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O ESTADO BURGUÊS 3.1 – A organização estatal

SEGUNDA SEÇÃO O ESTADO BURGUÊS E A SUA FORMA DEMOCRÁTICA

O ESTADO BURGUÊS 3.1 – A organização estatal

O Estado desempenha a função de organizar a dominação de uma classe social sobre outras em conformidade com a maneira pela qual a classe dominante realiza a apropriação do excedente em determinada abrangência territorial. Mas, esta organização é um produto social e histórico. Ela não existiu sempre. Ela surge da necessidade do exercício de um domínio de uma parte da sociedade sobre outra na implementação de atividades fundamentais para sustentar um determinado modo de vida individual e coletivo. Aqui, desponta uma preocupação com o que se denomina nível econômico.

Em qualquer sociedade, as pessoas exercem atividades imprescindíveis para obter tudo o que necessitam para continuar vivendo. A forma como estas atividades se organizam coletivamente caracterizam as sociedades de diversos modos. Estas atividades resultam em produtos que podem ser consumidos pelos próprios produtores ou trocados com outras pessoas por produtos diferenciados. A organização produtiva varia desde as mais simples e primitivas, até às de grande complexidade tecnológica. Existem elementos que estão presentes e exercem funções fundamentais no exercício da atividade social produtiva. Estes elementos são as matérias primas, os instrumentos de trabalho, isto é, os meios de produção, e a força de trabalho. Há necessidade, portanto, que sejam realizadas relações entre os seres humanos e a natureza e, também, dos seres humanos entre si mesmos. Os diversos tipos de relações dos humanos entre si mesmos caracterizam a vida social e a natureza dos conflitos sociais.

Os elementos fundamentais das atividades produtivas são: a propriedade dos meios de produção e o conjunto dos produtores diretos. As sociedades denominadas primitivas usaram coletivamente a terra e os instrumentos de trabalho que podiam ser produzidos assim que fossem necessários e chegaram a ser distribuídos como dádivas em rituais observados em tribos de diversas partes do mundo, inclusive, do norte do

Brasil. Nestas sociedades, não havia acumulação de produtos excedentes. Os trabalhos excedentes que eram realizados nestas sociedades se revertiam em beneficio da existência coletiva, como era o caso das guerras. São sociedades sem a presença de classes e, assim, não apresentam conflitos antagônicos internos (Cf. Marx, 1981a:67). Estas sociedades não dispõem de um organismo estatal, já que não necessitam de atividades desta natureza e chegam a reagir diante da possibilidade do surgimento do mesmo (Cf. Mindlin, 1985:47, 69, 80).

Nestas sociedades referidas acima, uma liderança profere discursos carregados de sentidos durante uma reunião compartilhada pelo conjunto das individualidades que compõem o grupo social. Entretanto, a voz da liderança não impede que, concomitantemente, os que pertencem à mesma sociedade expressem suas vozes em subgrupos informais a ponto de deixar dúvidas sobre a concordância com os conteúdos discursivos ali produzidos. São sociedades em que a vida das pessoas é profundamente ligada à natureza, e há dependência da participação coletiva nos esforços para obter os víveres e não existem mecanismos que sustentem a acumulação privada de bens. A observada desatenção aos discursos revela o não engajamento numa atividade que aponta para a realização de uma forma de poder que pode surgir e se constituir no que hoje conhecemos como Estado. Há uma espécie de resistência à constituição de um aparelho estatal (Cf. Clastres, 1990:21-25, 106-152).

Estas sociedades não apresentam cisões em classes antagônicas. Nelas, a vida de todas as pessoas e de cada uma está constituída de forma tão inter-relacionada que não há pertinência na colocação de determinadas questões como - se é direito e/ou dever participar de quaisquer assuntos de interesse social - por exemplo: a solução de divergências com tribos vizinhas através de ações que podiam ser inclusive a guerra. Quando, num dado momento, a atividade guerreira leva à escravização de quem perdeu o conflito, surge uma separação entre habitantes de um mesmo espaço, com uma divisão social do trabalho entre grupos que executam e outra parte que gerencia e usufrui o trabalho alheio. Aí, há a necessidade de uma força pública distinta do povo em geral, para garantir uma ordem social de domínio e de exploração. As terras passam a ser demarcadas como propriedade de tribos e depois, de chefes tribais, e chegam à propriedade privada de um meio de obtenção de víveres. O antagonismo social é instaurado e a sociedade vai se tornando cada vez mais complexa. As decisões vão

perdendo suas raízes populares. Então, surge o Estado, uma instituição gerenciadora dos negócios comuns de uma classe social que explora trabalho de outra classe (Cf. Engels, 1985:354-370).

As principais dimensões da convivência humana dependem das relações fundamentais entre os seres vivos e as coisas produzidas e/ou obtidas numa sociedade. No caso da sociedade burguesa, trata-se de uma sociedade fracionada em classes, determinadas por limites quase intransponíveis. Deste modo, estas relações passam a ficar imbricadas com certas racionalidades científicas que delimitam campos do saber - o que acaba por revelar os interesses presentes na definição e na implementação e obtenção dos resultados da produção material e imaterial. Os limites entre as classes sociais estão expostos em reflexões específicas a respeito das especialidades sociais, políticas e econômicas. Assim, são colocadas as questões de méritos provenientes do nascimento e da educação, como elementos para destaques na sociedade. Aparecem também as questões do mando e da obediência quando a referência é da especialidade da ação política. No mesmo sentido justificam-se as diversificações relacionadas a certas propriedades e ao exercício do trabalho na obtenção de produtos (Cf. Santos, 1987:43).

O poder político aparece como a capacidade de uma personalidade constituída de fazer com que os planos decorrentes de uma vontade predominante sejam executados por uma determinada classe social nos limites de um perímetro territorial submetido ao seu controle ou à sua influência. Como este poder desponta e se expressa? As guerras entre tribos rivais podiam resultar no aniquilamento total do grupo adversário ou incorporação da parte sobrevivente ao conjunto dos vitoriosos. Esta incorporação pode assumir formas distintas como, ou tornar os vencidos membros em condições de igualdade ou como escravos (Cf. Engels, 1985:355). Quando ocorre a última condição é que instaura a desigualdade social de classe. Há um domínio de uma fração social sobre outra e acontece a apropriação de (parte do) trabalho alheio. Foi deste modo que a colonização portuguesa implementou a exploração econômica do território brasileiro, primeiramente, tentando dominar os habitantes nativos e, com mais sucesso, trazendo negros africanos como cativos e escravizados.

“A forma econômica específica na qual o trabalho não-pago se extorque dos produtores imediatos, exige a relação de domínio e

sujeição tal como nasce diretamente da própria produção e, em retorno, age sobre ela de maneira determinante. Aí se fundamenta toda a estrutura da comunidade econômica – oriunda das próprias relações de produção – e, por conseguinte, a estrutura política que lhe é própria. É sempre na relação direta entre os proprietários dos meios de produção e os produtores imediatos (a forma dessa relação sempre corresponde naturalmente a dado nível de desenvolvimento dos métodos de trabalho e da produtividade social do trabalho) que encontramos o recôndito segredo, a base oculta da construção social toda e, por isso, da forma política das relações de soberania e dependência, em suma, da forma específica do Estado numa época dada. Isto não impede que a mesma base econômica, a mesma quanto às condições fundamentais, possa apresentar – em virtude de inumeráveis circunstancias empíricas diferentes, de condições naturais, de fatores étnicos, de influencias históricas de origem externa, etc. – infinitas variações e gradações que só a análise dessas condições empiricamente dadas permitirá entender” (Marx, 1980e:907. O Capital, liv. III, vol. VI, cap. XLVII).

No modo de produção capitalista, a apropriação do sobretrabalho é feita fundamentalmente por meio de mecanismos econômicos, isto é, sob a forma de compra e venda de força de trabalho. É através de uma troca ilusoriamente igual entre vendedor de força de trabalho (o trabalhador) e o comprador dessa mercadoria, que é o proprietário de meios de produção (o capitalista) se obtém produtos a serem vendidos no mercado, por meio de um equivalente geral: a moeda.

Por isso, o Estado pode assumir a aparência de neutralidade diante de questões mercantis e, por outro lado, os capitalistas podem dissimular os seus interesses diante da condução da administração pública. Capitalista e proletário são constituídos como juridicamente iguais, como pertencentes a uma comunidade nacional. “O Estado burguês constitui os agentes da produção como indivíduos sujeitos e, por outro lado, os aglutina em uma comunidade nacional. Em contrapartida, esta comunidade tende a ver neste Estado o guardião do interesse geral e da soberania daquela comunidade. Neste sentido, a ideologia nacional é uma transformação do culto ao Estado” (Almeida, 1995a:153) Mas o Estado executa políticas profundamente condizentes com os interesses do domínio de classe. Ele realiza “a articulação, própria à estrutura do todo de um modo de produção, comanda a constituição das instancias regionais” (Poulantzas, 1977:16). É a partir do Estado que o aparato jurídico se constitui e obtém a garantia de eficácia dos contratos. É também garantida pelo Estado a confiança na moeda e do respeito à propriedade privada dos meios de produção na sociedade, através do

consenso e/ou da repressão. É o Estado burguês que cria e reproduz as condições ideológicas e políticas da realização da acumulação capitalista de valor. Organiza a dominação de classe burguesa e desorganiza os trabalhadores ao “dissolver os agentes da produção em indivíduos juridicamente iguais” (Almeida, 1995a:64; Cf. Saes, 1985:29-38; e Rubin, 1987:47-87).

A aparente neutralidade se apresenta em razão da forma como a burocracia de Estado é constituída. Enquanto no Estado feudal a nobreza era a classe beneficiária da acumulação de valores e também a que assumia diretamente a administração dos negócios públicos, no Estado burguês os cargos da burocracia estatal são preenchidos por meio de mecanismos que camuflam o seu caráter de dominação de classe. O aparelho burocrático do Estado “apresenta-se não diretamente como um aparelho de dominação de classe, mas como a ‘unidade’, o princípio de organização e a encarnação do ‘interesse geral’ da sociedade, o que, aliás, tem incidências capitais no funcionamento concreto do aparelho burocrático: ocultação permanente do saber no seio desse aparelho por intermédio de regras hierárquicas e formais de competência, o que só torna possível pelo aparecimento da ideologia jurídico-política burguesa” (Poulantzas, 1977:210).

A unidade interna do aparelho de Estado é constantemente reforçada pela submissão dos funcionários a uma estrutura hierárquica em que há atribuição de competências e de atividades numa seqüência de saberes, decisões e obrigações descentes que têm no topo piramidal o ponto de partida. Esta burocracia formula e reúne meios para efetivar políticas tanto para a sua auto-reprodução quanto para o atendimento das aspirações das classes sociais. Para tanto, o corpo burocrático que garante a manutenção de um poder associado a certa ordem política e social, procura mover-se por si mesmo através da exação de recursos gerados no interior da sociedade, constituindo-se como uma força coletora de valores. O movimento de descida do topo para a base burocrático-piramidal encontra a massa de funcionários, que é precisamente a fração da burocracia que apresenta menores poderes de decisão, dispondo de menor acesso direto às plenas razões de Estado, e a que mais está obrigada a cumprir determinações superiores. Porém, a distância entre o topo e a base piramidal permite maior mobilidade própria e também, sofrer maior influência do meio social (Cf. Saes, 1985:43 e 130). Este se constitui num aspecto em que a burocracia de Estado apresenta

um ponto de fratura e estabelece compromissos de classe diversos dos que estão relacionados com a classe dominante. Esta possibilidade aumenta na medida em que a classe dominada se organiza e elabora propostas associadas à utopia de uma nova sociedade em que dominação e exploração de classe sejam realidades superadas.

O acesso à burocracia é feito através de concursos públicos em que os considerados mais competentes para o exercício das respectivas funções são recrutados. A princípio, qualquer cidadão pode se habilitar a ocupar postos na composição da burocracia. Não há mais o monopólio do acesso aos cargos burocráticos, como era o exercido pela nobreza no feudalismo. A partir daí, constitui-se um corpo burocrático cujo funcionamento é garantido por meio de uma lógica interna caracterizada pela obediência a uma disciplina hierárquica em que os superiores ordenam o que fazer e definem a dimensão das políticas. Essa burocracia se assume como possuidora de um saber ao qual o acesso é restrito. Assim, a não monopolização dos cargos pela classe dominante e o monopólio dos recursos administrativos constituem as características fundamentais da burocracia de Estado mais adequadas à ordem social burguesa. Esta burocracia é uma das condições que sustentam a heterogestão da sociedade, ou seja, a gestão da sociedade passa a ser realizada por um corpo de especialistas que se destacam e se colocam como se estivessem acima dela, como de fato aparecem. Deste modo, a burocracia camufla o seu compromisso com a dominação de classe. Imbuída de pretensa autolegitimação, esta burocracia organiza a dominação de classe instituindo duas categorias de forças diretivas primordiais que são as forças coletoras (burocracia) e as forças coercitivas (instituições militares). “O burocratismo impõe limites à prática dos funcionários; esta varia tão-somente quanto ao ritmo e os instrumentos adotados na execução de tarefas, cujo conteúdo geral é definido pelo topo da burocracia”. Esta rigidez hierárquica pode ser quebrada com através organizações alternativas como sindicatos, comitês e partidos políticos com outro projeto social (Saes, 1985:39-41 e 43. Grifos do original).

O Estado burguês ainda dispõe de um parlamento que é composto de representantes da população do território em que as normas reguladoras de convivência social e política são reconhecidas como válidas. Eleitos para um período determinado, os membros do parlamento passam a agir a partir de uma junção de interesses visando a sua continuidade no cargo o que os torna cada vez mais distantes das camadas populares

mais baixas das quais se nomeiam como representantes e das quais desejam receber apenas os votos em períodos predefinidos. Há, dentre os burocratas, os que, fugindo do caráter público da função, ousam também acumular - o que constitui fator de deslegitimação da burocracia de Estado por parte de setores significativos da sociedade. O parlamento, como local de debate e decisões, contribui na definição das políticas de Estado (Cf. Pinheiro, 1999:98-102; Castello, 1988:136; e Saes, 1987:53-58).

O Estado burguês ainda se apresenta como uma estrutura auto-regulada através de três poderes independentes e harmônicos, que são o executivo, o legislativo e o judiciário. Mas, essa trindade não resiste a uma atenta observação na medida em que o executivo promulga por iniciativa própria, algumas leis, sanciona ou veta determinadas (partes de) leis aprovadas pelo legislativo e o legislativo também executa atividades de investigação, que são próprias do judiciário com o executivo. O judiciário, por sua vez, busca o chamado espírito da lei, formando jurisprudência, agindo assim, como se fosse legislativo. Estes conflitos internos podem revelar posições diferentes de classes e frações de classes na consolidação, introdução ou remoção de interesses específicos. Ainda mais, o poder judiciário é parte importante do aparelho repressivo do Estado33. A pretensa auto-regulação restringe-se à formulação de políticas reprodutoras das condições de exploração do trabalho e da acumulação privada, em que a maior garantia está na estrutura burocrática, apesar dos conflitos periódicos entre as esferas de poder (Cf. Althusser, 1972).

3.2 - O Estado burguês e o território 3.2.1 – A política econômica

O Estado burguês é essencialmente caracterizado por três determinantes funcionais apresentadas a seguir: 1) A privatização da produção. O Estado procura excluir a produção de valores das decisões políticas. Mesmo que o Estado seja proprietário de parte dos meios de produção, esta propriedade pública não “conduz à estratégias de utilização e aplicação diferentes das adotadas pelo capital privado”. 2)

Dependência dos impostos. A eficácia das forças coletoras do Estado depende da incidência do sistema tributário sobre o volume dos valores realizados pela acumulação privada. É o processo de acumulação capitalista que possibilita a composição substancial do orçamento estatal que, por sua vez, permite ao Estado “manifestar o seu poder também com meios materiais”. 3) A acumulação como ponto de referência. A manutenção da burocracia de Estado depende da coleta de parte da mais-valia. O Estado é, deste modo, dependente do sucesso de realização do processo de acumulação capitalista, como meio de prover o seu próprio. Assim, o poder político burguês somente assume a forma de governo representativo somente quando o curso dos negócios da classe dominante desfruta de legitimidade social associada ao desenvolvimento das condições necessárias para realizar a mais-valia (Offe, 1984:122- 125).

O Estado procura cumprir suas funções atendendo as dimensões de território e os compromissos de classe social. Com isto, a burocracia estatal define suas políticas, ou seja, elabora e procura sustentar um conjunto de estratégias para produzir e reproduzir uma compatibilidade entre as determinantes estruturais acima apontadas. Isto acontece em dois eixos principais34, sendo um deles a superação de fronteiras espaciais à realização do valor extorquido, como exigência da capacidade produtiva ampliada com o uso de forças produtivas mais eficientes.

A superação das fragmentações do Estado Feudal, por exemplo, foi realizada através da coesão das forças militares e políticas sobre um território submetido a um procedimento jurídico comum e unidades monetárias comuns ou conversíveis, o que possibilitou maior velocidade no movimento de circulação das mercadorias. Um produto fabricado em um local pode necessitar (e acaba quase sempre necessitando) de outros mercados para ser consumido (Cf. Wood, 2000:14-21). O caráter fiduciário da moeda35 exige maior atuação estatal para garantir uma margem menor possível de variabilidade tolerável no cumprimento de suas funções. A paridade da moeda nacional com uma quantidade definida em ouro não eliminou a possibilidade de ocorrência das

34 Brunhoff, 1985, observa que os dois eixos principais da política econômica são: a gestão da moeda como garantia da troca de equivalentes, e a gestão da força de trabalho. Ver também Santos, 2001. 35 Entre 1816 e 1819 a Grã-Bretanha adota o padão-ouro para a Libra Esterlina que vigorou até o ano de 1931. O dólar americano esteve sob a mesma padronização aurífera até o ano de 1971 (Cf. Brunhoff, 1978:109-120; e, Bortolani, 1981:39-54).

crises monetárias, pois, enquanto mercadoria, o ouro está sujeito ao mesmo processo de produção como qualquer mercadoria. Assim, as gestões estatais adotam ou abandonam a paridade entre moeda e metal (ouro) conforme resoluções políticas diante de questões a serem enfrentadas. “Não mais repousando diretamente num valor materializado, a coerção monetária que decorre da posição particular da moeda como equivalente geral é cada vez mais percebida como um assunto do âmbito das regulamentações e das instituições estatais” (Brunhoff, 1978:24. Grifo do original).

As práticas monetárias necessitam de um padrão de referência a quem recorrer como garantia da equivalência geral entre mercadorias. Esta garantia precisa estar embasada numa instituição que supostamente se situa acima dos interesses de classes para regular, com uma aparente neutralidade, as práticas sociais e monetárias e que garanta a realização de valores, apesar da contradição inerente à própria moeda, que é uma fonte de crises. “A possibilidade geral das crises se estabelece no processo de metamorfose do capital e de dois modos: no tocante ao dinheiro na função de meio de circulação, com a compra e venda podem dissociar-se; no tocante ao dinheiro na função de meio de pagamento, em dois papéis distintos, o de medida dos valores e o de realização do valor, esses dois papéis podem romper a conjunção que os liga” (Marx:1983:949. O Capital. Teorias da mais-valia. Liv. IV, vol. II, cap. XVII. Grifos do original). Por isso, é a gestão estatal da moeda que garante uma margem de invariabilidade dos valores, ela é “uma necessidade dos capitalistas de controlar completamente as condições de reprodução capitalista, pelo amálgama de produção e circulação mercantil e de produção e distribuição capitalista” (Brunhoff, 1978:67).

Todo o processo de produção de valores acumuláveis necessita de um sistema de crédito que garanta aos proprietários de recursos monetários acumulados a solidez dos contratos sobre as aplicações concretas que precisam realizar. “Na exposição sobre o capital partimos da fórmula D-M-D’, da qual D-D’ era apenas o resultado. Agora