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MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL

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Academic year: 2019

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CARLA PELLICER DOS SANTOS

DISCURSOS SOBRE CRECHE NO JORNAL FOLHA DE S.

PAULO

ONLINE

(1994-2009)

MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL

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DISCURSOS SOBRE CRECHE NO JORNAL FOLHA DE S. PAULO

ONLINE

(1994-2009)

MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL

Dissertação apresentada à Banca

Examinadora da Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção de título de Mestre em Psicologia Social, sob orientação da Profa. Dra. Fúlvia Rosemberg.

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Banca Examinadora

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Ao meu Deus pelo seu amor infinito, sua presença na minha vida e força concedida, para que eu pudesse seguir em frente nos momentos obscuros.

À Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP pelo ambiente agradável.

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo financiamento concedido, sem o qual a realização dessa pesquisa não seria possível.

À minha orientadora Fúlvia Rosemberg pela constante presença, dedicação, seriedade, competência, conhecimento e pela disponibilidade para debates e trocas de materiais. Pelas disciplinas ministradas e pela sempre precisa correção dos trabalhos.

À banca examinadora do exame de qualificação pela seriedade, competência e disponibilidade. Às suas contribuições muito ricas na construção deste conhecimento.

Ao Núcleo de Estudos sobre Gênero, Raça e Idade (NEGRI), grupo de pesquisa onde encontrei pessoas muito capazes, interessadas na construção coletiva do conhecimento e sempre dispostas a contribuir para meu desenvolvimento acadêmico.

Aos grandes amigos Carlos, Duda e Priscila que estiveram ao meu lado em todos os momentos, contribuindo teórica e emocionalmente no processo de construção desta dissertação. Às nossas reuniões casuais ou formais sempre muito produtivas.

À Silvia Ribeiro pelas incansáveis discussões, pelo acolhimento em sua casa, pelo infinito carinho e cuidado, pela sua grande amizade e pela pessoa incrível que é.

À Marina e à Flaviana que me acolheram em São Paulo. Aos nossos dias de convivência juntas, os quais possibilitaram um enorme crescimento pessoal e também acadêmico.

À minha mãe Regina que sempre apostou em mim, depositou confiança e foi minha parceira.

Ao Marcus pelas contribuições tecnológicas, pela paciência e pela credibilidade depositada em mim.

À minha irmã Juliana por todo seu carinho, amor e parceria durante todos esses anos.

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Aos meus avós pela hospedaria, pelo carinho, pelos lanchinhos e por toda confiança e orgulho demonstrado.

Ao Marcos Daniel pelo carinho, cuidado e incentivo nos momentos finais de elaboração desta dissertação.

À Professora Mary Jane Spink pela disponibilidade para interlocuções sempre muito produtivas. Pelo seu carinho e confiança.

Aos funcionários e professores da PUC-SP que sempre estiveram dispostos a solucionar problemas e a contribuir com conversas formais e informais.

À Marlene Camargo pela disponibilidade em ouvir minhas angústias e pela sua prontidão ao auxílio nas questões burocráticas.

À Cidinha Mestriner pelas infinitas revisões, pelo enorme carinho e cuidado nos momento em que não parecia haver mais forças.

À Rosangela Ramos de Freitas pelo acolhimento em sua casa, paciência e didática no ensino de ferramentas e caminhos para a elaboração da análise.

À Denise por ajudar-me com minhas emoções.

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O objeto desta dissertação é descrever e interpretar discursos sobre creche captados em peças jornalísticas publicadas pelo jornal Folha de S. Paulo, no período de 1994 a 2009. Esta pesquisa se integra ao Núcleo de Estudos sobre Gênero, Raça e Idade (NEGRI), do Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Esta dissertação está fundamentada na concepção de criança como ator social, sujeito de direitos, e de infância como um grupo social permanente das sociedades. Concebemos as crianças como ativas no seu processo de formação e desenvolvimento, assimilando e produzindo conhecimentos e conteúdos da cultura ativamente: da mesma forma com que a cultura transforma a criança, a criança também transforma a cultura. O arcabouço teórico utilizado foi os Estudos Sociais da Infância e a Teoria de Ideologia de John B. Thompson. Essa última afirma que as maneiras como as formas simbólicas são produzidas, transmitidas e recebidas podem criar e manter relações de poder sistematicamente assimétricas. Formas simbólicas são um amplo conjunto de falas, ações, expressões que se constituem como construções significativas. Essa dimensão simbólica e o sentido por ela mobilizado constituem, também, a realidade social e participam ativamente da construção das relações sociais. De acordo com o enfoque dos estudos sobre a construção de problemas sociais, a definição de um problema social não constitui o reflexo de suas condições objetivas, mas resulta de sua construção a partir das formas como eles são concebidos e definidos, pela sociedade, perpassados pela projeção de sentimentos coletivos. Foi realizado um levantamento de peças jornalísticas a partir dos descritores “creche infância” e “creche criança”, selecionando aquelas que fizeram menção direta à creche. O período recortado tomou como limite inferior a data de início de publicação das peças jornalísticas no meio on line e como limite superior a data 13 de setembro

de 2009 quando versões impressa e on line tornaram-se compatíveis. Após o exame

de qualificação, foi realizada uma busca intencional associando ao termo creche os principais marcos legais da EI. Para a descrição dos dados foram utilizadas técnicas de análise de conteúdo propostas por Bardin e Rosemberg. Constituímos cinco núcleos de sentido: reduzida visibilidade do tema creche; opacidade em sua caracterização; retórica de denúncia/ataque em contexto de crise; ausência de crianças, de suas vozes, de suas individualidades, de suas histórias. Houve um silêncio refratário, uma certa omissão, um discurso pouco informativo e formativo. Esses discursos produzidos e transmitidos pelo jornal produziram e sustentaram relações de dominação de adultos sobre crianças, ou seja, produziu ideologia.

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The object of this thesis is to describe and interpret discourse about day care centers collected from journalistic texts published in the newspaper “Folha de São Paulo” from 1994 to 2009. This research integrates the Center for Research on Gender, Race and Age (NEGRI), of the Social Psychology Postgraduate Study Programe of the Pontifícia Universidade Católica in São Paulo. My thesis is based on the concept of child as a social actor, subject of rights, and of childhood as a permanent social group of the societies. We understand the children as active in their formation and development process, absorbing and producing acquirements/knowledge and contents of culture actively: as well as culture transforms the child, the child also transforms the culture. The theoretical frameworks used were the Social Childhood Studies and the Ideology theory by John B. Thompson. The latter states that the ways that the symbolic forms are produced, transmitted and received can create and maintain power relations systematically asymmetric. Symbolic forms are a wide range of speeches, actions, expressions which constitute significant constructions. This symbolic dimension and the meaning that it mobilizes also compose the social reality and participate actively in the construction of social relations. According to the approach of the studies about the construction of social problems, the definition of a social problem does not mean the reflex of its objective conditions, but results its construction from the ways they are understood and defined by society, permeates the projection of public feelings. Was made a research of journalistic texts by two keywords “day care center children” and “day care center childhood”, selecting those which mentioned the day care center directly. The underneath temporal limit was the initial date of publishment of on line journalist texts and the top limit was the date when both versions press and online got similar characteristics. After the qualifying exam, was made another research by the term day care center with the legal frameworks of childhood education. To describe dates we used techniques of content analyses proposed by Bardin and Rosemberg. We created five clusters of meaning: reduced visibility of the theme day care center; opacity in its characterization; rhetoric of complaint / attack in the context of crisis, absence of children, their voices, their personalities, their histories. There was a silence refractory, some omission, a speech very informative and formative. These talks produced and transmitted by the newspaper produced and maintained relations of domination of adults over children, they had produced ideology.

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INTRODUÇÃO... 1

1 TEORIAS E MÉTODO... 12

1.1 Estudos Sociais da Infância... 12

1.1.1 Tensões nos estudos sociais da infância... 26

1.2 Teoria de ideologia... 29

1.3 Método da Hermenêutica de Profundidade... 39

2 CONTEXTO SÓCIO-HISTÓRICO... 44

2.1 Cuidado e Educação de Crianças Pequenas no Brasil... 44

2.2 Infância na Mídia... 59

2.2.1 Infância e mídia... 59

2.2.2 Criança pequena, educação infantil e creche na mídia... 68

2.3 A Empresa Folha de S. Paulo... 79

2.3.1 História da empresa Folha de S. Paulo... 80

2.3.2 Projeto editorial da Folha... 83

2.3.3 Críticas ao jornalismo da Folha de S. Paulo... 86

2.3.4 A infância no jornal Folha de S. Paulo... 89

3 ANÁLISE FORMAL... 93

3.1 Procedimentos... 93

3.1.1 Constituição do corpus e da amostra... 94

3.1.2 Procedimentos para análise das UIs... 97

3.2 Descrição dos Resultados... 99

3.2.1 Tema pouco relevante... 99

3.2.2 Uma caracterização opaca da creche... 107

3.2.3 Omissão de referências à legislação... 109

3.2.4 Uma retórica da crise... 113

3.2.5 Conceituação de creche nem sempre adequada... 119

3.2.6 Uma criança genérica, esmaecida... 127

3.2.7 Coadjuvantes presentes e falantes... 129

CONSIDERAÇÕES FINAIS... 138

APÊNDICES... 151

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Quadros

Quadro 1 - Teses e dissertações do negri que analisaram o jornal Folha de S. Paulo... 2 Quadro 2 - Pesquisas do NEGRI sobre o tema infância/criança e/ou subalternidade

de idade... 6 Quadro 3 - Modos de operação da ideologia... 36 Quadro 4 – Linha do tempo da educação infantil brasileira... 58 Quadro 5 – Teses e dissertações do negri que versaram diretamente sobre

mídia... 62 Quadro 6 – Textos localizados sobre educação infantil, creche, infância e

mídia... 69 Quadro 7 - Descrição dos procedimentos para constituição do universo, corpus e da

amostra, número de peças jornalísticas resultantes e categorias de análise de conteúdo aplicadas nas peças jornalísticas... 94 Quadro 8 - Síntese dos manuais e suas categorias de análise... 98 Quadro 9 - Tendências predominantes do universo, corpus e amostra, por

categoria... 101 Quadro 10 - Percentuais observados na subcategoria não se aplica, por categoria de

análise da amostra... 108 Quadro 11 - Sugestões de político para acabar com o déficit de vagas na zona

noroeste... 118 Quadro 12 - Frequência e percentual referentes à presença de coadjuvantes nas uis

da amostra... 130

Tabelas

Tabela 1 – Taxa de frequência bruta (%) à creche/escola (EI/EF), por variáveis selecionadas. Brasil, 1995 e 2008... 46 Tabela 2 – Distribuição de frequência do número de teses e dissertações localizadas

no Banco de Teses da CAPES sob o descritor “infância e mídia”, por ano da

defesa e

financiamento... 60 Tabela 3 – Distribuição da frequência do número de teses e dissertações localizadas no Banco de Teses da CAPES sob o descritor “infância e mídia”, por região geográfica. ... 60 Tabela 4 – Distribuição da frequência das áreas do conhecimento mais expressivas

nos resumos do Banco de Teses da CAPES, localizados sob o descritor “infância e mídia”. ... 61 Tabela 5 – Distribuição de frequência do foco da pesquisa de teses e dissertações

(12)

Tabela 7 – Distribuição de frequência de UIs que compõem o corpus e a amostra, por ano... 97 Tabela 8 - Distribuição de frequência de UIs do universo, corpus e amostra, por

caderno... 103 Tabela 9 – Distribuição de frequência de UIs da amostra, por tema e tipo de

localização... 105 Tabela 10 - Distribuição de frequência das UIs da amostra, por presença do termo

creche na abertura e no título da peça jornalística... 106 Tabela 11 - Distribuição de frequência dos percentuais observados na subcategoria

não se aplica na amostra de UIs. ... 107 Tabela 12 – Distribuição de frequência das UIs da amostra, por menção à legislação

relacionada à EI. ... 109 Tabela 13 – Distribuição de frequência das UIs da amostra, por tipos de

hierarquização do cuidado e educação de crianças pequenas... 114 Tabela 14 - Distribuição de frequência das UIs da amostra, por pontos positivos e

negativos associados à creche... 115 Tabela 15 - Distribuição de frequência das UIs da amostra, por sugestões para melhorias das creches... 117 Tabela 16 - Distribuição de frequência das UIs da amostra, por modalidade de

conceituação... 120 Tabela 17 - Distribuição de frequência das UIs da amostra, por tipo e modalidade de conceituação... 120 Tabela 18 - Distribuição de frequência das UIs da amostra, por situação administrativa... 121 Tabela 19 - Distribuição de frequência das UIs da amostra por contexto socioeconômico da creche... 122 Tabela 20 - Distribuição de frequência de UIs da amostra, por localização da

creche... 122 Tabela 21 - Distribuição de frequência de UIs da amostra, por identificação de

crianças... 127 Tabela 22 - Distribuição de frequência de UIs da amostra, por tipo de presença da família... 131 Tabela 23 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por instituições

mencionadas enquanto coadjuvantes... 134 Tabela 24 – Distribuição de frequência das UIs da amostra, por utilização de dados

estatísticos... 136 Tabela 25 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por

ano... 169 Tabela 26 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por dia da

semana... 170 Tabela 27 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por

caderno... 170 Tabela 28 – Distribuição de frequência dos das UIs da busca intencional, por

tema... 170 Tabela 29 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por

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jornalístico... 170 Tabela 32 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por

foco/contexto... 171 Tabela 33 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por menção à creche no título... 171 Tabela 34 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por sexo do

autor... 171 Tabela 35 Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por origem

jornalística... 171 Tabela 36 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por

conceituação implícita de creche... 172 Tabela 37 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por situação

administrativa... 172 Tabela 38 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por legislação

mencionada... 172 Tabela 39 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por função da

creche... 172 Tabela 40 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por contexto da

creche... 172 Tabela 41 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por pontos

positivos e negativos da creche... 172 Tabela 42 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por tipos de educação e cuidado... 173 Tabela 43 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por idade da criança atendida pela creche... 173 Tabela 44 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por local da

creche... 173 Tabela 45 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por

identificação da criança... 173 Tabela 46 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por idade da

criança mencionada... 173 Tabela 47 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por sexo da criança... 173 Tabela 48 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por menção à

família... 174 Tabela 49 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por

profissionais da creche... 174 Tabela 50 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por menção a

profissionais fora do contexto da creche... 174 Tabela 51 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por menção a

políticos... 174 Tabela 52 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por menção a instituições... 174 Tabela 53 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por uso de

estatística... 175 Tabela 54 – Distribuição de frequência das UIs da busca intencional, por tratamento

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de creche... 175

Tabela 57 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por quadro institucional do autor... 175

Tabela 58 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por cidade... 176

Tabela 59 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por dia da semana.... 176

Tabela 60 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por gênero jornalístico... 176

Tabela 61 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por foco/contexto... 176

Tabela 62 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por sexo do autor... 177

Tabela 63 - Distribuição de frequência de UIs por origem jornalística... 177

Tabela 64 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por tipo de tratamento negativo atribuído à creche... 177

Tabela 65 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por função atribuída à creche... 178

Tabela 66 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por critério de acesso à creche... 178

Tabela 67 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por sexo da criança... 178

Tabela 68 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por cor/raça... 178

Tabela 69 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por menção à família. 179 Tabela 70 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por menção à empregada doméstica... 179

Tabela 71 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por menção a profissionais da creche... 179

Tabela 72 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por menção a profissionais fora do contexto da creche... 179

Tabela 73 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por menção a políticos.180 Tabela 74 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por menção a instituições coadjuvantes... 180

Tabela 75 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por menção à idade da criança atendida na creche... 180

Tabela 76 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por idade da criança individualizada ou genérica... 181

Tabela 77 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por autor... 182

Tabela 78 - Distribuição de frequência de UIs da amostra por tipo de tratamento positivo... 183

Tabela 79 - Distribuição de frequência de UIs da amostra, por tema da abertura... 183

Figuras Figura 1 – Gráfico da evolução da produção científica no período de 1999 a 2011. 13

Figura 2 – Gráfico da evolução da produção científica no período de 1993 a 2009. 14

Figura 3 - Número de artigos localizados na Folha de S. Paulo on line no período 1994 a 2009, por descritor selecionado... 100

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INTRODUÇÃO

O objeto desta dissertação é descrever e interpretar discursos sobre creche captados em peças jornalísticas publicadas pelo jornal Folha de S. Paulo on line, no

período de 1994 a 2009. Esta pesquisa se integra ao Núcleo de Estudos sobre Gênero, Raça e Idade (NEGRI), do Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Para a delimitação do período de publicação das peças jornalísticas que constituem o corpus da pesquisa, tomamos, como limite inferior, o ano de início das

publicações on line do jornal Folha de S. Paulo (1994). Para a definição do limite

superior do período abordado, apoiamo-nos na dissertação de Bizzo (2008), a qual identificou que, no período de 1997 a 2005, os conteúdos impresso e on line

apresentavam algumas diferenças. Porém, no dia 13 de setembro de 2009 houve reestruturações nas versões impressa e on line do jornal e, a partir desse momento,

ambas adquiriram o mesmo formato e conteúdo. Com isso, o mês de setembro do ano de 2009 passou a ser nosso limite superior para a composição do corpus.

O jornal Folha de S. Paulo on line, nossa fonte para o levantamento das

peças jornalísticas, desde a década de 2010, tem sido o segundo jornal de maior tiragem no Brasil (ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE JORNAIS, 2012), além de fazer parte de um dos maiores grupos de mídia do mercado brasileiro: o grupo Folha. A Folha de S. Paulo tem orientado suas produções a partir de um projeto editorial que visa a um jornalismo “apartidário, pluralista, crítico e moderno” (FOLHA, 2011). Seu público leitor é composto por homens e mulheres, a grande maioria entre 30 e 49 anos (43%), com formação superior, casado (a), com renda mensal entre 15 e 30 salários mínimos, católico (a), com acesso à internet e televisão por assinatura (FOLHA, 2011).

Analisamos essa mídia porque a concebemos como um ator social importante para a delimitação de um problema social e do espaço atribuído a esse problema na agenda de políticas públicas. Em nosso caso, a creche.

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vem desenvolvendo pesquisas sobre o tema infância e mídia diária, interessadas nos discursos produzidos e circulados pelo jornal Folha de S. Paulo sobre os seguintes temas: prostituta/prostituição infanto-juvenil (ANDRADE, L., 2001); trabalho infanto-juvenil (FREITAS, 2004); gravidez na adolescência (NAZARETH, 2004); “meninos de rua” (ANDRADE, M., 2005); o aborto voluntário (BIZZO, 2008) e os direitos da criança e seus marcos legais (MARIANO, 2010).

Quadro 1 - Teses e dissertações do NEGRI que analisaram o jornal Folha de S. Paulo

Ano Título Autor

2001 Prostituição infanto-juvenil e mídia:

estigmatização da pobreza e ideologia Leandro Feitosa Andrade

2004 O tema trabalho infanto-juvenil na mídia: uma

interpretação ideológica Rosângela Ramos de Freitas

2004 O discurso da mídia sobre a adolescente

grávida: uma análise da ideologia Leila Nazareth

2005 A categoria "meninos de rua" na mídia: uma

interpretação ideológica Marcelo Pereira de Andrade

2008

Infância associada ao tema aborto voluntário em peças jornalísticas publicadas no jornal

online da Folha de S.Paulo

Vanessa Monteiro Bizzo

2010 Direitos da criança e do adolescente: marcos legais e mídia

Carmem Lúcia Sussel Mariano

Por meio desses trabalhos, mostramos que os discursos da mídia diária acerca da infância tendem a utilizar retórica dramática, que adota feições sensacionalistas, que estigmatizam crianças e famílias pobres e que, muitas vezes, não respeitam a privacidade e o anonimato dos sujeitos depoentes, expondo, publicamente, detalhes de sua vida e de sua identidade.

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sistematicamente assimétricas. Nos estudos arrolados, interpretamos que essas características sustentam relações de dominação da adultez em relação à infância, cujo poder de ação e reivindicação de direitos está subjugado ao poder do adulto. Esses estudos constituíram uma das fontes de inspiração desta dissertação.

Outras pesquisas recentes do NEGRI − Galvão (2008), Laviola (2009), Nazareth (2011), Secanechia (2011) e Urra (2011) − voltaram a atenção para a análise de discursos sobre a educação e o cuidado de bebês, crianças entre 0 e 3 anos, e a creche, produzidos por diferentes atores sociais. Tais pesquisas assinalam que essa faixa etária é marcada por invisibilidade pública quanto a seus direitos e necessidades. Essas pesquisas constituíram, também, outras das fontes que inspiraram este trabalho.

Galvão (2008) e Laviola (2009) identificaram em discursos de mães e em discursos de homens-pais, respectivamente, uma concepção na qual o bebê estaria restrito ao espaço privado, ao contexto familiar unicamente e, quando frequenta instituições de educação e cuidado, essas são e devem ser instituições particulares. Quando questionados (as) sobre os direitos de bebês genéricos, que não fossem seus próprios filhos (as), as mães e os pais entrevistados (as) afirmaram não terem refletido sobre a questão e, no caso da creche, enfatizaram a falta de qualidade e infraestrutura no atendimento público, descrevendo a creche como espaço de vulnerabilidade para doenças e para a violência. Por fim, os (as) entrevistados (as) afirmaram que suas “opiniões” acerca do cuidado e da educação de crianças pequenas em creches são constituídas por meio de discursos de pediatras, psicólogos (as), amigos (as), familiares, mas, principalmente, discursos midiáticos.

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nessa faixa etária. Secanechia (2011) destacou, ainda, uma preocupação das entrevistadas com relação à qualidade e às diferenças regionais do atendimento em creches públicas, como, também, e sobretudo para nossos argumentos, um desconhecimento das políticas públicas voltadas ao cuidado e à educação de crianças pequenas. O direito subjetivo do bebê ao atendimento em creche foi obnubilado, nos discursos analisados, e a invisibilidade pública da criança pequena foi interpretada, pela autora, como um modo de operação da ideologia que cria e sustenta relações de dominação etária.

Outro conjunto de pesquisas teve o olhar orientado para as mídias. Nazareth (2011) descreveu e interpretou discursos sobre creche produzidos e transmitidos pela revista Pais e Filhos, no período de 1969 a 2008. Destacou que, de maneira geral, os discursos da revista são sedutores, com tom confessional, buscando construir uma intimidade com a leitora como um recurso persuasivo. Mesmo em casos de doença e morte, o conteúdo das matérias é otimista. No caso específico da educação e do cuidado de bebês, a autora mostrou que esse assunto é pouco abordado pela revista, contribuindo para a sustentação da visão de bebê restrita ao ambiente privado, sob os cuidados da mãe ou de familiares, predominantemente as mulheres. Os (as) bebês foram apresentados (as) na revista, como desprotegidos (as), frágeis, não ocorrendo, nesses discursos analisados, um olhar crítico acerca da participação da criança pequena no espaço público. Na revista Pais e Filhos, a fragilidade do bebê foi apresentada como um disparador para a preocupação de mães leitoras com a capacidade da instituição pública em cuidar de crianças pequenas e educá-las.

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Urra (2011) descreveu e interpretou discursos da mídia acadêmica pediátrica sobre a creche. A pesquisa analisou um corpus constituído por 37 artigos publicados

por dois periódicos acadêmicos brasileiros de Pediatria. Os resultados mostraram que a maioria dos artigos não apresenta uma conceituação de creche pautada nos textos da Constituição Federal (CF) de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN). A concepção latente captada no material analisado é pejorativa, negativa e apresenta a creche como destinada à pobreza e à assistência. A temática prevalente refere-se à alimentação/desnutrição das crianças e à creche como um “fator de risco” para a saúde e integridade física da criança. O cuidado materno nos primeiros anos de vida é privilegiado, o qual deve ser ensinado às mães. Mães, familiares, empregadas e a creche – particularmente a pública – são alvo de julgamento quanto à sua atuação. Urra (2011) interpretou que esses discursos estabelecem e sustentam relações de dominação de gênero e de idade. Para o autor, ocorre a naturalização do cuidado materno, apresentado como a melhor alternativa para a criança pequena, a qual fica restrita ao espaço doméstico. No caso da creche, ocorre sua eternalização, um dos modos de operação da ideologia, destacados por Thompson (2009): ela é apresentada como sendo eternamente uma instituição “de risco”.

Todos esses trabalhos e a presente dissertação estão fundamentados na concepção de criança como ator social, sujeito de direitos, e de infância como um grupo social permanente das sociedades. Concebemos as crianças como ativas no seu processo de formação e desenvolvimento, isto é, assimilando e produzindo conhecimentos e conteúdos da cultura ativamente: da mesma forma com que a cultura transforma a criança, a criança também transforma a cultura.

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são os mais frequentemente assinalados. Temos dado ênfase, nas pesquisas do NEGRI, às relações de idade (ver quadro 2).

Quadro 2 - Pesquisas do NEGRI sobre o tema infância/criança e/ou subalternidade de idade

Ano Título Autor

1988 O discurso especializado em literatura infanto-juvenil no Brasil

na década de 50: da crianca mitificada à política Gustavo Adolfo Ramos Mello Neto

1993 A gravidez e o projeto de vida: uma análise das adolescentes grávidas das camadas populares

Maria Isolda Castelo Branco Bezerra de Menezes 1995 Diretrizes de educação infantil em um órgão de assistência Sílvia M. Pereira de Carvalho

1995 O caminho das águas: estereótipos de personagens femininas

negras na obra para jovens de escritoras brancas Edith Piza

1996 Adolescentes trabalhadoras na rua: distribuidoras de folhetos Rosângela Ramos de Freitas

1996 Distribuidoras de folhetos: um outro olhar sobre adolescentes

em situação de rua Marli de Oliveira

1998 Sexualidade infantil através de relatos de educadoras de creche Elaine Cardia Laviola

1999 Construção social da infância e literatura infanto-juvenil brasileira

contemporânea Céia Maria Escanfella

1999 Discriminações contra personagens negros na literatura

infanto-juvenil brasileira contemporânea Chirley Bazilli

1999 O olhar e a escuta psicológica desvendando possibilidades: o

vínculo saudável entre a adolescente mãe e seu filho Dirce Maria Bengel de Paula 2000 O discurso acadêmico sobre gravidez na adolescência: uma

produção ideológica? Gabriela Junqueira Calazans

2001 Um olhar sobre discriminações sexuais na literatura

infanto-juvenil brasileira contemporânea Dione Maria Sousa Nogueira

2001 Prostituição infanto-juvenil na mídia: estigmatização e ideologia Leandro Feitosa Andrade

2004 O discurso da mídia sobre a adolescente grávida: uma análise

da ideologia Leila Nazareth

2004 O tema trabalho infanto-juvenil na mídia: uma interpretação

ideológica Rosângela Ramos de Freitas

2005 A categoria "meninos de rua" na mídia: uma interpretação

ideológica Marcelo Pereira de Andrade

2005 Concepções de infância em relatórios psicológicos judiciais Dayse Cesar Franco Bernardi

2008 Infância associada ao tema aborto voluntário em peças

jornalísticas publicadas no jornal online da Folha de S.Paulo Vanessa Monteiro Bizzo 2008 A criança pequena, seu cuidado e educação em discursos de

homens-pais Bábara Radovanski Galvão

2009 O tema trabalho infanto-juvenil em artigos acadêmicos de

psicólogos(as): uma interpretação ideológica Renata Lopes Costa Prado

2010 O bebê, sua educação e cuidado em discursos de mães de

camadas médias Elaine Cardia Laviola

2010 Direitos da criança e do adolescente: marcos legais e mídia Carmem Lúcia Sussel Mariano

2011 Discursos sobre a creche na revista Pais e Filhos: análise da

ideologia Leila Nazareth

2011 Concepção de creche em revistas brasileiras de Pediatria: uma

interpretaçãoo a partir da ideologia Flávio Urra

2011

Uma interpretação à luz da ideologia de discursos sobre o bebê e a creche captados em cursos de Pedagogia da cidade de Sao

Paulo

(21)

As maneiras como as formas simbólicas são produzidas, transmitidas e recebidas podem criar e manter relações de poder sistematicamente assimétricas, denominadas por Thompson (2009) de relações de dominação. Esse autor define formas simbólicas como um amplo conjunto de falas, ações, expressões que se constituem como construções significativas. Essa dimensão simbólica e o sentido por ela mobilizado constroem, também, a realidade social e participam ativamente da construção das relações sociais. Thompson (2009) afirma que, nas sociedades modernas, a transformação e desenvolvimento dos meios pelos quais as formas simbólicas são produzidas e circulam assumem, desde o final do século XV, isto é, desde a invenção da imprensa, caráter global e comercial e cria a massificação dos meios de comunicação. O autor denomina as instituições de difusão das formas simbólicas, nessas novas dimensões, de indústrias da mídia.

A partir das contribuições de Thompson (2009) acerca do processo de midiação da cultura moderna, pode-se destacar uma grande diversidade de instituições responsáveis pela produção e circulação de significados. Dentre os estudos realizados pelo NEGRI, podem-se diferenciar quatro tipos de mídias abordados: pesquisas que se interessaram pelos discursos produzidos pela mídia para mulheres, especificamente a revista Pais e Filhos (ROSEMBAUM, 1998; NAZARETH, 2011); pesquisas que focalizaram discursos produzidos e circulados pela mídia destinada a crianças e adolescentes, particularmente os livros de literatura infantil (PIZA, 1995; BAZILLI, 1999; ESCANFELLA, 1999, 2006; NOGUEIRA, 2001) e as pesquisas que abordaram a mídia para escolares (SILVA, 2005; MOURA, 2007); pesquisas que focalizaram o discurso da mídia diária, mais especificamente o jornal Folha de S. Paulo (ANDRADE, L. 2001; NAZARETH, 2004; FREITAS, 2004; ANDRADE, M., 2005; BIZZO, 2008; MARIANO, 2010) e pesquisas cujos objetos foram discursos da mídia acadêmica (CALAZANS, 2000; PRADO, 2009; URRA 2011).

(22)

forma como os diversos atores sociais, mais particularmente a mídia, abordam os temas relativos ao cuidado e à educação de bebês será importante para entendermos a visibilidade e o destaque que a creche assume na arena de negociação das políticas públicas. O reconhecimento (delimitação e conceituação) de um problema social é dependente de sua publicização, aspecto que coloca em cena a mídia como um ator social importante. “Para capturar a atenção pública, as arenas em que se constroem os problemas sociais desenvolvem uma retórica específica que associa a credibilidade de fatos a uma dimensão dramática (...)” (ROSEMBERG; ANDRADE, M., 2007, p. 261).

De acordo com o enfoque dos estudos sobre a construção de problemas sociais, a definição de um problema social, portanto, não constitui exclusivamente o reflexo de suas condições objetivas, mas resulta, também, de sua construção a partir das formas como eles são concebidos e definidos pela sociedade, perpassadas pela projeção de sentimentos coletivos (ROSEMBERG; ANDRADE, M., 2007).

Nosso argumento, nesta dissertação, é que discursos midiáticos destinados a cidadãos adultos não contribuem para a visibilidade social da creche como instituição que responde ao direito à educação de toda e qualquer criança brasileira. Porém, antes de sustentarmos esta argumentação, explicitaremos qual a conceituação de creche aqui adotada.

A definição de creche utilizada nesta pesquisa corresponde àquelas instituídas pela CF de 1988 e pela LDBEN. Por essas definições legais, a educação infantil, primeira etapa da educação básica, abrange dois segmentos: creches (0 a 3 anos) e pré-escolas (4 e 5 anos). A CF brasileira institui no Título II “Dos direitos e garantias fundamentais, Capítulo II, artigo 7º, os direitos sociais de trabalhadores (as) rurais e urbanos (as), bem como de outras pessoas que visem à melhoria de sua condição social e, no inciso XXV, é especificado o direito à assistência gratuita aos filhos (as) e dependentes, desde o nascimento até os cinco anos de idade, em creches e pré-escolas. No Título VIII “Da ordem social”, Capítulo VII, artigo 227, fica declarado que é dever da família e do Estado assegurar os direitos da criança e do adolescente com absoluta prioridade. E reconhece, como direitos da criança, o direito à educação dentre outros1. Mas, sobretudo, no Capítulo III, do Título VIII,

1 Outros direitos das crianças reconhecidos são: direito à vida, à saúde, à alimentação, ao lazer, à

(23)

Seção I, o artigo 208, inciso IV, institui o atendimento às crianças de 0 a 6 anos de idade, em creche e pré-escola, como um dever do Estado. Ou seja, a CF de 1988 assegura à criança, a qualquer criança entre 0 e 6 anos, o direito de frequentar creche e pré-escola, porém, não conceitua o que seria creche ou pré-escola.

Na LDBEN, o termo creche aparece juntamente com o termo pré-escola, primeiramente, no Título III, artigo 4º, inciso IV, definido como dever do Estado em oferecer educação pública, gratuita, às crianças de 0 a 6 anos de idade. No Título IV, artigo 11, inciso V, a educação infantil, em creches e pré-escolas, é definida como competência municipal. No Capítulo II, Seção II, artigo 30, inciso I, é a primeira aparição de uma definição clara do segmento etário atendido pela creche, pela qual fica delimitado que a educação infantil será oferecida a crianças na faixa etária de 0 a 3 anos em creches ou entidades equivalentes. No artigo 29, é instituída a educação infantil como primeira etapa da educação básica, com a finalidade de desenvolvimento integral de crianças até os 6 anos de idade (atualmente até 5 anos). Na sequência, no artigo 30, inciso I, é especificado o atendimento de crianças até os 3 anos em creches ou entidades equivalentes e, no inciso II, de crianças entre 4 e 6 anos em pré-escolas (atualmente 4 e 5 anos). Cabe destacar, ainda, que na LDBEN, no Título IV, artigo 11, inciso V, fica também expressa a competência do município em oferecer a educação infantil e no oferecimento do ensino fundamental:

oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com

prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino (grifo nosso).

Apesar de a legislação instituir a creche como instituição que responde ao direito à educação de crianças de 0 a 3 anos, a implementação da política de creche vem sendo objeto de muitas críticas. Essas críticas atingem a pequena extensão da oferta e sua qualidade ainda insatisfatória.

A oferta de Educação Infantil é menos expressiva entre as crianças com menor idade, mais pobres e não brancas. Um exemplo disso é que, no ano de 2008,

(24)

o atendimento de crianças em pré-escola atingiu 45,8%, enquanto que, nas creches, alcançou apenas 18,1% (PNAD 2009 apud VIEIRA, 2010). Nesse mesmo ano, famílias com renda per capita inferior a meio salário mínimo apresentaram índices

menores de frequência às creches; apenas 12,4%, em contraposição aos 39,5% referentes às crianças de famílias com renda mensal de três ou mais salários mínimos. No campo das desigualdades raciais, ainda tomando como base o ano de 2008, a cobertura do atendimento em creches para crianças negras foi de 15,5% contra 22% para crianças brancas (PNAD 2009 apud VIEIRA, 2010). A faixa etária de 0 a 3 anos merece atenção urgente para se enfrentarem as questões relativas à desigualdade social e à pobreza, com o intuito de fazer acontecer os direitos das crianças e de suas famílias (VIEIRA, 2010).2

Diante da dificuldade, ou morosidade, de a creche ser de fato considerada como uma expressão do direito universal à educação às crianças de 0 a 3 anos é que nos propusemos a realizar esta pesquisa. Nossa pergunta é: como o jornal Folha de S. Paulo trata a creche, ou seja, quais componentes discursivos predominam nas peças jornalísticas que se referem à creche? Quais componentes são esmaecidos ou mesmo ignorados? Ela é reconhecida como um direito à educação das crianças de 0 a 3 anos? Qual a concepção/conceituação explícita ou implícita de creche? É possível detectar componentes estigmatizantes nos discursos produzidos e veiculados pelo jornal?

Em análise preliminar do banco de dados, organizado a partir da busca no jornal Folha de S. Paulo, versão on line, havíamos percebido um número expressivo

de peças jornalísticas contextualizando a creche em situação de crise e, por vezes, de violência, como acidentes, violência e descuido da criança. A hipótese inicial deste trabalho é de que, discursos produzidos e transmitidos pela mídia sobre creche também contribuem para sua reduzida visibilidade na arena pública de negociações de políticas sociais. Além disso, ao associar a creche a situações de crise (como veremos), essa mídia contribui para sua estigmatização. Tais justificativas sustentam, então, nossa proposta de descrever e interpretar peças jornalísticas referentes à creche, publicadas entre 1994 e 2009, no jornal Folha de S. Pauloon line.

2 Se incluímos a modalidade “classe de alfabetização”, a taxa de escolaridade de crianças de 4 e 5

(25)

A descrição das peças jornalísticas da Folha de S. Paulo on line, que

versaram diretamente sobre a creche permitiu-nos identificar cinco núcleos de sentidos explicitados a seguir.

A creche constitui um tema pouco relevante para o jornal, apresentando um pequeno número de peças jornalísticas publicadas no intervalo de 16 anos do jornal, uma pequena presença nos cadernos/sessões relativos a editoriais e opiniões, uma grande maioria de peças jornalísticas sem autoria explicitada e pouca presença do termo creche nos títulos e aberturas3.

A creche foi caracterizada de maneira opaca, com significativa ausência de informações sobre a legislação que a amparara, sobre as crianças que frequentam a instituição, sobre os diferentes atores sociais que participam ativamente como coadjuvantes desta instituição.

A pequena atenção dada à creche como foco de política pública, a omissão de informações e caracterizações, bem como a opacidade da descrição da creche e de seus atores, associados a um clima de crise permanente levaram-nos a sugerir a participação do jornal na manutenção e produção de estigmas contra a creche.

Para a construção e sustentação dessa argumentação, a apresentação do texto está organizada em três capítulos. O primeiro versa sobre as teorias que permitiram a construção do objeto de pesquisa e que possibilitaram a interpretação dos resultados, bem como a metodologia utilizada, a saber: estudos sociais da infância, teoria de ideologia de John B. Thompson (2009) e metodologia da hermenêutica de profundidade (THOMPSON, 2009).

Seguindo a proposta de Thompson (2009) de contextualização sócio-histórica das formas simbólicas a serem analisadas, o segundo capítulo apresentará uma síntese bibliográfica de questões referentes ao cuidado e educação da criança pequena brasileira, à infância e mídia, abrangendo trabalhos que tomaram como objeto os discursos sobre e para a infância na mídia.

No terceiro capítulo apresentaremos os procedimentos para a constituição do

corpus da pesquisa e para sua análise, bem como a descrição do tratamento dado

ao tema creche pelo jornal Folha de S. Paulo. A interpretação/re-interpretação dos dados será apresentada nas considerações finais.

3 De acordo com o

Manual de Redação da Folha de S. Paulo, a abertura é apresentada junto com o

(26)

1 TEORIAS E MÉTODO

Este capítulo apresentará as teorias e o método que orientaram o desenvolvimento desta pesquisa: os estudos sociais da infância e a teoria de ideologia de John B. Thompson (2009); no campo metodológico, a hermenêutica de profundidade (HP), também proposta por Thompson (2009).

1.1 Estudos sociais da infância4

Nesta seção será apresentada a proposta teórica dos estudos sociais da infância, um campo de estudos recente, em construção. Sua consolidação nos últimos 20 anos não se deu de forma homogênea, o que se reflete na sua nomenclatura: alguns estudiosos denominam esse campo como Sociologia da Infância, principalmente nos trabalhos de origem francesa; outros o denominam estudos sociais da infância, como no caso de grande parte dos trabalhos originados em países anglófonos. Nesta dissertação será utilizada a denominação estudos sociais da infância, posto que abarca várias disciplinas para além da Sociologia: a Antropologia, a História, a Educação, bem como a Psicologia. A Psicologia, que desde o século XIX apresenta um interesse pela criança, entra nesse campo de estudos em construção via revisão de concepções naturalizantes sobre infância e criança.

Entre os (as) sociólogos (as), essa perspectiva ganhou força em virtude da insatisfação dos pesquisadores sociais com relação às concepções de infância e de criança vigentes nessa disciplina. Além disso, a infância ou a criança adentravam a disciplina via Sociologia da Educação e Sociologia da Família.

4 No contexto de trabalho para as disciplinas

Construção Social da Infância: análise de discursos contemporâneos e Estudos sociais da infância: pesquisas em contexto internacional e brasileiro,

vários dos mestrandos então filiados ao NEGRI (RIBEIRO; PELLICER; TEMPERINI; TORRES; FERREIRA, 2011) realizamos um trabalho coletivo que redundou no texto Os Estudos sociais da infância: uma revisão, cuja autoria passou a ser indicada como Ribeiro e colaboradores/as (2011) e

(27)

O campo ou enfoque dos estudos sociais da infância, particularmente na Sociologia, ganha visibilidade no Brasil na primeira década desse milênio. Trata-se de produção crescente que pode ser captada por indicadores na produção acadêmica: número de teses e dissertações defendidas e número de artigos localizados na base de dados Scielo Brasil.

Ribeiro e colaboradores/as (2011) identificaram um número crescente de trabalhos sendo publicados, principalmente na área da Educação, que tomam como referência os estudos sociais da infância ou a Sociologia da Infância. Analisando a base de dados Scielo, foram localizados 30 artigos, no período de 1999 a 20115, com destaque para os anos de 2005 e 2010, quando houve aumento significativo dessa produção (ver figura 1), usando-se os descritores “estudos sociais da infância”, “estudos sociais sobre a infância”, “Sociologia da Infância”, “novos estudos sobre infância”, “Antropologia da infância”, “Sociologia, infância”.

Figura 1 – Gráfico da evolução da produção científica no período de 1999 a 2011. Fonte: Scielo (RIBEIRO et al, 2011).

5 Destacam-se as publicações dos

Cadernos de Pesquisa dos anos de 2001 e 2010. No ano 2001, as

traduções de dois artigos de autoras europeias de origem francófona foram publicadas como Tema de Destaque do número 112 da referida revista, a saber: Emergência de uma Sociologia da Infância: evolução do objeto e do olhar de Régine Sirota e Sociologia da Infância: balanço dos trabalhos em língua inglesa de Cléopâtre Montandon. Em 2010, no volume 40, número 141, são artigos de autores

de origem anglófona que ocuparam o Tema de Destaque da revista Cadernos de Pesquisa: Alan

Prout; Jens Qvortrup; Leena Alanen. Em consonância com a temática da condição de vida das crianças, nesse mesmo número foi publicado o artigo A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança: debates e tensões, de Fúlvia Rosemberg e Carmem Lúcia Sussel Mariano (ROSEMBERG,

(28)

A grande maioria das publicações refere-se a textos traduzidos por importantes periódicos brasileiros, de autores (as)6 que têm se destacado no campo da Sociologia da Infância europeia, como Montandon (2001, 2005), Plaisance (2004), Prout (2010), Qvortrup (2011), Sirota (2001), entre outros.7

Analisando o levantamento de 136 teses e dissertações realizado no Banco de Resumos de Teses da Capes, no período de 1993 a 2009, o estudo de Ribeiro e colaboradores/as (2011) mostrou uma evolução do número de títulos localizados, a partir de 2005, com um salto em 2007 e um pico em 2009 (ver gráfico 2).

Figura 2 – Gráfico da evolução da produção científica no período de 1993 a 2009. Fonte: Capes - Banco de Teses (RIBEIRO et al, 2011).

Essa movimentação no âmbito das instituições acadêmicas em torno do tema infância e/ou criança vem sendo acompanhada, e participa, de movimentações mais amplas, no mesmo sentido de valorização da posição social da criança em outras esferas da vida social.

6 A partir deste momento, abandonaremos o uso da fórmula o (a) e empregaremos o masculino

genérico, como preconizado na língua portuguesa, para referir a homens e mulheres, desde que não interfira na precisão do sentido.

7 Sarmento (2005), professor da Universidade do Minho, em Portugal, se destaca entre os europeus

de língua portuguesa. A notar nenhuma tradução de autores de língua espanhola, como o artigo La nueva sociología de la infancia: aportaciones de una mirada distinta de Lourdes Muñoz (2006).

4

28

23

17 15 17

7 4 7

3 2

1 1 2 3 2

0 5 10 15 20 25 30

1993 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009

Ano

Q

u

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(29)

Corsaro (2011) salienta que, atualmente, em cenário internacional, o número de trabalhos publicados, dentre artigos e monografias, acerca das teorias sociais sobre infância, tem sido crescente. A temática tem adquirido ampla cobertura por meio de um maior número de cursos sobre a infância, pela criação de associações nacionais e internacionais dedicadas aos estudos sociais da infância (e/ou Sociologia, Antropologia, História) e em decorrência do maior número de periódicos disponíveis nessa área do conhecimento.

Para James e Prout (2003), a partir de 1990, também em cenário internacional, os encontros acadêmicos e a formação de grupos de pesquisa sobre esse assunto contribuíram para ampliar o debate entre os estudiosos da Sociologia. Isso, por sua vez, permitiu tornar a questão da infância mais visível, bem como ampliar o interesse de outros pesquisadores pela área.

Qvortrup (1993, apud CORSARO, 2011), pesquisador norueguês, afirma que esse interesse apenas recente pelo estudo sociológico da infância é resultado de uma marginalização desse grupo etário em dois eixos principais: a subordinação política e econômica da infância na sociedade, e as concepções teóricas tradicionais de infância e de socialização. A subordinação da infância na sociedade pode ser evidenciada a partir de indicadores sociais que descrevem sua situação de desigualdade em relação aos adultos. A condição social de crianças constitui, então, um tema tratado pelos estudos deste campo de conhecimentos.

Serão apresentadas, a seguir, contribuições de Sgritta (2002), para se delinear as condições sociais da infância no contexto internacional (norte-americano e europeu ocidental) e de Rosemberg (2006) para se discutir a questão no contexto brasileiro.

De acordo com Sgritta (2002), a aprovação da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, no ano de 1989, teve um impacto profundo no cenário político internacional, na virada do século XX para o XXI. Esse período foi marcado por debates para a ratificação do documento, bem como sobre as maneiras de interpretação dos direitos da criança para sua consolidação nos diferentes países. Apesar da intensidade dos debates, ainda permanece uma grande distância entre o que foi definido legalmente e as condições de vida das crianças no mundo.

(30)

uma vez que os níveis de pobreza aumentaram e são mais expressivos entre as crianças do que entre os adultos, piorando as condições de vida das crianças.

Nos Estados Unidos, em 1991, estudos mostraram que uma em cada oito crianças com menos de 12 anos sofria de fome, o que representava 5,5 milhões de crianças. Nesse mesmo período, na Alemanha, os níveis de pobreza entre crianças sofreram um aumento de 1,5 pontos percentuais e, na Hungria, esse aumento foi de 2,9 %.

A tese proposta por Sgritta (2002) é de que a invisibilidade das crianças no mundo público aponta para uma “cidadania fraca” das crianças, cujos interesses políticos e econômicos não ocupam lugar significativo na agenda pública. Além da distribuição desigual de recursos econômicos, essa condição social das crianças decorre de uma concepção de criança como dependente e incompleta que compõe as teorias populares e até mesmo as mais importantes e elaboradas teorias acadêmicas.

Rosemberg (2006), em seu artigo Criança pequena e desigualdade social no Brasil, apresenta uma análise da situação da criança pequena, tendo entre 0 e 6

anos, na sociedade brasileira. A autora argumenta que os indicadores sociais referentes a essa faixa etária evidenciam um desinteresse público pelas crianças pequenas, em função do seu pequeno poder de negociação político e econômico, bem como de seus pais, nesse momento de suas vidas.

Conforme assinalado por Rosemberg (2006), o Brasil é marcado por uma desigualdade histórica e estrutural que atinge segmentos sociais com menor participação política e que têm menor acesso aos benefícios das políticas públicas. O segmento social branco, adulto/idoso, em certa medida composto por homens e residentes nas regiões Sul e Sudeste do país, é o que dispõe de melhor renda e maiores benefícios sociais. As maiores desigualdades atingem as crianças entre 0 e 6 anos, negras e indígenas e moradoras da região Nordeste.

(31)

e 1997 1/3 da população brasileira; a inadequação das condições de vida das crianças implica altas taxas de desnutrição, mortalidade infantil e na infância; as crianças mais pobres são as que têm menor acesso à educação infantil, assim como as crianças com menor idade, entre 0 e 3 anos, têm menos acesso à creche (ROSEMBERG, 2006).

De acordo com Rosemberg (2006), essas desigualdades sociais fortemente desfavoráveis à faixa etária de 0 a 6 anos, associam-se à visão de infância vinculada ao espaço privado, da casa, algo que fortalece uma certa invisibilidade pública da criança pequena.

Por outro lado, a autora considera que estão surgindo sinais de mudança na concepção brasileira sobre a criança pequena, decorrentes de uma urbanização recente, acesso praticamente universal à televisão e expansão da educação infantil. A criança entre 0 a 6 anos passa a ser distinguida de outras idades da infância e a delimitar novas profissões no mercado de trabalho e novos espaços no mercado consumidor. Além disso, de acordo com Moro e Gomide (2003, apud ROSEMBERG, 2006), pais começam a reconhecer características de um sujeito ativo em seus filhos pequenos: a criança pequena é considerada inteligente, reivindicadora e esperta. Porém, essas alterações provocadas na e para a primeira infância brasileira continuam principalmente imbricadas no contexto privado, familiar.

Nossa expectativa, do NEGRI e deste trabalho, é, pois, que a criança pequena tenha seus direitos públicos reconhecidos. Dentre eles, o direito à educação, à creche para aquelas de até 3 anos de idade, independentemente de suas condições familiares (trabalho da mãe, educação e renda dos pais), de sua pertença étnico-racial e de seu local de residência (região fisiográfica ou área rural ou urbana).

(32)

Dentro dessa perspectiva “determinista”, Corsaro (2011) distingue o modelo funcionalista, popular nas décadas de 1950 e 1960. Esse modelo estava interessado em como e porque crianças se integram à sociedade, especificando o que elas devem se tornar para a manutenção do equilíbrio social. Nesse sentido, a socialização estava voltada ao futuro, àquilo que a criança iria se tornar. Um importante representante desse modelo foi Talcott Parsons (1955 apud CORSARO, 2011). Para esse sociólogo, a criança seria uma ameaça à sociedade, à sua estabilidade. Por isso, deveria, então, ser moldada e internalizar o sistema social a partir de um treinamento formal sobre as normas sociais. Para alguns sociólogos, o processo de internalização das regras sociais funcionaria como uma forma de controle social.

Corsaro (2011) ressalta, ainda, que, essa compreensão “determinista” de socialização, negligenciou a capacidade de ação e inovação das pessoas, além de ignorar a importância da infância e da criança para a sociedade.

No campo das Ciências Humanas e Sociais, a Psicologia do Desenvolvimento também contribuiu intensamente para os estudos sobre a socialização inicial das crianças. Corsaro (2011) salienta que, a partir, principalmente, das contribuições de Piaget e Vygotsky, já é possível perceber uma concepção de criança mais ativa no seu processo de desenvolvimento e nas aprendizagens.

Antes de avançar nessa argumentação, é necessário alertar que nosso intuito, neste texto, não é aprofundar a discussão acerca das teorias de desenvolvimento propostas por esses dois psicólogos. Apenas serão apresentados aspectos da argumentação de Corsaro (2011) que permitem identificar as contribuições dessas teorias do desenvolvimento para a consolidação dos estudos sociais da infância. Também serão apresentadas as principais críticas à visão “desenvolvimentista”, formuladas por Rosemberg (1976) e Castro (2001).

(33)

Já a visão sociocultural proposta por Vygotsky, apesar de também considerar o papel ativo da criança no seu processo de desenvolvimento, destaca a importância das ações coletivas, ocorridas e localizadas no contexto social. Diante disso, são as interações da criança e suas atividades práticas com outras pessoas que possibilitam as transformações das habilidades e dos conhecimentos já adquiridos. Um elemento importante nessa concepção de desenvolvimento é a aquisição e utilização da linguagem que possibilita a reprodução da cultura de gerações anteriores (VYGOTSKY, 1978 apud CORSARO, 2011).

Para Corsaro (2011), o ponto fraco dessas teorias denominadas construtivistas está na focalização do desenvolvimento individual, um processo enfrentado pela criança para se tornar adulto. Essa é outra limitação dessas perspectivas: a preocupação “exagerada” (p. 29) com o alcance da maturidade e competência adulta. Com isso, a compreensão da criança como um ator social só é possível quando ela deixa a etapa da infância. “A criança seria um aprendiz de adulto”, conforme Rosemberg (2012).

No Brasil, Rosemberg (1976)8 efetuou uma análise sobre alguns dos componentes da Psicologia do Desenvolvimento (por ela denominada genética, conforme tradição francófona). Parte da consideração de que, nas sociedades atuais, a relação entre adultos e crianças ocorre de forma hierárquica, sendo o adulto o detentor de maior poder, responsável pela educação formal e informal das crianças. Essa postura, que denomina “adultocêntrica”, fundamenta-se, principalmente, na concepção de uma dependência biológica inicial da criança e intensifica-se com a crescente urbanização e desenvolvimento tecnológicos das sociedades contemporâneas.

8 Duas publicações produzidas no contexto institucional da Fundação Carlos Chagas parecem se

destacar como a entrada da infância e da criança no campo da Sociologia, nos anos 1970: esse artigo de Rosemberg (1976) Educação para quem, e o número especial dos Cadernos de Pesquisas

(34)

A autora utiliza a expressão “sociedade-centrada-no-adulto” (ROSEMBERG, 1976, p.1467) para se referir à posição privilegiada atribuída ao adulto, entendido, também na Psicologia Genética (ou do desenvolvimento), como o ápice do processo de desenvolvimento. Esse processo, em muitos casos, seria visto, pela educação, como a humanização da criança, que deixaria, então, de ser natureza para se aproximar da sociedade. Isto é, a criança não seria um ser social e não seria “um pequeno humano” até sua aculturação.

Para outras perspectivas educacionais, também centradas no adulto, a criança é idealizada, a qual passa a ser considerada potencialidade para a salvação da humanidade, pois ainda não foi corrompida pelos valores da sociedade em que vive. A infância é tida como esperança, ou a “criança esperança” conforme a articulação mídia-organizações multilaterais (inicialmente UNICEF e, posteriormente, UNESCO). Nesse sentido, para Rosemberg (1976), esse pensamento também reforça a visão da criança como a-social, a-histórica, isolando-a da sociedade corruptível, o que a mantém na esfera da natureza idealizada.

A Psicologia Genética ou Psicologia do Desenvolvimento, conforme analisada por Rosemberg (1976), adotaria o paradigma da sociedade adultocêntrica que privilegia o homem branco, adulto e de classe média, como pode ser identificado nas qualificações especiais atribuídas às ciências que não tomavam o homem adulto, branco e de classe média como objeto, a saber: “(...) psicologia diferencial, psicologia da criança, do adolescente, da mulher, gerontologia” (ROSEMBERG, 1976, p. 1470).

Para Rosemberg (1976), nas proposições de Piaget apreende-se que a evolução dos estágios de desenvolvimento alcançaria o equilíbrio superior ao atingir, na idade adulta, o nível das operações formais, características do Ocidente, o que, por sua vez, colocaria em desvantagem as formas de expressão simbólica das crianças e dos que eram denominados “povos primitivos”, as etnias não brancas do mundo ocidental. Essa concepção de criança, subjacente às teorias desenvolvimentistas, reitera a posição da infância como etapa subordinada ao adulto e que deve ser superada para atingir o grau supremo da humanidade.

(35)

A infância é vista como uma fase, um processo estruturado de tornar ser, mas raramente como um curso de ação ou uma prática social (...). A criança é então dita como: “algo que vai ser”, uma tábua rasa (...) inexperiência, imaturidade (...) [o]

mundo adulto é visto não só como algo reconhecível, completo e em equilíbrio (...) mas também (...) como um mundo desejável (JENKS, 2002, p. 193).

Assim como Rosemberg (1976) e Jenks (2002), Castro (2001) também discute a subordinação social da infância a partir do debate de uma ciência psicológica focada em parâmetros adultos como superiores, desejáveis e “naturalmente” necessários para a inserção do sujeito na sociedade. Esses autores argumentam que a lógica “desenvolvimentista” (da Psicologia do Desenvolvimento) foi determinante na instalação de um estado de menoridade à criança.

A situação de menoridade, atribuída à infância, está representada não somente na sociedade adultocêntrica, mas, também, na privatização da criança, ou seja, sua vinculação ao espaço da casa, da família e da escola. Os direitos e necessidades das crianças não são tomados em si, ao contrário, ficam subentendidos aos direitos da família (CASTRO, 2001) e das mulheres (ROSEMBERG, 2006). Aqui, deve-se ter cautela em não “normalizar”, conforme Rosemberg (2012), algumas reflexões de Ariès sobre o convívio de crianças e adultos em espaços públicos (a cidade e suas instituições) durante a idade média. A cidade contemporânea, conforme Rosemberg (2012), não foi pensada para a criança. Nesse sentido, se “voltássemos” ao convívio social, tal como existiam, estaríamos sacrificando as crianças. O que seriam das crianças sem grades e redes?

Essa nova perspectiva nos estudos sobre criança (s) pode ser analisada de duas perspectivas complementares: a primeira destaca os componentes unitários ou compartilhados; a segunda aponta as diversas correntes metateóricas que a atravessam. Iniciemos pelo que compartilham.

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culturas devem ser consideradas objetos de estudos, por si mesmas e a etnografia é uma metodologia particularmente importante para o desenvolvimento de uma sociologia da infância (JAMES; PROUT, 2003). Por fim, James e Prout (2003) ressaltaram que a definição de um novo paradigma da nova Sociologia da Infância contribui para a reconstrução da infância na sociedade, fenômeno denominado por Giddens (1979 apud JAMES; PROUT, 2003) de dupla hermenêutica.

Muñoz (2006) também resume o que seriam os traços comuns nos estudos sociais da infância. São eles: uma abordagem mais global do objeto, interessada nos aspectos que são comuns às crianças; postura crítica em relação às conceituações tradicionais de socialização e desenvolvimento; busca por conectar os padrões geracionais mutáveis em função do tempo, tanto no que se refere às formas de ser criança como às formas de relações entre adultos e crianças, com mudanças sociais que afetam as duas gerações.

Na crítica aos paradigmas anteriores, respostas teóricas específicas vão sendo dadas às maneiras de como se deve olhar para a infância e a (s) criança (s). Isto é, esse campo em construção não é unitário e, como os demais, apresenta enfoques teóricos em consonância com as grandes correntes pós-positivistas contemporâneas. Focalizando, principalmente, a Sociologia – mas que poderia se estender a outras disciplinas – Mayall (2002, apud MUÑOZ, 2006) e Alanen (2003, apud MUÑOZ, 2006) definiram três enfoques considerados predominantes para os estudos da infância/crianças: Sociologia das crianças; Sociologia desconstrutiva da Infância e Sociologia estrutural da infância. A primeira defende o estudo das crianças em si e a partir de suas próprias visões de mundo; considera as crianças como atores sociais e que a investigação deve privilegiar as condições de vida das crianças, suas atividades, relações e conhecimentos.

A Sociologia desconstrutiva da infância está embasada nas proposições construcionistas, as quais apresentam as crianças e a infância como formações discursivas socialmente construídas e consideram necessário “desmontar” ou desconstruir (MUÑOZ, 2006, p.14) essas concepções de infância e de criança na sociedade. Nesse enfoque, as crianças também são tratadas como atores sociais que constroem o contexto social em que vivem (MUÑOZ, 2006).

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Figura 1 – Gráfico da evolução da produção científica no período de 1999 a 2011.
Figura 2 – Gráfico da evolução da produção científica no período de 1993 a 2009.
Tabela  1  –  Taxa  de  frequência  bruta  (%)  à  creche/escola  (EI/EF),  por  variáveis  selecionadas
Tabela 2 – Distribuição de frequência do número de teses e dissertações localizadas no Banco  de Teses da CAPES sob o descritor “infância e mídia”, por ano da defesa e financiamento.
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Referências

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