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O direito ao esquecimento como tutela da personalidade do indivíduo que deseja ser esquecido na sociedade de informação

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Academic year: 2021

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CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

DEPARTAMENTO DE DIREITO

GABRIELA NECKEL RAMOS

O DIREITO AO ESQUECIMENTO COMO TUTELA DA

PERSONALIDADE DO INDIVÍDUO QUE DESEJA SER ESQUECIDO

NA SOCIEDADE DE INFORMAÇÃO

Florianópolis 2019

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Gabriela Neckel Ramos

O DIREITO AO ESQUECIMENTO COMO TUTELA DA

PERSONALIDADE DO INDIVÍDUO QUE DESEJA SER ESQUECIDO

NA SOCIEDADE DE INFORMAÇÃO

Trabalho Conclusão do Curso de Graduação em Direito do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Santa Catarina como requisito para a obtenção do Título de Bacharela em Direito.

Orientador: Prof. Dr. Mikhail Vieira de Lorenzi Cancelier

Florianópolis 2019

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CENTRO DE CIÊNCIAS füRÍDICAS

COLEGIADO DO CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

TERMO DE APROVAÇÃO

O presente Trabalho de Conclusão de Curso, intitulado "O direito ao esquecimento como tutela da personalidade do indivíduo que deseja ser esquecido na sociedade de informação", elaborado pelo(a) acadêmico(a) "Gabriela Neckel Ramos" , defendido em 04/07/2019 e aprovado pela Banca Examinadm;a composta pelos membros abaixo assinados, obteve aprovação com nota

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cumprindo o requisito legal previsto no art. 1 O da · Resolução nº 09/2004/CES/CNE, regulamentado pela Universidade Federal de Santa Catarina, através da Resolução nº O 1/CCGD/CCJ/2014.

Florianópolis, 04 de julho de 2019

Prof. Dr. Mik~' , · · ifa de Lorenzi Cancelier

ssor Orientador

ue Lima Reinig o e Ban a

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Centro de Ciências Jurídicas

COORDENADORIA DO CURSO DE DIREITO

TERMO DE RESPONSABILIDADE PELO INEDITISMO DO TCC E ORIENTAÇÃO IDEOLÓGICA

Aluno(a):Gabriela Neckel Ramos RG: 4.228.245-4

CPF: 098.245.879-77 Matrícula: 14200157

Título do TCC: "O direito ao esquecimento como tutela da personalidade do indivíduo que deseja ser esquecido na sociedade de informação"

Orientador(a): Prof. Dr. Mikhail Vieira de Lorenzi Cancelier

Eu,Gabriela Neckel Ramos , acima qualificado(a) ; venho, pelo presente termo, assumir integral responsabilidade pela originalidade e conteúdo ideológico apresentado no TCC de minha autoria, acima referido

Florianópolis, 04 de julho de 2019.

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Dedico este trabalho aos meus maiores amores, Adriane, Valmor, Beatriz, Lucas e Princesa.

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AGRADECIMENTOS

Inicialmente, gostaria de agradecer aos meus pais, Valmor e Adriane, que são a minha essência. Agradeço por terem me “ensinado a pensar”, por terem me formado como pessoa e serem “daqueles pais” que tirariam a própria roupa para os filhos vestirem. Agradeço pela doação diária ao longo da minha vida para que eu pudesse alcançar os meus objetivos e por torcerem por mim mais do que quaisquer outras pessoas. Agradeço por todas as vezes que me olharam com orgulho nos olhos, mesmo quando eu estava chorando por ter achado que fracassei, porque vocês viam ali uma vontade de vencer e até isso os orgulhava. Vocês me deram tudo. Obrigada.

Agradeço também àquela que é a pessoa mais paciente e mais companheira de todas, talvez até sem perceber, minha irmã Beatriz. Agradeço por dividir o que é mais difícil de dividir, o espaço onde se vive, mas não só comigo, com todos os meus livros, meus cadernos, meus rascunhos e minha bagunça. Agradeço por me dar segurança, a sua presença me faz sentir tranquila e me permite ter as melhores noites de sono. Obrigada por todas as vezes que mesmo atrapalhando seus planos, você compreendeu quando eu precisava dormir um pouco mais, ou quando eu simplesmente tinha que ir dormir de madrugada e te acordava. Obrigada por estar comigo e sempre se fazer presente independente de qualquer coisa. Você, pra mim, é o verdadeiro significado de amor.

Ao meu amor, Lucas, agradeço por ter passado por todos os momentos da graduação comigo, desde o cursinho, até o TCC e em breve a formatura. Agradeço por toda a sua compreensão, por todas as vezes que você entendeu a minha ausência quando eu precisava estudar, por todas as vezes que você ficou trancado em casa para eu concluir o TCC e também, pelos dias em que você me “arrastou” para fora de casa para eu não enlouquecer. Obrigada por ser o meu oposto e ser um sopro de calmaria dos meus dias. Obrigada por me dizer todos os dias que “eu sempre dou conta” que “tudo vai dar certo” e o quanto você sente orgulho de mim. Obrigada por ter aguentado todos os finais de semestre, mesmo reclamando que eu sumia, apoiando essa minha loucura por estudar e fazer tudo ao mesmo tempo. Você é meu refúgio, minha paz, meu equilíbrio, obrigada.

À minha melhor amiga, Gabrielli, agradeço por estar comigo nestes últimos 13 anos, agradeço por ter permanecido ao meu lado. Obrigada por me proporcionar essa amizade aonde reciprocidade é a palavra de ordem, em que nós torcemos muito uma pela outra e cuidamos uma da outra. Obrigada por estar presente em todos os momentos, porque quando

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eu penso na minha caminhada até aqui, vejo você em cada passo. Você é minha família, obrigada.

Não posso deixar de agradecer às duas pessoas que passaram os últimos 5 anos comigo, convivendo, sofrendo com as provas, rindo com as coisas mais banais e demonstrando apoio, Amanda e Joana. Obrigada por todos os cadernos trocados, todos os plantões de dúvidas pré-prova “via whats”, pelas provas que fizemos juntas achando que não sabíamos nada e no final íamos bem. Obrigada pelas manhãs de EMAJ que eu passava com vocês, obrigada pelos cafés e obrigada por serem as melhores duplas e grupo de trabalho do mundo. Obrigada pelas risadas obrigada pelo carinho, obrigada por terem feito cada dia dessa graduação um momento divertido, vou sentir muita falta dos nossos dias. Vocês são, sem dúvida, o maior presente que levarei do CCJ.

Agradeço também ao Professor Mikhail, meu orientador. Não posso deixar de mencionar como a sua orientação e seu conhecimento que me foram essenciais, sou muito grata pelo trabalho que o Professor se propôs a realizar comigo. Mas agradeço também, por ter me acompanhado durante a graduação, por ter sido meu primeiro professor de Direito Civil e ter me apresentado esse gosto pela temática que me acompanha até hoje, resultando neste trabalho. Obrigada também por todo o apoio ao longo da graduação, pois sempre foi muito acessível e atencioso, me emprestando materiais e estando disponível para ajudar. O Professor foi essencial na minha caminhada, muito obrigada.

Ao Professor Guilherme, membro da banca e meu Professor orientador na Monitoria da disciplina de Direito Civil – Contratos, os meus agradecimentos por ter me proporcionado essa oportunidade de aprendizado e contato com os alunos que foi muito especial. Muito obrigada, pela condução do processo de aprendizagem de uma maneira que nos permitia participar efetivamente das atividades, isso foi engrandecedor. Participar das suas aulas, inicialmente como aluna e depois como monitora, foi um privilégio.

Agradeço também à Dra Lucilene dos Santos e “meninas do gabinete”, Ana Luiza, Ananda, Thaylane e Clara que dividiram comigo este último ano. À Dra Lucilene agradeço por sempre nos incentivar a estudar, aprender e estar sempre disposta a repassar seus conhecimentos, sendo muito presente e atenciosa. Às meninas agradeço pelos dias que compartilhamos, pelo ambiente maravilhoso de trabalho, pelo conhecimento adquirido e por terem vivido comigo esse último período da Universidade tão intensamente, vocês foram essenciais. Obrigada.

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RESUMO

Os direitos da personalidade são aqueles ínsitos à pessoa humana, tendo em vista seus aspectos físicos, morais e psicológicos, bem como suas projeções sociais. Pretendem os direitos da personalidade, a proteção da pessoa em si, garantindo um conjunto de atributos indispensáveis ao desenvolvimento dos seres humanos. O Código Civil de 2002 traz um capítulo para tratar especificamente destes direitos. Dentre os direitos da personalidade está o direito à privacidade, que à luz do direito da privacidade inicialmente foi pensado apenas como um dever de abstenção de terceiros de adentrar a esfera privada de um indivíduo. Com o desenvolvimento das tecnologias e a consequente transformação social o direito à privacidade transformou-se e surgiu um aspecto positivo, que consiste na possibilidade de realizar um controle sobre as informações pessoais que chegam ao conhecimento de terceiros. É também com o desenvolvimento das tecnologias que surgem institutos como o direito ao esquecimento. Este é o direito do indivíduo de não querer ser lembrado ou vinculado, na atualidade, a fatos pretéritos que possam lhe causar dano. Contudo, é instituto controverso, existindo divergências sobre seu conceito, sobre o bem jurídico que tutela, sobre sua origem e até mesmo sobre a sua existência. Entende-se o direito ao esquecimento como um direito autônomo que busca proteger a memória individual, apresentando como característica principal o decurso do tempo. Esse instituto jurídico se relaciona com os direitos da personalidade, mas com eles não se confunde, adquirindo autonomia diante da dignidade da pessoa humana. A pesquisa foi realizada através do método dedutivo, utilizando-se das ferramentas de revisão bibliográfica e análise jurisprudencial, para após verificados os principais delineamentos sobre o instituto, verificar-se na prática como tem ocorrido a sua aplicação.

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ABSTRACT

The rights of the personality are those inherent to the human person, considering their physical, moral and psychological aspects, as well as its social projections. The rights of personality claim to protect the person, guaranteeing a set of attributes indispensable to the development of the human beings. The Civil Code of 2002 contains a chapter dedicated to these rights. Among the rights of the personality is the right of privacy that was initially conceiveid as a duty of abstention of third parties to enter the private sphere of an individual. As the technologies developed, a social transformation happened and the right to privacy has changed. From this change a positive aspect has arisen, which is the possibility of controlling personal information that comes to public. It is also with the development of technologies that arise institutes such as the right to be forgotten. This is the right of the individual to be left alone in the present, not remembering or being attached to the past that may cause him harm. However, it is a controversial institute, and there are divergences about its concept, its legal bases, its origin and even its existence. The right to be forgotten is an autonomous right that protects the individual memory, presenting as main characteristic the course of time. This legal institute is related to the rights of personality, but they should not be confused, since the right to be forgotten acquired autonomy based on the principle of human dignity. The research was carried out through the deductive method, using the tools of bibliographic review and jurisprudential analysis, after verifying the main delineations about the institute, verify in practice how its application has occurred. The research was carried out through the deductive method, using the tools of bibliographic review and jurisprudential analysis, after verifying the main delineations about the institute, to compare with how it has been applied.

Keywords: Rights of personality. Right to privacy. Right to be forgotten.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Resultado classificação temática acórdãos STJ ... 54

Figura 2 – Resultado classificação temática acórdãos STF ... 55

Figura 3 – Divisão temática dentre os acórdãos analisados ... 56

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Art. – Artigo

STF – Supremo Tribunal Federal STJ – Superior Tributal De Justiça Nº - Número

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 13

2 DIREITOS DA PERSONALIDADE NA SOCIEDADE DE INFORMAÇÃO .. 15

2.1 HISTÓRICO ... 15

2.2 ASPECTOS GERAIS DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE ... 20

2.3 DIREITO À PRIVACIDADE ... 27

3 DIREITO AO ESQUECIMENTO ... 32

3.1 HISTÓRICO ... 32

3.2 CONTORNOS DO DIREITO AO ESQUECIMENTO ... 39

3.3 CORRENTES SOBRE DIREITO AO ESQUECIMENTO: DO DIREITO AUTÔNOMO À INEXISTÊNCIA DE UM DIREITO ... 46

4 ANÁLISE DA JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SUPERIORES ... 52

4.1 LEVANTAMENTO DO BANCO DE DADOS ... 53

4.2 APRESENTAÇÃO DOS CASOS E VERIFICAÇÃO DOS CONCEITOS APLICADOS PELO STJ E STF ... 58

4.3 ANÁLISE DOS CONCEITOS E FUNDAMENTAÇÃO DOS JULGADOS ... 72

5 CONCLUSÃO ... 75

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1 INTRODUÇÃO

A memória do ser humano é biologicamente limitada, portanto são os fatos fadados ao esquecimento. Contudo, ao adentrarmos neste século, com o desenvolvimento da tecnologia e surgimento da internet, esta lógica se inverte e a eterna lembrança torna-se a nova ordem natural. Uma vez publicado, fica disponível online indefinidamente. Eis o contexto em que surge o direito ao esquecimento.

O direito ao esquecimento é instituto jurídico que tem origem no exterior do Brasil e não possui regulamentação expressa no ordenamento jurídico pátrio, apesar de se encontrar a sua aplicação fundamentada na Constituição Federal, no Código Civil, no Código de Defesa do Consumidor, no Código Penal, no Marco Civil da Internet e na Lei Proteção de Dados Pessoais. Importante ressalvar que não se trata de instituto jurídico que se limita à internet, mas a todas as mídias, sejam analógicas ou digitais.

Por ser instituto novo aos olhos dos nossos juristas, sua aceitação e aplicação no país tem sido objeto de grandes discussões. A doutrina debruça-se amplamente sobre o estudo do tema, contudo a sua delimitação e seus atributos tem se definido majoritariamente na jurisprudência, onde se observam os grandes casos emblemáticos.

Diante da grande volatilidade do direito ao esquecimento, há grande dificuldade em se determinar o seu conceito, seus limites, o bem jurídico que tutela, bem como sua aplicação e as consequências da violação deste direito. Mais ainda, diversos são os pedidos que tem sido levados ao judiciário, sob o manto da expressão do direito ao esquecimento sem que de fato haja um entendimento sobre o que realmente é este direito.

Assim, a justificativa desta pesquisa, encontra-se na necessidade de se compreender quais as características essenciais do direito ao esquecimento. Mais do que compreender a sua aplicação, é necessário entender a sua essência e qual bem jurídico visa tutelar, para entender o seu status no ordenamento jurídico brasileiro, especificamente no âmbito dos direitos da personalidade.

Já na doutrina, à primeira vista, majoritariamente há posicionamento no sentido de que seria o direito ao esquecimento instituto decorrente do direito à privacidade, porquanto estaria destinado a impedir que um determinado fato pretérito causasse danos a pessoa por ser

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vinculado à ela de maneira descontextualizada. Contudo, o consenso sobre este conceito está longe de ser alcançado, o que motiva este estudo.

A hipótese principal que direcionou esta pesquisa é que o direito ao esquecimento é instituto jurídico autônomo, porquanto é direito complexo, que abrange bens jurídicos tutelados por alguns dos direitos da personalidade, vez que consiste no direito da pessoa de ser deixada em paz, desvinculada de fatos pretéritos, ou simplesmente não ser vinculada eternamente a uma memória e ao ocorrer a violação deste direito, a depender do caso concreto, poderá atingir um dos diversos aspectos da personalidade.

O método utilizado é o dedutivo, além dos procedimentos de revisão bibliográfica, para levantamento dos estudos já elaborados sobre o tema, bem como estudo de caso, para análise jurisprudencial dos julgados encontrados nos Tribunais Superiores com base nos conceitos e referenciais teóricos analisados sobre o direito ao esquecimento.

Para que seja possível traçar um caminho claro e um entendimento bem delineado sobre o instituto do direito ao esquecimento e sua relação com o ordenamento jurídico brasileiro é necessário compreender os direitos da personalidade, bem como o desenvolvimento do próprio direito ao esquecimento no direito internacional e por fim, necessário observar, em contraposição a discussão doutrinária apresentada, o que a jurisprudência dos Tribunais Superiores tem fixado.

Assim, se constrói esta pesquisa. Inicialmente perpassando pelo histórico, conceito e características dos direitos da personalidade, aprofundando-se no direito à privacidade, tendo em vista que se busca verificar eventual relação entre este e o direito ao esquecimento.

No segundo capítulo, se observa o desenvolvimento do direito ao esquecimento, majoritariamente na jurisprudência, posteriormente passando a análise da discussão doutrinária que ocorre no Brasil.

Por fim, no terceiro capítulo, passa a se analisar os conceitos de direito ao esquecimento que foram aplicados aos casos práticos. Importante, pontuar que não se trata de uma verificação do posicionamento dos Tribunais Superiores, mas sim, das construções dogmáticas e raciocínios jurídicos que se pode extrair de seus acórdãos.

Em suma, o objetivo geral do trabalho é verificar se o direito ao esquecimento no âmbito dos direitos da personalidade, como direito de ser deixado em paz, desvinculado de fatos pretéritos, ou simplesmente não ser vinculado eternamente a uma memória, é instituto jurídico autônomo ou decorrente do direito à privacidade.

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2 DIREITOS DA PERSONALIDADE NA SOCIEDADE DE INFORMAÇÃO

Os direitos da personalidade, como aqueles que trazem eu seu cerne a pessoa humana e suas projeções, tornam-se essenciais para o desenvolvimento da pesquisa, porquanto busca-se compreender a relação entre esta categoria e o direito ao esquecimento. Para tanto, neste capítulo será abordado de maneira mais atenta o conceito, características destes direitos e por fim, do direto à privacidade, tendo em vista que existe corrente doutrinária que entende ser o direito ao esquecimento uma faceta deste direito.

2.1 HISTÓRICO

As origens dos direitos de personalidade podem remeter a variados períodos históricos, sendo uma construção que se deu, diante da própria evolução da história. Por serem direitos relacionados ao ser humano, nada mais natural que exista um vínculo entre o desenvolvimento desta categoria jurídica e o contexto no qual estava inserida ao longo do tempo.

Assim, autores como Glanz (2010) indicam que o primeiro direito a proteger a personalidade foi o “direito bíblico” que determinava nos mandamentos: “Não matarás”. Outros chegam a afirmar que na Antiguidade já era possível verificar alguns traços dos direitos da personalidade na Lei de Talião, Código de Hammurabi quando buscam proteger o direito à vida, bem como também estão presentes esses rudimentos nas sociedades gregas e romanas (CONSALTER, 2017, p. 28).

Mais ainda, há quem defenda que a origem dos direitos de personalidade se encontre na “hybris grega” e na “iniura romana” (SZANIAWSKI, 2005, p. 23). Em verdade, grande foi a contribuição dos gregos que passaram a entender a pessoa como finalidade do direito, desenvolvendo o embrião do direito natural que seria posteriormente retomado pelo movimento naturalista que teve grande influência nas declarações de direitos e na construção dos direitos da personalidade como os conhecemos (ZANINI, 2009).

Por sua vez, os romanos entendiam que um indivíduo para ter capacidade jurídica plena precisaria ser homem livre (status libertatis), ser cidadão romano (status civitatis) e ter a condição de pater famílias (status familiae) (ZANINI, 2009). Naquela sociedade a tutela da

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personalidade se dava por meio de manifestações isoladas, sendo protegidas pela actio iniuriarum, que originalmente tutelava ofensas cometidas à vida e à integridade física, mas que, posteriormente, passou a tutelar também casos de injúria (SZANIAWSKI, 2005, p. 32). Ou seja, a partir disso, observamos que a tutela dada a estes direitos que ultrapassa o aspecto material, protegendo elementos essenciais da personalidade humana (ZANINI, 2009).

Já na Idade Média, diversas foram as transformações, inclusive ocorrendo a queda do Império Romano e as invasões bárbaras, o que levou a uma grande mudança na estrutura social, firmando-se o sistema feudal e ascendendo a doutrina cristã (CONSALTER, 2017, p. 33).

Diante desta estrutura feudal e grande divisão em reinos independentes politicamente, o direito era oral e variava de região para região. Porém, ocorreu a conversão dos bárbaros ao catolicismo, que tinha grande como base o antigo direito romano, propagando o direito canônico (ZANINI, 2009).

Por esse motivo, ao longo deste período direito e religião permaneceram entrelaçados, inclusive, desenvolvendo-se a ideia de dignidade a partir da “da concepção cristã de pessoa como uma substância racional e no princípio da imortalidade de alma e ressureição do corpo” (SZANIAWSKI, 2005, p. 36).

Apresenta-se também, a partir do pensamento de São Tomás de Aquino, a ideia de que a racionalidade do homem era pressuposto da sua dignidade e liberdade, eis que, de acordo com a doutrina cristã a pessoa teria livre arbítrio para escolher a maneira de se portar e se o fizesse de maneira correta encontraria a salvação (CONSALTER, 2017, p. 34-36).

Posteriormente, em um momento em que se percebe o declínio da estrutura feudal, surge a burguesia, o capitalismo e ocorre a formação do estado nacional soberano, simbolizado pelo monarca absoluto (ZANINI, 2009). Ainda, explica o autor (2009), que é neste contexto iniciam-se as grandes navegações e surge o renascimento que trazia o Humanismo como seu centro.

O Humanismo, foi desenvolvimento pela Escola de Direito natural que surgiu neste período, levando a reflexões sobre a condição do homem e suas relações com os demais indivíduos e com a sociedade política (SZANIAWSKI, 2005, p. 38). Essas reflexões introduzem o homem como o fim e responsável por si mesmo, assim explica Zanini (2009)

Com o Humanismo o homem acaba se tornando responsável por si mesmo e não mais subordinado à vontade divina, ou seja, abre-se o mundo à intervenção do homem, que passa a ter como princípios fundamentais a tolerância, a não violência e a liberdade de consciência.

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Contudo, é com o liberalismo, surgido na Inglaterra, que a proteção da pessoa humana é reconhecida pelo Estado, pois se instalou uma monarquia constitucional decorrente da revolução dos barões contra o Rei João Sem Terra (SZANIAWSKI, 2005, p. 39).

No contexto de desenvolvimento da Escola de Direito Natural e do jusnaturalismo, desenvolve-se a doutrina contratualista que explica a origem do Estado na celebração de um pacto baseado na vontade geral, que representa “a união de vontades de cada indivíduo isoladamente”, de modo que ao tornar as pessoas a base da sociedade, pois seria torna-se essencial para a manutenção do próprio Estado a proteção dos indivíduo (CONSALTER, 2017, p. 39).

Ainda, ao final do século XVIII se estabelece na Inglaterra uma monarquia legal fundamento na “tripartição do poder, no sistema representativo, na preeminência da opinião nacional e na intangibilidade dos direitos fundamentais do homem” (SZANIAWSKI, 2005, p. 39).

Conforme explica Szaniawski (2005, p. 39-40) o liberalismo Inglês foi levado para a América do Norte e aplicado em declarações de direito, como a Declaração da Colônia de Virgínia e a Declaração de Independências das Treze Colônias Inglesas. Já na Europa o destaque ficou para a França com a Revolução Francesa, e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, com base liberal e individualista.

Não se pode deixar de mencionar que diante do contexto histórico no qual a burguesia ganhava força e surgia o capitalismo, garantir a liberdade era de suma importância, para que fosse possível também a liberdade econômica. Neste sentido explica Doneda (2005) que o surgimento das declarações de direitos ocorreu, para proteger o indivíduo do Estado, de modo a propiciar um contexto social que desse suporte ao novo modelo sócio-econômico.

Ainda, ressalta Consalter (2017, p. 45) que “o conteúdo exacerbadamente individualista proveniente do pensar advindo da Revolução Francesa, traço que passou a ser marcante no ambiente jurídico dali em diante no mundo ocidental.”.

A partir disto, desenvolveu-se no século XIX um direito que influenciado pela concepção jusracionalista e iluminista, tinha como fundamento o pensamento racional, eis que se passa a falar em racionalismo jurídico como base do Estado. Coloca-se o indivíduo como interesse central do ordenamento jurídico e o positivismo jurídico a partir da ideia de um direito civil sistematizado e codificado (SZANIAWSKI, 2005, p. 41-42).

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Aqui se vislumbra a diferenciação entre direitos públicos e privados da personalidade, conforme explica Zanini (2009)

Ainda por influência do positivismo jurídico e da teoria dos direitos inatos, passou-se a conceber a tutela do homem e de sua personalidade em dois grandes ramos, ou seja, os direitos públicos da personalidade e os diretos privados da personalidade, sendo certo que os primeiros estariam previstos nas declarações de direitos e nas constituições, garantindo a defesa da pessoa contra atentados do próprio Estado; já os do segundo grupo eram aplicados nas relações entre particulares, nos casos de atentados por um sujeito privado contra algum atributo da personalidade de outro.

Ao final do século XIX ocorreu a Revolução Industrial que transformou de maneira profunda a estrutura social da época, cria-se uma nova classe social, levando a concentração maior de pessoas nas grandes cidades, ocorre a concentração de capital na mão das empresas, bem como há maior reunião de poder por parte de Estado e sua intervenção no domínio econômico (ZANINI, 2009).

Diante de todas as transformações ocorridas no século XIX, a sociedade do século XX é marcada por uma maior complexidade das relações privadas (DONEDA, 2005), bem como pelo surgimento constituições com grande preocupação social, como a Constituição Mexicana (1917) e a Constituição de Weimer (1919), que consolidaram os direitos econômicos, sociais e culturais, chamados de direitos de segunda geração (ZANINI, 2009).

Ainda, são marcos deste período o Código Alemão de 1900, que reconheceu 6 direitos de personalidade, sendo estes: a vida, o nome, o corpo, a saúde, a liberdade, direito à honra (MATTIA, 1977). Posteriormente em 1907, o Código Civil suíço apresenta medidas de proteção ao nome da pessoa, portanto, proteção de direito da personalidade (CONSALTER, 2017, p. 47).

Contudo, é no Código Civil Italiano (1942), que os direitos da personalidade são sistematizados da maneira bastante ampla, mais ainda, contando com aspectos inovadores “em relação aos atos de disposição do próprio corpo (art. 5º) e à repressão aos abusos de exposição e publicação da imagem das pessoas (art. 10)” (GOMES, 1966).

Conforme explica Doneda (2005) diante dos acontecimentos na Segunda Guerra Mundial desenvolveram-se os direitos da personalidade conforme os conhecemos hoje, buscando garantir um mínimo essencial que possibilitasse o desenvolvimento da pessoa. Poucos anos depois, a Carta de São Francisco (1948) consagra os direitos da personalidade no âmbito internacional (MATTIA, 1977).

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No mesmo ano foi proclamada a Declaração Universal dos Direitos do Homem1, sendo que esta serviu posteriormente como modelo para outras declarações, dentre elas a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969) (ZANINI, 2009). Ainda, foi promulgada a Convenção Europeia dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, que trazia o respeito à vida, à liberdade e à segurança dos homens em seu cerne (CONSALTER, 2017, p. 49).

Não de maneira independente, mas sim sofrendo influências de instrumentos internacionais, os direitos e garantias individuais passam a desenvolver-se também nas Constituições brasileiras. Como explica Consalter (2017, p. 51-54), inicialmente a Constituição de 1824 consagrou uma série de direitos ao cidadão brasileiro que posteriormente, na Constituição de 1981 foram estendidos aos estrangeiros; já a Constituição de 1934 trouxe um título especial tratando de direitos e garantias individuais e políticos; a Constituição de 1936 consagrou o direito à liberdade, inviolabilidade do domicílio e correspondência; ainda a Constituição de 1946 acrescenta o sigilo da votação no rol de direitos e garantias; a Constituição de 1967 aumenta o rol de direitos, seguida da Constituição de 1969 que não apresentou substancial alteração no que já estava posto.

Por fim, a Constituição de 1988 traz como seu fundamento a dignidade da pessoa humana, de modo que ampliou de sobremaneira o rol de direitos de garantias previstos anteriormente (CONSALTER, 2017, p. 51-54). Neste sentido, sobre a Magna Carta, explica Bezerra Júnior (2018, p. 45)

[...] Constituição Federal de 1988, chamada de “Carta Cidadã”, inaugurado nova ordem democrática e principiológica, fundada nos valores de solidariedade, liberdade, justiça, cidadania e da dignidade da pessoa, vista como limite e fundamento da República, tornava-se ainda mais imperiosa a compreensão, à luz de tais diretrizes, dos institutos de direito privado, ainda que inseridos em órbita própria e distinta daquela afeta ao direito constitucional.

Ao falar sobre os direitos da personalidade e seu desenvolvimento na esfera cível, são protagonistas os Código Civis de 1916 e 2002. Inicialmente, o Código Civil de 1916, de

1 Importante mencionar o artigo 12 da Declaração que versa sobre a privacidade, determinando que “ninguém

será sujeito a interferências em sua vida privada, em sua família, em seu lar ou em sua correspondência, nem a ataques à sua honra e reputação. Todo o homem tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques.”. Ainda, o artigo 19 apresenta o direito à liberdade de expressão, afirmando que “todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.”.

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cunho iminentemente materialista, seguindo a tradição individualista, não apresentou um direito geral da personalidade, tutelando apenas de maneira pontual alguns desses direitos (CONSALTER, 2017, p. 56). Neste sentido, Bittar (2014, p. 74) sistematiza a tutela concedida da seguinte maneira

[...] a) em uma disposição referia-se ao direito à imagem, estabelecendo que, nos retratos ou bustos de encomenda particular, a pessoa retratada podia opor-se, bem como seus sucessores, à reprodução ou pública exposição do retrato ou busto (art. 666, x), e b) em outra, preservava o segredo de correspondência (Art. 671, parágrafo único). Em outros, já reconhecia de modo inovador um direito moral ao autor (arts. 649, 650, parágrafo único; 651, parágrafo único; 658, revogados pela Lei n. 9.610/98), e, logo em seguida, permitia a cessão do direito de ligar o nome à obra (de caráter personalíssimo: art. 667) [...].

Contudo, diante da promulgação da Constituição de 1988 há uma mudança na perspectiva constitucional, sendo que passa a se dar mais importância às relações não patrimoniais em face das patrimoniais, o que levou a significativas alterações no novo código civil que estava em elaboração (MORAES, 2008).

O que ocorre, em verdade, com a Constituição de 1988 é uma modificação dos valores na legislação brasileira “deixa de ter um perfil essencialmente patrimonial, característico do Código Civil de 1916, concebido para uma sociedade agrária, tradicionalista e conservadora, para se preocupar substancialmente com o indivíduo [...]” (GLAGIANO; PABLO STOLZE, 2015, p. 185).

Neste contexto, o Código Civil de 2002, assim como os projetos de código civil francês e português à época, trouxe a grande importância da regulamentação dos direitos da personalidade (GOMES, 1966). O que na codificação brasileira se verificou através de um capítulo inteiro aos direitos da personalidade, enumerando algumas de suas características (CONSALTER, 2017, p. 57).

Neste contexto, diante da compreensão do caminho percorrido até que se alcançasse a atualidade, é possível compreender os direitos da personalidade como aqueles “direitos atinentes à tutela da pessoa humana, considerados essenciais à sua dignidade e integridade.” (TEPEDINO, 2004) sendo amplamente regulamentado no Código Civil de 2002.

2.2 ASPECTOS GERAIS DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE

Não se pode ignorar a existência deste rol de prerrogativas concedido as pessoas pela sua simples existência e mais ainda que seu surgimento se deu pelo amadurecimento da teoria

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dos direitos humanos e fundamentais, embora estes não se confundam, apenas se correlacionem (CONSALTER, 2017, p. 59).

Conforme explica Bittar (2015, p. 31-32) tais direitos são de mesma natureza, porém com graus de reconhecimento variados, sendo que no direito internacional são chamados de direitos humanos, já no âmbito do Direito Constitucional são tidos como os direitos fundamentais e, por fim, na esfera do Direito Civil, são chamados de direitos da personalidade.

Inicialmente, ao discorrer sobre os direitos da personalidade, importante compreender sobre qual acepção da personalidade este ramo do direito se fundamenta. A personalidade pode ser compreendida como capacidade jurídica ou como um valor de conotação fundamental para o ordenamento, mais ainda, como atributos da condição humana (MATTIETTO, 2017).

Assim, para que se obtenha a correta compreensão do que são de fato os direitos da personalidade deve-se compreender a personalidade como os “caracteres do próprio indivíduo”, como algo muito peculiar e inerente a cada pessoa, constituindo o seu primeiro bem. E é a partir dela que os demais bens do indivíduo poderão ser defendidos, contexto no qual se inserem os direitos da personalidade, sendo considerados “os bens inerentes à pessoa humana” (SZANIAWSKI, 2005, p. 70).

Desta forma são os direitos da personalidade uma categoria especial que visam proteger a pessoa na sua essência e como sujeito dos direitos que possa ser titular (BEZERRA JÚNIOR, 2018, p. 32).

Neste contexto, desenvolvem-se duas teorias acerca da compreensão dos direitos da personalidade: a teoria unitarista e a teoria pluralista. A teoria unitarista apresenta a personalidade como uma cláusula geral protetiva da personalidade, um valor ilimitado a ser tutelado pelos direitos da personalidade, que dela decorrem (CONSALTER, 2017, p. 65-67). Já a teoria pluralista defende a tipificação de direitos autônomos decorrentes do fracionamento do direito da personalidade, com o intuito de extinguir qualquer dúvida e imprecisão, de modo a garantir a tutela dos diversos bens jurídicos sobre os quais recaem esses direitos (SZANIAWSKI, 2005, p. 121).

De qualquer modo nos direitos da personalidade, não será a personalidade em si o bem jurídico digno de tutela, mas sim, o conjunto de atributos indispensáveis ao ser humano que

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dela irradiam (TEPEDINO, 2004). Ou seja, se trata de direitos que “irradiam do fato jurídico da personalidade” que devem ser tutelados para que se permita a realização desta, mas não se trata de direito “sobre a pessoa” (BEZERRA JÚNIOR, 2018, p. 32).

Importante discussão trata sobre a natureza dos direitos da personalidade. Três correntes se destacam nesse aspecto. A primeira corrente consistia na defesa de que não poderia o existir um direito sobre sua própria pessoa, pois isso autorizaria atos de disposição sobre si; a segunda, por sua vez, tinha que os direitos de personalidade consistiam nos poderes que o indivíduo exercia sobre a própria pessoa; e por fim, a terceira advogava que o direito consistia no dever de abstenção de terceiros de respeitar a esfera do indivíduo (BITTAR, 2015, p. 34).

Contudo, conforme explica Szaniawski (2005, p. 87) predomina a ideia de que os direitos de personalidade se encontram “nos bens constituídos por determinados atributos ou qualidades, físicas ou morais, do homem, individualizado pelo ordenamento jurídico”, de modo que não está nem na própria pessoa, nem em terceiros.

Assim, conceitua Limongi França (1971, p. 321) “Direitos da Personalidade dizem-se as faculdades jurídicas cujo os objetos são os diversos aspectos da própria pessoa do sujeito, bem assim as suas emanações e prolongamentos”.

No mesmo sentido, Chaves e Rosenvald (2012, p. 173) afirmam que

[...] é possível asseverar serem os direitos da personalidade aquelas situações jurídicas reconhecidas à pessoa, tomada em si mesma e em suas necessárias projeções sociais. Isto é, são os direitos essenciais ao desenvolvimento da pessoa humana, em que se convertem as projeções físicas, psíquicas e intelectuais do seu titular individualizando-o de modo a lhe emprestar segura e avançada tutela jurídica.

Historicamente a conceito de direito da personalidade dividiu-se entre os positivistas e os jusnaturalistas não podendo se negar a sua importância para a formação do que é aplicado atualmente. Para os positivistas os direitos da personalidade constituiriam um mínimo necessário, sem o qual a personalidade se esvaziaria, já para os jusnaturalistas, aqueles direitos, seriam atributos inerentes a pessoa cabendo ao Estado apenas reconhecê-los (BITTAR, 2015, p. 38). Ou seja, apresentam-se as ideias contrapostas de que para um os direitos surgiriam a partir da tipificação pelo Estado e para outro, haveria apenas o reconhecimento por parte deste, uma vez que é algo já existente e inerente à pessoa.

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Contudo, na atualidade, a partir da Constituição de 1988, com a implementação do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana2 a dicotomia apresentada, tem sido mitigada (BITTAR, 2015, p. 42), vez que, mesmo na esfera civil, a tutela da pessoa, tem buscado fundamento neste princípio (BEZERRA JÚNIOR, 2018, p. 40) o que tem levado a uma unidade de tratamento da matéria.

Tomando os direitos da personalidade como tutela da pessoa em si, pelos aspectos que decorrem de sua personalidade, resta analisar quando o indivíduo adquire personalidade jurídica. Conceito importantíssimo para que se compreenda as teorias que buscaram resolver essa questão é a definição de nascituro. Limongi França, 1971, p. 126 diz que nascituro é “a pessoa que está por nascer, já concebida no ventre materno” (LIMONGI FRANÇA, 1971, p. 126).

Deste modo, surgiram três teorias: natalista, condicionalista e concepcionista.

A teoria natalista entende que o nascituro não pode ser dotado de personalidade jurídica, de modo que a adquire quando nasce com vida; já a condicionalista apresenta o nascituro como uma pessoa virtual que tem a sua personalidade jurídica condicionada também ao nascimento com vida; por fim, a concepcionista entende que a personalidade jurídica é adquirida na concepção, estando condicionados ao nascimento com vida apenas os direitos patrimoniais (CHAVES; ROSENVALD, 2012, p. 302).

Ainda hoje, o tema acerca do momento em que se adquire personalidade jurídica é deveras controverso e não se vislumbra um fim para esta discussão, portanto, para os fins aos quais este trabalho se destina basta que se tenha conhecimento de que no Brasil, a doutrina tradicional se filia majoritariamente a teoria natalista, em que pese a teoria concepcionista estar ganhando força a jurisprudência (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2014, p. 132). Fato é que uma vez que viva, a criança é titular da personalidade jurídica, independente de qual corrente se filie, eis que a discussão se restringe ao nascituro. E uma vez que adquirida a personalidade jurídica, assim será até a morte daquele indivíduo, pois se tratam de direitos vitalícios.

2 Conforme explica Silva (2015, p. 107) a “dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o

conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida”. Explica o autor (2015, p. 107) que este conceito tem uma densidade valorativa que não se deve reduzir à defesa dos direitos pessoais tradicionais, em verdade, deve abarcar tudo aquilo que garante a base da existência humana, como uma referência constitucional unificadora dos direitos fundamentais.

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Os direitos da personalidade são aqueles ínsitos á pessoa e reconhecidos em suas projeções sociais, em função de sua estruturação física, mental e moral (BITTAR, 2014, p. 35). São aqueles que recebem proteção jurídica com intuito de preservar os valores inatos ao indivíduo, “como a vida, a higidez física, a intimidade, o segredo, o respeito, a honra, a intelectualidade e outros tantos” daí serem dotados de certas peculiaridades (BITTAR, 2014, p. 29). Portanto, os direitos da personalidade, como direitos inatos, são concedidos as pessoas pelo fato de estarem vivas.

Neste contexto, observa-se que estes direitos apresentam uma série de características, sobre as quais se explica: a extrapatrimonialidade, significa que são insuscetíveis de avaliação econômica, mesmo que sua lesão gere reflexos econômicos; por serem absolutos devem ser respeitados pela coletividade; ainda, são indisponíveis e impenhoráveis, de modo que não pode seu titular dispor, renunciar ou penhorar os seus direitos; além de que são vitalícios, porquanto se extinguem com a morte do titular (TEPEDINO, 2004).

Mesmo diante de tais características, algumas peculiaridades na aplicação desses direitos surgiram, contudo, sem desnaturar a sua essência. Essas aplicações dizem respeito a possibilidade do indivíduo de dispor sobre direitos autorais, sobre direito a imagem, direito ao corpo, ou ao órgão, ante situações altruísticas, ou científicas, por exemplo (BITTAR, 2015, p. 44).

Explicam Chaves e Rosenvald (2012, p. 177) que o Código Civil no art.11 autoriza que em alguns casos ocorra a cessão do exercício de alguns direitos de personalidade, desde que realizada de maneira transitória e específica e ainda, resguardada a titularidade e proibida a disposição total destes.

Ainda, quanto a característica da vitaliciedade, no tocante aos direitos a parte do corpo, a imagem e ao direito moral do autor, existe a possibilidade de surtirem efeitos mesmo após a morte de seu titular (BITTAR, 2015, p. 45). Isso ocorre, porquanto há o direito das pessoas vivas salvaguardarem a personalidade daquele parente que faleceu, contudo não há a transferência dos direitos da personalidade deste visto que são intransmissíveis, mas sim transmissão do direito indenizatório (CHAVES; ROSENVALD, 2012, p. 180).

A tutela dos direitos da personalidade no Código Civil de 2002 compreende várias maneiras de reação, que possibilitam à pessoa que está sendo lesada a buscar respostas distintas, a depender dos interesses visados (BITTAR, 2015, p. 88). Os objetivos a serem perquiridos podem ser divididos em: “a) cessação de práticas lesivas; b) apreensão de

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materiais oriundos dessas práticas; c) submissão do agente à cominação de pena; d) reparação de danos materiais e morais; e e) perseguição criminal do agente” (BITTAR, 2015, p. 88).

Portanto, conforme se observa da explicação do doutrinador, é possível aquele que tem seu direito lesado buscar proteção de maneiras diversas, inclusive, se julgar benéfico é possível que haja uma cumulação de esferas, por exemplo, cível e criminal (BITTAR, 2015, p. 88).

Diante do detalhamento e dos direitos tipificados pelo pelo Código Civil3 é possível falar-se em uma classificação realizada pela doutrina que é adotada com o intuito de detalhar

3 Tais possibilidades tem como fundamento o Código Civil de 2002 onde os direitos da personalidade são

disciplinados em capítulo específico que conta com 11 artigos e está localizado na Parte Geral, Livro I, Das Pessoas Físicas, Capítulo II.

O art. 11 do Código Civil de 2002 prevê que “com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.”. Conforme se observa, aqui há a menção de duas das características dos direitos da personalidade, além de que a parte inicial do dispositivo que trata sobre os casos previstos em lei, é o que dá embasamento para a disposição parcial de direitos como direito à imagem, mencionado acima.

Por sua vez, o art. 12 da codificação traz a permissão para que se exija que cesse a ameaça ou a lesão a direito da personalidade, bem como autoriza a reclamação de perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções. Mais ainda, no caso de se tratar de morto cabe ao cônjuge sobrevivente ou qualquer parente em linha reta ou colateral até quarto grau requerer a medida.

Os artigos 13 e 14 do Código Civil tratam sobre o direito de disposição do corpo. Traz o art. 13 a vedação de atos que importem na diminuição permanente da integridade física, que contrariem os bons costumes, sendo transplantes permitidos nos termos de lei especial. Já o artigo 14 autoriza a disposição do próprio corpo, no todo ou em parte, após a morte, contudo, a revogação de tal ato pode ser realizada a qualquer tempo (BITTAR, 2015, p. 80).

Determina também a codificação que ninguém poderá ser constrangido a se submeter a intervenção cirúrgica ou tratamento médico com risco de vida (CC, art. 15).

Quanto o direito ao nome, este é tutelado nos arts. 16,17, 18 e 19 do Código Civil de 2002. Determinou o legislador que todos tem direito ao nome e que nele estão compreendidos prenome e sobrenome (CC, art. 16). Explica Szaniawski (2005, p. 189) que o nome constitui o primeiro elemento que identifica a pessoa, e, portanto, sua personalidade identificando-o na sua individualidade, na sua família e na sociedade.

A pessoa não pode ter seu nome empregado por outrem em publicações ou representações que tenham intenção difamatória ou que a exponham a desprezo público (CC, art. 17), e, ainda, não se pode utilizar nome alheio em propaganda comercial sem autorização (CC, art. 18).

Por sua vez, o pseudônimo, este terá a mesma proteção dada ao nome (CC, art. 19).

O art. 20 da Lei traz que a divulgação de descritos, transmissão ou publicação da palavra, exposição ou utilização da imagem de uma pessoa poderão proibidas a seu requerimento, sem prejuízo da indenização, no caso de violação da honra, da boa fama ou respeitabilidade, ou se tiverem como destinação fins comerciais, salvo se autorizadas ou se necessárias à administração da justiça.

Por fim, a art. 21 tipifica o direito à privacidade, ao determinar que “a vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ao contrário a esta norma.” (CC, art. 21).

Ocorre que, na prática há uma série de usos anormais e por vezes ilícitos dos direitos da personalidade, uso de imagens, de criações intelectuais, divulgações de informações íntimas, dentre outros (BITTAR, 2015, p. 84), de modo que a tutela desses direitos acaba por ser estender para outras esferas do direito.

No âmbito do direito constitucional, os direitos da personalidade são tidos como direitos fundamentais, já na esfera penal, contam com a tutela repressiva mediante a tipificação de crimes contra a vida, a saúde, a honra, a intimidade, o segredo e os direitos intelectuais (BITTAR, 2015, p. 87).

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e facilitar a compreensão da matéria. Contudo, a dificuldade de se chegar a uma só classificação é tamanha tendo em vista a constante evolução destes direitos e que o rol apresentado pela codificação não é taxativo, de modo que diversos são os direitos que podem ser tutelados (CONSALTER, 2017, p. 81-83).

Diversos autores apresentaram suas classificações e conforme explicam Gagliano e Pamplona Filho (2014, p. 199) toda classificação irá variar de acordo com os critérios metodológicos que cada autor adotar.

Deste modo, apenas por um critério de afinidade adotaremos a classificação de Carlos Alberto Bittar que entende que os direitos da personalidade devem ser classificados de acordo com a natureza dos bens tutelados, classificando-os em: a) direitos físicos; b) direitos psíquicos; c) direitos morais (BITTAR, 2015, p. 115).

Assim, explica o autor que os bens jurídicos objeto dos direitos da personalidade podem ser físicos (vida, corpo, partes do corpo, imagem, voz, cadáver, locomoção), psíquicos (liberdade de expressão, liberdade de culto, liberdade de credo, higidez psíquica, intimidade, segredo pessoal, segredo profissional) ou morais (nome, reputação, dignidade da pessoa, direito moral de autor ou inventor, sepulcro, lembrança de família e outros) (BITTAR, 2015, p. 111).

Tendo em vista, que a classificação de Bittar segue os bens jurídicos tutelados, podemos concluir que os direitos físicos incluem o direito a vida, ao corpo, a partes do corpo, a imagem, a voz, ao cadáver e a locomoção. Já os direitos psíquicos tratam do direito a liberdade de expressão, liberdade de culto, liberdade de credo, higidez psíquica, direito a intimidade, segredo pessoal, e segredo profissional. Por fim, os direitos morais abarcam direito ao nome, reputação, dignidade da pessoa, direito oral de autor ou inventor, sepulcro, lembrança de família e outros.

Importante destacar, neste ponto o local no qual se insere o direito a intimidade, pois este será objeto do próximo tópico. Contudo, a nomenclatura adotada será diversa da apresentada por Bittar e cumpre esclarecer o motivo. Conforme explica Cancelier (2017, p. 84-86) o direito à privacidade seria espécie na qual estariam inseridos variados gêneros jurídicos, dentre eles o direito a intimidade, assim por estar um inserido no outro não se

Na esfera cível como explicado o legislador tutelou os direitos da personalidade em 11 artigos, tratando da natureza destes (arts. 11 e 12) e referindo a direitos específicos, como direito à “integridade psicofísica” (arts. 13 a 15), direito ao nome e ao pseudônimo (arts. 16 a 19), o direito à imagem (art. 20) e o direito à privacidade (art. 21) (DONEDA, 2005).

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vislumbra qualquer problema para utilizar-se a expressão direito à privacidade. De mesmo modo, no Código Civil utiliza-se a expressão “vida privada”, portanto, acredita-se ser mais adequada a adoção desta nomenclatura.

2.3 DIREITO À PRIVACIDADE

Inicialmente, o direito à privacidade foi pensado nos mesmos moldes do direito de propriedade, no sentido de que, ambos tinham como objetivo impedir a interferência alheia sobre o seu bem, com a peculiaridade de que o primeiro tutelava a vida íntima e familiar de cada ser humano (SCHREIBER, 2013, p. 135). E foi este o retrato pintado por Warren e Brandeis no artigo que escreveram e que é considerado como marco inicial do direito à privacidade.

Porém, com o desenvolvimento tecnológico que passou a ocorrer a partir de 1960, criou-se uma séria de mecanismos que permitiu um maior processamento de informações e grande aumento no fluxo de dados o acabou por criar sociedade marcada por um “constante intercâmbio de informações”, tornando necessária transformações no direito à privacidade (SCHREIBER, 2013, p. 135).

Diante desta mudança, o conceito de direito à privacidade baseada apenas no dever de abstenção de terceiros de adentrar na esfera privada do indivíduo torna-se incompleto, e surge a o aspecto positivo do direito a privacidade.

O aspecto positivo diz respeito ao controle realizado pelo titular das informações pessoais que poderão ser conhecidas pelos demais (CONSALTER, 2017, p. 149). Surge, então “necessidade de uma tutela efetiva da dignidade, a reclamar, de forma cada vez mais recorrente, o reconhecimento de um direito do indivíduo de controlar o uso, notadamente seus fins e o tempo de utilização das informações que constroem a sua imagem-atributo, como expressão de um direito de personalidade [...]” (BEZERRA JÚNIOR, 2018, p. 63).

Deste modo, é neste contexto histórico e a partir das alterações sofridas na percepção do direito à privacidade diante de uma sociedade que passa a conviver com aspectos tecnológicos que se vai estudar este direito da personalidade atualmente.

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Inicialmente, para que se possa estudar o que significa o direito à privacidade, deve-se compreender do que se trata a privacidade em si. Cancelier (2017, p. 72) apresenta definição bastante completa na qual explica

[...] Privacidade é antes de tudo uma qualidade inerente à pessoa, essencial para o desenvolvimento de sua personalidade e individualidade. Além de sua importância individual, a Privacidade pode ser trabalhada numa perspectiva coletiva, demonstrando-se fundamental também à sociedade. Ademais, nos parece claro que o termo, ao ser utilizado de maneira ampla, pode comportas expressões como intimidade, vida privada e segredo, em uma relação análoga àquela entre espécie e gênero, sendo Privacidade espécie da qual intimidade, vida privada e segredo são gêneros. A Privacidade não faz referência ao local, mas ao agir do sujeito, podendo ser mais ou menos ampla, conforme sua escolha comportamental. Privacidade é liberdade; liberdade de agir, de escolher, de desejar, que comporta limitações. Na relação jurídica, figura como bem, tutelado por direito próprio.

Então, o que é o direito à privacidade?

Conceitua Bittar (2014, p. 172) o direito à privacidade como “mecanismos de defesa da personalidade humana contra injunções, indiscrições ou intromissões alheias, conferindo traçado personalíssimo à tutela”. Ainda, explica o autor (2014, p. 172-173) que busca proteger os atentados quando aos aspectos particulares incluindo seu lar, sua família e sua correspondência.

De outro modo, Schreiber (2013, p. 135) apresenta uma nova roupagem ao direito à privacidade, expandindo-o para além da esfera da casa do indivíduo, alcançando aqueles ambientes em que há a circulação de informações atinentes a pessoa, e mais ainda, o conceitua como “ o direito ao controle da coleta e da utilização dos próprios dados pessoais”.

Observa-se destes dois conceitos que Bittar apresenta concepção relacionada ao aspecto negativo do direito à privacidade, enquanto Schreiber, diante das transformações sofridas a partir de 1960, que trouxeram a necessidade de atualização do conceito do direito da personalidade, apresenta o aspecto positivo.

A condição de direito negativo, consiste no direito de não permitir o conhecimento e intromissão de terceiros em elementos da esfera particular do indivíduo (BITTAR, 2014, p. 174). É impedir a interferência em ambiente reservado da vida de outrem, um verdadeiro dever geral de abstenção (SCHREIBER, 2013, p. 137). Outrossim, a condição de direito positivo, estaria relacionada a um poder de controle de seus dados pessoais, tendo como exemplo o dever de pedir autorização para inclusão de um nome em um cadastro (SCHREIBER, 2013, p. 137).

Portanto, compreende-se o direito à privacidade como aquele que une o desejo de estar só e o poder de retirar do conhecimento de terceiros dados e fatos que fazem parte da esfera

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pessoal do indivíduo, visando garantir um mínimo para condição humana da pessoa (CONSALTER, 2017, p. 150).

Imperioso dar especial atenção ao aspecto positivo do direito á privacidade, porquanto este acaba por reconhece ao indivíduo um direito à autodeterminação (BEZERRA JÚNIOR, 2018, p. 64) e por diversas vezes este aspecto é vinculado ao instituto do direito ao esquecimento, principal objeto deste trabalho. Neste ponto, sustenta o autor (2018, p. 63) que diante da possibilidade do indivíduo deliberar acerca daquilo que tem interesse em revelar a terceiros, poderia também ocorrer a oposição contra a permanência por tempo indeterminado de informações que podem ofender e expor a sua esfera privada, bem como a divulgação de seus dados pessoais.

De todo modo, este assunto será objeto do próximo capítulo, importa, por ora, compreender que a autodeterminação informativa como uma das manifestações da privacidade, assim como a intimidade e a vida privada (CANCELIER, 2017, p. 97).

Ao longo dos anos, muitas foram as tentativas de delimitação dos conceitos de privacidade, vida privada de intimidade, sendo importante marco histórico a Teoria das Esferas do alemão Henrich Hubmann que consistia em três esferas concêntricas: a mais externa considerada esfera da vida pública; a intermediária a esfera da vida privada e englobava a proteção de interferências externas; e a interna que era a esfera individual que contava com o direito ao nome, a imagem e reputação (CONSALTER, 2017, p. 128).

Não se pode negar a importância deste estudo, que foi difundido ao redor do mundo, influenciando diversos estudiosos e tornando inclusive a compreensão dos institutos mais didática. Contudo, conforme explica Cancelier (2017, p. 91) determinar camadas “de expressão da personalidade humana” não cabe ao direito e tão pouco é viável e mais ainda, retomando a ideia original do Warren e Brandeis, estariam ambas, intimidade e vida privada, presentes no conceito criado por eles, de modo que seriam manifestações do direito à privacidade.

Nova discussão suscitada também pela nova concepção deste direito da personalidade é a sua extensão, vez que não mais se limita ao ambiente domiciliar do indivíduo. Evidencia-se aqui novamente a dicotomia do público e privado.

Enuncia Bittar, (2014, p. 173-174) que pelo direito à privacidade (referindo-se como direito à intimidade) são protegidos os seguintes bens: a confidência; dados pessoais;

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recordações; memórias; diários; relações familiares; lembranças de família; sepultura; vida amorosa; saúde; afeições; entretenimento; costumes domésticos; atividades negociais; dentre outras atividades as quais a pessoa optar por afastar da curiosidade de terceiros.

Estes bens estão localizados no âmbito privado e permanecem abarcados atualmente pelo conceito de direito à privacidade. Contudo, o âmbito público também poderá sofrer influência, porquanto o que deve ser analisado não é caráter público privado do local, mas sim a expectativa de privacidade do indivíduo (SCHREIBER, 2013, p. 145).

Não se pode admitir que uma pessoa apenas pelo fato de estar em ambiente público tenha sua privacidade violada, assim explica Cancelier (2017, p. 59)

Seja em casa ou no meio da rua, seja a pessoa uma celebridade reconhecida ou alguém que vive uma vida de resguardo, a possibilidade de exercício da Privacidade estará presente. É claro que ao optar por praticar determinado ato em público, o sujeito tem consciência de que um número maior de pessoas terá acesso àquela informação, no entanto, o espectro da Privacidade permanece.

Portanto, não se deve condicionar o exercício do direito à privacidade da pessoa ao espaço público ou privado, em ambos este deverá ser respeitado, sob pena de se “declarar o fim da privacidade de quem quer que saia de pela porta de casa” (SCHREIBER, 2013, p. 145).

Buscando garantir a tutela do direito à privacidade, o ordenamento jurídico brasileiro o regulamentou na esfera Constitucional, Civil e até mesmo na esfera Criminal.

A Constituição de 1988 prevê a inviolabilidade da vida privada e da intimidade no art. 5º, X que determina “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

Já na esfera civil, explica Bittar (2014, p. 175) que as respostas possíveis se dão nos mesmos termos dos direitos da personalidade, buscando cessar práticas lesivas, apreender materiais oriundos destas ações, dentre outros (2014, p. 88).

Por fim, na esfera penal, há restrição a violação da privacidade conforme se vislumbra nos crimes de violação de domicílio, violação de correspondência, sonegação ou destruição de correspondência, comunicação telegráfica, radioelétrica ou telefônica e violação de correspondência comercial, dentre outros (BITTAR, 2014, p. 175).

Importante observação quanto a tutela do direito à privacidade na esfera civil faz Cancelier (2017, p. 115) ao apontar que a restrição se dá apenas no âmbito da invasão à privacidade, permanecendo silente quanto a situações de mau uso de informações evadidas.

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Diante de todo o exposto, não se pode pensar que o direito à privacidade é direito absoluto, que não sofre limitações, além da autonomia da vontade, é possível que este seja limitado pelo pela liberdade de expressão, pelo direito a informação e pela liberdade de comunicação (CANCELIER, 2017, p. 129).

Ainda, o interesse coletivo em face do particular é fundamento bastante utilizado para sua limitação, cabendo sempre uma análise ao caso concreto para que não haja um prejuízo a pessoa de maneira indevida (BITTAR, 2014, p. 177). Neste sentido, Cancelier (2017, p. 142)

A extensão do alcance do direito à Privacidade deve ser analisada, sempre, à luz do caso concreto, verificando-se como a pessoa lidou com suas informações privadas, o contexto no qual a comunicação ocorreu e a expectativa de maior ou menor divulgação. O dano à Privacidade não é passível de conserto (uma vez divulgada, a informação nunca voltará a ser privada) devendo, dessa forma, evitar-se a sua ocorrência.

Contudo, cabe aqui mencionar, que do mesmo modo que deve-se limitar o exercício do direito à privacidade, pois excessos cometidos sob a égide do direito de informar também poderá violar direitos, como por exemplo o direito ao esquecimento, que tem relação a limitação temporal da permanência e reutilização de informações que digam respeito a esfera íntima do indivíduo (BEZERRA JÚNIOR, 2018, p. 66-67).

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3 DIREITO AO ESQUECIMENTO

O direito ao esquecimento, objeto central de estudo deste trabalho, apresenta um desenvolvimento inicial no direito internacional, sendo na última década bastante discutido e estudado no Brasil. Diante da novidade que este direito apresenta, diversas são as teorias que o explicam. Assim, neste capítulo será destrinchado o seu desenvolvimento, analisando suas características e por fim, estudando as correntes teóricas que buscam o definir.

3.1 HISTÓRICO

As pessoas, seres dotados de racionalidade, cientes do destino inevitável que as aguarda no final da vida e com medo do desaparecimento, passam a buscar a construção de um legado no mundo material que deixe vestígios da sua existência e assim, passam a construir sua própria memória (BRANCO, 2017, p. 17-24).

As memórias pessoais eram produzidas através de diários, de fotografias, vídeos caseiros e conforme explica Branco (2017, p. 28), enquanto a comunicação ocorria desta maneira, era possível controlar quase que totalmente o acesso a essas informações e com quem compartilhá-las. Mais ainda, tal controle se estendia inclusive, ao momento em que escolhesse extinguir estes registros, pois uma vez que destruídos não restariam vestígios, contudo “com o advento dos suportes digitais, tudo mudou.” (BRANCO, 2017, p. 29).

As novas tecnologias apresentaram uma maneira automatizada de tratar os dados pessoais, ocorrendo assim uma mudança social onde se adotou um estilo de vida no qual as pessoa observam suas vidas na tela dos computadores (RAIMUNDO, 2012).

A partir da internet, diante das inúmeras possibilidades de registro, o arquivamento deixa de ser individual e passa a ser coletivo (BRANCO, 2017, p. 61). Outro fato que contribui é o surgimento das redes sociais e com elas as pessoas começam a ser influenciadas para compartilhar suas vidas privadas online, sob o discurso da necessidade de socialização e visualização dessas redes como um relacionamento entre amigos (SIMÓN CASTELLANO, 2012). Ainda, explica o autor (2012), que apesar da difusão da ideia de amizade virtual, ao ser publicado o conteúdo muitas vezes passa a estar disponível para qualquer pessoa ao redor do mundo, principalmente porque a maioria dos usuários que posta seus dados não se preocupa sequer em utilizar ferramentas de privacidade das redes que usufruem.

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O contexto apresentado e suas transformações, somado a uma capacidade de armazenamento sem precedentes, permitem que uma informação seja lembrada pela eternidade e que seja facilmente recuperada por qualquer pessoa no mundo (LIMA, 2013).

Observando o alcance das dos dados, explica RAIMUNDO (2012) que a capacidade de dano gerada pela publicação de uma informação na internet, diante da possibilidade de acesso por um número maior de usuários em escala global, toma tamanha proporção que só poderia ser comparada com os meios de comunicação como redes televisivas e jornais de maior tiragem do mundo. Ainda que, diante de sua expensão, em verdade, o dano possa ser muito maior.

Portanto, a partir dessa nova organização social, sob influência das novas tecnologias, observa-se que o esquecimento, que é “biologicamente comum” do ser humano, acaba por dar espaço a um novo paradigma, a lembrança4 (LIMA, 2013).

A nova realidade na qual nada se esquece, e tudo se lembra, contrasta com a fragilidade da memória humana (SIMÓN CASTELLANO, 2012), de modo que, uma vez que a vida privada5 do indivíduo é exposta na internet, assim o será permanentemente, não permitindo que escape do seu passado, eis aqui a justificativa do direito ao esquecimento (RAIMUNDO, 2012).

Neste sentido, Sarlet e Ferreira Neto (2019, p. 42) explicam que o armazenamento eterno dos dados geram o risco de não se conseguir mais esquecer o passado que poderá ser lembrado e interpretado por todos, a todo momento e em escala global, de modo que não será mais possível superar erros, perdoar e permitir o desenvolvimento pessoal, porquanto sempre vinculados a fatos pretéritos. Mais ainda, esmiúçam os autores (2019, p. 45)

Esse fenômeno acaba impedindo que o tempo exerça a sua função natural de corroer ocorrências pretéritas e de depreciar o valor original de eventos do passado, o que, em regra, sempre teve uma importante função estabilizadora, ao garantir aos indivíduos segurança e certeza de que o presente iria, gradualmente, se sobrepondo ao passado. Assim, na sociedade da hiperconexão, isso não mais ocorre, uma vez

4 Quando o passado se manifesta novamente no imaginário do indivíduo, que retoma mentalmente uma

percepção pretérita, revivendo formas sentidas outrora, eis que se manifesta a lembrança, este é o ato de lembrar (SARLET; FERREIRA NETO, 2019, p. 37).

5 Conforme exposto no capítulo anterior (p. 30), a vida privada, categoria inerente à privacidade, relaciona-se

com a liberdade de escolha e de agir do indivíduo, sendo possível impedir a intromissão de terceiros na sua esfera particular (aspecto negativo), bem como realizar um controle dos dados, parte da sua esfera pessoa, que chegam a conhecimento dos demais (aspecto positivo).

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