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Fatores comportamentais dos voluntários nas organizações da sociedade civil à luz da sociologia pragmática

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Academic year: 2021

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM DESENVOLVIMENTO GESTÃO EMPRESARIAL

TANDARA DIAS GONÇALVES

FATORES COMPORTAMENTAIS DOS VOLUNTÁRIOS NAS ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL À LUZ DA SOCIOLOGIA PRAGMÁTICA

IJUÍ – RS 2016

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TANDARA DIAS GONÇALVES

FATORES COMPORTAMENTAIS DOS VOLUNTÁRIOS NAS ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL À LUZ DA SOCIOLOGIA PRAGMÁTICA

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Desenvolvimento, na linha de pesquisa Gestão Empresarial, da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Desenvolvimento.

Orientadora: Profa. Dra. Adm. Denize Grzybovski

IJUÍ – RS 2016

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G635f Gonçalves, Tandara Dias.

Fatores comportamentais dos voluntários nas organizações da sociedade civil à luz da sociologia pragmática / Tandara Dias Gonçalves. – Ijuí, 2016. –

124 f. : il. ; 29 cm.

Dissertação (mestrado) – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Campus Ijuí). Desenvolvimento.

“Orientadora: Denize Grzybovski ”.

1. Sociologia pragmática. 2. Organizações da sociedade civil. 3. Fatores comportamentais. 4. Voluntariado. I. Grzybovski, Denize. II. Título.

CDU: 316

Catalogação na Publicação

Gislaine Nunes dos Santos CRB10/1845

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UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento – Mestrado

A Banca Examinadora, abaixo assinada, aprova a Dissertação

FATORES COMPORTAMENTAIS DOS VOLUNTÁRIOS NAS ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL À LUZ DA SOCIOLOGIA

PRAGMÁTICA

elaborada por

TANDARA DIAS GONÇALVES

como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Desenvolvimento

Banca Examinadora:

Profa. Dra. Denize Grzybovski (UNIJUÍ): _________________________________________

Profa. Dra. Enise Barth Teixeira (UFFS): __________________________________________

Prof. Dr. Airton Adelar Müeller (UNIJUÍ): ________________________________________

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Dedico este trabalho àqueles que, assim como eu, não aceitam a realidade que nos é imposta. Àqueles que têm fome de saber, a curiosidade por um novo olhar, uma nova perspectiva e uma inconformidade constante. Aos pesquisadores que conseguem aceitar que os males que afetam a sociedade, provêm de quem a compõem, o comportamento humano.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais, Paulo e Lara, que oportunizaram minha vida, e sempre sonharam e construíram comigo a importância em buscar a formação educacional, e me ensinarem que acima de tudo deverei ser sempre melhor do que penso poder ser.

Ao meu irmão Thales, por seu amor e companheirismo. Espero vê-lo trilhando um longo caminho na vida acadêmica.

À minha avó, Alice, que quando criança auxiliou muito em minha educação, e ao meu avô Serafim (in memoriam), que em vida muito me ensinou.

Agradeço a minha nova família, meus sogros Pedro e Jussara, pela atenção, orações e preocupações quando eu saia sozinha para a estrada.

Ao meu melhor amigo, meu companheiro, meu amor, Alessandro, que esteve junto nesta batalha, sempre me apoiando, me fazendo rir quando na verdade eu precisava chorar e ainda escutando minhas lamentações. Você, Alessandro, conseguiu por diversas vezes me fazer enxergar os problemas de outra forma. Obrigada por construir sua vida junto a minha! Sua compreensão sempre foi fundamental!

Jamais esquecerei da minha “magnífica” orientadora, mulher admirável, inteligente, segura de si. De quem muitos têm medo. Eu tenho-lhe amor! Denize, obrigada por acreditar nas minhas dúvidas, por estudar comigo, me orientar em todos os sentidos da vida e, continuo a dizer: “quando eu crescer quero ser igual a você”! Me desculpe se por diversas vezes não atingi suas expectativas, porém sua amizade, seu carinho e a sua presença fazem toda a diferença na minha vida.

Aos amigos Guaraci e Marinez, que me receberam como uma filha. Muito obrigada por abrirem seu lar e permitirem que eu fizesse parte da história de vocês.

Além do aprendizado que o mestrado me trouxe, deu-me ainda de presente uma amiga encantadora que sempre me equilibrou. Muito obrigada, Carlisa, você é uma “pecinha” mais que fundamental nesta caminhada.

Agradeço aos meus colegas de mestrado, por dividirem suas dúvidas e anseios comigo. Sempre fomos uma turma muito harmoniosa, pois vocês constroem partes e estimulam a disputa acadêmica como se fossem a água que corre pelo rio, sempre juntos.

Aos professores do PPGDR/UNIJUI que sempre alimentaram a busca pelo conhecimento, e sempre trouxeram questões inquietantes, “desconstruindo saberes”.

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Aos professores, Dr. Maurício Serva e Dra. Ana Paula Paes de Paula, pelas contribuições importantes para este trabalho durante o IV Colóquio Internacional de Epistemologia e Sociologia da Ciência da Administração. Vocês iluminaram meu olhar e reafirmaram meus achados.

Meu sincero agradecimento às organizações pesquisadas e seus voluntários, por me receberem, compartilharem comigo um pouco de suas histórias e permitirem que a dissertação fosse desenvolvida a partir do olhar de cada um de vocês.

Concluo meus agradecimentos dizendo que todo este suporte que recebi de cada um e de todos não foi e não será em vão. Meu espírito crítico sempre estará em busca pelas justificações das ações dos humanos. Para entender uma sociedade é necessário entender quem a compõe!

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O meu egoísmo é tão egoísta que o auge do meu egoísmo é querer ajudar mas não sei por que nasci pra querer ajudar a querer consertar o que não pode ser. Raul Seixas

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RESUMO

O tema deste trabalho são os fatores comportamentais nas organizações da sociedade civil (OSCs), que diz respeito as motivações do indivíduo em desenvolver a ação voluntária, por meio da Sociologia Pragmática. Com o objetivo geral de compreender os fatores que influenciam o comportamento dos voluntários na realização da ação social nas OCSs, foi necessário: (a) caracterizar e descrever o perfil dos voluntários que desenvolvem ações nas organizações da sociedade civil; (b) mapear os critérios que influenciaram os voluntários no processo de escolha da organização da sociedade civil para a realização da ação voluntária; (c) identificar os fatores que direcionaram a escolha dos voluntários por uma organização da sociedade civil. O estudo se justifica pela originalidade do tema, decorrente de uma área de poucos estudos voltados ao indivíduo como voluntário e na escassez de pesquisas sobre as verdadeiras motivações que induzem os voluntários a dedicarem parte de seu tempo e esforço em prol de uma causa social. Para conhecer mais sobre o comportamento dos sujeitos optou-se por situar o preoptou-sente estudo em três organizações específicas e optou-seus voluntários. As organizações selecionadas foram: Cáritas Paroquial Nossa Senhora de Fátima, Rotary Club International – Distrito 4660 e APAE Passo Fundo/RS. Trata-se de uma pesquisa exploratória e descritiva, o método utilizado foi o qualitativo, mediante análise de conteúdo e técnica de co-ocorrência. A coleta de dados foi realizada por meio de focus group e entrevista individual com os voluntários atuantes nas organizações selecionadas. Os resultados evidenciam que os fatores que influenciam o comportamento dos voluntários nas organizações da sociedade civil são psicológicos, psíquicos e sociais. Nesta pesquisa foram contemplados os fatores sociais, em que os indicadores de comportamento encontrados foram egoísmo, interesses e intenções. Os resultados indicam que o ator social, considerado voluntário, não pratica ação de voluntariado por perspectiva de justiça social, mas, sim, por interesses pessoais, conscientes ou não. Os voluntariados na maioria são aposentados, e aqueles que ainda estão no mercado de trabalho são caracterizados como profissionais influentes na sociedade. Os critérios adotados na escolha da organização para realização da ação voluntária foram as necessidades humanas básicas como pertencer a um grupo e manter ou estabelecer relações sociais. Conclui-se que o voluntariado pode ser compreendido como presente em diversas cités da Sociologia Pragmática e os voluntários se justificam pela configuração dos mundos “da fama” e “mercantil”.

Palavras-chave: Fatores comportamentais. Sociologia pragmática. Voluntariado. Organizações da sociedade civil.

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ABSTRACT

The theme of this work are the behavioral factors in civil society organizations (CSOs), which concerns the motivations of the individual to develop voluntary action through the Pragmatic Sociology. With the overall objective of understanding the factors that influence the behavior of volunteers in the realization of social action in OCSs, it was necessary to: (a) to characterize and describe the profile of volunteers who develop actions in civil society organizations; (B) map the criteria that influenced the volunteers in the selection process of civil society organization for the realization of voluntary action; (C) identify the factors that guided the selection of volunteers for a civil society. The study is justified by the subject of originality, due to an area of few studies have focused on the individual as a volunteer and the dearth of research on the true motivations that induce volunteers to devote part of their time and effort for a social cause. To learn more about the behavior of the subjects was decided to place this study in three specific organizations and their volunteers. The organizations selected were: Cáritas Paroquial Nossa Senhora de Fátima, Rotary Club International – Distrito 4660 e APAE Passo Fundo/RS. This is an exploratory and descriptive research, the method used was qualitative, through content analysis and co-occurrence technique. Data collection was conducted through focus groups and individual interviews with the volunteers working in the selected organizations. The results show that the factors that influence the behavior of volunteers in civil society organizations are psychological, psychological and social. In this research were included social factors, found that behavioral indicators were selfish, interests and intentions. The results indicate that the social actor, considered voluntary, not practicing voluntary action for social justice perspective, but rather by personal interests, conscious or not. The volunteer corps are mostly retired, and those still in the labor market are characterized as influential professionals in society. The criteria adopted for the organization of choice for realization of voluntary action were basic human needs such as belonging to a group and maintain or establish social relations. It is concluded that volunteering can be understood as present in several cités of Pragmatic Sociology and volunteers are justified by the configuration of the Worlds "fame" and "commercial".

Keywords: Behavioral factors. Pragmatic sociology. Volunteering. Civil society organizations.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Esquema gráfico de origem dos “mundos” da sociologia pragmática... 22

Figura 2 – Representatividade do elo entre a micro e a macro sociologia... 23

Figura 3 – Os objetivos de desenvolvimento do milênio... 31

Figura 4 – A interação dos fatores no comportamento do ator social... 48

Figura 5 – Foto dos voluntários da Cáritas numa ação social... 59

Figura 6 – Símbolo universal da Cáritas... 59

Figura 7 – Local de funcionamento da Cáritas Paroquial Nossa Senhora de Fátima... 61

Figura 8 – Material informativo dos Centros de Juventude... 62

Figura 9 – Folder de divulgação dos Grupos de Mulheres... 63

Figura 10 – Rotarianos do Distrito 4660 numa reunião festiva... 65

Figura 11 – Modificações do símbolo rotário... 66

Figura 12 – Significados do emblema rotário... 67

Figura 13 – A bandeira, o sino e o malhete rotarianos... 68

Figura 14 – Banco de cadeiras de rodas... 69

Figura 15 – Material de divulgação do evento “Desafio Rotary de Mountain Bike”... 69

Figura 16 – Símbolo das APAEs... 72

Figura 17 – Estrutura operacional da APAE Passo Fundo... 74

Figura 18 – Foto da diretoria e cozinheiros responsáveis pela Feijoada APAE... 81

Figura 19 – Fatores motivacionais dos voluntários... 94

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Movimentos sociais no Brasil numa perspectiva histórica... 30

Quadro 2 – Mundos que ilustram os regimes de justificação... 36

Quadro 3 – Os axiomas... 37

Quadro 4 – As definições de altruísmo egoísta em Hobbes... 45

Quadro 5 – Três intenções para exercer o voluntariado... 47

Quadro 6 – Categorias analíticas e subcategorias analíticas... 56

Quadro 7 – Categorias das unidades de registro utilizadas na análise de co-ocorrências... 57

Quadro 8 – Características das organizações estudadas... 76

Quadro 9 – Discurso dos voluntários sobre o perfil profissional, por tipo organizacional... 79

Quadro 10 – A ação social na perspectiva do egoísmo... 87

Quadro 11 – O comportamento humano na perspectiva do egoísmo... 88

Quadro 12 – A ação social na perspectiva das intenções... 90

Quadro 13 – A ação social na perspectiva do interesse... 91

Quadro 14 – O comportamento humano na perspectiva das intenções... 93

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Características dos sujeitos da pesquisa... 53 Tabela 2 – As três APAEs pioneiras no Brasil... 71

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

APAE – Associação dos Pais e Alunos Especiais CAR – Centro de Aprendizagem Rural

CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil CONEP – Conselho Nacional de Saúde

CVV – Centro de Valorização da Vida DF – Distrito Federal

EUA – Estados Unidos da América

FENAPAES – Federação Nacional das APAES FHC – Fernando Henrique Cardoso

GEPOG – Grupo de Estudos e Pesquisas em Organizações, Gestão e Aprendizagem IBASE – Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística LBA – Legião Brasileira de Assistência

ODM – Objetivos do Milênio

ONG – Organização Não Governamentais

ONU BRASIL – Organização das Nações Unidas Brasil

ORD – Núcleo de Pesquisas Organizações, Racionalidades e Desenvolvimento OSC – Organização da Sociedade Civil

OSCIP – Organização da Sociedade Civil de Interesse Público

PPGDR – Programa de Pós Graduação em Desenvolvimento Regional PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento SIDA – Síndrome de Imunodeficiência Adquirida

TAR – Teoria da Ação Racionalizada

TCLE – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido TCP – Teoria do Comportamento Planejado

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 16

1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTUDO... 20

1.1 APRESENTAÇÃO DO TEMA... 20

1.2 ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL... 25

1.3 OS MOVIMENTOS DE VOLUNTARIADO NO BRASIL... 27

2 REFERENCIAL TEÓRICO... 33

2.1 SOCIOLOGIA PRAGMÁTICA... 33

2.2 OS VOLUNTÁRIOS E O COMPORTAMENTO HUMANO... 40

2.2.1 Atores sociais como voluntários... 40

2.2.2 O comportamento humano... 41

3 METODOLOGIA... 50

3.1 CLASSIFICAÇÃO E DELINEAMENTO DA PESQUISA... 50

3.2 OBJETOS DE ESTUDO... 51

3.3 SUJEITOS DA PESQUISA... 52

3.4 COLETA DE DADOS... 53

3.5 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS... 55

4 AS ORGANIZAÇÕES ESTUDADAS... 58

4.1 CÁRITAS PAROQUIAL NOSSA SENHORA DE FÁTIMA... 58

4.2 ROTARY CLUB CARAZINHO... 65

4.3 APAE DE PASSO FUNDO... 70

4.4 AS OSCs, SUAS HISTÓRIAS E ESTRUTURA... 75

5 VOLUNTÁRIOS, ESCOLHAS E COMPORTAMENTOS... 78

5.1 PERFIL DOS VOLUNTÁRIOS... 78

5.2 FATORES COMPORTAMENTAIS QUE DIRECIONAM A ESCOLHA DOS VOLUNTÁRIOS... 84

6 FATORES INFLUENCIADORES NO COMPORTAMENTO DOS VOLUNTÁRIOS... 99

CONCLUSÕES... 106

(16)

APÊNDICES... 120

APÊNDICE A – Pedido de autorização da organização para realização da pesquisa... 121

APÊNDICE B – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)... 122

(17)

INTRODUÇÃO

O tema central desta dissertação são os fatores comportamentais dos voluntários nas organizações da sociedade civil (OCSs) à luz da Escola Francesa da Sociologia Pragmática (KARAM, SERVA, 2014). Este tema desperta interesse científico em razão do notável crescimento do número destas organizações no contexto brasileiro (IBGE, 2012; ONU BRASIL, 2014), e do interesse percebido de membros da sociedade em auxiliar àqueles mais necessitados, marginalizados, drogaditos e outros (CHARITIES, 2012). No entanto, nem sempre o fenômeno voluntariado nestas organizações1 é pautado pelo amor ao próximo e que, pelo interesse pessoal e espírito cívico, dedica parte do seu tempo a atividades de bem-estar social (ONU BRASIL, 2014).

Por voluntário entende-se toda pessoa que doa seu trabalho e suas competências em uma função de natureza social, e que lhe proporcione um sentimento de gratificação pela realização. O voluntário realiza uma ação social – por muitos denominada trabalho voluntário – definida a partir da qualificação, satisfação, doação e realização como uma ação de qualidade que faz a diferença numa determinada comunidade; não precisa ser grande, mas eficiente.

A abordagem teórica da sociologia pragmática traz a representatividade de uma teoria da ação, colocando as práticas constituintes da situação no centro da análise. A opção pela vertente teórica da escola francesa permite estudar os fatores comportamentais dos indivíduos pela sua caracterização e suas razões para agir, cujo nível analítico, nesta dissertação, é o individual. No desenvolvimento do estudo partiu-se do pressuposto teórico de que os voluntários nas organizações da sociedade civil direcionam suas escolhas para realizar ações

1

Falconer (1999), Montaño (2005) e Saraiva (2006) afirmam que essas organizações são do terceiro setor e que estas configuram-se como uma alternativa organizacional entre as organizações econômicas privadas e as organizações públicas. Assim, é extremamente específico em sua natureza, por reunir número significativo de organizações e de vários portes (IBGE, 2012) e por ofertar vagas tanto de emprego formal quanto de voluntariado. De acordo com Saraiva (2006), é um setor que cresce significativamente desde a década de 90. Dados do IBGE (2012) revelam que há, no Brasil, 290,7 mil fundações privadas e associações sem fins lucrativos, sendo que deste total 25 377 mil encontram-se atuando no estado do Rio Grande do Sul, o que representa 8,7% do total.

(18)

voluntárias orientadas por fatores comportamentais descritos por comportamento egoísta e subjacente2 à ação do voluntariado, cuja expressão real encontrasse nos impulsos e desejos inconscientes reprimidos, como pressupõe a perspectiva teórica freudiana.3

A discussão sobre os fatores comportamentais dos voluntariados nas OSCs parte da origem da motivação em realizar ações voluntárias, talvez seja a concepção ideológica de ser uma pessoa melhor (TENÓRIO, 2004) ou herança cultural do Brasil Colonial (ANDION, 2007). Também pode ser um tipo de controle (emocional, econômica, moral...) exercido pela cultura organizacional sobre os voluntários (MORGAN, 2013). Assim, as questões sobre os fatores comportamentais dos voluntários são recolocadas não apenas na perspectiva do indivíduo, mas também na perspectiva do tipo de organização no qual o voluntário faz o “trabalho voluntário” (DOHME, 2001), pois o sentido do trabalho é o que orienta suas decisões (MORIN, 2001).

Acredita-se que os fatores comportamentais dos voluntários encontram espaço para revelar comportamentos maquiavélicos em OCSs, em que a função de natureza social proporciona sentimentos de satisfação pela realização. Logo, pergunta-se: quais fatores comportamentais direcionam a escolha comportamental das pessoas que assumem a ação voluntária nas organizações da sociedade civil?

Com o objetivo geral de compreender os fatores que influenciam o comportamento dos voluntários na realização da ação social nas OCSs, foi necessário: (a) caracterizar e descrever o perfil dos voluntários que desenvolvem ações nas organizações da sociedade civil; (b) mapear os critérios que influenciaram os voluntários no processo de escolha da organização da sociedade civil para a realização da ação voluntária; (c) identificar os fatores que direcionaram a escolha dos voluntários por uma organização da sociedade civil.

2 Moscovici (2012) interpreta o comportamento humano como formado por duas esferas: a aparente e a

subjacente, respectivamente um lado visível e outro não; o autor usa do termo “luz e sombra” para ilustrar sua interpretação. Como comportamento aparente incluem-se os recursos materiais de uma organização, as relações humanas, a interação das pessoas como passíveis de consideração e observação. O comportamento

subjacente, a sombra, é a esfera na qual esconde-se a maior parte do comportamento, tendo uma gama de

fatores como atitudes, valores, sentimentos, interações, mecanismos de defesa, motivações e desejos.

3 Inconsciente para Freud (1974) é um depósito de desejos e impulsos reprimidos pela pessoa, o qual é

necessário para a sua construção familiar e social. A orientação de Freud (1974) é no sentido de que as pessoas na civilização agem sob coerção e renunciando a instintos; se, em hipótese, houvesse a interrupção da coerção, a maioria dos seres humanos estaria preparada para empreender o trabalho necessário à aquisição de novas riquezas. Para tanto deve-se considerar o fato de estar presente em todos os humanos tendências destrutivas e, portanto, antissociais e anticulturais, e que, num grande número de pessoas, essas tendências são suficientemente fortes para determinar o comportamento delas na sociedade. Nesta abordagem, Freud (1974) descreve o comportamento humano por uma perspectiva teórica anti-positivista, ou seja, de que as pessoas agem por razões que estão no inconsciente.

(19)

O estudo se justifica pela originalidade do tema, decorrente de uma área de poucos estudos voltados ao indivíduo como voluntário e na escassez de pesquisas sobre as verdadeiras motivações que induzem os voluntários a dedicarem parte de seu tempo e esforço em prol de uma causa social. Tais causas sociais têm sido objeto de ação em OSCs, interpretadas como agentes de associativismo voluntário com poder de examinar e transformar estruturas sociais e políticas com as quais promovem interação (KEANE, 1998 apud KRIEGER, 2011). Contudo, surgem dúvidas sobre as intenções do agir dos voluntários. Será que os voluntários têm um agir intencional e comportamento estimulado por elementos simbólicos ou por fatores comportamentais? Pelos atos da fala, na perspectiva weberiana, a ação social é resultado de um comportamento subjetivo dotado de sentido, ou seja, orientado subjetivamente e motivado por ele, argumenta Habermas (2009).

Em termos de orientação teórica, a pesquisa baseada na sociologia pragmática se difere da sociologia crítica de Pierre Bordieu, a qual é sucessora. Essa corrente teórica dispensa consideração pelo discurso, princípios e valores legitimadores dão sentido à ação, desligada da preocupação referente a possíveis ilusões que poderiam influenciar o ator, inconscientemente (SILBER, 2003; KARAM, 2014). Assim, torna-se um instrumento teórico capaz de desvelar os sentidos dos voluntários na prática do voluntariado, no nível de análise individual, e acalentar a inquietude da autora desta dissertação, que não acredita em ação social desprendida de uma ação orientada na perspectiva weberiana.

O estudo se insere nos propósitos do Grupo de Estudos e Pesquisas em Organizações, Gestão e Aprendizagem (GEPOG), os quais são de contribuir na produção do conhecimento teórico e empírico no campo das ciências da gestão e das organizações, com ênfase nas organizações da economia social (LAVILLE, 2001), de forma a fomentar novas investigações relativas ao tema central do grupo. No âmbito do GEPOG, em 2009 Juliana Porciuncula desenvolveu um estudo sobre o trabalho voluntário em instituições hospitalares brasileiras e norte americanas, o qual contribuiu par ao entendimento da temática no campo do comportamento organizacional. A diferença da realidade do voluntariado entre Brasil e EUA está na capacitação do voluntário. Enquanto nos EUA o voluntário recebe uma formação de dois anos, inclusive como estágio obrigatório no ensino médio, no Brasil não há qualquer capacitação (PORCIUNCULA, 2009). No presente estudo a temática é desenvolvida na perspectiva do indivíduo.

A dissertação articula-se também com os estudos desenvolvidos por pesquisadores do Núcleo de Pesquisa Organizações, Racionalidade e Desenvolvimento (Rede ORD), alocado no Departamento de Ciências da Administração da Universidade Federal de Santa Catarina

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(UFSC), coordenados pelo professor Maurício Serva, e com a Chaire Finance Autrement: Investissement - Solidarités – Responsabilité, coordenada pelo professor Bernard Paranque no âmbito da Euromed Marseille - École de Management. O tema deste protocolo de pesquisa na modalidade cooperação internacional é a “Ação Cooperativa e Desenvolvimento de Territórios”. Na Unijuí, este estudo está sendo coordenado pela professora Denize Grzybovski, orientadora desta dissertação.

A dúvida gerada por essa compreensão dos fenômenos sociais instiga pesquisar os fatores comportamentais em voluntários brasileiros, pois, dentre seus interesses, as OCSs estão em ascensão (IBGE, 2012; ONU BRASIL, 2014) e é necessário investigar quem são os atores sociais que estão se comprometendo em causas até então intituladas “nobres”.

Esta dissertação é apresentada em seis capítulos. O Capítulo 1 traz a apresentação do tema, a revisão da literatura sobre as organizações da sociedade civil e sobre os movimentos de voluntariado no Brasil.

No Capítulo 2 apresenta-se o referencial teórico sobre a Sociologia Pragmática seus fundamentos e contornos teóricos, bem como os fatores comportamentais dos voluntários na condição de atores sociais e os motivos para exercer o voluntariado.

No Capítulo 3 faz-se a apresentação dos procedimentos metodológicos adotados na investigação empírica. Inicialmente são apresentados os pressupostos ontológicos e metodológicos da pesquisa, evidenciando que ela está fundamentada no paradigma do humanismo radical, nos níveis exploratório e descritivo. É uma pesquisa de campo, classificada como qualitativa, pois objetivou compreender um fenômeno empírico. Os voluntários estudados atuam na Cáritas Paroquial Nossa Senhora de Fátima e no Rotary Club Carazinho, em Carazinho, e na Apae Passo Fundo, em Passo Fundo. Ambas localizadas no estado do Rio Grande do Sul.

As organizações da sociedade civil estudadas, bem como suas dimensões históricas e estruturais são analisadas no Capítulo 4, o qual também descreve as ações sociais desenvolvidas, evidencia as especificidades estruturais e dinâmicas próprias de cada OSCs e descreve o seu papel social.

O Capítulo 5 configura-se como o espaço do documento no qual o perfil dos voluntários e os fatores comportamentais que os influenciam na escolha das OSCs são apresentados e interpretados na perspectiva teórica da Sociologia Pragmática. Como resultado, o processo de escolha dos voluntários é compreendido.

No Capítulo 6 são discutidos os resultados da pesquisa considerando o regime de justificação proposto Laurent Thevenót e Luc Boltanski para analisar o ator social na

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condição de voluntário. As analises indicam que as justificativas dos voluntários dão-se com base nos mundos da fama e mercantil. São estes os mundos que constroem os fatores comportamentais para realizar a ação voluntária. A este capitulo seguem-se as conclusões da Dissertação, as contribuições do estudo realizado no âmbito dos três organizações selecionadas e as limitações da pesquisa.

1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTUDO

A compreensão da complexidade do tema em estudo requer a investigação do “estado da arte”, cujos resultados são apresentados a seguir e é constituído de três seções sendo a primeira marcada pela visão geral do tema que permite compreender o contexto teórico do seu desenvolvimento. A segunda seção apresenta os estudos sobre organizações da sociedade civil, perpassando pelo debate sobre o terceiro setor, o qual marcou uma parte dos estudos brasileiros. A terceira seção traz os movimentos de voluntariado no Brasil numa tentativa preliminar de historicizar os tipos organizacionais envolvidos com ações de voluntariado, contextualizar o número de voluntários envolvidos, bem como compreender a importância das organizações selecionadas para o estudo no contexto nacional.

1.1 APRESENTAÇÃO DO TEMA

Há diferentes definições do fenômeno social voluntariado na literatura gerencial e também nos documentos legais do governo brasileiro. Diante da necessidade de regularizar a ação voluntária crescente no país, o governo brasileiro publicou a Lei nº 9.608 de 18 de fevereiro de 1998, a qual no art. 1º considera serviço voluntário:

A atividade não remunerada, prestada por pessoa física a entidade pública de qualquer natureza, ou a instituição privada de fins não lucrativos, que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência social, inclusive mutualidade.

Então, seja denominada ação social, trabalho voluntário ou serviço voluntário, muito pode-se discutir a respeito do comportamento dos voluntários que os realizam, tanto na perspectiva paradigmática do humanismo radical (MORGAN, 2013), como na perspectiva da sociologia pragmática (THÉVENOT, 2001).

(22)

Fernando Tenório, em 2004, destacou que as ações de voluntariado desenvolvidas pela sociedade civil organizada incomodam o restante dos indivíduos, pois instiga todos a se autoquestionarem sobre questões complexas, como liberdade e autonomia, numa sociedade capitalista. Assim, os voluntários são considerados “diferentes” dos demais membros da sociedade (TENÓRIO, 2004, p. 44), talvez pelo sentimento altruísta e que, mesmo não sendo a intenção principal, espera usufruir algo (DOHME, 2001).

Na visão crítica de Saraiva (2006), voluntários são indivíduos que enfrentam as atividades sociais como uma terapia alternativa, construindo uma imagem de sociedade politicamente correta, considerando os voluntários seres humanos melhores, porque se concentram em servir e ajudar aos outros.

Nesse sentido, o tema é recolocado ao debate pela perspectiva comportamental, das pessoas que realizam ações de voluntariado. Kanaane (1994) explica que o comportamento humano é um conjunto de operações materiais e simbólicas, o qual possibilita sua compreensão do comportamento como um sistema de múltiplas interações. Sua origem pode estar situada nas necessidades humanas, favorecendo e permitindo o surgimento de variáveis no comportamento até atingir novamente o estado de equilíbrio, como constatou Abraham Maslow (MOSCOVICI, 2012); também sua origem pode estar no contexto de interação social e ambiente que o indivíduo se encontra (FREUD, 1974) ou nas características hereditárias, como o alcoolismo, a esquizofrenia, a agressividade excessiva, a anorexia entre outros fatores patológicos (BUSSAB; RIBEIRO, 1998).

No entanto, é na Sociologia Pragmática em que buscam-se elementos para entender as razões do agir pelas mediações simbólicas, ou seja, pelo que está atrás da ação humana. A corrente teórica da Sociologia Pragmática tem como seus precursores Luc Boltanski e Laurent Thévenot, iniciada fundamentalmente no livro De la justification: Les èconomies de la

grandeur, de 19914. Esta obra é considerada principal referência nesta dissertação, pois nela

Os autores apresentam a metodologia da Sociologia Pragmática, bem como o regime de justificação e como chega-se às ordens legítimas (cidades ou mundos; cités), ocultas na ação humana (KRIEGER, 2011; KARAM, 2014).

4 A obra utilizada na presente dissertação, de Boltanski e Thévenot, é On Justification: Economies of Worth,

tradução realizada no ano 2006 por Catherine Porter. A obra em francês, no entanto, De la justification: Les èconomies de la grandeur, teve sua primeira edição em 1991.

(23)

Considera-se fundamental neste debate a obra: “Le nouvel esprit du capitalisme”, de Boltanski e Chiapello escrita em 1999. Neste livro os autores reconstituem a história do capitalismo e das justificações coletivas utilizadas para aderir à lógica capitalista, sugerindo e originando uma nova lógica de justificação da ação, denominada “mundos dos projetos”.

Conforme afirma Krieger (2011), aos seis mundos dos projetos descritos na Figura 1, previamente elaborados e consolidados na literatura, Luc Boltanski e Eve Chiapello incluem mais um mundo, o mundo dos projetos.

Figura 1 – Esquema gráfico de origem dos “mundos” da Sociologia Pragmática.

Fonte: A autora (2016).

Na perspectiva da Sociologia Pragmática, os fatores comportamentais dos voluntários podem ser estudados pela caracterização destes atores sociais e pelas suas razões para agir, como propõe Thévenot et al. (2001). Dada a relevância de ações rotineiras ou intensas situações de disputas e conflitos à percepção dos mesmos, a Sociologia Pragmática verte da microssociologia e reconstitui o elo com a macrossociologia por meio das “mediações simbólicas que são as cidades” (VANDENBERGUE, 2006, p. 315).

Na Figura 2 apresentada a seguir pode-se visualizar o elo existente entre a micro e a macro sociologia, as quais contribuem para a formação da sociologia pragmática.

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Figura 2 – Representatividade do elo entre a micro e a macro sociologia

Fonte: A autora (2016).

Thévenot (2001) e Vandenbergue (2006) defendem que na Sociologia Pragmática, as ações humanas são justificáveis. Para estes autores, o comportamento entra no centro de análise na teoria dos atos de linguagem e da etnometodologia, discutidas por Jürgen Habermas e John C. Heritage. É preciso reconhecer que há outras abordagens da análise sociológica (análise da estrutura social, dos associativismo, da reflexividade, entre outros), que não serão contempladas nesta dissertação.

Na ótica de Habermas (1999), a teoria do ato de fala ou ato de linguagem dá-se ao reconhecimento da “virada pragmática”, ocasionada no cerne da filosofia da linguagem. Tal teoria está interligada à práxis comunicativa e não apenas à representação da realidade, considerando o caráter intersubjetivo da linguagem (sinais linguísticos) ou o caráter pragmático (HABERMAS, 1999).

De acordo com Heritage (1999), o mundo social é complexo e sua compreensão se dá a partir dos fenômenos empíricos da atividade social em toda a sua riqueza e diversidade, traduzidas por um sólido programa de investigação empírica, a etnometodologia. Mesmo criticado pela base teórica de Parsons, Guesser (2003) afirma que Garfinkel reformula a sociologia tradicional pela influência da fenomenologia de Alfred Schütz e Eduard Husserl e revela a natureza da intersubjetividade da ação social. Assim o fazendo, não permite generalização teórica dos dados empíricos, pois a investigação é conduzida a partir de grupos escolhidos pelas suas particularidades, os quais têm uma identidade revelada pelos elementos presentes na fala apreendida no processo de análise da conversação. Isso significa dizer que o que este grupo faz ou diz no processo de investigação e o que eles iriam fazer ou dizer em outros contextos pode não ser o que realmente fazem (GUESSER, 2003; HERITAGE, 1999).

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Assim, na presente dissertação, mesmo não seguindo a etnometodologia na abordagem dos dados, a investigação contempla o processo de análise de conversação utilizando o método focus group, desenvolvido por Robert Merton e Paul Lazarsfeld (VERGARA, 2005), e instrumentalização da investigação apresentadas por Oliveira e Freitas (1998).

Conhecida também como a sociologia francesa, dotada de uma abordagem crítica, a Sociologia Pragmática faz contornos nas questões do senso comum e é dedicada a delatar a redução da ação significativa ao comportamento, como o estado, a igreja ou a sociedade, que Vandenbergue (2006) considera como uma realidade que age como pessoas e não como organizações. A partir desta perspectiva teórica pode-se entender que os voluntários são dotados de comportamento racional e justificável por três linhas teóricas, que configuram-se em regimes pragmáticos, encontradas na Sociologia Pragmática (VANDENBERGUE, 2006; BOLTANSKI; THÉVENOT, 2006; SCHUBERT, 2006).

Thévenot (2001) orienta uma nova perspectiva de três questionamentos da Sociologia Pragmática, que até então estão sendo isoladas e estudadas separadamente uma da outra, como afirmam Karam e Serva (2014): (a) a caracterização do agente e suas razões para agir; (b) as modalidades de coordenação das ações; e (c) o papel dos valores e bens comuns. Nesta pesquisa o foco do estudo recai sobre a primeira, a caracterização do voluntário e suas ações para agir.

Na mesma direção, Thévenot (2001) contextualiza o regime de justificação, o qual se refere a convenções coletivas em prol do bem comum. O referente regime concerne, primeiramente, à correlação do ator com ele mesmo, em um ambiente que coordena sua própria conduta. Cada ação do ator social é explicada pelo regime de justificação, ou seja, primeiro justifica-se a ação para depois concretizá-la.

É nesse contexto teórico que se apresenta o debate sobre fatores comportamentais dos voluntários das OSCs, à luz da Sociologia Pragmática, o qual é distinto da psicologia comportamental na interpretação de Freud (1974).

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1.2 ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL

O termo “organizações” tem sido utilizado pelo senso comum como sinônimo de empresas, no entanto Bispo e Santos (2014) consideram que organizações aproximam-se da ideia de movimento, complexidade e ações. Logo, organização deve ser compreendida como um verbo associado ao processo de organizar contínuo em que a “organização” é edificada, perpetuando e modificando o cotidiano e baseando-se em práticas (SANTOS; SILVEIRA, 2015).

Muitos são os tipos organizacionais (empresas, instituições financeiras, fundações, sindicatos, organizações da sociedade civil, organizações da economia social, etc.) Saraiva (2006) apresenta uma visão crítica sobre as organizações da sociedade civil, inclusive questionando a existência destas organizações e sua legitimação como terceiro setor. Sugere ainda que terceiro setor pode ter sido hipoteticamente criado pela veia capitalista com finalidade de reinvenção do próprio capitalismo. O referido autor relata que os voluntários, são movidos por interesses, desmistificando a visão de atores sociais dispostos a realizar e transmitir o bem sem importar a quem, slogan cultuado pela Fundação Rotária (ROTARY, 2014) em todo mundo.

Montaño (2005) trata as organizações da sociedade civil como terceiro setor e como um recorte social das esferas estatal, política e econômica. Na esfera estatal, o Estado é considerado o primeiro setor; sendo mercado o segundo setor e a sociedade civil o terceiro setor. Para tanto, idealizou que o “político” pertence apenas ao estatal, o “econômico” ao privado, ligado ao mercado e lucros, e o “social” remete apenas à sociedade civil, em um conceito reducionista e prático da realidade.

Falconer (1999), por sua vez traz a concepção de que as organizações do terceiro setor no Brasil são compostas de cinco principais categorias, sejam elas: instituições religiosas e entidades ligadas a igrejas, organizações não governamentais e novos movimentos sociais, empreendimentos “sem fins lucrativos” de serviços, entidade paraestatal, nascida sob a tutela do Estado e, por fim, as fundações e entidades empresariais.

Tenório (2004) corrobora a ideia afirmando que o processo de institucionalização das organizações do terceiro setor entre os outros tipos organizacionais, vem desde a década de 1970. Assim, tais organizações assumem formas de associações, fundações, instituições filantrópicas, movimentos sociais organizados, ONGs e outras organizações assistenciais ou caritativas da sociedade civil (TENÓRIO, 2004).

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Andion (2007) aponta que, no período colonial do Brasil, a sociedade civil era vista como um espaço de filantropias, em que a maioria da sociedade colocava-se como receptora da caridade dos benfeitores, e não como cidadãos de direito.

A partir da década de 1990, surge, inclusive no Brasil, o terceiro setor como uma promessa, a de renovar o espaço público, resgatar a solidariedade e cidadania, humanizar o capitalismo e, contudo, superar a pobreza. Tal promessa realiza-se através de atos voluntários e uso da filantropia, reinventados com estruturas empresariais (FALCONER, 1999) e modelos de gestão igualmente empresariais.

Contrapondo Falconer (1999), Cohen e Arato (1992, p. 9) entendem sociedade civil:

como uma esfera da interação social entre economia e o estado, composta acima de tudo das esferas íntimas (especialmente a família), associações (especialmente associações voluntárias), movimentos sociais, e formas de comunicação pública.

Para os referidos autores, a sociedade civil assim definida deixaria de ser vista como rede de instituições, mas ativa como contexto e produto de atores coletivos auto constituídos. Nesse sentido, concebem a sociedade civil como uma nova utopia depois do desencantamento weberiano. Tal utopia expressa-se na ação coletiva dos movimentos sociais, manifestações sinalizadoras da democracia radical.

Para Giddens (2001), a “terceira via” é um modelo econômico entre o estado de bem-estar e que parece mais uma nova “política cognitiva” emanada de um mundo cêntrico decorrente do avanço da globalização, exercendo uma força para baixo, afetando comunidades.5O referido autor entende ser necessário que a sociedade civil e governo atuem juntos com a finalidade de conter tal pressão. Complementa ainda que: “Estado e sociedade civil deveriam agir em parceria, cada um para facilitar a ação do outro, mas também para controla-la” (p. 90), pressupondo que organizações da sociedade civil não seriam autônomas. Sendo assim a tese do estado mínimo está diretamente vinculada a uma visão peculiar da sociedade civil, pressupondo ser ela um mecanismo auto gerador de solidariedade social (GIDDENS, 2001).

5 Bem-estar é um termo que permite diversas interpretações. Na dimensão do bem-estar associado à políticas

públicas e ao desenvolvimento local no contexto brasileiro, o Programa Institutos Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT), coordenado pelo CNPq, elaborou o Índice de Bem-Estar Urbano dos Municípios Brasileiros (IBEU-Municipal), Lançado em setembro de 2016, o referido índice apresenta um levantamento inédito sobre as condições urbanas dos 5.565 municípios brasileiros, a partir da análise de dimensões como mobilidade, condições ambientais urbanas, condições habitacionais, atendimentos de serviços coletivos e infraestrutura. O IBEU-Municipal mostra que entre os maiores desafios do Brasil estão a infraestrutura e os serviços coletivos (RIBEIRO; RIBEIRO, 2016).

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Este pensamento giddeniano remete ao lema da Revolução Francesa: liberdade, igualdade e fraternidade, dando ênfase a fraternidade por ser o sentimento que a sociedade teria de se autodesenvolver, tratar e zelar por aqueles menos afortunados. Diante do exposto afirma Giddens (2001, p. 18):

O Estado tem a obrigação de fornecer bens públicos que os mercados não podem suprir, ou só o podem fazer de maneira fragmentada. Uma forte presença do governo na economia, e também em outros setores da sociedade, é normal e desejável, uma vez que, numa sociedade democrática, o poder público representa a vontade coletiva.

Tal entendimento de Giddens (2001) reforça a ideia de que sociedade civil organizada não prescinde do Estado, pelo contrário deve atuar em parceria e incluir outros atores sociais na tentativa de conduzir uma sociedade mais justa e solidária. Entretanto, Andion e Krieger (2014) explicam que as organizações da sociedade civil, a partir de 1990, passam a atuar em uma esfera pública com mais pluralidade e complexidade. Devido aos múltiplos interlocutores, fruto de processo da democratização e descentralização, e de novos instrumentos jurídicos e institucionais aproximam as OSC, Estado e mercado (ANDION; KRIEGER, 2014).

Diante do exposto, nesta dissertação, as OSCs são consideradas todas aquelas da economia social (LAVILLE, 2001), independente de sua denominação.

1.3 OS MOVIMENTOS DE VOLUNTARIADO NO BRASIL

Dados recentes apontam que 11% dos brasileiros são voluntários e mostram que o Brasil está entre os dez países que com maior número de voluntários, o que representa cerca de 18 milhões de pessoas envolvidas em ações voluntárias (CHARITIES, 2012).

A origem da ação voluntária no Brasil está no ano de 1543, quando foi fundada a primeira Santa Casa de Misericórdia no Brasil, na Vila de Santos, a qual era administrada por padres e freiras da Igreja Católica. O Comitê Internacional da Cruz Vermelha, que surgiu na Itália com a finalidade de prestar assistência médica em áreas de guerrilhas, e ao Brasil em 1908 (BRASIL VOLUNTÁRIO, 2014), mesmo momento histórico em que, na Inglaterra, nascia o movimento escotismo. Esse foi fundado por Baden Powell, oficial do Exército Britânico, com o lema “sempre alerta”, caracterizou-se como um movimento com fins educacionais, formado por voluntários, apartidário e sem fins lucrativos, tendo como proposta o desenvolvimento do jovem, através de um sistema prioritário de valores e honra. Este movimento iniciou no Brasil em 1910 (ESCOTEIROS DO BRASIL, 2014).

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Outro movimento importante que surgiu neste período, em Chicago, foi o Rotary, fundado em 1905 por três amigos advogados com a intenção de reavivar o espírito de amizade nas cidades, promovendo interação social. No Brasil, o primeiro clube de Rotary foi criado em 1923 (Rotary Club do Rio de Janeiro), com a finalidade de realizar ações sociais de combate à fome, em prol do meio ambiente, de prevenção à violência, de alfabetização, de combate ao uso de drogas, com especial atenção à erradicação da poliomielite, serviços à juventude e aos idosos, como campanhas de conscientização sobre a síndrome de imunodeficiência adquirida (SIDA) (ROTARY BRASIL, 2014).

A grandiosidade da organização percebeu-se em 1925, pois haviam mais de dois mil clubes e mais de cem mil associados presente em seis continentes. O Rotary chamou a atenção por sua reputação e atraiu diversas personalidades da época assim como presidentes, primeiros ministros e outros. No Rotary, os associados usam de seus recursos e talentos para assistir as comunidades em que estão inseridos, tal dedicação é representada pelo lema: “Dar de si antes de pensar em si”.

Na esteira destes movimentos, o governo brasileiro reconhece suas utilidades e, em agosto de 1935, promulga a Lei de Declaração de Utilidade Pública, que tem por objetivo regulamentar a colaboração do Estado com as instituições filantrópicas (BRASIL, 1935). Logo em seguida, em 1942, Getúlio Vargas cria a Legião Brasileira de Assistência (LBA), a qual era administrada pelas esposas dos presidentes (“primeiras damas”), que fez a década de 1950 ser reconhecida como a “era damista” (BRASIL VOLUNTÁRIO, 2014).

Em 1953, iniciou no Brasil o movimento “Leonismo no Brasil”, o Lions Club International, que surgiu nos EUA em Chicago no ano de 1917. Foi em uma missão de difundir o “leonismo” na costa do Atlântico que houve a fundação do Lions Club no Rio de Janeiro, liderado por Armando Fajardo. A visão deste movimento é “ser o líder mundial em serviços comunitários e humanitários” e sua missão é: “dar poder aos voluntários para que possam servir suas comunidades e atender às necessidades humanas, fomentar a paz e promover a compreensão mundial através dos Lions clubes” (LIONS CLUBS INTERNATIONAL, 2014).

Outros fatos marcantes na história do voluntariado foram: Fundação Dorina Nowill para Cegos em 1945; Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) em 1954; Centro de Valorização da Vida (CVV) em 1962; do Projeto Rondon em 1967; o surgimento de Organizações Não-Governamentais (ONGs) em 1970 e a criação da Pastoral da Criança, pela Igreja Católica em 1983 (BRASIL VOLUNTÁRIO, 2014).

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Em 1981, surge o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE), liderado pelo sociólogo mineiro Herbert de Souza, também conhecido popularmente como Betinho, cujas ações eram orientadas pelo seguinte pensamento: “Quem tem fome, tem pressa”. O sociólogo Betinho tornou-se símbolo de cidadania no país por sua liderança em campanhas contra a fome. E, em 1993, surgiu um dos movimentos mais importantes do IBASE, a Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida. Este movimento foi baseado no conceito “solidariedade, todos nós podemos”, tendo sua atuação principal no combate a fome no país (AÇÃO DA CIDADANIA, 2014; IBASE, 2014).

Nos anos 1990, grupos de mulheres foram organizados em função da atuação feminina na política, construindo redes de conscientização dos direitos das mulheres e frente de lutas contra discriminações. Outro fato marcante do início da década de 90 foi o movimento dos homossexuais, que ganhou impulso e foram às ruas através de passeatas e protestos, dentro do contexto de uma sociedade machista, estes movimentos tanto feministas quanto homossexual, foram considerados uma novidade histórica (GOHN, 2003).

Gohn (2003) destaca outros três movimentos sociais marcantes que ocorreram no Brasil no início dos anos 90: “dos indígenas, dos funcionários públicos e dos ecologistas” (p. 21). Porém, ao longo desta década, os movimentos populares urbanos perderam forças, diminuindo os protestos nas ruas e a visibilidade na mídia. Tal contexto provoca o deslocamento da atenção da mídia para as ONGs (GOHN, 2003).

O Quadro 1 ilustra a ordem cronológica dos movimentos formados por voluntários no Brasil.

Decorrente da crise econômica brasileira, no governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC), em 1999, viu-se a necessidade de institucionalizar o Conselho da Comunidade Solidária, dando origem à Comunitas, liderada pela primeira dama na época, Ruth Cardoso. A institucionalização deu-se em 1999, por meio do Decreto nº 2.999. Comunitas tem por objetivo continuar as ações promovidas pela Comunidade Solidária, ao programa de combate à pobreza e à exclusão que vigorou nos dois governos de FHC (COMUNITAS, 2014).

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Quadro 1 – Movimentos sociais no Brasil numa perspectiva histórica

Ano de Fundação no Brasil Movimento constituído por voluntários

1543 Santa Casa de Misericórdia

1908 Comitê Internacional Cruz Vermelha

1910 Movimento do Escoteirismo

1923 Rotary Club

1942 Legião Brasileira de Assistência

1945 Fundação Dorina Nowill- Cegos

1953 Lions Club International

1954 APAE

1962 Centro de Valorização da Vida

1967 Projeto Rondon

1981 IBASE

1983 Pastoral da Criança

1990 Movimentos feministas, homossexuais, indígenas, funcionários públicos

e ecologistas

1993 Ação da cidadania contra a fome, a miséria e pela vida

1999 Comunitas – Comunidade Solitária

2000 Declaração do Milênio

Fonte: A autora (2016).

Também em 1999 foi promulgada a lei regulamentadora das Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs), a Lei n. 9.790, de 23 de março (BRASIL, 2014) e, no ano de 2000, foi assinada por 189 nações, a Declaração do Milênio, um compromisso em combater a extrema pobreza e outros males da sociedade. Tal declaração tem como promessa a concretização de “8 Objetivos de Desenvolvimento do Milênio – ODM”, a serem alcançados até por meio de voluntariados e parcerias governamentais (PNUD, 2014), remetendo a utopia de bem-estar social (PEREIRA, 2012).

Na Figura 3 estão representados, tais objetivos, cujo prazo de realização foi o ano de 2015.

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Figura 3 – Os objetivos de desenvolvimento do milênio.

Fonte: PNUD, 2014.

Como ação estratégica para atingimento destes oito objetivos, a ONU declarou 2001 o Ano Internacional do Voluntário, cujo objetivo foi incentivar o serviço voluntário mobilizando 123 países. O propósito maior foi construir a consciência de solidariedade como sinônimo de ser voluntário (ONU, 2014).

Essa revisão histórica dos movimentos da sociedade civil no Brasil é relevante para compreender o voluntariado não como um movimento único do mundo contemporâneo. Solidariedade é compreendida a partir de Durkheim (1999), que considera-a um princípio da integração social constituído através do equilíbrio e da coesão social para o bom funcionamento da sociedade, mas pode ser expressa teoricamente a partir de diferentes termos, como aponta Araújo (2005): responsabilidade social, voluntariado, caridade, filantropia, outros. O certo é que, no contexto da sociedade brasileira, há diversidade de práticas de voluntariado e uma das justificativas encontradas para o número de voluntários é de que as pessoas procuram o serviço social para melhor preparar-se para o mercado de trabalho (DOHME, 2001).

Se, por um lado, o olhar de Dohme (2001) sobre o voluntariado é positivo e conservador, de um comportamento de amor ao próximo e sentimento de caridade, tornando inquestionável as boas e verdadeiras realizações solidárias, por outro lado, a ação voluntária tem sido permeada por motivos egoístas e não configura-se como uma ação desinteressada tanto de empresas (GARAY, 2001) quanto dos atores sociais (GARAY; MAZZILLI, 2003).

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Caldana e Figueiredo (2008) defendem que voluntariado não gera valor monetário para o indivíduo que o exerce, porém resulta na agregação de valores para o sistema metabólico capitalista. Sendo assim, não há possibilidades de desvincular voluntários de trabalhadores, pois tais trocas solidárias e autogeridas exigem que o modelo capitalista vigente de trabalho seja superado. A respeito, afirma Morin (2001), o trabalho precisa comportar interesses humanos, relações sociais permeadas por trocas simbólicas de forma a torná-lo com significado na vida daquele que o realiza.

No ano de 2015, os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística –IBGE, apontaram que 1,4% do Produto Interno Bruto (PIB) foi gerado por organizações da sociedade civil, o equivale, em moeda nacional corrente, a R$ 32 bilhões; até então não é considerado um setor “econômico”. O número de OSCs, o número de voluntários que se propõe a administrar e/ou doar seu tempo às OSCs e o volume de recursos gerados por movimentos sociais crescem continuamente, configurando-se num fenômeno social que requer atenção especial dos gestores e pesquisadores.

Então, nesta dissertação assume-se que as OSCs são formadas por atores sociais, sendo a maioria denominada voluntário, originalmente criadas para atuarem como espaços de filantropias e economia social em prol de comunidades carentes e realização de causas humanitárias.

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2 REFERENCIAL TEÓRICO

A fundamentação teórica desta Dissertação constitui-se no objeto deste capítulo. O mesmo está dividido em três seções. A primeira apresenta a Sociologia Pragmática, seus fundamentos e contornos teóricos. A segunda seção versa sobre os atores sociais como voluntários, com ênfase no elo com a sociedade civil organizada e a forma como estabelece relações. Na terceira seção, disserta-se sobre o comportamento humano, os motivos para exercer o voluntariado, desvelando que, para estudar os fatores comportamentais dos voluntários, não é possível seguir apenas uma teoria ou perspectiva teórica, mas de que há complementaridade entre os elementos do comportamento humano planejado e da ação racionalizada, fundamentais para os estudos dos fatores comportamentais dos voluntários.

2.1 SOCIOLOGIA PRAGMÁTICA

A Sociologia Pragmática é também conhecida como Economia das Grandezas, Sociologia da Crítica, Teoria da Capacidade Crítica, Teoria das Grandezas e, inclusive, Escola ou Economia das Convenções. Os resultados destes estudos constituem parte da escola francesa de sociologia (KARAM; SERVA, 2014), cuja opção teórica traz a representatividade de uma teoria da ação, colocando as práticas constitutivas da situação no centro da análise.

Situa-se epistemologicamente entre a hermenêutica e a fenomenologia, do pragmatismo e do interacionismo simbólico, da teoria dos atos de linguagem e da etnometodologia (VANDENBERGUE, 2006). A Sociologia Pragmática se encaixa, cronologicamente, após Pierre Bourdieu, no campo da sociologia francesa (KRIEGER, 2011), com a pretensão de retificar a Sociologia Crítica de Pierre Bourdieu, sendo uma reação alternativa desta teoria sociológica em busca dos princípios e valores que dão sentido à ação (SILBER, 2003; KRIEGER 2011).

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Nas palavras de Vandenbergue (2006, p. 329-330), a Sociologia Pragmática:

rompe com o “paradigma do desvelamento” dos mestres da suspeição (Marx, Nietzsche, Freud) para se ligar ao paradigma da interpretação dos hermeneutas e dos fenomenólogos, recusando invocar os mecanismos sociais e as forças inconscientes que determinariam o ator, sem ele saber, e explicariam suas ações. A sociologia da justificação apreende o ser humano como um ser livre (als freihandelndes Wesen) e religa o ponto de vista da antropologia pragmática de Kant, insistindo mais sobre o que o ser humano faz do que sobre o que é feito dele. Diferentemente da sociologia crítica, ela toma seriamente os discursos, os princípios e os valores legitimadores que dão um sentido à ação, sem ver aí ilusões bem fundadas que, em nome de um conhecimento superior, em nome da Ciência, seria necessário submeter à crítica. Contrariamente à cidade tridimensional da dominação, a cidade bidimensional da justificação é uma cidade sem estruturas profundas a desvelar e sem ilusões a dissipar.

Silber (2003) afirma que uma característica essencial da Sociologia Pragmática é a atenção prestada à falta peculiar de acordos duradouros, o que levaria os indivíduos a terem necessidades de se auto justificarem e participarem de ações rotineiras ou situações intensas de disputas e conflitos (KRIEGER, 2011; KARAM, 2014).

Partindo do princípio das abordagens objetivistas e clássicas da sociologia, que compreendem os atores sociais como “desprovidos de juízo mental” e não como atores com capacidades de reflexão e discernimento, a Sociologia Pragmática recusa a ideia separatória do ponto de vista objetivista do cientista social e a perspectiva descuidada dos atores sociais (VANDENBERGUE, 2006).

A Sociologia Pragmática vê os atores sociais com capacidade de reflexão e inclusive de afastamento da realidade, a fim de desenvolver um pensamento crítico sobre aquele universo o qual está inserido. Tal capacidade deve ser levada em consideração se o objetivo for compreender o modo como os membros da sociedade questionam e criticam instituições, entram em discussões ou concentram-se para um acordo (THEVÉNOT, 1998).

Boltanski e Thévenot (1991) explicam como os atores sociais justificam suas ações, dando destaque a disputas, desacordos e acordos cotidianos da sociedade. Em dado instante, que os atores apresentam críticas e defendem uma posição específica, surgem as controversas, disputas e possíveis desacordos, que quando superados originam acordos de práticas sociais.

No centro da Sociologia Pragmática surge um modelo de análise dos regimes desta teorização (regime de familiaridade, regime de ação planejada e regime de justificação), proposto por Thévenot (2001) e dividido em três hélices explicativas, as quais foram sistematizadas por Karam e Serva (2014) como sendo:

Hélice 1 – O indivíduo é definido através dos regimes pragmáticos que consolidam suas relações com seu ambiente humano e material, desde a dimensão mais profunda até a mais pública de legitimação;

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Hélice 2 – A coordenação do método da ação resulta em uma racionalidade “interpretativa”, além da “calculativa”, para responder à perspectiva do enredamento;

Hélice 3 – A observação do papel dos valores sociais e outras noções de bem comum, na coordenação da ação, não podem reduzir-se a prioridades individuais, e sim deverá fornecer um quadro analítico para convergir os legítimos compromissos. As ações justificáveis são o centro de análise para Boltanski e Thévenot (2006). Os autores defendem que as pessoas não inventam pretextos falsos para ações, ao contrário, as pessoas legitimam suas ações através do teste de justificação. Os processos violentos e tirânicos não estão no centro de estudo da Sociologia Pragmática, porque nestes casos não há justificação (BOLTANSKI; THÉVENOT, 2006; KARAM, 2014).

Boltanski e Thévenot (2006), com intenção de explicar a maneira como os humanos realizam acordos e justificam suas ações, vão além da divisão clássica entre a “sociologia do fenômeno coletivo (na qual se inscreve a corrente institucional[...]) e a lógica da economia neoclássica (na qual se inscreve a corrente estratégica)” (KRIEGER, 2011, p. 63). Os referidos estudiosos acreditam que o reducionismo aplicado a essas duas leituras modifica o significado da regra adotada para estabelecer acordos e o modo dessa construção se relaciona diretamente a pessoas particulares (BOLTANSKI; THÉVENOT, 2006).

Ainda, afirmam, todos convivem sob a autoridade da justificação, ou seja, para haver a edificação de acordos entre os indivíduos, os mesmos devem justificar suas escolhas e ações, legitimando o acordo. Este imperativo de justificação concerne a possibilidade de coordenação do estado comportamental humano e esta coordenação é considerada o primeiro pilar da legitimidade. Entende-se legitimidade como fenômeno construído e originado na interseção desses dois movimentos que se influenciam reciprocamente: o dos atores (indivíduos, organizações, stakeholders, voluntários) e da estrutura (regras, valores e crenças da sociedade) (BOLTANSKI; THÉVENOT, 2006; KRIEGER, 2011; KARAM, 2014).

O foco central das pesquisas está nos acordos em situações controversas, nas habilidades do ser humano em construir associações e de entrar em acordos com base em generalidades (BOLTANSKI; THÉVENOT, 2006). E quando os atores sociais não chegam ao consenso, buscam entendimento para condições da decisão a ser tomada, o que eleva uma decisão (ou acordo) a um princípio comum que determina as relações de equivalência. Tal processo de busca pelo princípio comum é infinita, porém ao procurar um princípio, tais disputas transformam-se em generalidades (BOLTANSKI; THÉVENOT, 2006; KARAM, 2014), que vão ao encontro de explicações pela perspectiva da teoria da justificação.

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