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Muito além da Capitã Marvel: a socialização profissional de mulheres policiais federais

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

FACULDADE DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO, ATUÁRIA E CONTABILIDADE.

DEPARTAMENTO DE ADMINISTRAÇÃO CURSO DE ADMINISTRAÇÃO

RAISSA MOTA MENEZES

MUITO ALÉM DA CAPITÃ MARVEL: A SOCIALIZAÇÃO PROFISSIONAL DE MULHERES POLICIAIS FEDERAIS

FORTALEZA 2019

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RAISSA MOTA MENEZES

MUITO ALÉM DA CAPITÃ MARVEL: A SOCIALIZAÇÃO PROFISSIONAL DE MULHERES POLICIAIS FEDERAIS

Monografia apresentada ao Curso de Administração da Faculdade de Economia, Administração, Atuárias e Contabilidade da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharel em Administração.

Orientadora: Profa. Dra. Tereza Cristina Batista de Lima

FORTALEZA 2019

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M513m Menezes, Raissa Mota.

Muito Além da Capitã Marvel: A Socialização Profissional de Mulheres Policiais Federais / Raissa Mota Menezes. – 2019.

86 f.

Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Economia, Administração, Atuária e Contabilidade, Curso de Administração, Fortaleza, 2019.

Orientação: Prof. Dr. Tereza Cristina Batista de Lima..

1. Socialização Profissional. 2. Policia Federal. 3. Mulheres. I. Título.

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RAISSA MOTA MENEZES

MUITO ALÉM DA CAPITÃ MARVEL: A SOCIALIZAÇÃO PROFISSIONAL DE MULHERES POLICIAIS FEDERAIS

Monografia apresentada ao Curso de Administração do Departamento de Administração da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharel em Administração.

Orientadora: Profa. Dra. Tereza Cristina Batista de Lima.

Aprovada em: ___/___/______.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________ Profa. Dra. Tereza Cristina Batista de Lima (Orientadora)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

___________________________________________ Prof. Me. Ana Cristina Pacheco de Araújo Barros

Universidade Federal do Ceará (UFC)

___________________________________________ Me. Luis Eduardo Brandão Paiva

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Dedico à minha família, aos meus amigos e aos meus professores. Mas, dedico, sobretudo, as gerações de mulheres que abriram caminhos para nós e para as futuras gerações, as quais nós abriremos os caminhos.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente à minha mãe, Luciana, pela minha vida, por todo o apoio que me foi dado, por toda a demonstração de garra e luta, por ser meu exemplo de mulher forte e por sua história que me inspirou a escrever esse trabalho.

Às minhas duas irmãs, Ana Beatriz e Joana, que me apoiam em todos as circunstâncias e me deram força nos momentos de tensão durante esse processo.

À minha avó, Angela, que sempre esteve do meu lado e me apoiou em todas decisões que tomei, e, principalmente, por ser uma mulher de fibra e a frente do seu tempo.

À minha madrinha, Juliana, que me faz olhar para fora dos padrões e enxergar além. Aos meus tios, Davi e Gisele, por se fazerem presentes mesmo estando fisicamente distantes.

Aos meus familiares e amigos, que tornam minha jornada mais leve e descontraída, e que compreenderam e apoiaram a minha ausência para me dedicar a este trabalho, sempre confiando na minha capacidade.

À minha orientadora, Profa. Dra. Tereza Lima, por ter acolhido minha ideia e norteado a elaboração deste estudo. E por ser um exemplo de profissional competente e dedicada ao trabalho. Agradeço ainda, a mestranda Rafaela Araújo, por toda a ajuda prestada.

À Profa. Me. Ana Cristina Pacheco e ao Me. Eduardo Brandão por se disponibilizarem a fazer parte da banca examinadora.

Por fim, agradeço a todas as mulheres que lutaram pela nossa entrada nas universidades, possibilitando que este momento ocorresse, as mulheres que lutaram pelo direito ao trabalho e sua livre escolha, e, agradeço, principalmente, as mulheres policiais federais, não só por se disponibilizarem a fazer parte desse estudo, mas também pela sua demonstração de força por se inserirem em um meio predominantemente masculino. Agradeço, também, ao Movimento Feminista como um todo, por dar suporte a todas as mulheres e por abrir novos caminhos para as próximas gerações.

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“Que nada nos limite, que nada nos defina, que nada nos sujeite. Que a liberdade seja a nossa própria essência, já que viver é ser livre."

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RESUMO

O presente estudo tem como objetivo investigar de que forma ocorre a socialização profissional de mulheres policiais federais lotadas na cidade de Fortaleza-CE. Para tanto, utilizou-se os fundamentos teóricos de Hughes (1958, 2016) e Dubar (2005). Buscou-se, por meio das três fases do processo de socialização profissional, “passagem através do espelho”, “instalação da dualidade” e “ajuste da concepção em si”, compreender como se dá a inserção de mulheres policiais federais em suas profissões, perceber qual o entendimento das policiais a respeito de sua profissão e verificar as percepções dessas profissionais sobre sua identidade profissional e carreira. Foi realizada uma pesquisa qualitativa por intermédio de entrevistas semiestruturadas com 13 policiais federais, cujos dados obtidos foram analisados por meio da técnica de análise de conteúdo. Como resultados, identificou-se que o maior interesse por essa área emergiu da estabilidade financeira proporcionada pelo serviço público e a época em que abriu o edital para o concurso público. As policiais identificaram a coragem como a principal característica que já possuíam e julgavam necessária para o exercício da função. Apesar de terem sido bem recepcionadas, sua inserção na profissão foi marcada por adversidades. Verificou-se que houve conflitos entre a cultura leiga e a profissional das entrevistadas. Percebeu-se, ainda, que as policiais enfrentam muitas dificuldades no exercício da profissão, principalmente no que tange a conciliação da vida familiar com a profissional e o machismo presente na instituição. Identificou-se que a forma de trabalhar, a maneira de se vestir e a postura adotada por elas formam sua identidade profissional. Por fim, quanto as suas carreiras, apesar de muitas sentirem-se satisfeitas, encontrou-se como barreiras para sua progressão, a estagnação do serviço público, o baixo retorno financeiro dos cargos de chefia, o preconceito em razão do gênero e a maternidade.

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ABSTRACT

The present study aims to investigate how the professional socialization of federal police officers women based in the city of Fortaleza-CE. For that, the theoretical foundations of Hughes (1958, 2016) and Dubar (2005) were used. The three stages of the process of professional socialization, "passing through the mirror", "installation of duality" and "adjustment of the conception itself", to understand how the insertion of federal police officers in their professions, to assess the police officers' understanding of their profession and to verify the perceptions of these professionals about their professional identity and career. A qualitative research was conducted through semi-structured interviews with 13 federal police officers, and data was analyzed through the content analysis technique. As a result, it was identified that the greatest interest for this career emerged from the financial stability provided by the public service and the timing in which public tender opened. The police officers identified the courage as the main characteristic necessary for the function that they already had. Although they were well received by their male colleagues, their insertion in the profession was marked by adversities. There interviewees had conflicts between their personal and professional culture. It was also noticed that police officers face many difficulties in the exercise of their profession, especially regarding the conciliation between family life and career; and the male chauvinism present in the Federal Police institution. It was identified that their professional identity was formed by the way of working, the way of dressing and the behavior adopted by them. Finally, although, they feel satisfied by their careers, many found barriers to their progression, such as stagnation of public service, low financial return of senior positions, gender bias and motherhood.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Modelo de Socialização Profissional... 36

Figura 2 – Rede de relacionamentos entre as categorias de análise e unidades de contexto.. 47

Figura 3 – Motivações... 48

Figura 4 – Aptidões... 51

Figura 5 – Inserção... 53

Figura 6 – Modelo idealizado... 56

Figura 7 – Modelo real... 58

Figura 8 – Dificuldades/incômodos... 60

Figura 9 – Abandono de estereótipos... 68

Figura 10 – Identidade profissional... 70

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LISTA DE TABELAS E QUADROS

Tabela 1 – Representatividade profissional feminina e rendimentos... 24

Tabela 2 – Quantitativo de Delegados, Agentes e Escrivães na PF... 27

Tabela 3 – Ocupação de DAS e FG na Polícia Federal... 28

Quadro 1 – Blocos de perguntas do roteiro da entrevista... 42

Quadro 2 – Categorias de Análise, unidades de contexto e unidades de registro... 43

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

BID Banco Interamericano de Desenvolvimento DAS Direção e Assessoramento de Superiores

DGP/PF Diretoria de Gestão de Pessoal da Polícia Federal

DIEESE Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos DPF Departamento de Polícia Federal

FBSP Fórum Brasileiro de Segurança Pública FG Funções Gratificadas

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística NEOP Núcleo de Estudos em Organizações e Pessoas OIT Organização Internacional do Trabalho

PF Polícia Federal

PED Pesquisa de Emprego e Desemprego PIB Produto Interno Bruto

SIOG Sistema de Informações Organizacionais

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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO... 14 1.1 Contextualização... 14 1.2 Justificativa... 16 1.3 Objetivos da pesquisa... 17 1.3.1 Objetivo geral... 17 1.3.2 Objetivos específicos... 17 1.4 Pressupostos... 17 1.5 Organização da monografia... 18

2 A MULHER NO MERCADO DE TRABALHO... 20

2.1 Inserção feminina no mercado de trabalho... 20

2.2 Os desafios de ser mulher na vida profissional... 23

3 SOCIALIZAÇÃO PROFISSIONAL... 30

3.1 Socialização e construção de identidade... 30

3.2 Identidade profissional e socialização profissional... 32

3.3 O modelo de Socialização Profissional de Hughes... 34

4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS... 38

4.1 Classificação da pesquisa... 38

4.2 Universo e Sujeitos da pesquisa... 39

4.3 Coleta de Dados... 40

4.4 Tratamento dos dados... 42

5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS... 45

5.1 Perfil das entrevistadas... 45

5.2 Análise da socialização profissional de mulheres policiais federais... 46

5.2.1 ... 46 Passagem através do espelho: a inserção profissional... 47

5.2.2 Instalação da dualidade: o modelo ideal e o real da profissão... 55

5.2.3 Ajuste da concepção em si: identidade profissional e carreira... 67

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 78

REFERÊNCIAS... 81 APÊNDICE A – Entrevista aplicada às policiais

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1 INTRODUÇÃO

Esta seção está estruturada em cinco itens. A princípio, é realizada uma abordagem introdutória acerca do tema em questão, finalizando com o problema da pesquisa. Em seguida, é apresentada a justificativa, o objetivo geral, os objetivos específicos e os pressupostos da pesquisa. Por fim, é exposta a estrutura da monografia.

1.1 Contextualização

A diversidade dos recursos humanos das organizações seja pela ótica de etnia, faixa etária, religião, orientação sexual, deficiência ou gênero, tem atribuído às empresas o desafio de entender as novas necessidades e encontrar a melhor forma de gerir grupos de indivíduos heterogêneos (MEDEIROS et al., 2014). Sob essa ótica, a gestão da diversidade é um instrumento administrativo que, se bem utilizado, é benéfico para o sistema organizacional, visto que, um bom entrosamento entre o corpo de funcionários possibilita que cada um colabore com seus conhecimentos e aptidões em prol do alcance dos objetivos almejados pela empresa (SICHEROLLI; MEDEIROS; JÚNIOR, 2011). No enfoque da diversidade de gênero, Fitzsimmons (2012) assegura que as empresas que se preocupam com essa questão, e a tem como foco, tendem a melhorar o desempenho, uma vez que possuem maior potencial para encontrar meios de resolver problemas complexos.

A presença da mulher no mercado de trabalho, em contraposição ao trabalho doméstico, ganhou força nos períodos de revoluções industriais e guerras mundiais. (BAYLÃO; SCHETTINO, 2014). Nas décadas de 1960 e 1970, ocorreram muitos movimentos artísticos e culturais que possibilitaram uma maior inserção de mulheres no mercado de trabalho (PEREIRA; SANTOS; BORGES, 2005). O movimento feminista, intensificado nesse período, auxiliou na mudança da identidade delas, passando a ser cada vez mais relacionada ao trabalho produtivo (BRUSCHINI; LOMBARDI, 2011).

O avanço da escolaridade e a entrada nas universidades possibilitaram a elas novas oportunidades de emprego, o que gerou mudanças no núcleo familiar, levando a redução crescente das taxas de fecundidade, especialmente nos grandes centros urbanos (BRUSCHINI; LOMBARDI, 2011). Apesar dos avanços no que diz respeito a participação feminina no mercado, elas ainda enfrentam muitas barreiras, seja por dificuldades de conciliar a vida familiar com a profissional ou a discriminação sofrida dentro das empresas (BIASOLI, 2016).

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A imagem da mulher relacionada aos afazeres domésticos e familiares e a do homem a associada à produção econômica se reflete no espaço organizacional, uma vez que se observa uma divisão por gênero das atividades, especialmente em algumas profissões, que por vezes, são vistas como femininas ou masculinas. Há uma predominância de mulheres em ofícios ligados a enfermagem e assistência social, por exemplo. Desse modo, frequentemente, os lugares em que elas são maioria, como é o caso dessas profissões, tendem a ser menos valorizados socialmente (ZAULI et al. 2013).

Em oposição a essas profissões, o ofício policial, com estereótipo extremamente masculino, tornou-se objeto de estudo dessa pesquisa, com investigação sobre mulheres policiais federais. Segundo Fogaça e Almeida (2014), há apenas 10% de delegadas e 15% de agentes mulheres do efetivo total de cada cargo. Existindo dificuldades desde a seleção, em razão dos testes físicos, que dificultam ainda mais a entrada de mulheres.

Para Hughes (1958, 2016), ao escolher uma profissão e se enxergar como tal, há uma visão estereotipada acerca da mesma e sobre si mesmo, influenciada por diversos fatores. Assim, quando de fato se torna profissional, com a vivência e descoberta de novas habilidades, uma nova concepção surge. A vida laboral é constituída das relações com os outros trabalhadores, chefes e clientes em diversas situações no trabalho. Nesse contexto, a socialização profissional é um processo amplo e contínuo, que tem conexão consigo e com os demais, com as atividades a serem realizadas e as circunstâncias vivenciadas (DUBAR, 2012).

O modelo de socialização profissional proposto por Hughes (1958, 2016) apresenta três fases, quais sejam: Passagem através do espelho, Instalação da dualidade e Ajuste da concepção em si. A primeira fase ocorre na inserção na profissão, em que há a interação entre a visão prévia da profissão, cultura leiga, e o que ela é na prática, cultura profissional. Na segunda fase há o confronto entre o que se imaginava, o modelo ideal, e o que de fato é o exercício do ofício, o modelo real. E na última fase, deixa-se para trás as concepções estereotipadas, e assume-se uma nova identidade profissional no desenvolvimento de suas carreiras.

Dado o exposto, considerando como grupo focal a mulher policial federal em meio aos estereótipos ligados a profissão e o ambiente laboral historicamente masculino, a presente pesquisa busca responder um questionamento: como ocorre o processo de socialização profissional de mulheres policiais federais?

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1.2 Justificativa

Apesar da crescente abordagem do tema socialização profissional em meio acadêmico, conforme observado após pesquisas para a realização do presente trabalho, ao se tratar do grupo focal mulheres policiais federais, não há estudos que procurem elucidar a inserção feminina nessa atividade policial.

A realidade da mulher policial militar é vista em alguns trabalhos, como de Souza (2014), com a polícia militar de São Paulo, Capelle e Melo (2010), com policiais militares de Minas Gerais e Calazans (2003), com policiais militares do Rio Grande do Sul. Entretanto, no âmbito federal, é escasso. Segundo Calazans (2003), essa falta de dados e pesquisas acerca da mulher na atividade policial é consequência da não problematização de questões que envolvem sua carreira.

O interesse sobre essas profissionais emergiu a partir das inúmeras operações da Polícia Federal que ganharam grande notoriedade nos últimos anos e, no entanto, apresentam uma baixa representatividade feminina em seus quadros. Segundo uma matéria da Folha de São Paulo (2017), estima-se que há apenas entre 15% e 25% de mulheres no contingente total de servidores. Além disso, as entrevistadas afirmaram que o machismo é presente, apesar de ser menor que em 1990.

Segundo uma pesquisa realizada pelo Núcleo de Estudos em Organizações e Pessoas (NEOP) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) em 2015, com 13.055 servidores de todas as instituições policiais, há uma predominância masculina generalizada, nas quais, apenas 18,87% dos entrevistados eram mulheres. Apesar do fato de que ao analisar a escolaridade, 76,80% delas possuem nível superior completo ou pós-graduação, contra 56,7% deles. Em relação a Polícia Federal, a representatividade é de apenas 22,7%.

A presente pesquisa lança luz à carreira dessas mulheres e as dificuldades por elas enfrentadas, bem como suas vivências enquanto profissionais. Isso contribui não somente para elas, no planejamento de carreira, mas também a área de gestão de pessoas, auxiliando suas atividades no que diz respeito a lidar com questões de gestão da diversidade de gênero. Além de ser útil para a própria instituição, posto que, poderá servir de base para o desenvolvimento de políticas públicas e de recursos humanos voltados a equidade de gênero dentro da organização.

Nessa perspectiva, o tema também tem relevância no âmbito econômico, uma vez que a desigualdade de gênero no mercado de trabalho causa impacto no setor. O presidente do

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Banco Interamericano de Desenvolvimento - BID no Fórum Econômico Mundial para a América Latina, afirmou que o Produto Interno Bruto - PIB da região poderia crescer até 16% caso conseguissem igualar a participação de mulheres e homens no mercado (FOLHA, 2018).

Ante o exposto, é importante entender de que forma as mulheres são inseridas no mercado de trabalho, em particular, as mulheres policiais federais, ramo que ainda é cercado de estereótipos, compreendendo seu processo de socialização profissional. Esse trabalho baseou-se nos modelos de Hughes (1958, 2016), Dubar (2005) e Spudeit (2010), sendo realizado por meio de entrevista semiestruturada.

1.3 Objetivos da pesquisa

A fim de solucionar a problemática da pesquisa em questão, foi definido um objetivo geral e a partir deste, três objetivos específicos, baseados nas três fases do processo de socialização profissional de Hughes (1958, 2016), expostos a seguir:

1.3.1 Objetivo geral

O objetivo geral do estudo é entender como ocorre o processo de socialização profissional de mulheres policias federais.

1.3.2 Objetivos específicos

O presente estudo teve como objetivos específicos:

a) Compreender de que forma acontece a inserção de mulheres na carreira de policial federal, considerando a cultura leiga e a cultura profissional;

b) Perceber como a mulher policial federal entende sua profissão, a partir do modelo ideal e o real da profissão;

c) Verificar as percepções das policiais federais sobre sua carreira e sobre sua identidade profissional após o abandono de estereótipos.

1.4 Pressupostos

O presente estudo teve como pressupostos:

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de mulheres nesse contexto é ainda limitada, apesar dos avanços já decorridos. No interior das instituições policiais, há uma organização verticalizada, com uma estrutura hierárquica de comando com meios próprios para controlar as relações de poder. Atualmente, é visível as mudanças no contexto social acerca do papel do homem e da mulher, o que possibilita o aumento do ingresso delas em cenários que antes eram exclusivamente masculinos, proporcionando novas disposições tanto nas esferas públicas quanto nas privadas (LOPES; BRASIL, 2010).

b) Os atributos reconhecidos culturalmente na profissão policial, tal como a força física, no transcorrer do tempo, deixaram de ser foco. Outros traços passaram a ter maior notoriedade, mais condizentes com a atual realidade, como a perspicácia na solução de adversidades, inovação, intelecto e habilidade de trabalhar em equipe. Cada vez mais, é preciso dar preferência a resolução sem conflitos e violência. Características estas, favoráveis às mulheres (CALAZANS, 2003).

c) A dificuldade da mulher policial começa desde a seleção, em que são exigidos pré-requisitos físicos que impossibilita o acesso igualitário de mulheres. Além do preconceito velado de alguns homens, que se recusam a trabalhar com mulheres ou subordinados a elas (FOGAÇA; ALMEIDA, 2014).

1.5 Organização da Monografia

Este trabalho é formado por cinco etapas. A princípio, é apresentada a introdução, que engloba, como já visto, a contextualização acerca do tema, finalizando com o problema de pesquisa, a justificativa para sua realização, o objetivo geral e os específicos, bem como os pressupostos e a estrutura desta monografia.

A segunda etapa constitui-se na exposição do referencial teórico, que serviu de base para a construção desta pesquisa. Nesta fase foi feito um levantamento bibliográfico sobre a Mulher no Mercado de Trabalho, desde sua inserção até os desafios por elas enfrentados, abordando, também, as questões das mulheres policiais, foco do estudo. Por fim, foi realizado, ainda, um levantamento acerca da Socialização Profissional, iniciando com informações sobre a socialização de forma geral e construção de identidade, seguido da identidade e socialização profissional, finalizando com o modelo de Hughes (1958, 2016), que apresenta três fases do processo de desenvolvimento profissional. Estas fases serviram de embasamento para a elaboração dos objetivos específicos e da entrevista.

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Na terceira etapa do trabalho é explicitada sua metodologia. Descreveram-se os procedimentos metodológicos usados para a realização do estudo. Essa descrição iniciou-se com a classificação da pesquisa sob diferentes aspectos, seguido do universo e amostra utilizados, da forma de coleta de dados e, por último, do modo em que esses dados colhidos foram tratados a fim de gerar interpretações.

Na quarta etapa é apresentado os resultados obtidos com a presente pesquisa, contendo as análises e discussões.

Finamente, a quinta etapa é composta pelas considerações finais, em que foram relacionados os objetivos iniciais com os resultados encontrados. Além das referências bibliográficas utilizadas para fundamentação desta pesquisa e o questionário aplicado nas entrevistas.

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2 A MULHER NO MERCADO DE TRABALHO

A presente seção versa sobre a mulher no mercado de trabalho, realizando-se, primeiramente, uma abordagem histórica a respeito de sua inserção e, posteriormente, são feitos esclarecimentos acerca dos desafios de ser mulher na vida profissional.

2.1 Inserção feminina no mercado de trabalho

Foram nos momentos históricos de maior desequilíbrio que ocorreu a maior entrada de mulheres no mercado de trabalho. Na primeira Revolução Industrial, a força de trabalho feminina foi muito importante para as indústrias (CAPELLE; MELO, 2010). Nesse período, as fábricas muito utilizaram a mão-de-obra das mulheres, com a finalidade de diminuir os custos com salários, e pensando na maior facilidade em geri-las (BAYLÃO; SCHETTINO, 2014).

Durante a Primeira e Segunda Guerra Mundial, devido a evasão dos homens, as mulheres tiveram que ocupar, momentaneamente, os cargos deixados por eles (CAPELLE; MELO, 2010). Ao final dessas guerras, os cenários estavam todos modificados, muitos homens não conseguiram retornar para seus postos, tendo em vista que vários morreram, outros foram mutilados ou ficaram com sequelas psicológicas. Nesse contexto, restou às mulheres, o ofício de substituí-los, deixando a casa e os filhos, para assumirem os projetos e trabalhos de seus esposos (BAYLÃO; SCHETTINO, 2014).

Na ocupação policial, foco desse estudo, as mulheres começaram a ter participação nessa atividade, em 1934, na França. A princípio, em um cargo denominado de assistente de polícia, com atividades relacionadas aos cuidados de crianças com ameaças psíquicas ou morais e patrulhamento de espaço público. Posteriormente, elas adentraram no grupo de inspetores, porém, em tarefas menores. Em 1973 foi sancionada uma medida que proporcionou às mulheres o ingresso por meio de concurso na função de inspetor principal. Um decreto, em 1974, permitiu concursos para as chefias. Nessa função, no entanto, elas não foram bem recebidas. O progresso continuou pelos próximos anos, atingindo 105 dos postos. Essa evolução foi de suma importância para incluí-las na profissão, considerando o ofício não mais exclusivamente masculino (CALAZANS, 2003)

Conforme Souza (2014), o surgimento das mulheres na polícia no Brasil, se deu pela busca de inseri-lo no contexto dos países mais desenvolvidos. Foi em São Paulo, estado com maior progresso econômico do país, que começou a ser implantada uma mudança cultural.

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Jânio Quadros, governador da época, após uma viagem a Londres, e lá ter visto policiais mulheres, decidiu introduzi-las nesse cenário, como parte da modernização. Essa inserção feminina se deu, primeiramente, na necessidade dos postos mais altos da sociedade de mostrarem que estavam acompanhando os avanços internacionais.

A Polícia Feminina de São Paulo surge, formalmente, em 12 de maio de 1955, através de decreto n. 25.548, durante o governo de Jânio Quadros. Instituída inicialmente como Corpo de Policiamento Especial Feminino, vinculada diretamente ao Gabinete do Secretário de Segurança Pública do Estado, passa, após período de experiência, a ser designado Polícia Feminina por meio da Lei n. 5.235, de 15 de janeiro de 1959. Subordinada à Secretaria de Segurança Pública, a Polícia Feminina é definida no artigo 2º da lei como “corporação uniformizada, organizada com base na disciplina hierárquica” e que tem como atribuições a investigação e prevenção da criminalidade associadas a tarefas de caráter assistencial que deveriam focar a proteção de menores e mulheres, sendo estas funções designadas por melhor se ajustarem ao perfil psicológico feminino (SOUZA, 2014, p.70).

No contexto da Polícia Federal, segundo a Diretoria de Gestão de Pessoal da Polícia Federal (DGP/PF), por meio da informação nº 10999937/2019-DGP/PF, de 13 de maio de 2019, requisitada através do Sistema Eletrônico do Serviço de Informação ao Cidadão, desde o primeiro concurso realizado para cargos do Departamento Federal de Segurança Pública (DFSP), antigo Departamento de Polícia Federal (DPF), em 1969, já transferido para Brasília, não havia nenhuma restrição quanto a participação de mulheres, sendo o ingresso permitido para qualquer função, não existindo número mínimo ou máximo de vagas destinadas a elas.

A presença feminina nas polícias pelo mundo teve um aumento significativo desde a década de 1960. Nos anos 1990, houve o maior índice de crescimento. No entanto, segundo Souza (2014, p.09), “[...] recentemente, pesquisas têm apontado um processo de desaceleração do recrutamento feminino com tendências à estagnação”.

O número de mulheres economicamente ativas tem crescido bastante nos últimos tempos. Os anos 1960 e 1970 foram importantes nesse contexto, período em que diversos movimentos sociais e políticos incentivaram uma mudança cultural. Devido a isso, elas passaram a ter uma maior escolarização, inclusive em âmbito universitário e a trabalharem fora de casa. A recessão econômica do país, nos anos 1980, ocasionou o aumento da desigualdade social, fazendo com que houvesse um crescimento ainda maior da participação feminina na atividade econômica (PEREIRA; SANTOS; BORGES, 2005).

Os movimentos feministas ganharam força no final do século XX, o que propiciou uma maior conscientização das mulheres no que diz respeito as relações de trabalho e seu papel na sociedade. Em decorrência disso, o modelo tradicional patriarcal começou a ser questionado. Dentro do núcleo familiar, surgiram algumas mudanças, como a possibilidade de

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separação, consequência do divórcio e da dificuldade de conciliar a vida a dois com o trabalho. Acrescente-se a isso, o retardamento da idade de casar e o crescente número de casamentos sem registro oficial. Essas mudanças impactaram a sociedade de forma geral, e em especial, no mercado de trabalho (ZAULI et al. 2013).

A inserção feminina no mercado foi impulsionada, também, pelo avanço dos métodos contraceptivos, o que permitiu a escolha de quantos filhos queriam ter e quando os teriam, facilitando a divisão entre casa e trabalho (BAYLÃO; SCHETTINO, 2014). Devido a isso, as mulheres adquiriram liberdade para exercer outros papéis que não o de serem mães. Além dos avanços nas áreas da medicina, biologia e farmacologia que influenciaram esse processo, as mudanças na economia e no mercado de trabalho conjuntamente com mais oportunidades de educação foram de grande relevância (ZAULI et al. 2013).

As discussões acerca da importância da diversidade emergiram nos anos 1990, nos Estados Unidos. Diversas empresas americanas possuíam filiais espalhadas pelo mundo, e isto, influenciou os demais países ao terem contato com a diversidade cultural e os conceitos de equidade de gênero (ZAULI et al. 2013). O progresso tecnológico, a globalização, e o capitalismo, impulsionados pelo início do século 21, proporcionaram um avanço na entrada delas no mundo organizacional. Cada vez mais elas vêm ganhando espaço e assumindo cargos de liderança. Aliado a isso, há ainda a questão financeira, fazendo com que tanto os homens como as mulheres, estejam inseridos no mercado de trabalho, a fim de arcarem com o sustento do núcleo familiar (BAYLÃO; SCHETTINO, 2014).

As mudanças nesse cenário não se devem somente ao aumento do número de trabalhadoras, mas também ao tipo de ocupação. Historicamente, havia trabalhos executados por homens e outros por mulheres. Cada vez mais, elas estão se inserindo em universos que eram predominantemente masculinos (PEREIRA; SANTOS; BORGES, 2005). De acordo com Capelle e Melo (2010), no Brasil, existem alguns segmentos em que elas são bem aceitas e valorizadas, contudo, há outros em que elas encontram muitas barreiras para se inserir e progredir.

As mulheres que adentram nos melhores cargos são, geralmente, as que possuem renda familiar suficiente para encarregar outras pessoas da atividade doméstica (normalmente, mulheres também). Muito embora tenha ocorrido um avanço feminino no mercado de trabalho, as questões sociais e culturais, da mulher ter que assumir múltiplos papéis, conciliar a vida doméstica com a profissional, formam uma barreira que impede as mulheres de assumirem cargos gerenciais, fenômeno esse denominado “teto de vidro” (BIASOLI, 2016).

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2.2 Os desafios de ser mulher na vida profissional

A maior entrada feminina no mercado de trabalho significou uma grande mudança no papel da mulher na sociedade. No entanto, não trouxe igualdade de sexo nas empresas. Elas continuam assumindo as tarefas de casa e, em sua maioria, são elas que interrompem suas carreiras para se dedicarem a criação dos filhos (ZAULI et al. 2013). Em 2016, as mulheres dedicavam em torno de 73% a mais de horas nas tarefas domésticas em comparativo com os homens. No Nordeste, essa porcentagem é ainda maior, chegando a 80%. Um dos fatores que contribui com esta diferença está relacionado a maior porcentagem de mulheres em empregos de período parcial (até 30 horas semanais), com 28,2%, contra 14,1% (IBGE, 2018).

Apesar do aumento significativo no número famílias, nas quais a mulher é a principal pessoa economicamente ativa, ainda existem grandes diferenças salariais entre os sexos. Além disso, o crescimento na carreira também é muito mais veloz para homens (ZAULI et al. 2013). As mulheres ainda ocupam cargos mais baixos, por vezes recebendo salários menores que os homens, e estatisticamente, tem maiores chances de ficarem desempregadas (BAYLÃO; SCHETTINO, 2014). Conforme estudos da Organização Internacional do Trabalho - OIT (2016), na maioria das regiões do mundo, excluindo o Leste Asiático, Leste Europeu e a América do Norte, as mulheres tem maior probabilidade de ficarem sem emprego, com uma taxa global de desemprego de 6,2%, contra 5,5% dos homens.

De acordo com dados do IBGE (2019), em 2018, as mulheres com idade entre 25 e 49 anos, recebiam cerca de 79,5% do salário dos homens de mesma faixa etária. Em algumas profissões, a participação feminina é maioria, como os trabalhadores domésticos (95%), professores do ensino fundamental (84%), funcionários da limpeza de prédios, hotéis, escritórios e outros pontos comerciais (74,9%) e profissionais de centrais de atendimento (72,2%). Porém, apesar da alta representatividade, elas ainda recebem menos, conforme tabela 1:

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Tabela 1 – Representatividade profissional feminina e rendimentos

Profissões Representatividade feminina (%)

Rendimento das mulheres em relação ao rendimento dos homens (%)

Diretores e Gerentes 41,80% 71,30%

Profissionais das ciências e intelectuais 63% 64,8% Professores do Ensino Fundamental 84% 90,50% Professores universitários 49,80% 82,60% Médicos especialistas 52% 71,8% Advogados 52% 72,6%

Fonte: IBGE (2019), elaborada pela autora (2019).

É preciso que haja uma reestruturação do mercado, de forma que se tenha uma melhor distribuição de funções entre os gêneros, reduzindo a ocupação de postos inferiores e menor remuneração das mulheres (BAYLÃO; SCHETTINO, 2014).

Em 2015, a taxa de atividade global de mulheres era de 49,6% enquanto que a de homens era de 76,1%, sendo quase 27 pontos percentuais de diferença entre os sexos, uma diferença considerável em termos de oportunidade (OIT, 2016).

Em nível regional, segundo a Pesquisa de Emprego e Desemprego- PED, publicada em março de 2017 pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos- DIEESE, na Região Metropolitana de Fortaleza, existiam em 2016, 1.465.000 pessoas fora do mercado de trabalho local, sendo 932 mil mulheres e 542 mil homens. Ao analisar a escolaridade, observa-se que, conforme o IBGE (2018), no Brasil, na faixa etária de 25 a 44 anos, 21,5% das mulheres possuíam ensino superior completo, contra 15,6% dos homens.

Quanto à participação feminina no Congresso Nacional, a representatividade ainda é muito baixa, sendo, em 2017, de 11,3%. No Senado, a presença de mulheres era de 16% e, na Câmara dos Deputados, 10,5%. O Brasil foi o pior resultado dentre os países da América do Sul. A média mundial foi de 23,6% (IBGE, 2018).

Segundo uma pesquisa feita por Vaz (2010), que analisou a participação feminina nos cargos em comissão da Direção e Assessoramento Superiores (DAS), quanto maior o nível do cargo, menor era a participação. Esses postos têm função de chefia e assessoramento, na administração pública federal. Considerando os seis níveis existentes de DAS, em 2009, as mulheres ocupavam 45,3% do tipo DAS 1, entretanto, do tipo DAS 6 (mais elevado e melhor remunerado), apenas 20,9%, comprovando que nem mesmo instituições públicas escapam do teto de vidro, fenômeno no qual, as mulheres enfrentam barreiras para o crescimento vertical na carreira.

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Segundo Carvalho Neto, Tanure e Andrade (2010), a presença de mulheres nos níveis mais elevados da organização ainda é menor em comparativo com os homens, uma vez que dos 965 executivos entrevistados, somente 23% são mulheres, o que mostra que quanto mais elevada é a função menor é a presença feminina. Dos 36 presidentes entrevistados, apenas 2 eram mulheres. O ambiente da alta gestão organizacional é predominantemente masculino. À vista disso, um dos fatores que dificultam o crescimento feminino dentro das organizações é a dificuldade de conciliar a vida profissional com a pessoal, segundo essa vertente, as mulheres deixam de assumir cargos de liderança para não terem conflitos ao regerem suas vidas profissionais e familiares (VAZ, 2010).

Mesmo as mulheres trabalhando fora de casa, ainda paira sobre elas, a responsabilidade das tarefas domésticas ou a supervisão delas, e os cuidados com os filhos, isso faz com que tenham dupla ou tripla jornada de trabalho, apesar dos avanços nesse sentido, a divisão igualitária dos serviços de casa ainda é rara. Fato este que atrapalha o avanço delas na profissão (CAPELLE; MELO, 2010).

O Brasil é um país historicamente machista, e apesar da grande participação feminina no mercado de trabalho, a responsabilidade pela criação dos filhos ainda não é totalmente e igualmente dividida. As mulheres enfrentam maior estresse ao desempenharem seu papel na unidade familiar do que os homens. Há, no país, uma larga oferta de mão-de-obra de baixo custo, em que elas podem transferir algumas tarefas para outras mulheres. As babás e empregadas domésticas as auxiliam no cuidado com a casa e com os filhos. Entretanto, mesmo possuindo empregados, sobra a elas a orientação e imposição de limites acerca do trabalho desempenhado pelas pessoas por elas contratadas, o que se torna um peso a mais para a mulher (CARVALHO NETO; TANURE; ANDRADE, 2010).

Devido à maior responsabilidade com a criação dos filhos, as mulheres acabam tendo menos liberdade de fazerem viagens de trabalho. Dificilmente a família muda de cidade em decorrência do trabalho da mãe, enquanto que o contrário, é bem mais comum. Isso dificulta o avanço delas na hierarquia (CARVALHO NETO; TANURE; ANDRADE, 2010).

Ademais, outro fator, sendo um dos mais importantes quanto a barrar o crescimento feminino no trabalho, é a questão da discriminação, que se apresenta sob dois aspectos, um é por preferência, em que o contratante prefere empregar um homem, mesmo que as pessoas de ambos os sexos tenham a mesma capacitação, e o outro é estatístico, em que pressupõe que a produtividade feminina é inferior à masculina (SANTOS; TANURE; CARVALHO NETO, 2014).

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Lombardi (2006) identificou, por meio de entrevistas com engenheiras, algumas razões que impedem a ascensão hierárquica de mulheres. A construção civil é um ambiente predominantemente masculino no qual as dificuldades são ainda potencializadas devido este aspecto. Um dos fatores é o fato da organização conceder privilégios às áreas ocupadas por homens e quando essas mesmas áreas são ocupadas por mulheres, o mesmo não ocorre. Há ainda, a questão da disponibilidade de fazer viagens e horas extras, o que é mais difícil para elas devido a conciliação da vida familiar e profissional. Além disso, a dificuldade dos engenheiros de aceitarem a liderança feminina, pode levar a conflitos explícitos. Adicionalmente, os parâmetros de avaliação levarem mais em consideração características masculinas, do que as das mulheres, como a habilidade de relacionamentos e resolução de conflitos.

No cenário policial, segundo uma pesquisa realizada por Capelle e Melo (2010), com policiais militares de Minas Gerais, todas as mulheres entrevistadas realizam tarefas tanto operacionais quanto administrativas, no entanto, vários homens fazem apenas atividades operacionais. E elas, mesmo quando são mandadas para a área operacional, muitas vezes, ficam responsáveis pelo atendimento do público em geral.

Este fato se repete com policiais militares de São Paulo, em um estudo feito por Souza (2014), as mulheres são mantidas longe das ruas por ligarem a imagem feminina a fragilidade e pelo machismo presente na instituição. Elas acabam aceitando a situação, pois trabalhando internamente é possível conciliar mais facilmente a vida profissional com a doméstica. Na mesma pesquisa, mais de 70% dos praças disseram existir preconceito contra mulheres na organização, enquanto 40% dos oficiais disseram o mesmo, já entre elas, os índices foram iguais nos dois grupos. A maioria das respondentes informaram nunca ter presenciado ou terem sido vítimas de preconceito, porém, várias disseram que já souberam de situações do tipo.

No Ceará, em 1995, a polícia militar fez um concurso para recrutar mulheres, no entanto, as aprovadas nunca foram sequer nomeadas. A instituição chegou a se manifestar, dando ênfase de que se tratava de um caso isolado. Porém, em 2003, foram abertas 1.000 vagas e as mulheres foram barradas, mesmo com liminar da justiça. Em 2007, foi realizado concurso com 1.000 vagas e em 2008 com 2.000, para o cargo de soldados de fileira, e foram disponibilizadas 5% destas para elas. Já na Polícia Civil do Ceará, em 2004, dos 377 cargos comissionados, apenas 101 eram ocupados por mulheres. Cerca de 30% dos servidores pertencia ao sexo feminino. Estes dados demonstram a representatividade feminina limitada nessas organizações (LOPES; BRASIL, 2010).

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O ambiente da polícia federal, assim como o da construção civil e da polícia militar e civil, tem uma predominância histórica masculina, fazendo com que haja uma maior dificuldade de aceitação feminina nesse ambiente. Segundo Fogaça e Almeida (2014), o preconceito velado dos homens dentro da instituição é um dos desafios enfrentados por elas.

Segundo um estudo realizado por Haarr e Morash (2013), com mulheres policiais nos Estados Unidos, a maioria delas sentem a necessidade de se provar constantemente, trabalhando mais arduamente que os outros, a fim de demonstrarem suas habilidades. Esse trabalho de reafirmação que elas enfrentam, mostram a necessidade de uma mudança das políticas internas e na forma de gestão organizacional, de modo que as mulheres possam concentrar suas energias exclusivamente na atividade policial. No entanto, o baixo número de mulheres na polícia causa uma sub-representação delas nas tomadas de decisão, impedindo o desenvolvimento de políticas públicas eficazes. Para Yu (2014), enquanto a mulheres representarem apenas 15,5% do contingente total, nenhuma medida tomada será suficiente para mudar a identidade masculina da organização. A instituição deve criar uma cultura organizacional que não aceite o assédio e a discriminação de gênero e implementar políticas que enfatizem a contribuição feminina nesse ambiente predominado pelos homens.

O efetivo de mulheres na Polícia Federal, em março de 2019, segundo o Ministério de Planejamento, Desenvolvimento e Gestão hoje vinculado ao Ministério da Economia (2019), é de 4.106 servidoras, o que representa apenas 17,1% do todo. No Nordeste há 823 profissionais mulheres (17,6%). No Ceará, dos 850 funcionários, apenas 180 (21,2%) são mulheres. Ao verificar, em específico, o quantitativo total dos cargos de Delegado, Agente e Escrivão, objeto de análise da pesquisa, em âmbito nacional, de acordo com dados disponibilizados pela Diretoria de Gestão de Pessoal da Polícia Federal (DGP/PF), por meio da informação nº 10994036/2019-DGP/PF, de 14 de maio de 2019, requisitada através do Sistema Eletrônico do Serviço de Informação ao Cidadão, observa-se a discrepância de representatividade numérica entre os sexos, conforme tabela 2:

Tabela 2 – Quantitativo de Delegados, Agentes e Escrivães na PF

Cargo Quantitativo Total Quantitativo Mulheres % Mulheres

Delegado de Polícia Federal 1.579 226 14,31%

Agente de Polícia Federal 5.820 569 9,78%

Escrivão de Polícia Federal 1.784 378 21,19%

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Segundo Fogaça e Almeida (2014), a minoria feminina nesse cenário é justificada pela associação da atividade policial ao uso da força bruta em predominância ao preparo intelectual. As autoras destacam, entretanto, que, cada vez mais, são exigidas investigações eficazes e é preciso incluir as mulheres na instituição, para que haja uma polícia democrática e que respeita os direitos humanos. As características culturais do ofício, como a força física, se tornaram menos evidentes. Outros traços são mais requisitados, mais adequados a realidade moderna, como a inteligência, eficácia na resolução de problemas, inovação e capacidade de trabalhar em equipe. Novas situações surgem, e tornam a força bruta menos importante, como dar prioridade em diminuir ocorrências potencialmente violentas e evitar conflitos, por exemplo (CALAZANS, 2003).

A representatividade feminina na polícia federal, de forma geral, sempre foi baixa. Isso reflete tanto nos cargos de chefia com DAS, que possuem maior remuneração, como nos cargos com FG, que tem menor remuneração, de acordo com informações fornecidas pela Diretoria de Gestão de Pessoal da Polícia Federal (DGP/PF), por meio da informação nº 10994036/2019-DGP/PF, de 14 de maio de 2019, requisitada através do Sistema Eletrônico do Serviço de Informação ao Cidadão, referente ao mês de abril de 2019 e os valores brutos recebidos por cada um, em consoante com o disponibilizado pelo Sistema de Informações Organizacionais – SIOG (2019):

Tabela 3 – Ocupação de DAS e FG na Polícia Federal

Cargo/Função Remuneração Quantitativo de homens % homens Quantitativo de mulheres % mulheres FG 2 R$ 656,29 170 80,2% 42 19,8% FG 3 R$ 532,07 411 82,7% 86 17,3% DAS – Chefia 1011 R$ 2.701,46 102 82,9% 21 17,1% DAS – Chefia 1012 R$ 3.440,75 28 75,7% 9 24,3% DAS – Chefia 1013 R$ 5.685,55 24 80,0% 6 20,0% DAS – Chefia 1014 R$ 10.373,30 14 87,5% 2 12,5% DAS – Chefia 1015 R$ 13.623,39 8 100% 0 0 DAS – Chefia 1016 R$ 16.944,90 1 100% 0 0 DAS – Assistente 1021 R$ 2.701,46 0 0 2 100% DAS – Assistente 1022 R$ 3.440,75 3 60,0% 2 40%

Fonte: Diretoria de Gestão de Pessoal da Polícia Federal (2019), Sistema de Informações Organizacionais (2019), elaborada pela autora (2019)

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Em conformidade com dados apresentados pela tabela 3, observa-se que os cargos e funções cujas remunerações são mais significativas e correspondem aos que possuem maior poder de decisão e de maior relevância dentro da instituição (DAS 5 e 6) são ocupados em sua integralidade por servidores do sexo masculino. Enquanto que nas Funções Gratificadas (FG) e nos cargos de assistente, DAS – Assistente 1021 e DAS – Assistente 1022, a representatividade feminina passa a ser mais significativa. Depreende-se que as mulheres ocupam cargos e funções com menor poder de decisão e remuneração inferior.

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3 SOCIALIZAÇÃO PROFISSIONAL

Esta seção aborda o processo de socialização profissional, exposto, de início o conhecimento acerca da socialização e construção da identidade, posteriormente, a socialização profissional e a identidade profissional. Por fim, é apresentado o modelo de socialização profissional proposto por Hughes (1958, 2016).

3.1 Socialização e construção de identidade

O processo de socialização se dá pela interação entre os indivíduos. É por meio deste, que se adquire uma personalidade, aprende-se a viver em sociedade e a planejar a vida. Portanto, é um processo fundamental tanto para o ser humano quanto para sociedade (TURNER, 2000).

De acordo com Dubar (2005), a socialização não é apenas propagação de valores, regras e normas, mas um processo de construção de identidade, em que as vivências de cada um e a forma com que são interpretadas fazem parte desse processo, podendo ser reconstruídas ao longo do tempo. Socializar-se é assumir ser parte de grupos de referência.

Segundo Berger e Luckmann (2014, p. 167), “[...] o indivíduo não nasce membro da sociedade. Nasce com uma predisposição para a sociabilidade e torna-se membro da sociedade”. De acordo com os autores, essa sociedade tem que ser compreendida como um processo dialético constituído de três momentos: exteriorização, objetivação e interiorização. Apenas após concretizado esse grau de interiorização é que o indivíduo se torna parte da sociedade.

Logo no início da vida, as pessoas são inseridas em seus primeiros núcleos sociais, como a família, pré-escola ou orfanato, por exemplo. E essas relações, além de assegurar a supervivência, ajudam a delinear os valores sociais de cada um. Enquanto adultos são inúmeros os processos de socialização, e destes, advém os desafios, crescimentos e realizações. Essas interações entre indivíduos são constantes durante toda a vida e transformam as instituições humanas no decorrer da história (SPUDEIT; CUNHA, 2016).

A primeira forma de socialização, introduzida ainda na infância, é chamada de socialização primária. É nela que a criança assimila comportamentos e os interioriza. O processo posterior a essa primeira etapa, é chamado de socialização secundária, em que há a

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inserção de um sujeito já antes socializado, em novos ambientes. Sendo a primeira, base para a segunda (BERGER; LUCKMAN, 2014).

O ciclo biológico dos seres humanos engloba o nascimento, crescimento e morte. No entanto, na sociedade, esse ciclo é medido por meio das fases de estudo e trabalho, como a pré-escola, escola, trabalho e aposentadoria. E é por meio deste que o indivíduo constitui sua identidade (HUGHES, 1958, 2016).

A fase adulta faz parte do ciclo vital e mesmo pessoas de faixa etária similar podem possuir características identitárias muito diferentes, pois estas advêm de vivências pessoais, considerando o ambiente social de cada um. A construção da identidade pessoal e social é fundamentada por meio dos papéis sociais assumidos pelos adultos, como o profissional, por exemplo (ANDRADE, 2016).

Sob essa ótica, cada indivíduo é composto por dois seres, o ser individual e o ser social. E apesar de estarem ligados, possuem conceitos que diferem entre si. Dessa maneira, o primeiro é constituído pelas características que dizem respeito somente a si mesmo e as vivências de cunho pessoal. O segundo é uma demonstração dos grupos aos quais fazem parte, como os preceitos religiosos, as tradições, as crenças morais e opiniões diversas (DURKHEIM, 2011).

A identidade de um sujeito é o que ele tem de mais relevante, e sua perda, é sinônimo, para Dubar (2005, p.125), “[...] de alienação, sofrimento, angústia e morte”. Ainda segundo o autor, essa identidade não é entregue ao nascimento, é formada quando criança, e, a partir de então, renovada no transcorrer do tempo. O indivíduo não a concebe só, ele necessita da opinião alheia. Ela é fruto das consecutivas socializações.

Segundo Berger e Luckmann (2014), a identidade é constituída por processos sociais. E quando consolidada, é conservada ou alterada pelas relações sociais. Esses processos são definidos pelo sistema social. De acordo com os autores:

A identidade é um fenômeno que deriva da dialética entre um indivíduo e a sociedade. Os tipos de identidade, por outro lado, são produtos sociais tout court, elementos relativamente estáveis da realidade social objetiva (sendo o grau de estabilidade evidentemente determinado socialmente, por sua vez). Assim sendo, são o tema de alguma forma de teorização em uma sociedade, mesmo quando são estáveis e a formação das identidades individuais é relativamente desprovida de problemas (BERGER; LUCKMAN, 2014, p. 222).

Machado (2003) identifica quatro tipos de identidade: a identidade pessoal, identidade social, identidade no trabalho e identidade organizacional. Conforme Santos (2005, p.123) “A identidade, enquanto característica singular de um indivíduo que o distingue do outro,

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implica, paradoxalmente, uma dualidade: a identidade pessoal (ou a identidade para si) e a identidade para os outros”.

A estruturação da identidade é um processo ativo entre os traços individuais e as percepções de cada um e a influência do contexto externo social. A identidade pessoal é, então, a forma com que o sujeito recebe e assimila os estímulos sociais, culturais e psicológicos de diferentes ambientes (SANTOS, 2005). De acordo com Dubar (2005), entre os fatos mais importantes no processo de construção da identidade social está o egresso do ensino escolar e o ingresso no mercado de trabalho, considerando-se que as escolhas realizadas durante o período escolar, exprimem uma antecipação relevante do futuro status social.

A construção da identidade engloba um processo de atenção e análise que acontece em todos os graus do trabalho psíquico, pelo qual o sujeito julga a si próprio de acordo com o que percebe ser a forma que os outros julgam e conjectura também, o modo de julgamento dos demais em relação a si, baseando-se no jeito que se percebe em comparação com os demais e com os quais considera significativo (ERIKSON, 1976).

Portanto, esse processo de construção identitário, ocorre ao longo de toda a vida. Tendo início na socialização primária, na infância, dentro do núcleo familiar, posteriormente, passando pela socialização secundária, no ambiente escolar e outros grupos sociais, chegando, por fim, na socialização profissional. Em cada ciclo, o espaço social influencia os sujeitos e é influenciado por eles. E a identidade é construída por meio dessas influências (BOULART; LANZA, 2007).

3.2 Identidade profissional e socialização profissional

O trabalho de um indivíduo proporciona ao mesmo uma subcultura e uma identidade, transformando-se em um aspecto de sua personalidade, sendo uma das partes mais importantes da identidade social de cada um (HUGHES, 1958, 2016). De acordo com Tardif e Raymond (2000, p.210):

Se uma pessoa ensina durante trinta anos, ela não faz simplesmente alguma coisa, ela faz também alguma coisa de si mesma: sua identidade carrega as marcas de sua própria atividade, e uma boa parte de sua existência é caracterizada por sua atuação profissional. Em suma, com o passar do tempo, ela tornou-se – aos seus próprios olhos e aos olhos dos outros – um professor, com sua cultura, seu éthos, suas ideias, suas funções, seus interesses etc.

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A profissão é um dos maiores anseios nas sociedades, em razão do status que possuem. As pessoas almejam profissões grandiosas, pois isto interfere na forma como são vistas por si mesmos e pelos outros (HUGHES, 1958, 2016).

A identidade profissional é uma forma de apresentação do indivíduo perante a sociedade e funciona como, para Malvezzi (2000, p.141) “[...] um conjunto de recursos ocupacionais que alguém apresenta como bagagem pessoal”. Essa identidade sofre influências durante o processo de construção, porém elas não definem o resultado (MALVEZZI, 2000).

Um profissional não é formado apenas de conhecimentos teóricos adquiridos durante a formação acadêmica, mas também, essencialmente, pela inserção no ofício como de fato ele é. Ocorre um processo pelo qual os estudantes convertem o que idealizavam da profissão e como se imaginavam nela e os estereótipos envolvidos, com o mundo profissional real, como é na prática. Não é apenas absorção de saberes, é também, incorporação de uma cultura profissional (HUGHES, 1958, 2016).

Uma parte significante da identidade profissional é construída pela experiência, a qual é adquirida pela prática da realização do ofício, pelo relacionamento com os demais profissionais e pela junção entre a identidade virtual, a que é proposta pelos de fora, e a identidade real, a que é absorvida pelo indivíduo (SANTOS, 2005).

De acordo com Dubar (2005), a identidade profissional é constituída de quatro saberes: os práticos, os profissionais, os de organização e os teóricos. O primeiro diz respeito a vivência prática do ofício, não ligados aos saberes teóricos, “[...] são estruturantes da identidade hoje ameaçada de exclusão; associada a uma lógica instrumental do trabalho pelo salário (TER) [...] ” (p.328). O segundo envolve a conexão entre os saberes práticos e os saberes técnicos, e está no centro da identidade desenvolvida pelo trabalho, “[...] associada a uma lógica da qualificação no trabalho (FAZER) [...] ” (p.328). Os saberes de organização envolvem outras conexões entre os saberes práticos e teóricos, eles formam a identidade da organização, “[...] que implica mobilização e reconhecimento; associada a uma lógica da responsabilidade (SER) [...] ” (p. 329). Por fim, os saberes teóricos são aqueles não associados aos saberes práticos e profissionais, eles “[...] estruturam um tipo de identidade marcado pela incerteza e pela instabilidade e consideravelmente orientado para a autonomia e acumulação de distinções culturais (SABER) [...]” (p. 329).

De acordo com Spudeit e Cunha (2016), durante a construção da identidade há o obstáculo de lidar com a procura do equilíbrio entre o que de fato o indivíduo é, e o que os demais esperam dele. Para as autoras, entre os diversos âmbitos, o aspecto profissional é o que possui maior relevância, uma vez que a profissão é fator determinante para a construção

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da identidade. Os ofícios são resultados sociais em permanente construção. É possível o entendimento desse processo, por meio das mudanças ocorridas no ambiente escolar, familiar ou mesmo pela mídia. Tais cenários podem ser vistos como locais socializadores que se encontram em uma relação de interdependência, em um lugar de múltiplos vínculos.

O processo de construção da identidade profissional abrange a educação acadêmica, o desenvolvimento profissional e as vivências em diversos ambientes sociais. Associa-se a profissão ao processo de socialização profissional, o qual engloba crenças, maneiras de capacitação e atitudes. Possui como resultado, a definição de identidade. (SPUDEIT, 2010).

Em todas as profissões, a vida laboral é construída das relações com os outros, sejam chefes, parceiros, clientes ou o público em geral, adentradas em experiências de trabalho, frisadas pela divisão do trabalho, caminhos percorridos e acertos e fracassos. A socialização profissional é, portanto, um processo que relaciona as experiências vividas, as tarefas a serem feitas, concepções a serem seguidas e a interação com outros profissionais e consigo mesmo, sendo um processo de construção contínuo. É a forma pela qual se aprende o trabalho (DUBAR, 2012).

Essa socialização possui como parâmetro a imersão em uma profissão, englobando a relação do indivíduo com as diversas organizações, pela absorção de regras, valores, símbolos e expressões. É um processo que percorre toda a vida profissional (SPUDEIT; CUNHA, 2016).

Finalmente, de acordo com as convicções apresentadas por esses autores, a socialização profissional é o processo de imersão na vida profissional, considerando os conhecimentos adquiridos, a vivência prática da profissão, os relacionamentos com os demais e as experiências e concepções pessoais. A identidade profissional é, portanto, o produto desse processo. O tópico seguinte, abordará especificamente, o modelo de socialização profissional proposto por Hughes (1958, 2016).

3.3 O modelo de Socialização Profissional de Hughes

Everett Hughes, em 1955, publicou um famoso artigo intitulado “The making of a physician [A fabricação de um médico]”, em que o autor elaborou uma estrutura para estudar o processo de formação para uma profissão. Em 1958, esse artigo foi recobrado no capítulo 9 do livro “Men and their Work” (DUBAR, 2005). E reeditado em 2016.

O estudo foi produzido com profissionais da área de medicina, desde professores até cientistas sociais, em que foram traçadas as trajetórias dos alunos de uma escola particular de

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medicina. Apesar do grupo focal ser dessa área em específico, os resultados também são implícitos as outras profissões (HUGHES, 1958, 2016).

O processo para se tornar médico inicia quando o indivíduo escolhe e almeja a profissão, a partir do conhecimento leigo que o mesmo possui acerca da medicina e de si mesmo como profissional. Ele, então, ingressa na faculdade, e essa formação não é feita exclusivamente da absorção dos conhecimentos técnicos e teóricos. Mas também, da introdução no trabalho real, e da transformação do conhecimento anterior, leigo, rodeado de estereótipos, no conhecimento profissional, do que de fato a prática da profissão é, com todo o status da atividade fim e, também, as tarefas menos prestigiosas, como a administrativa. Todo esse agrupamento, de funções mais e menos valorizadas, os jargões, crenças e desafios, formam a cultura médica profissional. Já a cultura médica leiga envolve as concepções e crenças sobre o papel apropriado do médico, e não sobre o que ele é realmente na prática (HUGHES, 1958, 2016; DUBAR, 2012).

A educação médica se dá pelo conjunto de planos e experiências não calculadas que os leigos, em sua maioria jovens e com algum conhecimento sobre a cultura médica, absorvem e se tornam detentores de um pedaço do conhecimento teórico e científico da profissão. O ponto inicial é a cultura médica leiga. Já o fim é variável, apesar da padronização do aprendizado, pois essa etapa final não está nos ciclos formais, mas do que foi realmente aprendido, e este, apresenta graus diversos (HUGHES, 1958, 2016).

O início do ciclo de imersão em uma profissão é marcado pelo contato das culturas, leiga e profissional, dentro do sujeito. Essa interação ocorre várias vezes durante a vida, sendo mais profunda no processo de aprendizagem e iniciação. Considera-se que os indivíduos ao adentrarem no percurso para se tornarem médicos, possuem uma imagem de como é o trabalho, quais as diferentes áreas e como se veem na profissão. Porém, essas ideias, na maioria dos casos, são bem mais simples do que a realidade. (HUGHES, 1958, 2016).

As profissões, de uma forma geral, possuem diferentes tipos de tarefas a serem desempenhadas, algumas possuem mais prestígio que outras. Na medicina por exemplo, as várias áreas possuem níveis diferenciados de valorização perante a sociedade, tanto na visão leiga quanto na profissional, apesar de por vezes, não terem a mesma visão. O status também se difere em relação ao tipo de trabalho realizado, se é administrativo ou prescrição de remédios, por exemplo. Ao vivenciar a cultura profissional, o aluno aprende novas habilidades e observa de perto esses afazeres, passando então, por mudanças de atitude em relação a si mesmo, descobrindo gostos e aptidões, e ao trabalho, possibilitando a escolha de que especialidade seguir e que papel deseja desempenhar. O modelo ideal de profissional é aquele

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que consegue equilibrar as atividades mais e menos valorizadas e desempenha bem seu papel em relação aos colegas, pacientes e a si mesmo. (HUGHES, 1958, 2016).

Considerando-se o exposto, o modelo de socialização profissional de Hughes é estruturado em três fases. De acordo com os resultados obtidos pelos estudos de Hughes (1958), Dubar (2005) intitulou essas fases de: Passagem através do espelho, Instalação da dualidade e o Ajuste da concepção em si, conforme esquema da figura 1 a seguir:

Figura 1 - Modelo de socialização profissional

Fonte: Hughes (1958, 2016), Dubar (2005) elaborado pela autora (2019)

A primeira etapa denominada de “Passagem através do espelho” representa a interação entre a cultura leiga - visão que o sujeito tem sobre a profissão antes de conhece-la na prática - e a cultura profissional – visão de como a profissão de fato é, após contato com a mesma - dentro do indivíduo, provocando emoção e angústia. A segunda etapa “Instalação da dualidade”, refere-se ao confronto entre o modelo ideal, que consiste na forma simbólica como a profissão é vista e os estereótipos envolvidos, e o modelo prático, que diz respeito a realidade do trabalho. Há, nessa fase, o conflito entre o que era idealizado e esperado do ofício e o que ele é realmente. Por fim, vem o “Ajuste da concepção em si”, em que os estereótipos são abandonados, e uma nova identidade surge após a interação entre as culturas e o confronto entre os modelos. Nessa etapa consideram-se as capacidades, habilidades e gostos adquiridos e se faz uma escolha a respeito de que forma se quer seguir profissionalmente (HUGHES, 1958, 2016; DUBAR, 2005).

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Portanto, dado o exposto, a primeira fase consiste na interação entre a visão prévia da profissão e o que ela é na prática. Na segunda fase há o confronto entre o que se imaginava e o que de fato é o exercício do ofício. E na última fase, deixa-se para trás as concepções estereotipadas, e assume-se uma nova identidade profissional.

Referências

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