIRE, 1984)

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Essa prática, em alguns momentos, se coaduna com os objetivos propostos nos documentos legais, contudo, em outros produz uma prática divergente e não previsível do que até então se objetivava.

Anos mais tarde, ao ingressar no curso de mestrado e ao participar das reuniões do grupo de pesquisa “Políticas Contemporâneas de Currículo e Formação Docente” minha formação foi lapidada e expandida ao entender que os documentos, as legislações e as normativas não são mecanicamente postos em prática.

A partir das leituras de Ball (1994; 2001) apreendo que os sujeitos da prática reelaboram as legislações, o que significa considerar que o Estado não tem o poder absoluto e nem o controle sobre os efeitos de suas políticas educacionais no contexto da prática. Isso me levou a relativizar o poder dos documentos sobre os sujeitos.

Apreendi, ainda, que a política de currículo é construída em um movimento cíclico e contínuo, e, com a Teoria do Discurso, que a política de currículo é formação discursiva2, espaço de prática articulatória contingencial e de produção de poder e de resistência.

Sob tais pressupostos, foi ganhando substância o interesse em investigar como os cursos de Pedagogia traduzem as legislações. Nessa direção, apreendi que as DCNP configuram a última legislação vigente voltada a normatizar os cursos de Pedagogia em âmbito nacional (PARECER CNE/CN nº. 05/2005 e RESOLUÇÃO CNE/CP nº. 1/ 2006). Um dos desdobramentos dessa legislação é a reelaboração do PPC dos cursos por parte das Instituições de Ensino Superior (IES), visando adequá-lo às DCNP.

A respeito das DCNP, muito se tem produzido acerca dos embates travados, desde a sua concepção até o que se seguiu a sua promulgação (MAZZOTTI, 1996; PIMENTA, 1997; AGUIAR; MELO, 2005; LIBÂNEO, 20006; AGUIAR et al., 2006; FRANCO et al., 2007; SAVIANI, 2007; 2008; SHEIBE, 2007; BERALDO; OLIVEIRA, 2010; SHEIBE; DURLI, 2011; DOURADO, 2013, entre outros). Constatei, ainda, a partir do levantamento bibliográfico, a ausência de pesquisas que tratam da tradução das DCNP pelos cursos de Pedagogia de MT em seu processo de reformulação curricular.

2

Segundo Burity (2008, p. 42), a formação discursiva é “[...] um conjunto articulado, mas heterogêneo, de discursos, ou seja, de sistemas de regras de produção de sentido. Uma formação discursiva já está hegemonizada por um determinado discurso dentro de uma pluralidade. Não é um todo monolítico, fechado em si, mas produz efeitos de posicionamento, autorização e restrição sobre os sujeitos que nela se constituem ou expressam”.

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Para Aguiar e Melo (2005), as diferentes interpretações sobre a Pedagogia, as diversas identidades atribuídas ao curso de Pedagogia abrangem desde uma concepção de licenciatura separada do bacharelado, de corte positivista, a uma concepção de curso de estrutura única, envolvendo a relação intrínseca entre ambos, com base num enfoque globalizador.

Desse modo, apresento a reforma curricular dos cursos de Pedagogia em Mato Grosso a partir das Diretrizes Curriculares Nacionais de Pedagogia (DCNP) de 2006 como tema dessa pesquisa, que se justifica pelas indagações vivenciadas, pelos caminhos percorridos como acadêmica, pedagoga e pesquisadora em educação.

Paralelo a isso, segundo dados do último Censo Escolar de 2014, o número de alunos matriculados na educação infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental, etapas essas de atuação exclusiva do pedagogo (a), é de quase 400 mil, distribuídos nas redes pública e privada de ensino de MT. Além disso, a ampliação do atendimento nas creches de 16% para 50%, instituída pela Emenda Constitucional nº. 59, de 11 de novembro de 2009, representa uma demanda por cerca de 210 mil pedagogos (OLIVEIRA, 2011).

Esses números expressam a urgente necessidade de estudos que busquem contribuir com a problemática levantada. Nessa perspectiva, a problematização da tradução das DCNP pelos cursos de Pedagogia em MT concorre para ampliar a compreensão da complexidade em torno dos referidos cursos e dos desafios que as Instituições de Ensino Superior (IES) se deparam para definir sua política de currículo, ao traduzirem as DCNP no seu Projeto Pedagógico de Curso (PPC).

Tais considerações levaram-me a tecer os seguintes questionamentos: Como as DCNP foram traduzidas pelas IES ao elaborarem o PPC de Pedagogia? E ainda: Quais são os agentes políticos dos discursos configuradores da política de currículo em análise e quais argumentos sustentam tais discursos? E, por fim, que desdobramentos a tradução feitas das DCNP pelos cursos de Pedagogia provocou nos PPCs desses cursos?

O objetivo principal dessa pesquisa foi: Compreender o processo de

tradução produzido nos cursos de Pedagogia de MT a partir das DCNP, no que diz respeito, em especial, aos sentidos e significados enunciadores da Pedagogia.

Por sua vez, os objetivos específicos foram assim definidos: identificar os agentes políticos e suas demandas curriculares articuladas na construção do PPC; analisar os PPCs de Pedagogia no que diz respeito a sua política de currículo; e

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caracterizar o discurso produzido a partir da tradução das DCNP no conjunto dos cursos.

Nesse horizonte, considerando a amplitude dos questionamentos e a exequibilidade da pesquisa, fez-se necessária a sua delimitação. Para a escolha dos cursos de Pedagogia realizei um levantamento no site do e-MEC3 no ano de 2014 de todos os cursos reconhecidos pelo MEC no estado de Mato Grosso, registrando a informação de que foram ofertados naquele ano vinte e dois cursos de licenciatura em Pedagogia na modalidade de ensino presencial. Desses, 17 pertencem a IES privadas e cinco a IES públicas.

O critério de escolha dos cursos se pautou em privilegiar IES públicas e privadas com notória participação histórica na formação de pedagogos no Estado de MT, bem como o maior número de egressos do curso. Saliento que, inicialmente, tive como proposta contemplar um maior número de IES privadas, contudo, a falta de disponibilização do PPC no site, tal qual recomenda o MEC, e ainda devido às dificuldades de contato, esse propósito se tornou inviável.

Para a coleta de dados, optou-se pela pesquisa bibliográfica e análise documental dos PPCs dos cursos. A pesquisa bibliográfica indicou a inexistência de pesquisas âmbito nacional que investigaram a tradução das DCNP a partir de aportes teóricos contemporâneos a luz da Teoria do Ciclo de Políticas e da Teoria do Discurso. A escolha pelo PPC se justifica por ser este o documento que organiza pedagogicamente o funcionamento do curso.

Isto posto, realizei uma busca da disponibilização dos mesmos nos sites das instituições e, quando necessário, entrei em contato por e-mail com a coordenação dos cursos para solicitação do PPC. Com o resultado das buscas pelos sites institucionais e também dos retornos recebidos por e-mail foi possível realizar a análise de seis PPC de três IES diferentes. Ressalto que uma IES oferta dois cursos de Pedagogia, outra três cursos e uma terceira apenas um curso de Pedagogia.

Dos PPCs disponibilizados organizei as informações de modo que nenhuma IES fosse identificada, pois a minha intenção foi compreender as particularidades do processo de tradução das DCNP de cada curso e de não estabelecer comparações entre eles, muito menos entre as IES.

3O e-MEC é um sistema eletrônico do Governo Federal de acompanhamento dos processos que regulam a

educação superior no Brasil. Todos os pedidos de credenciamento e recredenciamento de instituições de educação superior e de autorização, renovação e reconhecimento de cursos, além dos processos de aditamento, que são modificações de processos são feitas pelo e-MEC. (BRASIL, 2014).

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Para organizar as análises dos dados, atribuí aleatoriamente sigla alfabética a IES e aos cursos e numérica aos seus respectivos PPCs. Sendo assim, tem-se:

 IES Y: curso de Pedagogia A- PPC1 e curso de Pedagogia B- PPC2;

 IES W: curso de Pedagogia C- PPC3, curso de Pedagogia D- PPC4, curso de Pedagogia F- PPC6;

 IES Z: curso de Pedagogia E- PPC5.

A partir dessa delimitação, situei esses cursos na história do curso de Pedagogia no Brasil. Por meio dela concluí que a polêmica acerca da identidade da Pedagogia e do pedagogo tem influenciado diretamente a organização do currículo (BERALDO; OLIVEIRA, 2010).

A análise dos PPCs parte de uma perspectiva de acesso restrito e precário a significados e sentidos que constituem os discursos da política de currículo e que configuraram o processo de tradução das DCNP. O acesso restrito é compreendido aqui como a impossibilidade de acessar o ‘real’ na medida em que ele é sempre construído e reconstituído a partir de múltiplos olhares e interpretações. Portanto, esse acesso é sempre precário, é constantemente “passível de resistência, deslocamento e contestação por outras lógicas e discursos.” (OLIVEIRA; OLIVEIRA; MESQUITA, 2013 p.19).

Em relação ao significado, para Hall (1997): “O significado surge não das coisas em si – ‘a realidade’ – mas a partir dos jogos de linguagem e dos sistemas de classificação nos quais as coisas estão inseridas.” (HALL, 1997, p.29). O sentido, nesse contexto, refere-se ao que é produzido dentro de um sistema de significação através da linguagem (HALL, 1997). Para Hall:

O significado aqui não possui origem nem destino final, não pode ser fixado, está sempre em processo "posicionado" ao longo de um espectro. Seu valor politico não pode ser essencializado, apenas determinado em termos relacionais. (HALL, 2003, p.6, grifo do autor)

Por essa via, o significado é constituído de acordos coletivos e provisórios, ao mesmo tempo em que o sentido é produzido subjetivamente com base em significantes circulantes na cultura. De qualquer modo, o significado e o sentido estão intrinsecamente interacionados, ou seja, o significado interfere no sentido e vice-versa. O significado e o sentido compõem então o processo de significação, que compõe a linguagem, a qual, por sua vez, configura um dos componentes do discurso.

A partir disso, construí o referencial teórico metodológico apresentado no Primeiro Capítulo: “Fundamentos teórico-metodológicos: noções configuradoras para a análise da tradução das DCNP nos cursos de Pedagogia de Mato Grosso”.

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Para tal, articulada à noção de sistema discursivo recorri à compreensão do Ciclo de Políticas e a noção de tradução a partir da Teoria do Discurso e dos Estudos Culturais. Em seguida, expus a noções de currículo e de política de currículo e de formação de inicial de professores orientadoras dessa pesquisa. Posteriormente, considerei essas opções teóricas na abordagem qualitativa de pesquisa. Finalizei o capítulo descrevendo os procedimentos realizados para a coleta de dados, a saber, a pesquisa bibliográfica e investigação do discurso dos PPCs por meio da análise documental.

De posse dos fundamentos teórico-metodológicos, prossegui para o Capítulo II: “Problematizando o significado de Pedagogia: entre dissensos e acordos provisórios”. Nele, recorri à história do curso Pedagogia, no entendimento de que ela se constitui de dissensos e acordos provisórios. Finalizo esse capítulo com a Seção I “A tradução das DCNP: um recorte da reforma curricular dos cursos de Pedagogia”, na qual discorro e problematizo a tradução das DCNP pelos cursos de Pedagogia.

Após construir os referenciais teórico-metodológicos, problematizar a história do curso de Pedagogia desde a sua criação em 1939 até a constituição das DCNP e discutir a tradução como um recorte da reforma, apresento o terceiro capítulo: “Contextualização e a problematização dos cursos de Pedagogia de Mato Grosso a partir das DCNP”.

No início desse capítulo, exponho um panorama organizacional, pedagógico e político dos cursos de Pedagogia investigados em forma de cinco quadros quanto à categoria administrativa (adm.) das IES, à denominação concedida ao curso, à nomenclatura dos respectivos PPCs, ao prazo de integralização curricular, ao diploma conferido aos egressos, ao turno de oferta do curso, ao número de vagas ofertada/ano, à nota do curso no ENADE4 (2012), à distribuição da carga horária total dos cursos, ao nº de disciplinas obrigatórias e optativas com as respectivas cargas horárias (CH), a CH das atividades complementares, do estágio supervisionado e do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Caracterizo, ainda, a estrutura curricular dos cursos de Pedagogia em relação aos núcleos propostos pelas DCNP e suas respectivas cargas horárias. Para finalizar, descrevo as nomenclaturas atribuídas aos núcleos/eixos pelos cursos.

4 O ENADE faz parte do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) que analisa as

IES, os cursos e o desempenho dos estudantes. O processo de avaliação leva em consideração aspectos como ensino, pesquisa, extensão, responsabilidade social, gestão da instituição e corpo docente. O SINAES reúne informações do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (ENADE) e das avaliações institucionais e dos cursos (Conceito Preliminar de Curso- CPC e o Conceito de Curso- CC). (MEC, 2014).

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Em seguida, exponho e analiso cada curso quanto à estrutura dos PPCs e à história dos cursos, desde a sua criação até a instituição das DCNP, focalizando as análises para o perfil profissional, a noção de currículo e o significado de Pedagogia.

Finalizo o capítulo três com a Seção I: “Os modelos de formação de professores a partir da noção de currículo dos cursos investigados”. Nessa seção, procurei investigar a partir da noção de currículo dos cursos investigados, os modelos de formação de professores propostos e suas implicações para a gestão democrática.

Em algumas considerações, sinalizo que a tradução das DCNP pelos cursos de Pedagogia de MT está envolta em dissensos e acordos provisórios no que diz respeito ao perfil do egresso, à noção de currículo e ao significado de Pedagogia. Isso demonstra a instabilidade de sentidos no conjunto dos cursos de Pedagogia de MT.

Por essa via, os PPCs apresentam um caráter híbrido, atravessado por demandas contraditórias entre a formação do pedagogo voltada para o magistério na Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental e para a gestão empresarial.

Além disso, os modelos de formação dos cursos de Pedagogia investigados baseiam-se na epistemologia da prática em suas diferentes vertentes, sendo que aqueles cursos que se assentaram na perspectiva crítica propiciam à construção da gestão democrática na escola.

Portanto, a tradução das DCNP pelos cursos de Pedagogia envolveu os agentes do contexto da prática, e sofreu influências da outras legislações, principalmente da Resolução CNE/CP nº 01/02, a qual institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica. Além disso, a tradução importou o estabelecimento do diálogo entre a identidade originária dos cursos de Pedagogia com a identidade proposta pelas DCNP.

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1 FUNDAMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS: NOÇÕES

CONFIGURADORAS PARA A ANÁLISE DA TRADUÇÃO DAS DCNP NOS CURSOS DE PEDAGOGIA DE MATO GROSSO

Neste capítulo, apresento as noções configuradoras para análise da tradução das DCNP pelos cursos de Pedagogia de MT. Para isso, organizei a exposição do texto em sete seções. A primeira, a abordagem teórico-metodológica do Ciclo de Políticas, recorri a Ball e Bowe (1992), Ball et al (1992), Mainardes (2006), Ball (1994; 2001), Oliveira (2008), Dias, Abreu e Lopes (2012), Lopes, Cunha e Costa (2013), Beraldo e Oliveira (2010),), Maguire e Ball (2011) e Lopes (2010), na perspectiva de adotar uma análise que considere os diferentes contextos da política de currículo.

Na segunda seção, trago a noção de tradução a partir da Teoria do Discurso e dos Estudos Culturais, com base em Hall (2003), Mendonça (2007; 2009); Laclau (2002; 2011), Lopes (2009), Lopes, Cunha e Costa (2010) e Beraldo e Oliveira (2010).

Amparada em tais pressupostos, construí na terceira seção, “A noção de currículo de política de currículo”. Para isso, recorri à construção cultural do currículo, com base em Saul (1984), Apple (1989:1995), Ball (1994; 2001; 2011), Goodson (1995), Moreira (1997; 2005), Moreira e Silva (1997), Sacristán (2000), Laclau (2005; 2011), Macedo (2006; 2011), Oliveira (2008), Lopes (2010) Silva (2011), Oliveira e Lopes (2011), Oliveira, Oliveira e Mesquita (2013).

Na quarta seção, abordo a noção de formação de inicial de professores, com base em Ball e Goodson (1985 apud DAY, 1999), Shön (1987), Garcia (1999), Gomes (1995), Nóvoa (1995), Alarcão (1996), Tardif (2000; 2002), Contreras (2002) Kuenzez (2002 apud MALDANER, 2007), Zeichner (2003; 2008), Garcia, Hypólito e Vieira (2005), Maldaner (2007), Moreira (2001), Silva (2007) e Kunzer (2007).

Na quinta seção, problematizo a abordagem qualitativa de pesquisa no entendimento de que a análise do objeto de pesquisa valoriza contextualização e significação. Deste modo, o que está em questão é o aprofundamento reflexivo das informações coletadas (BOGDAN; BIKLEN, 1994; LAPERRÉRE, 2008; OLIVEIRA; OLIVEIRA; MESQUITA, 2013).

Na sexta seção, nomeada “A pesquisa bibliográfica” trago os resultados da pesquisa bibliográfica realizada e as suas implicações para a minha pesquisa, com base em André (1996), Oliveira (2007), Nickel (2006), Vieira (2007), Santos (2011), Neves (2011), Moraes (2011), Muffarrei (2011), Albuquerque (2013) e Rocha (2010).

(21)

Na sétima e ultima seção, desenvolvo os procedimentos realizados a partir da análise documental dos PPCs a partir de Cellard (2008), Lopes (2010) e Santiago (2008).

1.1 A ABORDAGEM DO CICLO DE POLÍTICAS

Ao aderir à teoria do Ciclo de Políticas, ou trajetórias das políticas, opto por uma análise da política que rompe com os modelos verticalizados e lineares (agenda, formulação, implementação e avaliação). A teoria do Ciclo de Políticas, inicialmente desencadeada por Stephen Ball e Richard Bowe, tem seu ápice com a publicação do livro Reforming education and changing schools (1992). Nele, os autores rejeitam os modelos de análise de política educacional que separam as fases de formulação e implementação e que ignoram disputas e debates sobre a política (MAINARDES, 2006).

O modelo analítico proposto está voltado para a dinâmica das relações macro e micro, global e local no processo de produção de políticas, pois, “Para Ball há imbricação e permanente tensão entre o local e o global.” (LOPES; CUNHA; COSTA, 2013, p. 393).

Tal perspectiva indica que a análise da política curricular esteja implicada na contextualização do problema de pesquisa em âmbito nacional e internacional e, ainda, que essa contextualização envolva tensões e resistências em âmbito local, ou seja, que contemple as especificidades da tradução da política por agentes políticos do contexto da prática.

Nesse sentido, Mainardes (2006) salienta que o Ciclo de Políticas é um referencial teórico, analítico e crítico de políticas educacionais, que destaca a natureza complexa e controversa da política educacional, sendo, portanto, uma estrutura dinâmica e flexível.

Para Ball, “o foco da análise de política deveria incidir sobre a formação do discurso da política e sobre a interpretação ativa que os profissionais do contexto da prática fazem para relacionar os textos da política à prática.” (MAINARDES, 2006, p. 50).

Para a análise da política, o Ciclo de Políticas apresenta três facetas ou arenas políticas: a política proposta (intenções governamentais e das escolas), a política de fato (textos políticos e legislativos) e a política em uso (discursos e práticas dos profissionais

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que atuam no nível da prática) (MAINARDES, 2006). Ball compreende essas facetas por meio de três contextos interacionados: o contexto de influências, o contexto da produção de texto e o contexto da prática.

Nessa compreensão, cada um dos referidos contextos se constitui dos outros contextos, ou seja, no contexto de influências encontramos traços do contexto do texto e da prática e vice versa. Para Ball et al. (1992), cada um desses contextos apresenta arenas, lugares e grupos de interesse e cada um deles envolve disputas e embates. Contudo, por questões didáticas, a seguir apresento cada contexto, separadamente, visando, com isso, apreender suas especificidades.

O contexto de influência é o espaço privilegiado em que são construídos significados para as políticas. Esse contexto é bem entendido na medida em que o compreendo como arena política em que grupos divergentes disputam para influenciar a definição das finalidades sociais da educação e do que significa ser educado. Nesse contexto,

[...] ocorrem disputas entre discursos veiculados pelo poder público, por grupos econômicos nacionais e internacionais, por movimentos sociais, partidos políticos, instituições, comunidades disciplinares e epistêmicas, enfim, por um coletivo de grupos sociais interessados em exercer influências na formulação e nos destinos da política. (BERALDO; OLIVEIRA, 2010).

Para Oliveira (2008, p. 3): “O contexto de influência consiste no espaço-tempo onde às ideias centrais são estabelecidas para legitimar um discurso político.” No caso das DCNP, envolve a atuação das comunidades disciplinares e epistêmicas5 (BERALDO; OLIVEIRA, 2010), a atuação das Secretarias Municipais e Estaduais de Educação, as forças da política nacional e internacional e as expectativas dos profissionais do contexto da prática.

A disseminação de influências internacionais pode ser entendida de duas maneiras. A primeira, pelo fluxo de ideias por meio de redes políticas e sociais que envolvem a circulação internacional de ideias; o processo de empréstimos de políticas; os grupos de indivíduos que vendem soluções no mercado político acadêmico (periódicos, livros, conferências e performances de acadêmicos), que viajam para vários lugares para expor suas ideias.

5

O conceito de comunidades epistêmicas está associado à “concepção de política como produção para além do Estado, sem, no entanto, desconsiderar o Estado como atuante no processo.” (LOPES, 2006, p. 144). “Em se tratando do curso da Pedagogia, entendemos que a comunidade epistêmica é constituída por produtores livros ou documentos que analisam a situação educacional, pesquisadores desse campo do conhecimento e por docentes que atuam no citado curso.” (BERALDO; OLIVEIRA, 2010, p.1).

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A segunda ocorre no patrocínio e ou na imposição de “soluções” oferecidas e recomendadas por agências multilaterais: World Bank; Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE); Organização das Nações Unidas para a educação, à ciência e a cultura (UNESCO) e do Fundo Monetário Internacional (FMI), entre outros.

Dessa forma, o contexto de influência oferece subsídios para a construção do contexto do texto. Nesse contexto, estão expostos nas legislações e em outros documentos publicados pelos órgãos oficiais dos governos federal, estadual e municipal os significados e sentidos legitimados nos outros contextos (o de influência e o da prática).

Na análise da tradução das DCNP identifica-se a centralidade de dois documentos compondo esse contexto, o Parecer CNE/CP nº 5, de 2005, e a Resolução nº 01, de 2006. Em relação a esse contexto, Mainardes (2006) destaca que: “A política não é feita e finalizada no momento legislativo, os textos precisam ser lidos com relação ao tempo e ao local específico de sua produção.” (p. 52). Isso significa que a compreensão do texto implica em relacioná-lo ao seu contexto de produção.

A partir da institucionalização dos documentos no contexto do texto, os agentes políticos do contexto da prática, os profissionais das escolas e das IES interpretam, traduzem a política na tessitura de suas histórias, experiências, valores, propósitos e interesses diversos. Durante o processo de interpretação:

Algumas vozes [...] são silenciadas. Certas possibilidades são oferecidas, outras são concluídas, algumas formas de pensar são empoderadas e encorajadas, outras são inibidas. (MAGUIRE; BALL, 2011, p. 185).

Deste modo, a tradução é limitada por condições materiais e culturais. Para Oliveira (2008), a interpretação no contexto da prática “consiste nas possibilidades e limites materiais e culturais daqueles que exercem a política de currículo [...]” (OLIVEIRA, 2008, p.15). Por essa perspectiva, os textos políticos não passíveis de serem controlados (BALL, 2001).

Por isso, no contexto da prática os sujeitos não só traduzem os textos da política, mas participam, estão presentes no contexto de influências, reivindicando o atendimento de suas demandas, bem como nas decisões para a definição do ‘texto’ no contexto do texto. Durante esse processo de tradução, rejeitam partes do texto, selecionam outras e ignoram outras. Por essa via:

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[...] os professores e demais profissionais exercem um papel ativo no processo de interpretação e reinterpretação das políticas educacionais, o que eles pensam e acreditam têm implicações [...] (MAINARDES, 2006 p. 53).

Nesse processo de tradução, a circulação de concepções produz e interpreta de maneira diversificada a política proposta nos documentos institucionalizados (BALL, 1994), o que tem sido amplamente reconhecido no campo do currículo:

A potência da abordagem de Ball encontra-se no reconhecimento de que a circulação dos textos e discursos implica a circulação de ideias, concepções e valores dos atores sociais que atuam no campo da educação e, por isso, produzem a reinterpretação das políticas para além ou para aquém do que é suposto por quem escreve os textos e tenta por eles construir regras para as políticas. (LOPES; CUNHA; COSTA, 2013, p. 393).

Nesse pressuposto, a movimentação de textos, no caso das DCNP, implica em circulação de discursos embasados em determinadas concepções e valores legitimados, ou não. Portanto, a análise da tradução das DCNP nos PPCs parte do pressuposto de que o PPC é resultado de uma disputa que ocorre nos contextos de influência e da prática em torno do perfil profissional, da noção de currículo e do significado de Pedagogia e que esses, por sua vez, atuam no processo de significação da identidade do pedagogo.

Dessa forma, as DCNP se configuram como documento curricular, como texto político, portanto, são produções contextuais. Parafraseando Dias, Abreu e Lopes (2012), ao desenvolver a presente pesquisa com base nessa abordagem, exercito não apenas a superação da noção de política verticalizada, mas também o propósito de a ela conferir uma tessitura incrivelmente complexa e dinâmica.

Em suma, a opção teórica e metodológica do Ciclo de Políticas oferece uma nova forma crítica e contextualizada de compreender a política curricular em movimento cíclico, constante, sem um marco para início ou fim.

1.2 A NOÇÃO DE TRADUÇÃO A PARTIR DA TEORIA DO DISCURSO

Ao escolher a noção de tradução a partir da Teoria do Discurso de Ernesto Laclau para orientar o processo da pesquisa, estou me referindo a um aporte teórico contemporâneo considerado pós-estruturalista “[...] que contempla a contingência, a precariedade, a indeterminação e o paradoxo como dimensões ontológicas do social.” (MEDONÇA, 2009, p. 153-154). Sob essa perspectiva, a própria existência do social está tramada e condicionada a impossível representação plena do real. Nesse sentido, para Mendonça (2009):

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A Teoria do Discurso tem o potencial de ser uma ferramenta de compreensão do social, uma vez que seu próprio entendimento dá-se, nesta perspectiva, a partir da construção de ordens discursivas, sendo a questão do poder central e constituidora de relações sociais. (p.153).

Assim, ao incorporar os aportes teóricos de Ernesto Laclau para a pesquisa, avanço na investigação dos processos envolvidos na tradução, por meio da análise de negociações de discursos6 que visam se tornar hegemônicos.

A partir disto, a noção de tradução implica compreender a investigação como um campo discursivo. Compromete-me a sinalizar nos textos a indecidibilidade, o [...] “que permite descontruir tanto a lógica de se pensar o social e tentar ordená-lo com a política, quanto, igualmente, a lógica não distinta que tem dado sustentação à investigação neste campo.” (LOPES; CUNHA; COSTA, 2013, p. 404).

Nessa perspectiva, a tradução implica na impossibilidade de que o sentido atribuído se repita a cada nova tradução (LOPES; CUNHA; COSTA, 2013). É nesta medida que investigar a política de currículo, implica em “metaforicamente, lidar com uma ‘fotografia’, um quadro discursivo (texto/contexto de significação) delimitado por antagonismo7 e exclusão.” (LACLAU 2011 apud LOPES, CUNHA e COSTA, 2013 p. 400).

Além disso, a noção de tradução coordena a investigação com a compreensão de discursos que constituem o cenário da investigação dos textos a partir de fios tramados na contingência. Sob essa perspectiva, a noção de tradução questiona a representação plena entre a correspondência do escrito e as suas demandas8. (LOPES; CUNHA; COSTA, 2013). Considero, assim, que a noção de tradução se torna potente “[...] para compreender e investigar as diferentes significações que as políticas de currículo assumem contextualmente.” (LOPES; CUNHA; COSTA, 2013, p. 397).

Para Hall (2003), a tradução é um processo de negociação entre novas e antigas culturas, vivenciado por pessoas que migraram de seu lugar de origem para outro destino. Nesse processo de tradução, as pessoas têm diante de si uma cultura que não as

6 Para Laclau, toda prática é um discurso, assim como todo discurso é uma prática. “Dessa forma a teoria

do Discurso visa a não separar a linguagem (retórica), o indivíduo (sua psique) e o político (a sociedade e o social).” (LOPES, 2010, p. 10).

7 Segundo Laclau e Mouffe (2005 apud Mendonça, 2009, p. 161) “[...] o antagonismo é entendido como a

impossibilidade constituição de um sentido objetivo, ou finalístico, a toda lógica discursiva”.

8 As demandas são elementos que são hibridizados ao mesmo tempo em que se tornam discurso

hegemônico. Ou seja, ao mesmo tempo em que são articulados na constituição de um dado discurso, que, de forma contingente e provisória, fixa determinados sentidos e significados em uma representação da política. (LOPES, 2010)

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assimila e, ao mesmo tempo em que não abandonam completamente suas identidades originárias, precisam dialogar constantemente com a nova realidade.

Trazendo essa perspectiva para a presente pesquisa, durante o processo de tradução das DCNP, os cursos de Pedagogia tem diante de si uma ‘nova’ cultura, uma ‘nova’ identidade que precisa dialogar com a sua identidade originária. No decurso da tradução, os cursos não abandonam completamente sua identidade originária e nem ‘absorvem’ completamente a nova identidade proposta.

Em tais pressupostos, problematizo os discursos produzidos no processo de tradução da DCNP. Para isso, identifico as práticas articuladas na construção do PPC nos referidos cursos. Para Mendonça (2007) essa prática

[...] consiste na articulação de elementos num sistema discursivo a partir de um ponto nodal – um ponto discursivo privilegiado – que fixa parcialmente os sentidos desse sistema. (LACLAU e MOUFFE, 1985, p.113 apud MENDONÇA, 2007, p. 2)

Deste modo, a tradução (transição) vincula-se a tudo que é híbrido e diverso, a tudo que é mistura, transformação e criação do novo, do inesperado e inusitado. Reitero que investigar a política a partir da tradução implica em “[...] metaforicamente, lidar com uma ‘fotografia’, um quadro discursivo (texto/contexto de significação) delimitado por antagonismo e exclusão.” (LACLAU, 2011 apud LOPES; CUNHA; COSTA, 2013, p. 400).

Sob esse aspecto, o hibridismo expressa ao mesmo tempo a negação e a afirmação. Desse modo, o entendimento de que os textos são híbridos implica em compreender a não possibilidade de uma única leitura. Por essa via Hall (2003) afirma que:

O hibridismo não se refere a indivíduos híbridos, que podem ser contrastados com os "tradicionais" e "modernos" como sujeitos plenamente formados. Trata-se de um processo de tradução cultural, agonístico uma vez que nunca se completa, mas que permanece em sua indecidibilidade. (p.74)

Nesse contexto, o processo de tradução envolve a hegemonia de um determinado sentido. A hegemonia é “uma relação em que um conteúdo particular assume, num certo contexto, a função de encarnar uma plenitude ausente” (LACLAU, 2002 p. 122 apud MENDONÇA, 2007, p. 76).

Sob esse viés, para “encarnar” a demanda de outros grupos sociais o discurso que pretende ser hegemônico precisa ser visto como o mais atraente dos discursos dispersos no campo da discursividade. O discurso que “encarna a plenitude ausente” pode, então, representá-la em outros contextos (BERALDO; OLIVEIRA, 2010).

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1.3 A NOÇÃO DE CURRÍCULO E DE POLÍTCA DE CURRÍCULO

A discussão em torno da noção de currículo9 é relevante na medida em que ela indica concepções de ser humano e projetos de sociedade (SILVA, 2011). Nessa perspectiva, a necessidade de se definir o currículo leva a pensar no seu significado, na sua pluralidade de definições existentes na literatura e em nós mesmos, o que é “é um sintoma de que, ao definir currículo, nós estamos ou devemos estar comprometidos com decisões anteriores”, pois “[...] tomar decisões curriculares é tomar decisões de valor.” (SAUL, 1984, p. 39-40).

No Brasil, os estudos do currículo deram início na década de 1920 e se intensificaram nessa mesma década com o aumento da pós-graduação (MOREIRA, 1997). Destarte, segundo Silva (2011), os estudos referentes ao currículo tiveram sua origem nos Estados Unidos, no início do século XX. Naquele momento, todo o investimento, tanto intelectual como financeiro, se pautou em encontrar alternativas mais adequadas de apresentação prática e organizacional do currículo.

Segunda Silva (2011), a ênfase permaneceu quase que exclusivamente na elaboração eficiente de programas e na formação técnica e especializada. Em outras palavras, na atividade técnica de como fazer o currículo (BOBBITT, 1918; TYLER, 1949).

Para Moreira e Silva (1997), nesse modelo de currículo tecnocrático pautado numa suposta neutralidade, a preocupação volta-se para como organizá-lo de modo a atender objetivos previamente estabelecidos, requerendo que seus resultados sejam mensurados e especificados. Para Bobbitt (1918) segundo Silva (2011), “Currículo é a especificação precisa de objetivos, procedimentos e métodos para a obtenção de resultados que podem ser precisamente mensurados.” (p. 12).

Portanto, esse ‘modelo’ de escolarização está voltado para o ensino, a aprendizagem, a avaliação, a metodologia, a didática, a organização, o planejamento, a eficiência e os objetivos (SILVA, 2011). Nessa direção, o questionamento feito ao currículo é: como organizá-lo com vista a atender os objetivos previamente estabelecidos?

9 Indicar a noção de currículo e de política de currículo implicou em trazermos autores que por vezes se

diferem em relação às concepções de poder e cultura. No entanto, minha intenção não é abarcar tais diferenças, mas, sim trazer as contribuições desses autores para a nossa pesquisa.

(28)

Concorrente de Bobbitt e Tyler, Dewey publica em 1902 o livro “A criança e o currículo”. Nele, o autor demonstra interesse na construção da democracia e ressalta a necessidade de respeito aos interesses das crianças e jovens. Para Dewey, a escola deve ser o local de vivência e prática direta de princípios democráticos. Contudo, Dewey não conseguiu influenciar o currículo como Bobbitt. “A atração e influência de Bobbitt devem-se provavelmente ao fato de que sua proposta parecia permitir à educação torna-se científica.” (SILVA, 2011, p. 23).

Sucintamente, os modelos curriculares tecnocráticos de Bobbitt e Tyler e progressivista de Dewey opuseram-se ao modelo curricular clássico e humanista, preocupado com uma formação enciclopédia, universalista e voltado para a memorização de obras literárias e artísticas. O tecnocrático denunciava a abstração e a inutilidade dos conhecimentos clássicos para a vida moderna. O currículo progressivista insistia na valorização da psicologia infantil como orientadora da aprendizagem, o que jamais interessou ao modelo clássico (SILVA, 2011).

Contrário a isso, em uma perspectiva crítica fomentada pelo contexto histórico social da década de 1960 (Independência das antigas colônias europeias; protestos estudantis na França; protestos contra a guerra do Vietnã; movimento feminista; movimento de contracultura; liberação sexual; e lutas contra a ditadura militar no Brasil), disseminaram-se críticas ao status quo, ou seja, ao estado atual das coisas e dos fatos, tanto em relação às teorias mais amplas da contestação, da desconfiança e da transformação social de Althusser, Bourdieu e Passeron quanto às teorias críticas do currículo a partir do movimento denominado Nova Sociologia da Educação (NSA), ou Movimento de Reconceptualização, representou uma forte reação às concepções burocráticas e administrativas de currículo de Bobbitt e Tyler.

Nesse entendimento, a suposta neutralidade é contestada, evidenciando que o currículo implica relações de poder conflituosas, deslocando a preocupação para o que o currículo faz e a quem ele favorece (APPLE, 1989). Nessa direção:

O currículo nunca é apenas um conjunto neutro de conhecimentos, que de algum modo aparece nos textos e nas salas de aula de uma nação. Ele é sempre parte de uma tradição seletiva, resultado da seleção de alguém, da visão de algum grupo acerca do que seja conhecimento legítimo. (APPLE, 1995 p.59).

A produção de currículo é um processo político, envolto em tensões e conflitos que buscam constituir um discurso legitimador, “[...] assim a elaboração de currículo pode ser considerada um processo pelo qual se inventa uma tradição” (GOODSON,

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1995, p. 112)10. Nessa direção, para o referido autor, o currículo se faz na ruptura, na descontinuidade da história. Para Goodson (1995):

A negociação contínua [...] revela antecedentes estruturas de poder na educação e sugere a forma como as atitudes de grupos dominantes na sociedade continuam influenciando a escolarização, apesar dos sinais de conflitos e contestações. (p. 132).

Sob esse viés, o currículo vigente não é naturalmente determinado. Ele não é essencialmente estruturado, ao invés disso, o currículo é fabricado, é inventado com base em interesses de um grupo privilegiado. Nessa direção, para Sacristán (2000):

A organização do conhecimento corresponde a um formato cujo desenvolvimento se realiza dentro de determinadas condições políticas administrativas e institucionais. Tais condições não são irrelevantes, mas artífes da modelagem real de possibilidades que um currículo tem. (p. 35).

Isso significa dizer que a organização do conhecimento está sustentada em determinada condições políticas e institucionais. Tais condições implicam em modelagens possíveis do currículo. Desse modo, o currículo não é proveniente de modelo fixo de conceber a educação, pois ele exerce uma função socializadora entre as gerações, envolvendo ‘elementos’ sobre os quais professores e alunos reagem e o modelam. Nas palavras do autor:

O currículo é uma práxis antes que um objeto estático emanado de um modelo coerente de pensar a educação ou as aprendizagens necessárias das crianças e dos jovens, que tampouco se esgota na parte explicita do projeto de socialização cultural nas escolas. O currículo é uma prática na qual se estabelece diálogo, por assim dizer, entre agentes sociais, elementos técnicos, alunos que reagem frente a ele, professores que o modelam. (SACRISTÁN, 2000, p. 15-16).

Sob essa perspectiva, o currículo é teoria e prática ao mesmo tempo. Nessa direção, Moreira (2005), propõe que:

[...] se conceba o currículo como um território contestado, como um campo de conflitos nos quais diferentes grupos e agentes lutam pela oficialização e pelo prestígio de seus conhecimentos, significados, habilidades, métodos, crenças e valores. (p. 16).

A partir disso, e já em perspectiva pós-crítica de currículo, compreendo que a noção de currículo envolve a cultura. Desse modo, acrescento a cultura como ‘elemento’ imbricado na construção da noção de currículo. A partir dos Estudos

10 Goodson utiliza o termo tradição inventada a partir de Hobsbawn (1985). Para este, a tradição

inventada significa um conjunto de práticas e ritos: práticas normalmente regidas por normas expressas ou tacitamente aceitas; ritos - ou natureza simbólica - que procuram fazer circular certos valores e normas de comportamento mediante repetição, que automaticamente implica em continuidade com o passado. De fato, onde é possível, o que tais práticas e ritos buscam é estabelecer continuidade com um passado histórico apropriado.

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Culturais11, Silva (2011) concebe a cultura como arena de disputas em torno da significação social, ou seja, de produção de significados, na qual os grupos sociais diversos situados “[...] em posições diferencias de poder lutam pela imposição de seus significados à sociedade mais ampla”. (p. 133-134).

Por essa via, o currículo é arena de produção cultural, em que não cabe a distinção entre a sua produção e implementação (teoria e prática), “entre formal e vivido, entre cultura escolar e cultura da escola” (MACEDO, 2006, p. 98). O currículo como artefato cultural é resultado de um processo de construção social (SILVA, 2011). Portanto, “as diversas formas de conhecimento corporificadas no currículo é fruto de um processo de construção social.” (SILVA, 2011, p. 135).

Com fundamentos na Teoria do Discurso, apreendo que o currículo é consequência de acordos provisórios que buscam se hegemonizar por meio de articulações em um dado contexto. Por essa via, a noção de currículo fixada e hegemonizada é negociada entre os sujeitos, apresentando, por isso, um caráter provisório, híbrido e contingencial. Essa hegemonia é sustentada por demandas também provisórias e construtoras de discursos para a legitimação de práticas da política de currículo em vigência.

Isso significa que a concepção de currículo é política e está ancorada em determinada concepção de homem, de sociedade e de educação, indicando que o currículo é construtor de identidade, de subjetividade (SILVA, 2011). Nesse sentido, o currículo é um texto cultural no qual o significado é negociado e fixado temporariamente.

Nesse contexto, a legitimação de “[...] todo conhecimento depende da significação e esta por sua vez, depende de relações de poder.” (SILVA, 2011 p. 149). Portanto, a significação do conhecimento, ou seja, sua validade e legitimação dependem do discurso hegemonizado por um grupo que detém provisória e precariamente o poder. Tal pressuposto levou-me a compreender, a partir de Macedo (2011), o currículo na contemporaneidade como projeção de identidades que nunca se completa.

Em tal contexto, as identidades não podem mais ser vistas como expressão de entes positivos e previamente constituídos, mas como uma relação imaginária entre sujeitos que se constituem na própria prática de identificação, que nunca será completa. (MACEDO, 2011, p. 4).

11

Estudos Culturais estão preocupados com questões que se situam na conexão entre cultura, significação, identidade e poder. Os Estudos Culturais tomam claramente o partido dos grupos em desvantagem nessas relações (SILVA, 2011, p. 134).

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Daí resulta o caráter híbrido de toda identidade. Segundo Macedo (2011), o significante identidade tem sido “[...] preferencialmente preenchido por identidades historicamente apresentados como universais, tais como, por exemplo, o cidadão.” (p.8). Nessa direção:

[...] a vinculação entre projeto identidade e conteúdo opera com retórica da falta. A não identidade [...] a não cidadania se estabelece no plano individual e a identidade do sujeito é representada como algo que lhe é externo e que pode ser por ele adquirida. (MACEDO, 2011, p. 8).

Portanto, o currículo é arena de produção cultural, é artefato cultural, é construção social. Então, as diversas formas de conhecimento corporificadas, fixadas, legitimadas contingencialmente e provisoriamente no currículo, são frutos de um processo de significação implicado em relações conflituosas de poder. (APPLE, 1989:1995; MACEDO, 2006; SILVA, 2011).

Dessa forma, considero que a política12 de currículo produz identidades, na medida em que o currículo é artefato cultural, um terreno contestado, local de resistência e de afirmação de identidades. A partir disso, “[...] as políticas de currículo são políticas culturais [...] são uma política da diferença, sem significados fixos [...] são produtos de relações de diferenças mutáveis e modificadas.” (OLIVEIRA; LOPES, 2011, p.37).

Nessa direção, a política de currículo se constitui de significação e ressignificações do currículo (SILVA, 2011). Portanto, a política curricular envolve processos de articulações em torno do poder de significar sentidos preferenciais provisórios em formações históricas e culturais muito específicas.

Isso implica entender que a política articula um conjunto de sentidos, hibridizando sentidos circulantes, iterando fragmentos de sentidos partilhados por sujeitos que se constituem nesse processo de articulação. (MACEDO, 2011, p.10).

Sendo assim, as políticas curriculares não são objetos ou coisas, as políticas curriculares são também processos e produtos em constante diálogo e transformação (BALL, 1994). Para o autor, o processo de produção de políticas está voltado para a dinâmica das relações macro e micro, global e local. Sendo assim, a política de currículo é constituída por textos simbólicos que são constantemente ressignificados simultaneamente entre os contextos e por diferentes sujeitos.

12

Para Mouffe (2001), a política é uma atividade inerente à natureza humana. Refere-se: “[...] à reunião de práticas, discursos e instituições que buscam estabelecer certa ordem e organizar a coexistência humana em condições que são potencialmente conflitantes, porque são afetadas pelas dimensões da política e do político” (p. 417).

(32)

Nesse entendimento, para a teoria do Ciclo de Política, a definição de política de currículo envolve processos de negociações constantes e complexas, uma vez que os sujeitos e os contextos influenciam e são influenciados por discursos circulantes, o que causa uma interdependência delicada (BALL, 2001). Por essa via, a política de currículo no curso de Pedagogia é:

[...] constituída por textos que, sendo processos símbolos, são constantemente, contextualizados e recontextualizados de modo a

subversivo ou não, seja no momento da implantação seja na produção. (OLIVEIRA, 2008 p. 43).

Isso significa dizer que os agentes da dimensão prática do currículo influenciam (contexto de influências) e participam do processo de elaboração da política (contexto do texto), ao traduzirem a política de currículo institucionalizada em seu cotidiano. Essa perspectiva tira o poder do Estado como único e privilegiado sujeito no processo de construção da política.

Portanto, a análise da política de currículo necessita ser contextualizada nos contextos micro e macro. Segundo Ball (2011), por meio dessa contextualização é possível desnaturalizar as “trapaças” da política de currículo. Nas palavras de Ball (2011), a análise da política:

[...] necessita ser acompanhada de cuidadosa pesquisa regional, local e organizacional se nos dispusermos a entender os graus de “aplicação” e de “espaço de manobra” envolvidos na tradução das políticas nas práticas ou na diferencial “trapaça” das disciplinas da reforma. (p. 30).

Além da necessidade de contextualização regional e local para a análise da política educacional, apreendo a partir da Teoria do Discurso de Laclau (2005; 2011) e das contribuições de Oliveira, Oliveira e Mesquita (2013) que a política é constituída por discursos. Dessa forma, a análise da política de currículo implica em investigar as demandas que são postas em jogo na disputa por significação, entendendo-as como elementos diferenciais que são hibridizados, ao mesmo tempo em que sentidos e significados são postos em disputa para se tornarem hegemônicos e, assim, configurar um discurso hegemônico.

Portanto, analisar uma política de currículo implica identificar as demandas curriculares articuladas na construção da política, ou seja, da formação discursiva em diferentes contextos. Nessa direção, compreendo a política de currículo também “[...] como articulação discursiva pela constituição de representações.” (LOPES, 2010, p. 3).

(33)

1.4 A NOÇÃO DE FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES

Para Moreira (2001), os estudos sobre currículo precisam necessariamente envolver investigações sobre os professores e sobre a sua prática, pois o currículo exerce papel ativo no desenvolvimento do professor. Segundo o autor, não se pode falar em desenvolvimento curricular se ao mesmo tempo não ocorrer o desenvolvimento do professor “[...] e, com ele, o aperfeiçoamento das práticas escolares (ALVAREZ MÉNDEZ, 1990). Logo, não se pode pensar currículo sem se pensar o professor e a sua formação.” (MOREIRA, 2001, p. 2).

Desse modo, entendo que o discurso sobre currículo e suas traduções trazem implicações para o desenvolvimento profissional do pedagogo. Nessa direção, é preciso pensar o currículo e a formação de professores13 implicadas em uma sociedade multicultural na qual a “[...] pluralidade de culturas, etnias, religiões, visões de mundo e outras dimensões das identidades infiltra-se, cada vez mais, nos diversos campos da vida contemporânea.” (MOREIRA, 2001, p.3).

A partir daí entendo que as noções críticas e pós-críticas de currículo podem vir a propiciar a formação de professores reflexivos críticos participantes ativos nas políticas educacionais. É nesse sentido que a formação “[...] pode estimular o desenvolvimento profissional dos professores, no quadro de uma autonomia contextualizada da profissão docente” (NÓVOA, 1995, p.27). Para isso é importante valorizar os paradigmas de formação que favoreçam

[...] a preparação de professores reflexivos, que assumam a responsabilidade do seu próprio desenvolvimento profissional e que participem como protagonistas na implementação das políticas educativas. (NÓVOA, 1995, p.27).

Portanto, o curso de formação inicial tem papel fundamental no desenvolvimento profissional docente e na construção de sua identidade. Segundo Gomes (1995) a formação inicial de professores está baseada em três “modelos” de formação: a racionalidade técnica, a baseada em competências e a prática reflexiva. Sendo todos eles orientados em determinadas concepções de ensino, de aprendizagem,

13A formação de professores “[...] é a área de conhecimentos, investigação e de propostas teóricas e

práticas que, no âmbito de Didáctica e da Organização Escolar, estuda os processos através dos quais os professores - em formação ou em exercício - se implicam individualmente ou em equipe, em experiências de aprendizagem através das quais adquirem ou melhoram os seus conhecimentos, competências e disposições, e que lhes permite intervir profissionalmente no desenvolvimento do seu ensino, no currículo e da escola, com o objectivo de melhorar a qualidade da educação que os alunos recebem”. (GARCIA, 1999, p.26)

Referências

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