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PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM CIÊNCIAS SOCIAIS

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CLOVES BARBOSA

ESTADO BURGUÊS, POLÍTICAS ORÇAMENTÁRIAS PARTICIPATIVAS E PARTICIPAÇÃO POPULAR: REPRODUÇÃO E MUDANÇA NA ORDEM SOCIAL.

PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM CIÊNCIAS SOCIAIS

PUC/SP

São Paulo

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CLOVES BARBOSA

ESTADO BURGUÊS, POLÍTICAS ORÇAMENTÁRIAS PARTICIPATIVAS E PARTICIPAÇÃO POPULAR: REPRODUÇÃO E MUDANÇA NA ORDEM SOCIAL.

PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM CIÊNCIAS SOCIAIS

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Doutor em Ciências Sociais, sob a orientação do Professor Dr. LÚCIO FLÁVIO RODRIGUES DE ALMEIDA.

PUC/SP

São Paulo

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RESUMO

Esta tese discute a relação entre o Estado burguês e as políticas orçamentárias participativas. Centraliza o foco na participação popular e nas mudanças na ordem social. Discute a experiência de participação popular na cidade de Camaragibe – PE, durante a gestão de Paulo Santana, do Partido dos Trabalhadores, no período de 1997-2004, quando as experiências do orçamento participativo foram assimiladas e adaptadas com a denominação Programa de Administração Participativa. Esta experiência política suscita questões teóricas e práticas relacionadas com o Estado e a participação política popular na sociedade capitalista. Neste contexto, as lutas sociais encontram o maior desafio para promover a sobrevivência da parte da população que produz riquezas, mas não usufrui delas plenamente.

Um poder relativamente autônomo da sociedade e que garante os privilégios burgueses é contraditório com o exercício popular do poder, que procura romper com as formas de dominação e de exploração capitalistas. O recurso à população para legitimar estas formas é estruturalmente incapaz de realizar toda a potencialidade de participação popular.

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ABSTRACT

This thesis discusses the bourgeois State and participatory budget policies. It focuses on the popular participation and the perspectives of changes in social order. It analyzes the experience of popular participation in Camaragibe – Pernambuco, during mayor Paulo Santana’s administration, from 1997 to 2004, when the participatory budget policy was assimilated under the name of Administrative Participatory Program. This political experience raises some political and practical questions related to the capitalist State and the popular participation on capitalist society. In this context, the social struggles find a great challenge to promote the survival of the part of the population that produces wealth, but doesn’t enjoy it completely.

A power relatively autonomous regarding the society and that guarantees bourgeois rule is contradictory to the popular exercise of power, which tries to break all the ways of domination and exploitation. The call to peoples’ voice in view to legitimate this ways is structurally unable to realize all the potentiality of popular participation.

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DEDICATÓRIA

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AGRADECIMENTOS

Este trabalho só foi realizado em razão do apoio e da solidariedade de diversas pessoas e instituições a quem manifesto minha gratidão. A PUC/SP me concedeu uma bolsa restituível que foi de grande valia durante o primeiro semestre do curso. A bolsa de estudos concedida pela CAPES por intermédio da comissão de bolsas da PUC/SP foi elemento importante para boa parte dos recursos necessários à conclusão deste estudo. O professor Dr. Lúcio Flávio Rodrigues de Almeida revelou, durante o período de orientação, ser pessoa de profunda capacidade crítica e de uma solidariedade a toda prova, o que é um dos valores fundamentais da sociedade que almejamos. A banca do exame de qualificação, composta pelo Prof. Lúcio Flávio de Almeida, Profª. Lúcia Bógus, e Prof. Jair Pinheiro formulou observações valiosas. Os colegas do NEILS (Núcleo de Estudos sobre Ideologias e Lutas Sociais) possibilitam inestimáveis discussões sobre as temáticas que se tornam objeto de estudos de todo o núcleo. Recebi o apoio de Ana Moraes. Contei com manifestações concretas de solidariedade dos colegas de trabalho e da direção da Secretaria do Orçamento Participativo de Olinda. Parte da equipe da gestão petista de Camaragibe concedeu as entrevistas necessárias a este trabalho. Valéria Francabandiera e a minha companheira Vera Moraes foram as primeiras leitoras destas páginas. Mariana Borga realizou a revisão final do texto.

Os momentos dedicados à composição e desenvolvimento deste trabalho resultaram em menor atenção à minha companheira, a quem devo grande apreço por também haver suportado esta situação e o seu incansável apoio e compreensão aos meus momentos de dificuldades.

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GLOSSÁRIO DE SIGLAS

CEAS: Centro de Estudos e Ação Social.

CEMEC: Centro Médico de Camaragibe.

ES: Estado do Espírito Santo.

FEACA: Federação das Associações de Moradores de Casa Amarela.

GAP: Grupo de Assessoria e Participação.

IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

IDH: Índice de Desenvolvimento Humano.

ICMS: Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços.

ISS: Imposto Sobre Serviços.

ITBI: Imposto sobre Transmissão de Bens Inter Vivos.

IPTU: Imposto Predial e Territorial Rural.

ITR: Imposto Territorial Rural.

LAFEPE: Laboratório Farmacêutico de Pernambuco.

LDO: Lei de Diretrizes Orçamentárias.

LOA: Lei Orçamentária Anual.

OD: Orçamento Democrático.

OGU: Orçamento Geral da União.

ONG: Organização Não-Governamental.

OP: Orçamento Participativo.

MDB: Movimento Democrático Brasileiro.

PAP: Programa de Administração Participativa.

PPA: Plano Plurianual.

PCB: Partido Comunista Brasileiro.

PC do B: Partido Comunista do Brasil.

PDT: Partido Democrático Trabalhista.

PFL: Partido da Frente Liberal.

PMDB: Partido do Movimento Democrático Brasileiro.

PMN: Partido da Mobilização Nacional.

PGM: Programa Governo nos Municípios.

PPB: Programa Prefeitura nos Bairros.

PPS: Partido Popular Socialista.

PSB: Partido Socialista Brasileiro.

PSDB: Partido Social Democrata Brasileiro.

PSF: Programa de Saúde da Família.

PT: Partido dos Trabalhadores.

PTB: Partido Trabalhista Brasileiro.

PT do B: Partido dos Trabalhadores do Brasil.

SC: Estado de Santa Catarina.

SEBRAE: Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas.

SESI: Serviço Social da Indústria.

TRE: Tribunal Regional Eleitoral.

UNICEF: Fundo das Nações Unidas para a Infância.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 11

PRIMEIRA SEÇÃO

AS SOCIEDADES DE CLASSES E O PODER POLÍTICO 18

Introdução 19

CAPÍTULO I

AS SOCIEDADES DE CLASSES E A REPRODUÇÃO DA VIDA 20

1.1 A produtividade social e as formas de dominação 20

1.1.1 O Estado pré-burguês 21

1.1.2 A sociedade burguesa 26

1.2 As estruturas da sociedade capitalista 28

1.2.1 A estrutura econômica 28

1.2.2 A estrutura ideológica 34

1.2.3 A estrutura política 38

1.2.3.1 As relações sociais de dominação política 38

1.2.3.2 A fragmentação e a organização de classe 40

1.3 O poder político burguês 47

CAPÍTULO II

O CONTEXTO HISTÓRICO DO PODER EM CAMARAGIBE

52

2.1 Os municípios brasileiros 52

2.2 O surgimento de Camaragibe 59

2.3 A ideologia de Carlos Alberto de Menezes 63

2.3.1 O capitalismo e a questão operária 63

2.3.2 A solução meneziana da questão operária 65

2.3.3 A vila da fábrica e seus desdobramentos 73

2.4 Camaragibe torna-se município 77

2.5 O exercício do poder político em Camaragibe 84

2.5.1 As condições locais do poder 84

2.5.2 Os ocupantes do poder executivo 86

2.5.3 O exercício do poder legislativo em Camaragibe 95

SEGUNDA SEÇÃO 98

O ESTADO BURGUÊS E A SUA FORMA DEMOCRÁTICA

Introdução 99

CAPÍTULO III

O ESTADO BURGUÊS

100

3.1 A organização estatal 100

3.2 O Estado burguês e o território 106

3.2.1 A política econômica 106

3.2.2 A definição da política orçamentária 111

3.2.3 A arrecadação e a crise fiscal 113

3.3 O Estado em questão 115

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CAPÍTULO IV

A FORMA DEMOCRATICA DO ESTADO

122

4.1 Os fundamentos liberais da democracia 122

4.1.1 As forças sociais e a democracia 126

4.1.2 O governo representativo 130

4.2 A democracia (não) é o governo do povo 133

TERCEIRA SEÇÃO 138

PARTICIPAÇÃO POPULAR E POLÍTICAS DE ESTADO

Introdução 139

CAPÍTULO V

OS PROPÓSITOS GERAIS DAS POLÍTICAS PARTICIPATIVAS 140

5.1 A participação popular 140

5.1.1 A participação popular e a divisão do trabalho político 141 5.1.2 A participação popular e a utopia de uma sociedade sem classes 144

5.2 As classes populares e suas lutas políticas 148

5.2.1 A participação popular e a (nova) cidadania 151

CAPÍTULO VI

PARTICIPAÇÃO POPULAR E GOVERNOS LOCAIS 155

6.1 As limitações dos governos locais 155

6.2 Os recursos públicos 158

6.2.1 A origem dos recursos 158

6.2.2 Os antagonismos sociais e a gestão pública 159

6.3 A capacidade de arrecadação 161

6.4 A aplicação dos recursos 165

CAPÍTULO VII

PARA UMA TIPOLOGIA DA PARTICIPAÇÃO POPULAR 169

7.1 Participação e poder 169

7.2 A variabilidade da participação popular 170

7.3 A abrangência política e social da participação popular 175

CAPÍTULO VIII

A GESTÃO PARTICIPATIVA DE CAMARAGIBE 180

8.1 Principais modelos de participação popular e gestões estatais 180

8.2 Os conselhos e a (des)ordem social 184

8.3 Os conselhos e a (in)sustentabilidade da produção capitalista 188

8.4 O conselho da cidade de Camaragibe 190

CONCLUSÃO 199

BIBLIOGRAFIA 202

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INTRODUÇÃO

O propósito mais geral deste trabalho é o de estudar o Estado burguês e a participação popular. Especificamente, a participação popular será abordada na implementação de políticas orçamentárias participativas. Em coerência com o caráter popular desta participação, será relevante procurar visualizar os limites e as perspectivas das referidas políticas para o processo de construção do socialismo, ou, em termos mais rigorosos, do comunismo. Serão consideradas em análise, as políticas orçamentárias participativas que acontecem no Brasil a partir de experiências municipais, como a que ocorre no município de Camaragibe, localizado na Região Metropolitana do Recife, em Pernambuco.

Camaragibe comemora sua data cívica em 13 de maio, como desmembramento do município de São Lourenço da Mata ocorrido em 1982, e conta com uma área considerada totalmente urbana que totaliza 55,1 Km2, habitados por 128.702 pessoas, de

acordo com o censo demográfico de 2000. O município foi, na maioria das vezes governado por representantes da burguesia mais tradicional da localidade. A região metropolitana do Recife o abarcou em sua expansão, mas não transformou ainda a mentalidade predominante.

As políticas orçamentárias participativas têm, até o momento, maiores experiências no âmbito municipal. Este é um dos pontos em que esta política vem demonstrando as suas fraquezas e as suas forças no cenário nacional e mundial.

Outros objetivos desta tese são os de: analisar a dinâmica da referida relação entre o Estado e a participação popular; avaliar um tipo de política participativa na definição das políticas orçamentárias implementadas em localidades de diversos matizes ideológicos e políticos; contribuir para compreender a relação entre Estado e sociedade.

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Esta tradição teórica parte de Marx, e continua principalmente em Althusser e Poulantzas e em autores brasileiros como Saes e Almeida. As questões relacionadas com localidades e reprodução da força de trabalho são as que apresentam as melhores contribuições tanto para a crítica quanto para a busca de saídas para as questões em torno do Estado e a participação popular na definição dos rumos condizentes com projetos de superação da ordem social burguesa. São importantes também as contribuições de Bordenave, Demo e Tragtenberg relacionadas à participação popular. Contribuem ainda para a compreensão e crítica do objeto de nosso estudo a teoria do valor e das crises que tem como fundamento O Capital e outras reflexões recentes como as de Bernardo, Rubin e Mandel.

A realização do estudo foi efetuada em três aspectos gerais, que são: 1) Aprimoramento da apropriação do corpo teórico necessário para o desenvolvimento deste trabalho com base em uma bibliografia relacionada ao assunto; 2) Análise de produções significativas do Partido dos Trabalhadores relacionadas com os objetivos buscados por este trabalho. Neste ponto, poderemos avaliar o alcance teórico das propostas partidárias diante dos desafios que a ordem burguesa reserva aos trabalhadores e aos movimentos sociais e, também, as alternativas de superação desta mesma ordem social. É preciso observar a avaliação feita a partir do município enquanto local de implementação de uma política que procura ser alternativa à ordem social em questão, e, apontando os limites, perceber o alcance das saídas que resultam deste contexto; 3) Pesquisa de campo a partir de um roteiro de entrevistas com líderes comunitários e populares participantes de gestões dos conselhos do orçamento participativo da cidade de Camaragibe e de participantes de outros mecanismos formais e/ou informais de participação popular. Entrevistamos também ocupantes do aparelho de Estado em nível municipal, incluindo o poder legislativo local. Procuramos verificar com estas entrevistas as possíveis aproximações e distanciamentos entre o Partido dos Trabalhadores (PT) e a gestão municipal de 1997 – 2004.

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pesquisa busca obter a avaliação feita da conjuntura atual e da relação desta com a ordem social e econômica burguesa e o potencial de superação desta ordem a partir do ponto de vista e proposta de uma nova sociedade. 2) Quanto a quem esteve relacionado com cargos no legislativo municipal, nosso propósito foi o de verificar as possíveis divergências de interesses e conflitos entre os dois poderes e até que ponto estas diferentes posturas revelam projetos políticos diversos (defesa da ordem ou propostas diferentes de superação da mesma) e, especialmente, as posições diante da participação popular nas decisões de governo. 3) Com relação aos participantes de atividades relacionadas diretamente com a política orçamentária participativa tivemos o propósito de observar as modificações de posturas políticas após a participação nestas atividades e a avaliação dos mesmos sobre o processo de participação popular, e o alcance político destas modificações. 4) Procuramos observar se suas práticas sociais e suas posturas políticas estão aquém, se nivelam ou superam as proposições definidas pelo partido político no poder (no caso, o PT), especialmente as relacionadas à transição para o socialismo. Houve quem solicitasse a não revelação do próprio nome como condição para conceder a entrevista, razão pela qual adotamos o procedimento de omitir a identificação de todas as pessoas entrevistadas, mesmo que em certos casos esta identidade esteja mais do que evidente.

As hipóteses a partir das quais nos propomos realizar este estudo são três. A primeira, de caráter geral, sustenta que a implementação de políticas orçamentárias participativas ocorre somente a partir de momentos de crise na condução da dominação burguesa e, quando esta dominação perde legitimidade de governo, faz despontar a oportunidade para que novos atores entrem em cena.

A segunda hipótese é que a superação da lógica continuista da ordem social passa pela constituição dos setores populares (trabalhadores e movimentos populares e eclesiais) como parceiros de ocupantes do executivo (gestores municipais) na definição de políticas de Estado, com vistas à superação de (des)ordem social burguesa.

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área de conflitos de interesses entre frações tradicionais da política pernambucana, que representam a nível local a burguesia que governou o Estado na maior parte do tempo.

Estas hipóteses somente podem ser verificadas considerando uma totalidade em que estão presentes os elementos constitutivos do Estado burguês com a vigência de alguma forma de participação popular. Portanto, o ponto de partida é uma realidade social considerada em seu aspecto histórico e circunscrito a uma localidade que concentra a observação cognoscente. Assim sendo, dois aspectos fundamentais devem ser levados em consideração ao produzir conhecimentos. Um destes aspectos é a historicidade do real, isto é, a sua dinamicidade no tempo e no espaço. O outro aspecto é o caráter provisório do conhecimento sobre o objeto selecionado para ser estudado. Um e outro estão numa relação indissociável na medida em que modificações na natureza do real acarretam necessidades de adequações no conteúdo teórico correlato.

Para observar o real (o concreto) em sua dinâmica espacial e temporal é preciso considerar os elementos que compõem esta totalidade, ou seja, como uma realidade estruturada tanto no nível social quanto no nível político e, ainda no ideológico apresenta as tendências do seu devir. Esta realidade dinâmica é o ponto de partida do conhecimento. Ela é

“uma rica totalidade com múltiplas determinações e relações (...). O concreto é concreto por ser a síntese de múltiplas determinações, portanto, unidade da diversidade. Aparece no pensamento como processo de síntese, como resultado, não como ponto de partida, ainda que seja o verdadeiro ponto de partida, também da observação imediata e da representação. No primeiro passo, a representação plena é volatizada em determinação abstrata; no segundo, as determinações abstratas conduzem à reprodução do concreto pela via do pensamento (...). O método que consiste em elevar-se do abstrato ao concreto é para o pensamento somente a maneira de apropriar-se do concreto, de reproduzi-lo como concreto pensado” (Marx,1986a:21-22).

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práticas sociais conforme as delimitações reservadas à classe social em que se encontram inseridas. Relações sociais são as interações que pólos sociais distintos estabelecem com o objetivo de atingir certos objetivos característicos destas polaridades dentro da sociedade. Cada pólo é composto por uma classe social fundamental da sociedade em consideração (Cf. Bernardo, 1991b:23-32).

O conhecimento de uma realidade parte das suas múltiplas relações e determinações que compõem a formação social brasileira e, também, da particularidade da realidade local que é objeto deste estudo. Trata-se de uma formação social engendrada pela dominância do modo de produção capitalista e do Estado a ele correspondente1. Mas, nada de defender uma correspondência biunívoca entre uma totalidade real com todos os elementos que dela fazem parte e os conceitos teóricos utilizados para a análise em todo o processo. Há elementos que tanto se expressam como o testemunho de um passado, quanto podem ser a expressão de algo que tenta estabelecer-se.

“O dinheiro pode existir e existiu historicamente antes de existir o capital, antes da existência dos bancos e do trabalho assalariado. Deste ponto de vista, podemos dizer que a categoria mais simples pode exprimir relações dominantes de um todo menos desenvolvido ou as relações subordinadas de um todo mais desenvolvido, relações que existiam já historicamente antes que o todo se desenvolvesse no sentido que encontra a sua expressão numa categoria mais concreta. Só então, a evolução do pensamento abstrato, que se eleva do mais simples ao mais complexo, pode corresponder ao processo histórico real. Por outro lado, podemos dizer que há formas de sociedade muito desenvolvidas, mas, historicamente imaturas, e nas quais se encontram as formas mais elevadas da economia, como, por exemplo, a cooperação, uma divisão do trabalho desenvolvida, etc., sem que exista qualquer forma de moeda” (Marx, 1986a:23; Cf. Idem, 1977:231-232).

O conjunto deste trabalho é dividido em três seções. Na primeira, apresentamos a relação entre tipos de Estado e as formações sociais presentes na história da humanidade que têm suas sustentações na separação entre os produtores diretos a os que apropriam dos resultados do trabalho. As relações sociais que decorrem desta separação

1 Por modo de produção entendemos “um todo complexo com dominância, em última instância, do

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e as determinações abstratas e concretas constituem os fundamentos objetivos que estruturam as sociedades em classes que condicionam os comportamentos individuais e coletivos e a constituição do poder político burguês (Cf. Poulantzas, 1977:83-94, seguindo Marx, 1986a:23). Esta seção compreende os dois primeiros capítulos. Na segunda seção abordaremos o Estado e a democracia burguesa que delineiam o exercício do poder na sociedade brasileira e buscamos ressaltar a historicidade deste tipo de domínio político e sua incompatibilidade com as aspirações populares. Estes assuntos estão expostos no terceiro e quarto capítulos. Na terceira seção deste trabalho verificamos algumas exposições teóricas sobre práticas de participação popular na definição de políticas orçamentárias participativas, procurando revelar o conflito de posturas teóricas e políticas sobre a prática participativa. Este conteúdo abarca do quinto ao oitavo capítulos deste trabalho.

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INTRODUÇÃO

O fracionamento da sociedade em classes antagônicas embasou a constituição de um poder político cujo objetivo fundamental sempre foi o de garantir a reprodução da dominação de classe como garantia dos privilégios de uma minoria social sobre a maioria da população. A primeira seção deste trabalho apresenta uma visão deste processo que considera as estruturas sociais e os tipos de Estado que caracterizam as formações sociais no decorrer do processo histórico e que estão relacionados com a (ausência de) participação popular.

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CAPÍTULO I

AS SOCIEDADES DE CLASSES E A REPRODUÇÃO DA VIDA

1.1 – A produtividade social e as formas de dominação

Após fixarem moradia num dado território os seres humanos passam a depender de condições que lhes são fisicamente externas. Os cultivos que efetuam passam a contar com as variações climáticas, com a fertilidade e relevo do solo e a forma específica de constituição do agrupamento humano e das suas relações com outros grupos distintos na produção e na reprodução das condições de existência (Cf. Poulantzas, 1977:154, seguindo Marx, 1981a:66-67). As diversas formas de produção da vida tornam-se o cerne das preocupações materiais e intelectuais. “O que distingue as diferentes épocas econômicas não é o que se faz, mas como, com que meios de trabalho se faz” (Marx, 1968:204. O Capital, liv. I, vol. I, cap. V).

Decorre daí, a possibilidade do surgimento de sociedades compostas por classes sociais distintas. Constituídas as classes, aquela que reúne melhores condições, exerce uma dominação e executa uma forma específica de exploração do trabalho de outra classe da mesma sociedade. Se os trabalhadores diretos detêm a posse e as habilidades técnicas dos meios de produção, somente pode haver extração de trabalho excedente por outra classe com recurso à coerção extra-econômica (Cf.; Marx, 1980e:906. O Capital, liv. III, vol. VI, cap. XLVII; Srour, 1978:449). Instituições são constituídas para realizar as coações ou estarem aptas a realizá-las, sempre que se fizer necessário. O poder político é exercido por meio de uma conjunção de instituições que funcionam como aparelhos de Estado. O Estado é uma instituição que organiza a ação destes aparelhos com a finalidade de garantir a realização dos objetivos da classe dominante numa sociedade específica.

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político. O Estado assume configurações institucionais próprias a cada tipo de dominação de classe e desempenha funções sociais decorrentes destas mesmas configurações. Com isso, o marxismo identifica quatro tipos diferentes de Estado como o escravista, o despótico, o feudal com a transição absolutista, e o capitalista ou burguês (Cf. Saes, 2001:96-97). Apresentaremos uma breve descrição das configurações pré-burguesas de Estado2 para, depois, ver com maior atenção as estruturas que fundamentam a sociedade burguesa.

1.1.1 - O Estado pré-burguês

As três configurações pré-burguesas do Estado correspondem a relações de exploração de classe que necessitam de coerção extra-econômica para realizar os seus objetivos. A relação predominante de exploração econômica caracteriza o tipo de Estado na medida em que ela aponta qual é a classe exploradora e a classe explorada de cada formação social. O tipo escravista de exercício do poder político tem como características a existência de uma classe de senhores de escravos que, sendo proprietária dos meios de produção, tem a posse de pessoas e pode se apropriar de outras, por meios de instrumentos social e politicamente estatuídos. Há, portanto, propriedade de coisas e de pessoas. O predomínio do escravismo exige uma instituição estatal que lhe seja correspondente e que garanta sua reprodução3. Aristóteles justifica a instituição escravocrata fundamentando-a em razões naturais e depois aponta a guerra como uma razão fundamental que faz surgir novos escravos.

Na visão aristotélica existem dois tipos de escravos. O primeiro tipo são aqueles cuja condição social é decorrente da própria natureza. Os escravos são pessoas que estão na condição de terem que executar tarefas sob as ordens inquestionáveis de um senhor. “Sua condição apenas permite uma virtude proporcional à dependência, visto que, dedicado às artes mecânicas, ele não possui senão uma servidão limitada”. O esforço teórico de Aristóteles em fundamentar a escravidão como decorrente da natureza constitutiva de determinadas individualidades é inconsistente em suas próprias

2 Para uma exposição mais aprofundada do tema é recomendável consultar autores como: Marx, 1981a;

Godelier, 1974; Saes, 1987; Idem, 1999; Pinsky, 1982; Srour, 1978; e Poulantzas, 1977.

3 Engels observou que a escravidão acompanha todas as formações sociais antagônicas observadas na

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palavras. Ele mesmo aponta que a dependência pessoal é decorrente da condição de exercer atividades mecânicas. Por isso, não é a natureza, mas sim, o exercício de um tipo de atividade é o que condiciona um ser à dependência de outro. Ele mesmo ressalta a divisão social do trabalho entre os que se dedicam às atividades manuais e aqueles empenhados em atividades intelectuais, e ainda reconhece que o exercício de atividades manuais não decorre da natureza, pois, “o escravo vive em comum com o seu dono; o artesão vive mais independente e afastado (...). A natureza fez o escravo; ela não fez nem o sapateiro, nem outro artesão qualquer”. Assim sendo, a condição de escravo não é decorrente da natureza, mas o resultado de uma condição social que segrega, restringe opções e submete uma parcela das pessoas ao exercício de atividades produtivas cujos resultados não são revertidos em benefício de quem produz (Aristóteles, 1966:31. A Política, liv. I, cap. IV, §15).

Mesmo fundamentando a divisão social do trabalho e de classes como condição natural dos seres, Aristóteles reconhece as delimitações tênues da própria argumentação. “A ciência do senhor consiste no uso que ele faz de seus escravos; ele é amo, não tanto por possuir escravos, porém por que deles se utiliza. Esta ciência do senhor nada tem, aliás, de muito grande ou de muito alto; ela se reduz a saber ordenar aquilo que o escravo deve saber executar. Igualmente todos os que podem furtar-se a ela deixam as suas preocupações a um criado, e entregam-se à política ou à filosofia” (Aristóteles, 1966:19. A Política, liv. I, cap. II, § 23). A distinção absoluta entre o senhor e o escravo e entre quem governa e quem é governado somente tem como seus suportes a reprodução da sociedade dividida em classes.

O segundo tipo de escravidão é aquele de que fazem parte os que se tornaram escravos em razão de derrotas bélicas ou por dívidas. “Existem homens que são escravos em qualquer parte, e, outros não são escravos em parte alguma” (Aristóteles, 1966:18. A Política, liv. I, cap. II, § 19). As guerras fazem com que os vencedores subordinem uns povos a outros e os condicionem ao exercício de trabalho compulsório.

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destinou parte deles a mandar e parte a obedecer” (Aristóteles, 1966:30. A Política, liv. I, cap. IV, § 10).

Ao construir a própria argumentação, mais uma vez, Aristóteles demonstra sua localização social e histórica enquanto membro de uma sociedade escravista, quando justifica a dominação de classe e não aponta elemento de possível mudança social. Ele permanece fiel à sua fundamentação epistemológica naturalista e sustenta que autoridade e obediência são coisas tanto necessárias quanto úteis. Mas, necessidade e utilidade são atributos sociais historicamente desenvolvidos (Cf. Aristóteles, 1966:15. A Política, liv. I, cap. II, § 8). E, falar em autoridade é definir quem (não) pode exercer o poder em determinada sociedade. Participa do poder os que desfrutam da condição de cidadão, e estes são os homens livres. “Cidadão é o que possui participação legal na autoridade deliberativa e na autoridade judiciária” (Aristóteles, 1966:77. A Política, liv. III, cap. I, § 8). Assim, nem todos os homens são cidadãos, mas esta é uma condição reservada aos que podem aspirar para si mesmo o exercício de função decisória num aparelho de Estado. Para o pensamento aristotélico, há quem não pode ser considerado cidadão, mesmo que estas pessoas com suas atividades sejam necessárias à vida na polis. A condição de cidadania está contraposta a uma outra que é a condição de escravidão. Do mesmo modo que um aparato militar pode se utilizado para escravizar mais pessoas empreendendo guerras sob as decisões de um Estado, as forças militares coesas garantem a manutenção de pessoas escravas nos limites de um território.

E estas forças militares constituem um dos principais fatores que revelam a contradição básica da fundamentação naturalista do pensamento de Aristóteles, uma vez que ele próprio aponta que os grandes proprietários são os que podem criar cavalos e com isto, constituir uma infantaria pesada. Outro fator determinante é a grande propriedade rural como principal fonte de meios de vida. O senhor proprietário de terras é também o que ocupa os postos da alta hierarquia do aparato militar que garante a permanência da escravidão (Cf. Aristóteles, 1966:227. A política, liv. VII, cap. III, § 3).

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conjunto de aldeias. Nelas não há, formalmente, propriedade individual, mas estatal. “A propriedade aparece como cessão da unidade global ao indivíduo, através da mediação exercida pela comunidade particular. O déspota surge como o pai das numerosas comunidades menores, realizando a unidade comum de todas elas. Conclui-se que o produto excedente pertencia à unidade suprema. O despotismo oriental aparentemente leva a uma ausência legal de propriedade” (Marx, 1981a:67 e 78).

Há, nestas sociedades, uma forma dual de propriedade que se expressa pela propriedade estatal e pela propriedade privada, sendo que a primeira caracteriza um pressuposto necessário da segunda. A propriedade privada é uma concessão do poder estatal como direito de ocupação produtiva do solo. Condições produtivas individualmente inacessíveis somam-se aos fatores determinantes de um Estado proprietário composto por sacerdotes e funcionários (militares) que detém a propriedade da terra e que proporciona gastos com irrigação - o que incrementa a produtividade do solo sobre o que se realiza uma extorquia de valores excedentes. Enquanto pertencentes à comunidade as pessoas são livres, portanto, não se encontram nas mesmas condições das que estão submetidas ao escravismo. Na formação social em que predomina a produção asiática há o despotismo de uma comunidade superior com sua chefia suprema que exerce o domínio sobre as outras comunidades dispersas por um território (Cf. Marx, 1980a:588-9. O capital, liv. I, vol. II, cap. XI).

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de propriedade surge simultânea e fatalmente como relação direta de dominação e servidão, aparecendo o produtor imediato como servo. Essa dependência pode reduzir-se, indo da servidão com corvéia para a mera obrigação de pagar um tributo” (Marx 1980c:906. O Capital, liv. III, vol. VI, cap. XLVII).

Neste tipo de Estado o exercício do poder tem as limitações legitimadoras da lei divina e dos privilégios dos Estados que compõe a formação social medieval fragmentada em células produtivas e domínios territoriais com titulares hierarquizados e sobrepostos uns aos outros. O discurso ideológico deste Estado busca seus fundamentos numa vontade pretensamente supra-humana, ou seja, divina. O Estado feudal é concebido como “manifestação da ordenação cósmica–divina” (Poulantzas, 1977:158).

As contradições da formação social feudal proporcionaram o surgimento das condições para o surgimento de uma nova formação social. Poulantzas delimita o exercício absolutista do poder como próprio de um Estado de transição do feudalismo para o capitalismo (Cf. Poulantzas, 1977:153 e 156). Num tempo em que ainda não apresentava uma dominância plena do modo de produção capitalista havia uma convivência conflituosa entre procedimentos feudais e os procedimentos submetidos ao capital. Trata-se, portanto, de um Estado favorável à burguesia nascente4 no seu confronto com a aristocracia dominante. É um processo em que muitas pessoas conseguem se livrar da condição servil e se estabelecer nos aglomerados urbanos presenciando a competição entre a cobrança de impostos por parte do Estado e a arrecadação tributária própria do senhorio. O artesão e o negociante são figuras destacadas neste processo. Quando o primeiro passa a submeter uma quantidade de força de trabalho assalariada da qual extrai mais-valia, ele torna-se capitalista. O negociante que, por sua vez, cria uma manufatura segue o mesmo procedimento e assume comportamentos capitalistas. O modo burguês de ser estava comprimido no interior de uma formação social que não lhe correspondia5. As novas condições determinantes da produção e reprodução da vida social estavam em desajustes com a garantia de privilégios aristocráticos (Cf. Soboul, 1973:11-15).

4 “L´Etat absolutiste (...est) un instrument de la bourgeoise naissante contre l´aristocratie” (Anderson,

1978:19).

5 “La structure sociale, aristocratique et hierarchisée, maintenait chez les sujets un complexe d´infériorité

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Neste período inicial para o capitalismo a burguesia apresentava profunda necessidade da intervenção permanente do Estado para garantir as condições inerentes à produção de mercadorias. Era necessário quebrar as resistências ao trabalho continuado para atender a produção e também garantir uma superpopulação relativa para obter uma oferta de força de trabalho ao nível das exigências da procura sem pressão para elevar o salário e assim manter um nível de extração da mais-valia. A coação própria das relações econômicas capitalistas ainda não conseguia sobreviver sem ser coadjuvada pela violência direta ainda que cada vez mais esporádica. É o que caracteriza a acumulação primitiva (Cf. Marx 1980a: 854-855, O Capital, liv. I, Vol. II, cap. XXIV).

O período do poderio absolutista caracteriza-se pelo estabelecimento das condições do modo de produção capitalista que ainda não podia sustentar-se por suas próprias forças. Esta produção surge como uma maneira de produzir dentre outras. O discurso da livre iniciativa ganha expressões cada vez mais amplas. “O capitalismo exigia a liberdade porque necessitava dela para assegurar o seu impulso, a liberdade sob todas as suas formas: liberdade da pessoa, condição do assalariado – liberdade dos bens, condição de sua modalidade – liberdade do espírito, condição da pesquisa e das descobertas científicas e técnicas” (Soboul, 1989:11). O poder político nestas condições é de caráter centralizador, absoluto e aglutinador de um conjunto nacional abrangendo um território determinado. O tipo absolutista de Estado mantém um exército a serviço do poder central composto por mercenários que não mais se identificam e nem se submetem por laços feudais. Este Estado constitui-se como sendo o prenúncio do Estado burguês cada vez mais próximo. “O Estado absolutista apresenta, assim, uma autonomia em relação à instância econômica” (Poulantzas, 1977:159).

1.1.2 -A sociedade burguesa

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trabalho, por outro o tempo de circulação” (Marx, 1986b:130). Os movimentos que ocorrem no interior de uma dada sociedade precisam estar dentro de certos limites para realizar os objetivos que deles são esperados. As práticas ocorrem dentro de limites que funcionam como suportes e garantem a articulação social das ações efetivadas na sociedade em níveis específicos da formação. Estes limites são fornecidos por estruturas sociais.

Uma estrutura social define limites de variabilidades nas relações que são levadas a termo no interior de uma sociedade. A estrutura funciona como determinante da vida individual e coletiva, fazendo com que diferentes modos de vida sejam efetivados, sejam louvados e cultivados. A estrutura social é uma determinante geral da vida numa coletividade. Uma estrutura delimita e articula as práticas sociais e os pensamentos correlatos a estas mesmas práticas, condicionando as expectativas pessoais e grupais e, ainda, possibilita reproduzir o que pode resultar dos relacionamentos sociais e produtivos num determinado espaço e tempo (Cf. Althusser & Balibar, 1974:222 e 288, Wright, 1981:16-28).

Marx destaca três estruturas que devem ser levadas em consideração nas análises de situações concretas que são compostas pelas instâncias econômica, ideológico-jurídica e política. Elas são integrantes das realidades sociais. “O econômico, o político e o ideológico não constituem essências prévias que entrem em seguida em relações externas (...). A articulação, própria à estrutura do todo de um modo de produção, comanda a articulação das instâncias regionais” (Poulantzas: 1977:16).

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estrutura econômica é um elemento muito importante da análise que desenvolvemos neste trabalho.

Mas, a produção não acontece no vazio, como se os instrumentos de produção estivessem à disposição para se interligarem com a força de trabalho necessária ao seu emprego eficiente, por meio de uma cooperação humana adequada ao nível tecnológico destes instrumentos e com objetivos naturalmente existentes. “Na produção social da sua existência, os homens estabelecem relações determinadas necessárias, independentes da sua vontade, relações de produção que correspondem a um determinado grau de desenvolvimento das forças produtivas materiais. O conjunto destas relações de produção constitui a estrutura econômica da sociedade, a base concreta sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política” (Marx, 1977:28). Enfrentando desafios e formulando soluções, os seres humanos desenvolvem fórmulas que se estabelecem e passam a determinar as ações individuais e coletivas. A formação social, em particular a que se trata neste trabalho, que é a capitalista, precisa ser analisada considerando três estruturas inter-relacionadas de um modo que caracteriza a sociedade burguesa. “Nenhuma produção é possível sem um instrumento de produção, ainda que esse instrumento seja somente a mão. Nenhuma é possível sem o trabalho passado acumulado, ainda que este trabalho seja somente a destreza que o exercício repetitivo desenvolveu e concentrou na mão do selvagem. O capital, entre outras coisas, é também um instrumento de produção; é também trabalho passado objetivado” (Marx, 1986a:5). Além da estrutura econômica ou produtiva, há de se considerar ainda a estrutura jurídica e a estrutura política.

1.2 - As estruturas da sociedade capitalista

1.2.1 - A estrutura econômica

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propriedade dos meios pelos quais realizam o trabalho (...). Converte em assalariados os produtores diretos. A chamada acumulação primitiva é apenas o processo histórico que dissocia o trabalhador dos meios de produção. É considerada primitiva porque constitui a pré-história do capital e do modo de produção capitalista”. (Cf. Marx, 1980a:830. O Capital, liv. I, vol. II, cap. XXIV).

As dispersões que caracterizam o espaço rural e as atividades produtivas neles realizadas precisam sofrer modificações para estar em consonância com a sociedade. As bases que sustentam um modo de vida ligado à terra com a conseqüente obtenção dos meios de subsistência a partir da utilização dos próprios instrumentos de trabalho pelos trabalhadores diretos precisam ser desfeitas. Os grandes meios de produção necessitam encontrar disponível uma considerável quantidade de força de trabalho que se submeta a acatar as novas condições de trabalho. Liberada das condições que a fixavam à terra, esta força de trabalho agora se encontra “livre” para ser empregada em uma indústria em troca de salário, independente do lugar em que esteja instalada. É agora uma força de trabalho assalariada. A desapropriação dos trabalhadores diretos dos próprios meios de produção é uma das condições para que haja a concentração destes meios de produção sob a propriedade de uma minoria social, isto é, de uma classe de privilegiados proprietários. Estes proprietários de meios de produção se distanciam consideravelmente dos produtores diretos quanto às condições díspares de vida. “A única propriedade significativa, do ponto de vista da estrutura do processo de produção é a dos meios de produção” (Althusser & Balibar, 1974:253).

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escravo é outro elemento ressaltado por Marx na constituição da acumulação primitiva de capital. A volumosa soma de riqueza social acaba por se tornar um fundo de valores à disposição dos capitalistas em razão das condições estruturais que lhes garantem este privilégio. O processo possibilitou uma acumulação de riqueza sem precedente na Europa. Mas essa reformulação social não foi pacífica. Medidas como a coerção ativamente implementada e a manipulação dos mecanismos econômicos e sociais sempre estiveram na ordem do dia, na medida em que eram necessários para atingir os objetivos burgueses (Cf. Bernardo, 1991a:102; Marx, 1980a:868. O Capital, livro I, vol. II, cap. XXIV).

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valores no sistema de crédito. O ciclo destes recursos se completa no momento em que o próprio Estado que os torna disponíveis passa a tomar (parte de) estes mesmos recursos para garantir seu próprio funcionamento. “Mas além disso, a dívida pública fez prosperar as sociedades anônimas, o comércio com os títulos negociáveis de toda a espécie, a agiotagem, em suma, o jogo da bolsa e a bancocracia moderna. O banco da Inglaterra começou emprestando seu dinheiro ao governo a juros de 8%; e, ao mesmo tempo, foi autorizado pelo Parlamento a cunhar moedas utilizando o capital emprestado ao governo”. Com isto, de credor e estimulador do processo de produção capitalista, o Estado torna-se um devedor e prisioneiro (de uma fração) dos capitalistas. “Passou então a emprestar o mesmo capital ao público sob a forma de bilhetes para descontar letras, emprestar com garantia de mercadorias e comprar metais preciosos. Não passou muito tempo para o banco fazer empréstimos ao Estado nessa moeda fiduciária e para pagar com ela, por conta do Estado, os juros da dívida pública”. Deste modo, ficou estabelecida a sustentação do capital financeiro, cuja dinâmica procura arrastar o processo produtivo de onde obtém os valores excedentes como finaliza Marx. “Não bastava que o banco recebesse muito mais do que dava; ainda recebendo, continuava credor eterno da nação até o último centavo adiantado. Progressivamente tornou-se o guardião inevitável dos tesouros metálicos do país e o centro de gravitação de todo o crédito comercial” (Marx, 1980a:872-873. O Capital, liv. I, vol. II, cap. XXIV).

O processo de acumulação primitiva permite constituir os elementos determinantes do capital com os seus objetivos definidos e colocá-los em vias de realização. Deste modo, este processo proporciona a formação de um aglomerado de força de trabalho livre, a concentração e apropriação privada dos meios de produção e a garantia de recursos necessários ao crédito (Ver capítulo III).

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antagônicos em virtude dos interesses inconciliáveis de cada um diante do outro. Destituídas dos meios de sobrevivência, as pessoas do segundo grupo encontram como forma de obter os víveres de que necessitam, a submissão aos ditames do grupo, que agora é composto pelos proprietários dos instrumentos de trabalho, e têm acesso assegurado aos recursos financeiros imprescindíveis à obtenção de matérias primas. Este segundo grupo tem como objetivo imediato garantir a própria sobrevivência e, neste ponto, coincide com o propósito do primeiro grupo de pessoas. “Se a direção capitalista é dúplice em seu conteúdo, em virtude da dupla natureza do processo de produção a dirigir que, ao mesmo tempo, é processo de trabalho social para produzir um produto e processo de produzir mais-valia, ela é, quanto à forma, despótica” (Marx, 1968:380-381. O Capital. liv. I. vol. I. cap. X). Para constituir uma sociedade enquanto capitalista, os agentes sociais deste projeto necessitaram realizar um esforço que, por meio do absolutismo articulou aspectos do feudalismo com o capitalismo nascente (Cf. Bernardo, 1977a:320-327). Aqui está um dos elementos pelos quais são estabelecidas relações produtivas entre os dois grupos humanos. Elas acontecem sob as determinações sociais e historicamente constituídas da propriedade privada dos meios de produção e do trabalho assalariado (Cf. Borges Neto, 2002:106).

Se, à primeira vista, estas relações parecem harmoniosas, elas comportam, na verdade, objetivos antagônicos. Os proprietários dos meios de produção possuem um objetivo estruturalmente estabelecido que é inerente à lógica primordial da produção capitalista, que é o de obter riqueza privadamente acumulada. “O processo de trabalho converte-se no instrumento de valorização, do processo de autovalorização do capital, a criação de mais-valia. O processo de trabalho subsume-se no capital (é o processo do próprio capital), e o capitalista entra nele como dirigente, guia; para este é ao mesmo tempo, de maneira direta, um processo de exploração do trabalho alheio. É isto o que denomino subsunção formal do trabalho ao capital” (Marx, 1975:73).

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fundamentais neste processo. Após estabelecer as condições sociais da produção os capitalistas precisam empregar produtivamente a seu modo, a força de trabalho da qual precisa. “Trabalho produtivo é o que – no sistema de produção capitalista – produz mais-valia para o empregador ou que transforma as condições materiais de trabalho em capital e o dono delas em capitalista e, por conseguinte, o trabalho que produz o próprio produto como capital. Assim, ao falar de trabalho produtivo, falamos de trabalho socialmente definido, trabalho que envolve rotação determinada entre o comprador e o vendedor do trabalho” (Marx, 1980f:391. O Capital. Teorias da mais-valia. liv. IV, vol. I, cap. VII).

Para realizar a acumulação o capitalista precisa obter como seu este valor resultante do trabalho coletivo. Então, ele se apropria do valor excedente gerado pelo emprego da força de trabalho alheia. Enquanto trabalhador assalariado, o proletário obtém um salário fixo por um contrato em razão do emprego da força de trabalho durante um período determinado. É o estágio do desenvolvimento das forças produtivas que torna possível esta forma de exploração do trabalho que possibilita a extração de mais-valia. Embora o que de fato interessa ao capitalista é o valor absoluto obtido como excedente do trabalho, Marx identifica duas maneiras de obtê-la. Uma destas maneiras é a denominada de mais-valia absoluta e a outra é a mais-valia relativa. A primeira é aquela mais-valia obtida por meio da ampliação da jornada de trabalho. A segunda é a mais-valia obtida com a intensificação do processo produtivo, isto é, com a aplicação de tecnologias mais avançadas (Cf. Marx, 1968:363. O Capital, liv. 1, vol. I, cap. VI e X).

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de lucro obtido pelo capital da sociedade (...). Quando o capitalista mais forte quer expandir-se no mercado, suplanta os menores, como nos tempos de crise emprega esta prática: reduz a propósito a taxa de lucro a fim de eliminar os mais débeis” (Marx, 1980c:250 e 257. O Capital, liv. III, vol. IV, cap. XIII).

Fundamentalmente, a estrutura econômica é um dos suportes das atividades produtivas em que sujeitos antagônicos entram em relações com objetivos definidos e regulamentados. Ela é um sustentáculo dos parâmetros das ações dos sujeitos dentro do modo capitalista de produção. Esta estrutura, por sua vez, necessita de normas que estabelecem os limites das ações individuais e coletivas. É necessário prevenir e/ou solucionar os conflitos e enfrentar os momentos de crise que possam ocorrer no processo produtivo. A estrutura econômica tem necessidade de uma estrutura jurídica. “Toda a forma de produção engendra suas próprias instituições jurídicas, sua própria forma de governo” (Marx, 1986a:8).

1.2.2 - A estrutura ideológica

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prática, a expressão não somente de processos psicológicos, mas, também e especialmente, de relações sociais estabelecidas.

A teoria e prática do direito revelam a falsa neutralidade da qual a jurisprudência é constituída. “O objetivo prático da mediação jurídica é dar garantia às marchas mais ou menos livres da produção e da reprodução social que, na sociedade de produção mercantil se operam formalmente através de uma série de contratos jurídicos privados” (Pachukanis, 1988:13). O que está sendo regulamentado é o conjunto de relações sociais que dois sujeitos realizam, em especial, antagônicos por constituição. As normas jurídicas representam uma garantia das ações que procuram perpetuar as relações sociais burguesas, pois, o termo médio entre dois agentes em contenda, sendo um deles privilegiadamente constituído, e o outro, alguém que se encontra numa desvantagem estrutural que não está em questão, representa, a priori, em seu conteúdo, o reforço da vantagem de quem desfruta de privilégios. Por meio destas normas estabelecidas, os proletários somente podem lutar para garantir a condição de seres explorados. Este é o resultado final deste processo. É a confirmação da desigualdade como sendo o que é justo dentro de um novo paraíso social em que os oprimidos padecem mais uma vez, que é a esfera da circulação ou da troca de mercadorias. É a procura por perenizar o que é fugaz e transitório (Cf. Bernardo, 1991b:38).

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contrafeito, como alguém que vendeu sua própria pele e apenas espera ser esfolado” (Marx, 1968:197. O Capital, liv. I, vol. I, cap. IV).

Esta avidez por realizar negócios que marca o comportamento do capitalista revela um conteúdo proporcionado pela estrutura econômica determinante da sociedade burguesa, que lhe é extremamente favorável, em contraposição aos trabalhadores. Considerando as condições de classes distintas “dissipa-se a ilusão de que o pagamento da força de trabalho é parte do produto gerado no mesmo ciclo” possibilitando a cada uma das classes ganhos diferenciados a partir de uma produção coletiva (Almeida, 1995a:29).

Pelo contrato previamente firmado, os trabalhadores empregam a sua própria força de trabalho por um salário a que passam a ter direito após cumprir uma jornada mensal produtiva definida. Nesta lógica processual, os trabalhadores “recebem sob a forma de meios de pagamento, uma fração importante do seu próprio produto excedente que se expande e se transforma em quantidade cada vez maior de capital adicional” (Marx, 1980a:717; O Capital, liv. I, vol. II, cap. XXIII). A condição de força de trabalho livre que resulta da estrutura econômica para o trabalhador apresenta-lhe como vantagem histórica diante da condição vivida pelos antigos escravos.

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manter a coerência interna quanto aos fundamentos de sua argumentação, justifica uma situação econômica e política sob uma formulação normativa adequada à disparidade real. Marx ressalta a distinção entre as duas formas de aplicação da força de trabalho quando lembra que “o escravo romano era preso por grilhões; o trabalhador assalariado está preso ao seu proprietário por fios invisíveis. A ilusão de sua independência se mantém pela mudança contínua dos seus patrões e com a ficção jurídica do contrato” (Marx, 1980a:667. O Capital, liv. I, vol. II, cap. XXI).

O direito burguês exerce a função de ser uma cortina de fumaça que obnubila o desenrolar das relações sociais que o fez surgir, além de ser o fundamento de sua reprodução. Há uma forma de produzir que está sendo regulamentada por formulações jurídicas que lhe correspondem. “O capital são os produtos gerados pelos trabalhadores e convertidos em potências autônomas dominando e comprando os produtores, e mais ainda são forças sociais e a forma do trabalho com elas conexa, as quais fazem frente aos trabalhadores como se fossem propriedades do produto deles. Temos aí, portanto determinada formação social envolvida numa névoa mística e de um dos fatores de um processo social de produção e fabricado pela história” (Marx, 1980e:936. O Capital, liv. III, vol. VI, cap. XLVIII). O direito burguês propõe-se a tratar de maneira igual os que são socialmente desiguais. A igualdade perante a lei deixa intacto o antagonismo social característicos dos conflitos da sociedade e que este direito se apresenta como uma instância de solução.

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sociedade por meio de diversos instrumentos utilizados para reproduzirem esta ilusão. Mas, enquanto instância de expressão de contendas e de elaboração de decisões, a estrutura jurídica abre a possibilidade do desvendamento de seus fundamentos pelos seus próprios argumentos que partem de contratos cujas personalidades são tidas como fora de questão. A busca da não-contradição terminológica e estilística esconde o antagonismo real (Cf. Bernardo, 1977b:11). Há uma polaridade inconciliável entre duas posições estruturais. Este é o momento em que a justiça revela que além de decidir pela força do direito que prevalece, ela expressa muito mais o direito de uma força social com a qual se acha comprometida, que é a força da classe dominante.

As normas legais precisam, antes de tudo, serem elaboradas e consolidadas por instituições com certa legitimidade social para estarem à disposição do judiciário. Como as normas trazem em si mesmas os objetivos a serem atingidos e sobre os quais não há consenso prévio elas surgem das lutas travadas na sociedade com vistas ao poder de decisão. Assim, a estrutura jurídico-ideológica desponta de uma estrutura econômica e política (Cf. Poulantzas, 1977:48 e Althusser & Balibar, 1974:222, seguindo Marx, 1985b:17).

1.2.3 - A estrutura política

1.2.3.1 - As relações sociais de dominação política

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Entretanto, as relações sociais que são efetivadas para produzir o produto acumulável somente acontecem com o encontro de duas classes sociais. Elas se constituem como classes antagônicas no capitalismo em razão do caráter inconciliável de interesses e de objetivos que possuem na sociedade. Os proprietários dos meios de produção e os proprietários de força de trabalho, quando separados entre si e se reproduzem sob o disfarce da igualdade enquanto cidadãos e se diferenciam profundamente quando se trata da apropriação do resultado da atividade produtiva. E neste processo, despontam os conflitos entre estas duas classes sociais. Estas classes se constituem estruturalmente diferenciadas quanto às condições de reproduções e às tentativas de conservar estas condições da parte dos capitalistas, e às tentativas de revolucionar esta sociedade rumo à construção de outra sociedade sob novas determinantes e com novas relações sociais. Deste modo estas classes sociais entram em confronto em torno da partilha do resultado do trabalho. É pelo fato de terem que cooperar numa mesma estrutura produtiva com objetivos antagônicos que capitalistas e trabalhadores se constituem uns frente aos outros enquanto classes sociais em luta.

A lógica da produção capitalista opera com o objetivo principal de realizar a mais-valia por meio do comércio de mercadorias cuja obtenção passa por valores que resultam da produção que pode ser tanto material quanto imaterial. Em resumo, o objetivo dos capitalistas é obter mais capital através do movimento do volume de capital que já acumularam. Neste processo concorrem os meios de produção e a força de trabalho cujos proprietários relacionam-se como classes sociais antagônicas. Os proprietários da força de trabalho estão submetidos aos capitalistas devido às determinações da formação social e das relações produtivas do capital, e, nestas condições, movimentam os meios de produção resultando em produtos que lhes são alheios, embora portem os valores que eles fizeram surgir. Aos operários cabem remunerações em forma de salário enquanto aos capitalistas a apropriação da mais-valia. Classes sociais distintas participam diferencialmente do usufruto da produção social.

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fragmentado. Outro elemento é o caráter de organização em torno dos interesses comuns e elaboração de estratégias e táticas coletivas. A solidariedade de classe pode ser revelada através da coesão organizativa. A classe consolida a sua organização com o exercício do poder de garantir as condições de realização, com a submissão dos outros aos objetivos que ela procura alcançar. A classe dominante reúne suas forças e institucionaliza formas de ação que lhe favorece e tudo faz para fragmentar quem lhe faz oposição.

1.2.3.2 - A fragmentação e a organização de classe

Da parte dos capitalistas, os dois primeiros elementos revelam-se nas práticas concretizadas na busca de efetivação de seu principal objetivo que é a realização da mais-valia por meio da venda de mercadorias. A solidariedade geral de classe e o interesse econômico direto dos capitalistas revelam-se quando os que pertencem a um mesmo ramo de produção participam “da exploração da totalidade da classe trabalhadora pela totalidade do capital” (Marx, 1980c:222. O Capital, liv. III, vol. IV, cap. X).

Como a mais-valia somente se efetiva com a venda do produto, capitalistas competem entre si no mercado para realizar a mais-valia que resultou das atividades de apropriação de valores, ou seja, uma quantidade de trabalho não pago (Marx, 1980c:280. O Capital, liv. III, vol. IV, cap. XV). Esta postura que pode ser tomada por capitalista refere–se a uma estratégia para eliminar concorrentes no mesmo espaço de mercado através da prática de preços menores do que os usualmente praticados. Esta prática depende da capacidade de sustentar os preços reduzidos até obter o objetivo almejado. Outra medida causadora de conflitos entre capitalistas é a de implantar tecnologia mais avançada o que permite obter um ganho de oportunidade diante da prática do mesmo preço dos concorrentes ou reduzir o preço e obter a mesma mais-valia que outros capitalistas. Neste termo, o capitalista obtém este objetivo com o uso de uma tecnologia mais avançada do que os seus concorrentes no mesmo mercado.

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preço de mercado. Em outros termos, o custo de produção (e de comercialização) é determinante do preço de uma mercadoria. “Um capital que rota mais lentamente por a mercadoria permanecer mais tempo no processo de produção ou por ter de vender-se em mercados distantes, perde por isso lucro que, entretanto lhe cabe em virtude de compensação decorrente de acréscimo ao preço; ou ainda investimentos expostos a maiores riscos” (Marx, 1980c:236. O Capital, liv. III, vol. IV, cap. XII).

Para obter melhor posição no mercado, o capitalista busca produzir mercadoria com custos cada vez mais baixos. Este intento é realizado pela elevação do grau de extração de trabalho excedente, que, fundamentalmente, advém do prolongamento da jornada de trabalho e da intensificação do (exercício do) trabalho, ou seja, da mais-valia absoluta e da mais-valia relativa, respectivamente (Cf. Santos, 1987:113 e 133). Enquanto a primeira está totalmente determinada pelos limites físicos dos trabalhadores, a segunda depende também da adição de meios de produção em relação à mesma quantidade de força de trabalho. Assim, há uma ampliação da composição orgânica do capital que se caracteriza pela maior parcela de capital constante em relação ao capital variável, o que resulta em vantagem comparativa para um capitalista diante de outros. “O capitalista que emprega métodos melhores de produção, mas ainda não generalizados, vende abaixo do preço de mercado, mas acima do preço individual de produção; assim, eleva-se para ele a taxa de lucro, até que a concorrência desfaz essa vantagem” (Marx, 1980c:265. O Capital, liv. III, vol. IV, cap. XIII).

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empregado decresce sempre em relação à massa de trabalho materializado que põe em movimento, à massa de meios de produção produtivamente consumidos, inferindo-se daí que a parte não-paga do trabalho vivo, a qual se caracteriza em mais-valia deve continuamente decrescer em relação ao montante de valor do capital globalmente aplicado” (Marx, 1980c:243-244. O Capital, liv. III, vol. IV, cap. XIII).

Decorre deste processo, a concentração crescente de capital, na medida em que a disputa pelos mercados leva parte dos capitalistas a perderem posições ou a desaparecerem. São os momentos de crise. “Nessa luta, as perdas se distribuem de maneira bem desigual e de forma bem diversa segundo as vantagens particulares de cada um ou as posições já conquistadas, e desse modo, um capital é posto em ociosidade, outro é destruído, um terceiro tem somente perdas relativas ou experimenta apenas depreciação passageira, etc.” (Marx, 1980c:291. O Capital, liv. III, vol. IV, cap. XIV).

As crises decorrem da necessidade intrínseca da produção capitalista que, ao fazer cooperar forças sociais antagônicas no mesmo processo e intensificando as condições de sua reprodução concentradora de valor extorquido acaba por aprofundar as contradições inerentes a este modo de produzir mercadorias. Esta mobilização de forças sociais para atender ao capital confronta em escala ascendente os agentes nas relações de produção e nas relações sociais (Cf. Marramao, 1990:109).

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imanentes, mas ultrapassa-os apenas com meios que de novo lhe opõem esses mesmos limites, em escala mais potentes” (Marx, 1980c:287, O Capital, liv. III, vol. IV, cap. XV).

Nas tentativas de superar seus limites internos o capitalismo provoca uma crise que leva a um novo patamar de relações entre as forças inerentes ao processo produtivo, mas, por não eliminar os elementos antagônicos, uma nova crise desponta no percurso deste processo. “As crises não são mais do que soluções momentâneas e violentas das contradições existentes, erupções bruscas que restauram transitoriamente o equilíbrio desfeito” (Marx, 1980c:286, O Capital, liv. III, vol. IV, cap. XV).

Outra conseqüência é a que incide sobre a população concentrada nos espaços urbanos pelo próprio processo de produção capitalista concentrou nos espaços urbanos. Ao produzir maior volume de mercadorias com a ampliação do capital constante, o capitalismo faz surgir uma superpopulação relativa de trabalhadores (Cf. Marx, 1980c:249, O Capital, liv. III, vol. IV, cap. XIII). Ao diminuir o poder de compra da população concentrada e ao mesmo tempo procurar realizar a mais-valia no mercado, o capitalismo fica dispondo de um volume de produtos também excessivo para a capacidade de compra desta população dentro dos limites e objetivos do capital. A mais-valia extorquida encontra dificuldades para realizar-se. Este é, finalmente, o elemento que caracteriza a crise da produção capitalista. Ela é, portanto, uma crise de realização da mais-valia.

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