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Tributação e Direitos Humanos: direito à intimidade versus a quebra do sigilo bancário pelo Fisco

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Academic year: 2017

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(1)

PRÓ-REITORIA

ACADÊMICA

ESCOLA

DE

DIREITO

PROGRAMA

DE

PÓS-GRADUAÇÃO

STRICTO SENSU

EM

DIREITO

TRIBUTAÇÃO E DIREITOS HUMANOS: DIREITO À INTIMIDADE

VERSUS

A QUEBRA DO SIGILO BANCÁRIO PELO FISCO

Brasília - DF

2015

(2)

DAIANA FERREIRA DE ALMADA

TRIBUTAÇÃO E DIREITOS HUMANOS: DIREITO À INTIMIDADE

VERSUS

A QUEBRA DO SIGILO BANCÁRIO PELO FISCO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito na Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito, com área de concentração em Tributário, Econômico e Financeiro.

Orientadora: Profa Dra. Liziane Angelotti Meira.

(3)

Dissertação de autoria de Daiana Ferreira de Almada, intitulada “TRIBUTAÇÃO E DIREITOS HUMANOS: DIREITO À INTIMIDADE VERSUS A QUEBRA DO SIGILO

BANCÁRIO PELO FISCO”, apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Direito da Universidade Católica de Brasília, em 15 de dezembro de 2015, defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada:

_______________________________________________________ Profa. Dra. Liziane Angetlotti Meira

Orientador - PPG Stricto Sensu (UCB)

_______________________________________________________ Prof. Dr. Marcos Aurélio Pereira Valadão

Examinador Interno - PPG Stricto Sensu (UCB)

_______________________________________________________ Prof. Dr. Jonathan Barros Vita

Examinador Externo

(4)

Ficha elaborada pela Biblioteca Pós-Graduação da UCB

A444t Almada, Daiana Ferreira de.

Tributação e Direitos Humanos: direito à intimidade versus a quebra do sigilo bancário pelo Fisco. / Daiana Ferreira de Almada – 2015.

145 f.: il.; 30 cm

Dissertação (Mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2015.

Orientação: Profa. Dra. Liziane Angelotti Meira 1. Direito. 2. Tributação. 3. Direitos humanos. 4. Direito à intimidade. 5. quebra do sigilo bancário. 6. Fisco. I. Meira, Liziane Angelotti, orient. II. Título.

(5)

Dedico,

Aos meus avós Maria Antônia e Luiz Carlos, porque mesmo em face das adversidades, sempre acreditaram na importância dos estudos na formação dos netos e, por isso, me apoiaram.

(6)

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por esta oportunidade a qual me concedeu e me permitiu realizar este sonho, pois busque primeiro o Senhor, que tudo se fortalece quando se crê e se tem fé.

Agradeço a minha Mãe Maria das Graças, a minha vovó Maria Antônia e ao meu companheiro José Marcone Lopes Nunes, que tiveram paciência e me apoiaram nos momentos mais difíceis e que amo incondicionalmente.

Agradeço aos meus irmãos que me incentivaram a enfrentar as dificuldades e a nunca desistir.

Agradeço as minhas amigas Luiza Nunes, Laudi Silva e Eliene Todan pelo apoio nos momentos difíceis.

Agradeço aos professores que fizeram parte desta jornada, em especial, a minha professora orientadora Dra. Liziane Angelotti Meira, pela paciência, dedicação e pelo conhecimento contribuído e transmitido para a realização deste trabalho.

(7)

EPÍGRAFE

O Direito não é uma simples ideia, é força viva. Por isso a justiça sustenta, em uma das mãos, a balança, com que pesa o Direito, enquanto na outra segura a espada, por meio da qual se defende. A espada sem a balança é a força bruta, a balança sem a espada é a impotência do Direito. Uma completa a outra. O verdadeiro Estado de Direito só pode existir quando a justiça bradir a espada com a mesma habilidade com que manipula a balança.

(8)

RESUMO

ALMADA, Daiana Ferreira de. Tributação e Direitos Humanos: direito à intimidade versus a quebra do sigilo bancário pelo Fisco. 2015. 145 p. Dissertação de Mestrado, na linha de concentração em Direito Tributário Econômico e Financeiro, da Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2015.

Tributação e Direitos Humanos são institutos interligados. Os entes federados ao exercerem a competência tributária devem ser norteados pelos Direitos Humanos. O Estado, sendo responsável pela tutela e promoção de tais, utiliza-se da arrecadação tributária para efetivá-los, para tanto, às vezes ao exercer seu poder de império acaba por ter que restringir alguns direitos, como é o caso do direito à intimidade e à vida privada, previsto nos incisos X e XII, do art. 5º, da Constituição Federal de 1988, quando envolvem casos relacionados com o sigilo bancário, que apesar de não está incluído de forma expressa no rol dos direitos fundamentais, foi reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal como direito fundamental e, para que ocorra sua relativização, prescinde de autorização do Poder Judiciário (entendimento do STF). Porém, a Lei Complementar nº 105/2001, em seus artigos 5º e 6º, trouxe a previsão da Administração Tributária tem acesso a dados bancários dos contribuintes, desde que exista processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso, prescrição esta que virou alvo de algumas Ações Diretas de Inconstitucionalidades (ADI´s), que encontram-se pendentes de julgamento até o presente momento. Entendemos que não há motivos, para o Guardião da Constituição Federal, declarar a inconstitucionalidade de referida Lei, tendo em vista que não existe nos incisos X e XII, do art. 5º, da Carta Magna, consignação de reserva de jurisdição, de modo que no primeiro momento, não seria obrigatório a participação do Poder Judiciário, mas a última em se verificando, em cada caso concreto, inobservância dos preceitos legais ou eventuais abuso de poder por parte dos agentes do Fisco. O direito ao sigilo bancário, não deve ser oposto à Administração Tributária, tendo em vista que às informações obtidas, estarão resguardadas pelo dever funcional, e eventuais abusos, serão punidos com os rigores da lei. O acesso aos dados bancários dos contribuintes e a troca de informações internacionais em matéria tributárias, tem se tornado, nos dias atuais, uma ferramenta de suma importância à Administração Tributária. Diante do atual cenário internacional de troca de informações, a República Federativa do Brasil celebrou com os Estados Unidos um Acordo Intergovernamental, para implementar um conjunto de normas norte-americana, conhecida Foreign Account Tax Compliance Act – FATCA - que alterou o Código Tribunal deste país, prevendo que às instituições financeiras devem encaminhar de forma automática informações bancárias dos correntistas norte-americanos à Administração Tributária do país, como o Brasil incorporou tal Acordo no direito brasileiro, restará ao Guardião da Constituição se manifestar acerca do assunto, uma vez que, tem prevalecido neste Tribunal, que o sigilo bancário, ressalvados os casos permitidos constitucionalmente, apenas pode ser relativizado mediante ordem judicial.

(9)

ABSTRACT

Taxation and Human Rights are interconnected institutes. The federated beings, when exercising that power, must be guided by Human Rights. The State, which is responsible for safeguarding and promoting them, uses tax revenues to effective them to do so. Sometimes when exercising his empire power it ends up restricting certain rights such as the right to intimacy and to privacy as provided in sections X and XII of art. 5 of the Federal Constitution of 1988. When involving cases related to bank secrecy, which although are not included explicitly in the list of fundamental rights, were recognized by the Supreme Court as a fundamental right and to occur its relativisation it is necessary the authorization of the Judiciary (understanding of the Supreme Court). However the Complementary Law No. 105/2001, in its Articles 5 and 6, brought the prediction of the Tax Administration which has access to taxpayers’ data banking, provided that there is administrative process instituted or tax proceeding in progress, prescription which has turned into a target of some Direct actions of Unconstitutionalities (ADI's), which are open to trial until the present time. We understand that there are no reasons for the Guardian of the Federal Constitution to declare the unconstitutionality of the referred law, given that there isn’t jurisdiction reservation consignment in sections X and XII of art. 5 of the Magna Carta, so that at first the participation of the judiciary would not be mandatory, but the last to be checked in each case, a failure to follow legal requirements or possible abuse of power by of the IRS agents. The right to bank secrecy should not be opposed to the tax authorities, given that the information obtained will be safeguarded by the functional duty, and any abuse will be punished with the rigors of the law. The access to taxpayers’ banking data and the exchange of international information in tax matters have become a very important tool for Tax Administration nowadays. In today's international arena for exchanging information, the Federative Republic of Brazil signed up with the United States an Intergovernmental Agreement for implementing a set of North American standards, known as Foreign Account Tax Compliance Act - FATCA - which amended the Court Code of this country, predicting that financial institutions should send automatically banking information of American account holders to the tax authorities of the country like Brazil has incorporated this Agreement in Brazilian law, it will be left to the Constitution Guardian to determine the subject once it has prevailed in this Court that bank secrecy, except in cases permitted constitutionally, can only be qualified by court order.

(10)
(11)

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade BACEN – Banco Central do Brasil

CF – Constituição Federal 1988

CIDE– Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico COAF – Conselho de Controle de Atividades Financeiras

COFINS – Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social CTN – Código Tributário Nacional

CPI´s - Comissões Parlamentares de Inquérito CVM – Comissão de Valores Mobiliário

EUA – Estados Unidos da América

FATCA. – Foreign Account Tax Compliance Act IE – Imposto de Exportação

IGVA - Intergovernamental Agreement II – Imposto de Importação

IRS – Internal Revenue Service

IPI – Imposto sobre Produto Industrializado

IPTU– Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana ITR– Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural

LC – Lei Complementar

OCDE – Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico OIT – Organização Internacional do Trabalho

ONU – Organizações da Nações Unidas RE – Recurso Extraordinário

RFB – Receita Federal do Brasil STF – Supremo Tribunal Federal STJ – Superior Tribunal de Justiça

(12)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 11

CAPÍTULO I - DIREITOS HUMANOS E TRIBUTAÇÃO... 16

1.1 A questão da terminologia dos Direitos Humanos... 16

1.2 Evolução histórica e dimensões dos Direitos Humanos ... 19

1.3 Proteção dos Direitos Humanos no âmbito internacional ... 28

1.4 histórico da tributação nas constituições brasileiras ... 31

1.5 Das funções dos tributos ... 40

1.5.1 Função Fiscal ... 41

1.5.2 Função extrafiscal ... 43

1.6 Relação entre Direitos Humanos e a tributação ... 45

CAPÍTULO II PROTEÇÃO INTERNA DO SIGILO BANCÁRIO ... 49

2.1 Breve histórico do sigilo bancário no direito brasileiro ... 49

2.2 Sigilo bancário e sigilo fiscal ... 51

2.3 Lei complementar n° 105/2001 e a quebra do sigilo bancário ... 57

2.4 Competência para quebra do sigilo bancário no direito interno ... 64

2.5 Sigilo bancário como extensão do direito à intimidade e à vida privada ... 72

2.6 Jurisprudência do STJ e STF acerca da quebra do sigilo bancário e o direito à intimidade ... 77

CAPÍTULO III – TRATADOS INTERNACIONAIS E OS SIGILOS BANCÁRIO E FISCAL ... 92

3.1 Tratados internacionais e a troca de informações ... 92

3.2 Os tratados sobre dupla tributação internacional ... 101

3.2.1 Modelos da OCDE e da ONU ... 105

3.3 Tratados sobre troca de informações em matéria tributária ... 111

3.4 Fatca e a troca de informações para fins fiscais ... 113

3.5 Quebra do sigilo bancário como combate à evasão fiscal e aos paraísos fiscais ... 120

3.6 Sigilo fiscal no direito internacional contemporâneo e a necessidade de adequação constitucional e jurisprudencial ... 130

CONCLUSÃO ... 134

(13)

INTRODUÇÃO

O tema do presente trabalho envolve os direitos humanos, mais especificamente, o direito à intimidade, de um lado e a quebra do sigilo bancário pelo Fisco, de outro.

O tema desperta várias discussões tanto no âmbito doutrinário como jurisprudencial. A questão da Lei Complementar nº 105/2001 prever a quebra do sigilo bancário pela Administração Tributária, provocou em muitos contribuintes, um sentimento de negativo, pois alguns defendem que tal quebra viola os direitos fundamentais à intimidade, à vida privada e ao sigilo da comunicação de dados, previstos nos incisos X e XII, do art. 5º, da Carta Magna de 1988.

A República Federativa do Brasil foi definida pela Constituição Federal de 1988 como um Estado Democrático de Direito, cabendo-lhe assegurar e garantir os Direitos Humanos

A Constituição Federal incluiu no rol dos direitos e garantias fundamentais o direito à intimidade e à vida privada, conferindo a esse rol o status de cláusula pétrea (art. 60, §4º, IV).

O sigilo bancário não tem previsão expressa na Carta Política, não se constituindo como um direito autônomo. Em sede infraconstitucional, ao contrário, o sigilo bancário, além de possuir proteção específica, possui hipóteses de relativização na Lei Complementar nº 105/2001.

A interpretação do Guardião da Constituição acerca do artigo 5º foi ampla e garantista. Assim, o Supremo Tribunal Federal considerou que o direito ao sigilo bancário se inclui no direito à intimidade e à privacidade, e só pode ser flexibilizado por ordem emanada do Poder Judiciário.

No que tange à quebra do sigilo bancário por parte da autoridade fiscal, encontra-se respaldo no artigo 6° da Lei Complementar nº 105/2001 que foi regulamentado pelo Decreto nº 3.724/2001 e este alterado pelo Decreto nº 8.303/2014, sendo que este último foi editado para se adequar às normas do Foreign Account Tax Compliance Act (FATCA).

No final do ano de 2014, mais precisamente em 23 de setembro, o Brasil e os Estados Unidos assinaram um Acordo Intergovernamental (IGVA) para implantar um conjunto de leis norte-americanas que ficou conhecido como FATCA.

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Federal do Brasil e esta repassar ao Internal Revenue Service (IRS) dos Estados Unidos as operações que envolvam contas mantidas por cidadãos norte-americanos, ou outros cidadãos que tenham relações econômicas como os EUA, sob pena de retenção de 30% de imposto sobre qualquer rendimento de fonte dos Estados Unidos. Esse percentual, a partir de 2017, passará a incidir sobre o rendimento bruto da venda de qualquer ativo financeiro que venha de fonte norte-americana.

Diante desse cenário, percebe-se que essa relativização pode representar uma mudança no direito ao sigilo bancário interno, tendo em vista que, atualmente, o Brasil experimenta duas posições aparentemente contraditórias: uma ligada ao direito interno, que apesar de não apresentar expressa proteção na Constituição Federal, é reconhecido pela jurisprudência da Corte Constitucional como direito fundamental e, para que ocorra sua relativização, é necessária autorização expressa do Poder Judiciário; e outra, tendente a relativizar tal direito para fins fiscais, diante da assinatura do FATCA.

Nesse contexto, surgem muitas questões: “Como os Direitos Humanos, mais especificamente o direito à intimidade, servem de limitação constitucional ao poder de tributar por parte do Estado?” E, “Qual a condição desse direito fundamental frente à possibilidade da quebra do sigilo bancário pela autoridade fazendária?” E ainda, “O direito ao sigilo bancário é um direito fundamental?” e “Como fica o sigilo bancário e o direito à intimidade diante da formalização do Acordo Intergovernamental assinado pelo Brasil e os Estados Unidos para implementação das normas do FATCA?” “A formalização desse Acordo estaria em conformidade com a ordem interna?” E “Qual seria o status que esse Acordo teria no Direito brasileiro interno?” Essas questões representam o problema inicial ao desenvolvimento do presente trabalho.

Como justificativa teórica, do presente tema é importante para se compreender se realmente resta superado o Estado Liberal e Estado Social, pelo Estado Democrático de Direito, e ainda para demonstrar que, mesmo estando positivados em sede constitucional, os direitos fundamentais sofrem agressões por parte do poder público, em algumas ocasiões em que utiliza seu poder de império na arrecadação de tributos.

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é o caso do Brasil, conforme prevê o artigo 1º da nossa Carta Política, não pode ser vista como um meio de dominação e de concentração de renda, interferindo de forma prejudicial na cadeia produtiva, aumentando, desse modo, a diferença entre as classes mais privilegiadas do restante da população.

Ademais, explicar a relação entre Direitos Humanos e a tributação, especificamente o direito à intimidade e a quebra do sigilo bancário pela autoridade fazendária torna-se relevante frente ao recente Acordo Intergovernamental (IGA) assinado entre o Brasil e os Estados Unidos para troca de informações bancárias de forma automática e sem prévia autorização judicial.

O Decreto nº 8.506, de 24 de agosto de 2015, que promulgou o Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Estados Unidos da América para Melhoria da Observância Tributária Internacional e Implementação do FATCA, firmado em Brasília, em 23 de setembro de 2014, incorporou tal norma no direito brasileiro. Diante da incorporação de tais normas restará saber se ocorrerá alteração nos argumentos decisórios do Supremo Tribunal Federal, que ainda não julgou o Recurso Extraordinário nº 601.314, que teve sua repercussão geral conhecida em 2009, bem como de outras Ações Diretas de Inconstitucionalidade referentes ao tema.

O objetivo deste trabalho é, analisar se o Fisco no exercício de suas atribuições, pode determinar diretamente a quebra do sigilo bancário, sem violar o direito à intimidade garantindo constitucionalmente e, ainda, estudar como o sigilo bancário tem sido tratado no âmbito internacional, como tem ocorrido a troca de informações bancárias entre as Administrações Tributárias dos Estados estrangeiros e qual tem sido o tratamento recomendado tanto pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) quanto pela Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o tema.

(16)

conferida aos direitos humanos no âmbito internacional, com enfoque embrionário no direito comunitário, na liga das nações e na Organização Internacional do Trabalho (OIT). Na parte da tributação, iniciaremos apresentando sua evolução histórica na Constituição Brasileira de 1824 até a atual de 1988. Neste mesmo capítulo serão examinadas as funções que os tributos possuem, sendo a função fiscal - aquela que tem o nítido caráter arrecadatório - e a extrafiscal - tem a função de intervenção na ordem econômica e social. Finalizando o capítulo, será analisada a relação entre Direitos Humanos e tributação, e como tais diretos devem nortear a competência tributária dos entes federados.

No segundo capítulo, tratar-se-á das questões envolvendo o sigilo bancário, porém com enfoque no direito interno. Onde, será trazida a evolução histórica de tal sigilo no direito brasileiro. Será evidenciada a distinção entre o sigilo bancário e o fiscal, apontando a base legal de tais institutos. Ainda, quais autoridades têm legitimidade para decretar a quebra do sigilo bancário, bem como fica o direito à intimidade e à vida privada diante da relativização deste sigilo. Será também apresentando como o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça têm se posicionado acerca da possibilidade da quebra do sigilo bancário pela Administração Tributária. Neste contexto, apresentaremos as cinco Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADINs) que foram propostas junto ao Guardião da Constituição - questionando a constitucionalidade da Lei Complementar nº 105/2001 – as quais se encontram até a presente data pendentes de julgamento.

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quebra do sigilo bancário como forma de combater à evasão fiscal e paraísos fiscais. E, finalizando o capítulo será abordado que, diante do atual cenário internacional o posicionamento dominante no Supremo Tribunal Federal tem entendido no sentido de que a relativização do sigilo bancário, ressalvado o previsto no art. 58, § 2°, V, da Constituição Federal, apenas pode ocorrer mediante autorização judicial.

(18)

CAPÍTULO I - DIREITOS HUMANOS E TRIBUTAÇÃO

Tributação e direitos humanos são temas que, a priori, não parecem apresentar um vínculo entre si. Porém, ao se analisar mais detalhadamente esses dois institutos, percebe-se que os Direitos Humanos servem de parâmetro para que o Direito Tributário possa delimitar regras que permitam aos seres humanos gozarem do patrimônio que possuem tendo, com isso, satisfeitas suas necessidades. Nesse diapasão, os Direitos Humanos surgem como instrumento configurador e limitador do poder do Estado de tributar.

O direito fundamental à intimidade, previsto na Carta Magna no art. 5º, inciso X, é uma garantia constitucional à vida privada, resguardando um espaço íntimo intransponível por interferências ilícitas externas.

Em que pese essa garantia constitucional, haverá, no entanto, situações em que o direito à intimidade será relativizado, tendo em vista que, por mais importante que sejam os Direitos Humanos, não apresentam caráter absoluto. Uma dessas situações é a possibilidade da quebra do sigilo bancário que, conforme a Lei Complementar nº 105/2001, pode ser feita pela autoridade fazendária.

Diante disso, neste capítulo, abordar-se-á o que se entende por Direitos Humanos, sua evolução histórica, o direito fundamental à intimidade e também qual a relação simbiótica entre Direitos Humanos e tributação.

1.1 A QUESTÃO DA TERMINOLOGIA DOS DIREITOS HUMANOS

Os Direitos Humanos são direitos inerentes a todas as pessoas, independentemente da posição social, raça, sexo, nacionalidade, religião ou qualquer outra condição.

Ricardo Lobo Torres, ao tratar da terminologia dos Direitos Humanos, esclarece que “os direitos naturais são sinônimos dos Direitos Humanos, ou direitos fundamentais, ou direitos individuais, ou direitos civis, ou liberdades públicas1.

Há alguns autores que afirmam que os Direitos Humanos podem ser chamados também de direitos do homem, direitos fundamentais, e, nesse contexto, estariam ligados à proteção que se tem na esfera da liberdade do ser humano.

(19)

Nessa linha de pensamento, José Joaquim Gomes Canotilho identifica que as expressões “direitos do homem” e “direitos fundamentais” são frequentemente usadas como sinônimos. Mas, segundo sua origem e o respectivo significado, podem ser distinguidas pelo fato de os direitos do homem serem direitos válidos para todos os povos em todos os tempos (dimensão jus naturalista-universalista); ao passo que os direitos fundamentais são os direitos do homem, “jurídico-institucionalmente” garantidos e limitados “espaço-temporalmente” 2.

Alguns autores simplesmente entendem que a expressão “Direitos Humanos” estaria ligada ao ramo do Direito Internacional Público, já os direitos fundamentais estariam ligados à ordem interna. Nesse sentido, nas palavras de Valerio de Oliveira Mazzuoli Direitos Humanos é expressão intrinsecamente ligada ao direito internacional público. Assim, quando se trata de “Direitos Humanos”, está -se tecnicamente a referir à proteção que a ordem internacional confere sobre es-ses direitos3.

Nota-se, portanto, que a etimologia entre Direitos Humanos e direitos fundamentais tem gerado posições divergentes na doutrina; assim, neste trabalho, adotar-se-á o posicionamento de Ricardo Lobo Torres que, como visto, considera os Direitos Humanos e fundamentais como sinônimos.

Nas palavras de Marcos Aurélio Pereira Valadão:

Entende-se por Direitos Humanos os direitos da pessoa humana, enquanto indivíduo e cidadão, que são inalienáveis, imprescritíveis, com eficácia erga omnes, e que têm origem nos denominados direitos naturais, podendo materializar-se como direitos transindividuais, i.e., coletivos e difusos4.

Os Direitos Humanos, em que pese disporem sobre as necessidades da pessoa humana de fruir com liberdade sua vida, apresentam, ainda, os limites que o Estado deve seguir na busca pela efetivação dos princípios constitucionais, a exemplo os princípios da dignidade da pessoa humana, isonomia, intimidade, dentre outros.

Alexandre de Moraes afirma que:

Essas ideias encontram um ponto fundamental em comum, a necessidade

2 CANOTILHO, Jose Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003. p. 24.

3 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direitos Humanos. São Paulo: Método, 2014. p. 83. 4 VALADÃO, Marcos Aurélio Pereira. Direitos humanos e tributação uma concepção integradora.

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de limitação e controle dos abusos de poder do próprio Estado e de suas autoridades constituídas e a consagração dos princípios básicos da igualdade e da legalidade como regentes do Estado moderno e contemporâneo5.

Hugo de Brito Machado conceitua o Direito Tributário como ramo do direito que se ocupa das relações entre o Fisco e as pessoas sujeitas a imposições tributárias de qualquer espécie, limitando o poder de tributar e protegendo o cidadão contra os abusos desse poder6.

Já Regina Helena Costa define Direito Tributário como “conjunto de normas jurídicas que disciplinam a instituição, a arrecadação e a fiscalização de tributos” 7.

Parece contraditória a relação entre esses dois institutos, pois sendo o Direito Tributário uma forma de arrecadar tributos e os Direitos Humanos uma forma de proteger o ser humano, em todas as suas relações, aparentemente haveria colisão entre esses ramos do Direito.

Porém, são, no fundo, complementares, visto que o Direito Tributário tem por intento obter das pessoas recursos para que o Estado possa manter-se, e os Direitos Humanos, por seu turno, servem para coibir atos que violem a dignidade da pessoa humana, inclusive arrecadação excessiva e inconstitucional de tributos, ou outros meios usados pelo Estado que, de forma abusiva, arrecade desconsiderando a sua capacidade contributiva.

Ricardo Lobo Torres menciona que:

Há um direito às condições mínimas de existência humana digna que não pode ser objeto de intervenção do Estado e que ainda exige prestações estatais positivas. O direito ao mínimo existencial não tem dicção constitucional própria. A Constituição de 1988 não o proclama em cláusula genérica e aberta, senão que se limita a estabelecer que constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais” (art. 3º, III), além de imunizá-lo em alguns casos contra a incidência de tributos (art. 5º, itens XXIV, LXXII, LXXIII, LXXIV, art. 153, §4º, etc) 8.

Maria Garcia, buscando a definição precisa dos direitos fundamentais, após detida análise das lições de Perez Luño, Canotilho e Lassale, aponta cinco direitos

5 MORAES, Alexandre. Direitos humanos fundamentais. Comentários aos arts. 1° a 5º da Constituição Federal da República Federativa do Brasil. São Paulo: Editora Atlas, 2003. p. 19. 6 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 34. ed. São Paulo: Malheiros, 2013. p. 50. 7 COSTA, Helena Regina. Curso de Direito Tributário: Constituição e Código Tributário Nacional.

São Paulo: Saraiva, 2013. p. 28.

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fundamentais básicos presentes na Constituição brasileira: vida, liberdade, igualdade, segurança e propriedade, reconhecidos no caput do art. 5º, os quais constituem os fundamentos dos Direitos Humanos consagrados9.

Paulo Bonavides entende como direitos fundamentais aqueles nomeados constitucionalmente e que são revestidos de um grau maior de garantia e segurança10.

Diante do exposto, nota-se que os Direitos Humanos decorrem da própria natureza dos homens, apresentando-se como direitos mínimos que devem ser assegurados pelo Estado. Este, ao utilizar de sua competência tributária para instituição de tributos, restringe determinados direitos fundamentais dos contribuintes, tais como os de propriedade e liberdade, devendo ter por escopo garantir outros nos seus gastos, na prestação de serviços etc.

1.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA E DIMENSÕES DOS DIREITOS HUMANOS

Cumpre anotar, que não se adentrará nas divergências doutrinárias concernentes à terminologia dos Direitos Humanos e, para fins didáticos, serão empregado Direitos Humanos ou fundamentais como sinônimos.

Os Direitos Humanos são frutos de uma lenta evolução histórica e social. Com o passar do tempo, a sociedade percebeu que haveria necessidade de se proteger alguns direitos inerentes ao ser humano.

Os Direitos Humanos, desde os primórdios da civilização, passaram por várias fases, sendo cada uma marcada pelo aparecimento de determinada classe de direitos.

Os primeiros indícios dos direitos comuns, mais especificamente no que tange à vida, à família e ainda à propriedade, são encontrados no Código de Hamurabi de 1690 a.C. Essa lei acaba se sobrepondo ao poder instituído, prevendo-se em prevendo-seu texto algumas expressões relacionadas ao direito de defesa do homem11.

9 GARCIA, Maria. Mas Quais são os Direitos Fundamentais? Revista de Direito Constitucional e

Internacional, Instituto Brasileiro de Direito Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, n/ 39, abr./jun. 2002, p. 115-123.

10 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 40. 11 Alexandre de Moraes menciona que o Código de Hamurabi talvez seja a primeira codificação a

(22)

No plano histórico, os Direitos Humanos surgem em meio à consolidação da noção de “inversão” típica do Estado Moderno, na relação Estado/Cidadão, onde a questão é encarada cada vez mais sob a ótica dos direitos dos cidadãos e não do ponto de vista dos direitos do Estado, reservando-se ao homem o direito de gozar de algumas liberdades fundamentais e de caráter natural, pois que não dependem do beneplácito do Estado12.

A importância dos Direitos Humanos e sua concretização, mormente no Brasil, que, a despeito de ter a temática dos direitos fundamentais profundamente arraigada no texto constitucional, ainda está longe de ver concretizado o ideal de um Estado Democrático de Direito, embasado nos valores de respeito à dignidade humana13.

O estudo da evolução histórica do mundo jurídico, principalmente quando se trata dos direitos essenciais à pessoa humana, torna-se importante para que seja possível compreender que esses direitos não surgiram todos de uma única vez, como uma descoberta repentina de uma sociedade, mas que estes foram construídos gradativamente com o passar dos anos.

Nessa linha de pensamento, Norberto Bobbio ressalta que:

Os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizados por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas. 14

Nesse sentido, Fábio Konder Comparato afirma que tais direitos foram reconhecidos e positivados apenas por meio da evolução histórica, ou seja, não surgiram todos de uma única vez, mas foram sendo descobertos e declarados conforme as transformações da civilização, sendo a luta pela limitação do poder político um dos principais fatores para o acolhimento destes direitos. 15

Ainda nas palavras do autor:

A primeira manifestação de limitação do poder político deu-se no século X a.C. quando se instituiu o reino de Israel, tendo por Rei Davi, que se proclamava um delegado de Deus, responsável pela aplicação da lei divina e não como faziam os monarcas de sua \época proclamando-se ora como o

12 SCAFF, Facury Fernando (org). Constitucionalismo, Tributação e Direitos Humanos. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 51.

13 Ibidem, p. 51-52.

14 BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p. 5.

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próprio deus ora como um legislador que poderia dizer o que é justo e o que é injusto. 16

Marcus Vinicius Ribeiro, tratando dos Direitos Humanos nas fases da história, destaca que, na antiguidade clássica, esses direitos começaram a ser reconhecidos e colocados em posição de destaque. Foram considerados fundamentais ao indivíduo em face do Estado e de seus agentes. Ao contrário, os pensadores gregos acreditavam que a personalidade humana somente podia se desenvolver se estivesse integrada e subordinada ao Poder Público. Aristóteles, por sua vez, entendia que o homem deveria viver em função do Estado. 17

Na antiguidade greco-romana, alguns filósofos se notabilizaram por reconhecer a existência de Direitos Humanos, nesse sentido Marcus Vinicius Ribeiro menciona que18:

No período clássico da cultura grega, filósofos como Platão e Aristóteles foram importantes para a primeira percepção da existência dos Direitos Humanos. Na Grécia Antiga, já havia ideias de cidadania, mas não se percebia a noção de ser individual, pois não se indagou, concretamente, sobre a existência de direitos fundamentais do indivíduo em face do Estado e de seus agentes.

Nessa esteira, Flademir Jerônimo Belinati Martins afirma que a Grécia Antiga também lançou bases para o reconhecimento dos Direitos Humanos, sendo que sua primeira colaboração foi no sentido de colocar a pessoa humana como centro da questão filosófica, ou seja, passou-se de uma explicação mitológica da realidade para uma explicação antropocentrista. 19

Ainda nesse período, surge na Grécia a ideia de que os direitos naturais são superiores aos direitos positivados, e, nesse sentido, Celso Lafer indica que tal superioridade é apresentada pela distinção entre a lei particular e a lei comum, sendo que essa distinção já era feita por Aristóteles na peça Antígona onde se invoca leis imutáveis contra a lei particular que impedia o enterro de seu irmão. 20

Na antiguidade clássica, existiu em Roma o ius gentium, tido como um

16 COMPARATO, Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 40.

17 RIBEIRO, Marcus Vinicius. Direitos Humanos e Fundamentais. 2. ed. Campinas: Russell Editores, 2009. p. 80.

18 Ibidem, p. 29.

19 MARTINS, Flademir Jerônimo Belinati. Dignidade da Pessoa Humana: Princípio Constitucional Fundamental. Curitiba: Juruá Editora, 2003, p.21.

(24)

conjunto de normas que eram aplicadas aos estrangeiros. Essas normas, ainda que de hierarquia inferior, reconheciam alguns direitos que eram destinados aos estrangeiros. Havia ainda, nessa época, a possibilidade de o povo participar dos assuntos que envolviam a cidade e isso acabava por limitar o exercício do poder político do Estado.

Sidney Guerra, ao traçar a evolução histórica dos direitos fundamentais, menciona que outro marco importante e que se destaca nesse período é a Lei das XII Tábuas, que pode ser considerada a origem dos textos escritos consagradores da liberdade, da propriedade e da proteção dos direitos do cidadão.21

Outro fator que influenciou o reconhecimento dos Direitos Humanos foi o surgimento do cristianismo, o qual limitou o poder político, ao apresentar a distinção entre o que é de “Cesar” e o que é de “Deus”.

Menciona José Horácio Meyrelles Teixeira, que se pode afirmar ter sido o cristianismo, não só do ponto de vista político, como no campo geral das valorações, importante por ter fundado a dignidade do homem como ser individual, racional e livre, criatura de Deus, chamada a uma vida sobrenatural e imortal. 22

Nesse sentido, Jorge Miranda afirma que:

É com o cristianismo que todos os seres humanos, só pôr o serem e sem acepção de condições, são considerados pessoas dotadas de um eminente valor. Criados a imagem e semelhança de Deus, todos os homens e mulheres são chamados à salvação através de Jesus, que, por eles, verteu seu sangue. Criados à imagem e semelhança de Deus, todos têm uma liberdade irrenunciável que nenhuma sujeição política ou social pode destruir. 23

Apesar de a antiguidade clássica ter contribuído com o reconhecimento de vários direitos inerentes à pessoa humana, nessa época, foram violados importantes direitos fundamentais, como por exemplo, diferenciação de sexo, classe social e ainda havia escravidão, o que retirou muito do mérito dessa época.

A idade medieval, por sua vez, é marcada pela descentralização política, ou seja, nesse período a sociedade era dividida em três estamentos: clero, nobreza e o povo; sendo que o clero tinha as tarefas relativas à oração e propagação, os

21 GUERRA, Sidney. Direitos Humanos na Ordem Jurídica Internacional e Reflexos na Ordem

Constitucional Brasileira. Rio de janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 114.

22 TEIXEIRA, José Horácio Meirelles. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991. p. 206.

(25)

senhores feudais (nobreza) eram responsáveis por vigiar e proteger e o povo tinha o dever de trabalhar para sustentar a sociedade.

Manoel Gonçalves Ferreira Filho menciona que na segunda metade da Idade Média começou-se a difundir documentos escritos reconhecendo direitos a determinados estamentos e as comunidades, porém nunca a todas as pessoas. 24

Um dos documentos importantes que surgiu nesse período foi a Magna Carta do Rei João sem Terra, tida por alguns doutrinadores do Direito, como a origem do Direito Tributário, por abrigar o princípio da legalidade na expressão “não há taxação sem representação”.

Fábio Konder Comparato leciona que a Magna Carta outorgada pelo Rei João Sem-Terra no século XII, foi devido as pressões exercidas pelos barões ingleses, tendo em vista que o Rei aumentava as exações fiscais para financiar campanhas bélicas. Tal documento reconheceu vários direitos fundamentais, tais como a liberdade eclesial, direito à propriedade privada, a liberdade de locomoção, a criação dos impostos deveria ocorrer com anuência dos contribuintes, a desvinculação da lei e da jurisdição da pessoa do monarca. 25

No campo religioso destaca-se São Tomás de Aquino que defendia que o ser humano era dotado de igualdade e de dignidade, tendo em vista ter sido criado à imagem e semelhança de Deus.

Após essa fase, da Idade Média, o velho continente vivenciou uma “crise de consciência”, nascendo, assim, um grande sentimento de liberdade.

Explicando essa fase da história, Alexandre de Moraes afirma que:

Durante a Idade Média, apesar da organização feudal e da rígida separação de classes, com a consequente relação de subordinação entre o suserano e os vassalos, diversos documentos jurídicos reconheciam a existência de Direitos Humanos, sempre com o mesmo traço básico: limitação do poder estatal. O forte desenvolvimento das declarações de Direitos Humanos fundamentais deu-se, porém, a partir do terceiro quadro do século XVII até meados do século XX. 26

Nesse contexto, Sidney Guerra argumenta que o campo estava preparado para o surgimento da Reforma, cujo princípio fundamental foi a liberdade de

24 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos Humanos Fundamentais. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 11.

25 COMPARATO, Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 71, 72- 79 e 80.

(26)

consciência, de Rousseau, do enciclopedismo e da Revolução Francesa. 27

Diante desse sentimento de liberdade da sociedade, surgem declarações como a Petição de Direitos de 1629, a Lei de Habeas Corpus de 1679 e ainda o Bill of Rights de 1689.

Explicando, esses documentos, Sidney Guerra menciona que:

A petição de direitos de 1629 surge por meio da reunião do Parlamento, ratificando as liberdades consagradas em 1215 na Magna Carta; previa que nenhum homem livre ficasse sob a prisão ou detido ilegalmente; ninguém seria chamado a responder ou prestar juramento, ou a executar algum serviço, ou encarcerado, ou de qualquer forma molestado ou inquietado, por causa de tributos ou da recusa em pagá-los.

O habeas Corpus Act de 1697 estabelecia que, por meio de reclamações ou requerimento escrito de algum indivíduo ou a favor de algum indivíduo detido ou acusado de prática de um crime, o lorde-chanceler ou, em tempo de férias, algum juiz dos tribunais superiores poderia conceder o habeas Corpus consolidando a ideia de que esta garantia judicial criada para proteger a liberdade de locomoção seria a matriz de todas as outras garantias criadas posteriormente para a garantia dos Direitos Humanos. O Bill of Rights garantia a liberdade pessoal, a propriedade privada, a segurança pessoal, o direito de petição, a proibição de penas cruéis, dentre outras, estabelecendo uma nova forma de organização do Estado cuja função precípua é a de proteção dos direitos da pessoa humana. 28

Outro documento bastante importante que surgiu em 1776 foi a Declaração de Independência Norte-Americana tida como o primeiro documento a prever os princípios democráticos na história da política moderna. Nessa linha de pensamento, Fábio Konder Comparato afirma que os governos são instituições entre os homens para garantir seus direitos naturais, de tal forma que seus poderes legítimos derivam do consentimento dos governantes, e toda vez que alguma forma de Governo torna-se destrutiva é direito do povo alterá-la ou aboli-la, e instituir uma nova Forma de Governo. 29

Essa declaração tem sua importância na evolução dos Direitos Humanos, por ser o primeiro documento político a reconhecer a soberania popular e por reconhecer a existência de direitos que são aplicados a todos, indistintamente de cor, raça, sexo ou qualquer outra forma de manifestação social.

Merece destaque, também, a Declaração de Direitos da Virgínia, tendo em vista que, em seu texto, previa, além dos direitos à propriedade, à liberdade e à vida,

27 GUERRA, Sidney. Direitos Humanos na Ordem Jurídica Internacional e Reflexos na Ordem

Constitucional Brasileira. Rio de janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 141. 28 Ibidem, p.144-145.

(27)

outros direitos fundamentos como o de liberdade de imprensa e religião, princípio do juiz natural e o due process of law.

Posteriormente, surge a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, que põe fim ao antigo regime, sendo tido como o primeiro elemento constitucional da nova fase política.

Ainda nessa época eclode a Revolução Francesa, que foi muito importante na afirmação dos Direitos Humanos onde nas palavras de Fábio Konder Comparato desencadeou a supressão das desigualdades entre indivíduos e grupos sociais, até então nunca experimentado pela humanidade. Na tríade: liberdade, igualdade e fraternidade, sem dúvida a igualdade representou o ponto central do movimento revolucionário. A liberdade, para os homens de 1789, versava justamente no cerceamento de todas as peias sociais ligadas à existência de estamentos ou corporações de ofícios. E a fraternidade, como virtude cívica, seria o resultado necessário da abolição de todos os privilégios. 30

A partir da instituição das declarações acima citadas, essas passaram a ser integradas aos textos constitucionais, no primeiro momento como preâmbulo, e, algumas vezes, em capítulo autônomo.

Usando-se do magistério de Sidney Guerra, quem menciona que as declarações de direitos têm força na medida em que os textos constitucionais erigem seus ditames como princípios informadores e de validade de toda ordem jurídica nacional, valem na proporção em que esta mesma ordem jurídica está preparada para torná-las efetivas. 31

Conforme destaca Norberto Bobbio, na base das Constituições Democráticas modernas estão o reconhecimento e a proteção dos Direitos Humanos como principais indicadores do progresso histórico.32

Assim, se hoje há a presença dos direitos fundamentais no ordenamento jurídico, isso decorre do longo caminho percorrido, destacando-se que cada fase da história apresenta sua importância, por evidenciar o surgimento de um novo Direito Humano.

Passamos agora, a discorrer, ainda que de forma breve, sobre as dimensões ou, como alguns doutrinadores preferem, gerações dos Direitos Humanos.

30 Idem, p. 75.

31 GUERRA, Sidney. Direitos Humanos na Ordem Jurídica Internacional e Reflexos na Ordem

(28)

Os Direitos Humanos não sugiram todos de uma única vez, eles foram surgindo gradativamente com a evolução da sociedade, controlados por fatores sociais, políticos e econômicos.

A doutrina constitucionalista classifica os direitos fundamentais em três “dimensões”. Entretanto, alguns constitucionalistas apontam direitos de quarta e quinta dimensão. Contudo, essa classificação é doutrinária, logo, não há um reconhecimento constitucional da existência dessas dimensões de direitos e, por isso, trataremos dessa questão de forma perfunctória.

Segundo Marcos Aurélio Pereira Valadão33:

Os doutrinadores costumam distinguir fases de evolução do reconhecimento dos Direitos Humanos, tidos como de primeira, segunda, terceira e quarta geração. Correspondem aos direitos de primeira geração os direitos da liberdade, que são os direitos civis e políticos; aos direitos de segunda geração os direitos sociais, culturais e econômicos, o direito à igualdade social, bem assim os direitos coletivos ou de coletividade e às prestações do Estado relacionados aos diretos da fraternidade; aos direitos de terceira geração os ligados à solidariedade, seriam o direito ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente e à comunicação, e aos de quarta geração o direito à democracia, a informação e ao pluralismo.

Os direitos de primeira dimensão são os direitos civis e políticos, que têm por finalidade a proteção à liberdade, segurança, integridade física, à vida, etc., que exigem do Estado uma abstração, uma obrigação de não fazer.

No magistério de Carlos Henrique Bezerra Leite o surgimento dos direitos de primeira dimensão se deu com as revoluções burguesas do século XVII e XVII, e teve inspiração no iluminismo racionalista. Tais direitos também são chamados de direitos individuais, direitos de liberdade ou de direitos subjetivos e têm destinatários cada indivíduo isoladamente.34

Em comento aos Direitos Humanos, mais especificamente os direitos de primeira geração, Paulo Bonavides assevera que:

Os direitos de primeira geração são os direitos de liberdade lato sensu, sendo os primeiros a constarem dos textos normativos constitucionais, a saber, dos direitos civis e políticos, que em grande parte correspondem, sob o ponto de vista histórico, àquela fase inaugural do constitucionalismo ocidental; são direitos que têm por titular o indivíduo, sendo, portanto, oponível ao Estado (são direitos de resistência ou de oposição perante o Estado). 35

33 VALADÃO, Marcos Aurélio Pereira. Direitos humanos e tributação uma concepção integradora.

Revista Direito em Ação, Brasília, v. 2, n. 1, p. 239, set. 2001.

(29)

No segundo momento, aparecem os direitos de segunda dimensão, que são os direitos econômicos, sociais e culturais, que complementam os direitos de primeira dimensão.

Antônio Carlos Wolkmer menciona que os Direitos Humanos de segunda dimensão são pautados nos princípios da igualdade e com prestações positivas por parte do Estado, que deve garantir aos indivíduos melhores qualidades de vida.36

Nesse contexto, argumenta Valerio de Oliveira Mazzuoli que os direitos de segunda geração, nasceram no século XX e compõem-se dos direitos de igualdade, dos direitos econômicos, sociais, culturais, que foram introduzidos no constitucionalismo do Estado social. Tais direitos foram inseridos nos chamados direitos programáticos, tendo em vista que não necessitam para a sua concretização aquelas garantias habitualmente fornecidas pelos instrumentos processuais de proteção aos direitos de liberdade. 37

Surgiram, então os direitos de terceira dimensão, que são aqueles ligados ao desenvolvimento, paz, meio ambiente, comunicação e patrimônio comum da humanidade, são os direitos metaindividuais e transindividuais.

Paulo Bonavides ressalta que tais direitos também são chamados de direitos de fraternidade ou de solenidade e surgiram com a conscientização de que o mundo é dividido em nações desenvolvidas e nas subdesenvolvidas ou nas em vias de desenvolvimento. E nessa dimensão de direitos se inserem à paz, o meio ambiente, à comunicação e o patrimônio comum da humanidade.38

Atualmente há uma corrente doutrinária, a exemplo de Ingo Wolfgang Sarlet e Alexandre de Moraes, que crítica a classificação dos direitos fundamentais em gerações, pois esse termo levaria a entender que cada geração dos direitos fundamentais eliminaria a antecedente, e não é isso que ocorre. Porém, tal crítica reside apenas na terminologia empregada, uma vez que as expressões “dimensões” e “gerações”, relacionam aos direitos fundamentais já constitucionalizados.

36 WOLKMER, Antônio Carlos. Introdução aos fundamentos de uma teoria geral dos “novos” direitos. In: LEITE, José Rubens Morato; WOLKMER, Antonio Carlos (Coord). Os novos direitos no Brasil: natureza e perspectivas: uma visão básica das novas conflituosidades jurídicas. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 52.

(30)

1.3 PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS NO ÂMBITO INTERNACIONAL

Uma das características dos direitos humanos é a historicidade, tendo em vista que estes não apareceram todos simultaneamente, eles passaram por um longo processo de construção, até serem consolidados como se encontram nos dias atuais.

Nesse sentido, menciona Flávia Piovesan que os direitos humanos são fruto de um espaço simbólico de luta e ação social, na busca por dignidade humana, o que compõe um construído axiológico emancipatório. 39

No mesmo sentido são as lições de Noberto Bobbio, ao afirmar que os Direitos Humanos nascem como direitos naturais universais, desenvolvem-se como direitos positivos particulares (quando cada Constituição incorpora Declarações de direitos) para finalmente encontrar a plena realização como direitos positivos universais.40

Os Direitos Humanos no campo internacional têm seus precedentes históricos no Direito Humanitário, na Liga das Nações e na Organização Internacional do Trabalho.

Para que os Direitos Humanos tivessem proteção no âmbito internacional foi indispensável redefinir o alcance e ainda o âmbito da definição de soberania estatal, pois só assim, se conseguiria permitir que tais direitos fossem incorporados como legítimo interesse nacional. Além disso, foi importante redefinir qual status o indivíduo ocuparia no cenário internacional, para que, assim, se tornasse verdadeiro sujeito de proteção do Direito Internacional.

Como mencionado, um dos precedentes históricos de proteção internacional dos Direitos Humanos, foi o Direito Humanitário que, nas palavras de Flávia Piovesan, é o direito que se aplicava na hipótese de guerra, que apresentava por objetivo fixar limites à atuação do Estado e garantir a observância dos Direitos Humanos. Esse direito tinha por destinatário os militares postos fora de combate. Referido direito atribuía regulamentação jurídica contra o emprego de violência no âmbito internacional. 41

39 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e direito constitucional internacional. São Paulo: Saraiva. 2010. p. 105.

40 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992. p. 46.

41 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e direito constitucional internacional. São Paulo:

(31)

O Direito Humanitário é tido como a primeira expressão de que os Direitos Humanos, mais especificamente o direito de liberdade e a autonomia dos Estados, nos casos de conflito armado, encontra seus limites no plano internacional.

Ao discorrer sobre o Direito Internacional dos Direitos Humanos, Valerio de Oliveira Mazzuoli explica que os direitos humanitários, após os horrores cometidos durante a Segunda Guerra Mundial, são aqueles aplicáveis no caso de conflitos armados, cuja função é estabelecer limites à atuação do Estado, com intuito de assegurar a observância e o cumprimento dos Direitos Humanos; sua aplicação não está adstrita aos conflitos internacionais, podendo perfeitamente dar-se em caso de conflitos armados internos. 42

Nessa linha de pensamento, Christophe Swinarski menciona que:

O direito humanitário se consubstancia no conjunto de normas internacionais, de origem convencional ou consuetudinária, especificamente destinado a ser aplicado nos conflitos armados, internacionais ou não internacionais, e que limita, por razões humanitárias, o direito das partes em conflito de escolher livremente os métodos e os meios utilizados na guerra, ou que protege as pessoas e os bens afetados, ou que possam ser afetados pelo conflito.43

Em síntese, os Direitos Humanitários apresentam sua importância na proteção internacional dos Direitos Humanos por protegerem não apenas os indivíduos nos conflitos armados no campo internacional, mas também nos conflitos instaurados em âmbito interno.

Segundo precedente na proteção dos Direitos Humanos no plano internacional, foi a Liga das Nações, que tinha por objetivo promover a paz e a segurança internacional e ainda a cooperação entre os países.

A Convenção da Liga das Nações, de 1920 apresentava previsões genéticas relativas aos Direitos Humanos, destacando-se nessa época as voltas ao mondate system of the league, aos sistemas das minorias e aos parâmetros internacionais do direito do trabalho, em que os Estados empenhavam-se em assegurar melhores condições de trabalho para homens, mulheres e crianças. Tais previsões representavam um limite à concepção de soberania estatal absoluta, tendo em vista que referida Convenção previa sanções econômicas e militares que seriam impostas

42 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direitos Humanos. São Paulo: Método, 2014. p. 58. 43 SWINARSKI, Christophe. Introdução ao direito internacional humanitário. Brasília: Escopo,

(32)

aos Estados que violassem suas obrigações. 44

No entanto, a Liga das Nações não obteve o êxito pretendido e, com a eclosão da Segunda Guerra Mundial, ela formalmente desapareceu em 31 de julho de 1947.

Ante aos anseios dos movimentos dos trabalhadores pela criação de uma organização que fosse responsável por estabelecer mecanismos de proteção a eles, surge a Organização Internacional do Trabalho.

Os apelos para que fossem instituídas normas destinadas à proteção dos trabalhadores já vinham desde a Revolução Industrial, tendo em vista as condições sub-humanas nas atividades laborativas exercidas por estes.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT), surgiu em 1919 e tinha por finalidade promover a universalização dos princípios da justiça social, especialmente daqueles consagrados pelo Tratado de Versalhes, como fundamentais ao Direito do Trabalho e da Previdência Social.45

Nesse sentido destaca Flavia Piovesan que o objetivo da Organização Internacional do Trabalho era de promover padrões internacionais que estabelecem melhores condições de trabalho e bem-estar, e que sessenta anos após a sua criação, já havia promulgado mais de cem convenções internacionais, comprometendo-se a assegurar um padrão justo e digno nas condições de trabalho. 46

Em arremate a esses três precedentes históricos dos Direitos Humanos, no âmbito internacional, Flávia Piovesan conclui que o Direito Humanitário, a Liga das Nações e a Organização Internacional do Trabalho, contribuíram para o processo de internacionalização dos Direitos Humanos, seja ao assegurar parâmetros globais mínimos para as condições de trabalho no plano mundial, seja ao fixar como objetivos internacionais a manutenção da paz e segurança internacional, seja ao proteger direitos fundamentais em situações de beligerância, e que tais institutos apresentam por ponto comum a finalidade de protegerem os Direitos Humanos no

44 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e direito constitucional internacional. São Paulo: Saraiva. 2010. p. 48.

45 GUERRA, Sidney. Direitos Humanos na Ordem Jurídica Internacional e Reflexos na Ordem

Constitucional Brasileira. Rio de janeiro: Lumen Juris, 2008.

(33)

âmbito internacional. 47

Vale a pena, ainda, mencionar que a estrutura normativa do sistema que prevê a proteção dos Direitos Humanos, nos dias atuais, são os mecanismos de caráter global, que é o Sistema das Nações Unidas e o de caráter regional pertencente aos sistemas regionais europeu, africano e o interamericano.

1.4 HISTÓRICO DA TRIBUTAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS

No Brasil, o tributo é arrecadado através do tempo pelo Estado ou pelo monarca, com intuito de atender aos gastos públicos e às despesas da corroa. O tributo abrangeu o pagamento em dinheiro ou bens, exigidos perante os vencidos de guerra e dos próprios súditos, utilizando o termo de donativos, ajudas, contribuições ao soberano, tanto como dever ou obrigação. Já no Estado de Direito, os tributos organizaram-se como relação jurídica, sendo sua imposição previamente definida nos termos da lei.

Dessa forma, traçar-se-á um histórico das Constituições brasileiras, considerando a evolução tributária, demonstrando que tais Constituições, desde a época do Império, foram cada vez mais povoadas pelas limitações ao poder de tributar, evidenciando que a atual Constituição Federal de 1988 é a que mais traz normas da interferência do Estado no domínio econômico, assim limitando a intervenção via tributação.

Explicando como funcionava a tributação na Constituição imperial de 1824, primeira Constituição Brasileira, Sacha Calmon Navarro Coêlho assevera que nas Constituições republicanas o princípio da legalidade jamais foi contestado, e no período colonial, as tributações geralmente eram referendadas, por períodos estabelecidos, pelo Senado das Câmaras, que nessa época representava os contribuintes eleitos para a vereança municipal. Embora a Constituição de 1824 não mencionasse expressamente à lei, firmava que a competência legislativa tributária deveria respeitar os princípios da legalidade e da anualidade, como previsto nos artigos 171 e 172.48

Nesse mesmo sentido, é o entendimento de Marcos Aurélio Pereira Valadão

47 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e direito constitucional internacional. São Paulo: Saraiva. 2010. p. 61.

(34)

que evidencia:

Até a Constituição imperial, de 1824, nos tempos do Brasil colônia, a tributação obedecia às cartas régias e as exações eram instituídas de acordo com a necessidade de caixa da corroa, sendo o Brasil daquela época submetido a um sistema fiscal feudal constituído de impostos comuns e extraordinários chamados “direitos privados do rei”.

[...]

Como se tratava de um Estado unitário, a discriminação das rendas tributárias era despicienda na Constituição, vez que era centralizado o poder impositivo. Contudo, o Ato Adicional de 1834, que alterou a Carta de 1824, outorgou às Assembleias Provinciais (recentemente criadas) competência para legislarem sobre decretação e arrecadação de tributos, desde que não prejudicassem as imposições gerais, e determinando, também, que as ditas assembleias tratassem das repartições dessas receitas com os Municípios – forte traço da descentralização que estava em curso e motivado, também pela tradicional autonomia de nossas “comunas”. O mencionado Ato Adicional restringiu a competência tributária das províncias, que antes era concorrente com o Governo Central, embora subsistisse a bitributação em alguns casos. 49

Alessandro Mendes Cardoso explique que:

No campo fiscal, a Independência não produziu mudanças imediatas, tendo sido mantida, basicamente, a estrutura vigente no período colonial. Apesar da previsão no artigo 179, item 15, da Constituição de 1824 de que “ninguém será isento de contribuir para a despesa do Estado em proporção dos seus haveres”, o princípio da capacidade contributiva, na forma como era entendido na época, não saiu da previsão formal, já que não havia na estrutura socioeconômica brasileira as condições para a sua efetiva aplicação. 50

O texto constitucional de 1824 foi o de maior longevidade em nossa história, sendo ainda, uma Constituição que poderia ser classificada de nominativa, tendo em vista que as práticas constitucionais adotadas na época não correspondiam com as previstas em seu texto, ou seja, essa Carta trazia o direito de liberdade quando, nessa época, vigorava a escravidão.

Nesse diapasão, impende destacar a tendência descentralizadora da Constituição de 1891, que como consequência do reino unitário para república, repartiu competências tributárias apenas entre à União e os Estados, deixando os Municípios de fora de tal competência impositiva. Ainda, com tendências descentralizadora conferiu mais competências tributárias ao Estado que à união.51

49 VALADÃO, Marcos Aurélio Pereira. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar e

Tratados Internacionais. Belo Horizonte: Del Rey, 2000.

50 CARDOSO, Alessandro Mendes Cardoso. O Dever Fundamental de Recolher Tributos: no Estado Democrático de Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014. p. 96.

51 VALADÃO, Marcos Aurélio Pereira. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar e

(35)

Seguindo essa mesma linha de pensamento Alessandro Mendes Cardoso aduz que a Constituição de 1891 não atribuiu competência aos Municípios, porém à União e aos Estados conferiu-lhes repartição de competência tributária, com base em um sistema de rendas. À União foi conferida a competência para instituir os seguintes tributos: impostos sobre importação, direitos de entrada, saída e estadia de navios e as taxas de selo, correios e telégrafos federais, além da competência residual. Aos Estados, por sua vez, foi conferido competência tributária para criar os impostos de exportação de produtos de sua produção, sobre imóveis urbanos e rurais, sobre indústrias e profissões, transmissão de propriedades, além da taxa de selos, referentes a atos de seu governo e negócios de sua economia, e como não foi atribuído competência aos Municípios, os Estados deveriam elaborar leis que dispusessem sobre a sua organização.52

Em que pese haver essa repartição de competência, o único ente que podia instituir novos impostos por intermédio da competência residual era a União, que deveria obedecer a certos requisitos para este feito.

Desde a época do Império, foram criadas normas que vedavam as províncias de tributar os produtos que circulavam em suas fronteiras. A Constituição de 1981 atribuía ao Poder Central o imposto sobre as importações e aos Estados o de exportação. No entanto, essa distribuição de competências tributária causava uma certa disparidade entre a arrecadação dos Estados mais desenvolvidos e os menos desenvolvidos, o que ocasionava uma situação de instabilidade do sistema fiscal e acirrava, ainda mais, as disputas políticas.

Ao explicar essa situação vivenciada pelos Estados durante essa época, Ivone Rotta Pereira afirma que:

Como forma de compensar a escassez de recursos decorrentes dessa política fiscal diferenciada da realidade, alguns Estados se fizeram de desentendidos e passaram a tributar mercadorias que vinham de qualquer outra região, caracterizando uma importação interna, embora adotassem as mais diversas denominações para esse tributo: taxa de trânsito, imposto de consumo, taxa de estatística, de desembarque, etc. Ou, então, cobravam imposto sobre o “giro de capital” das empresas importadoras de bens estrangeiros, o que vinha a ser um imposto de importação disfarçado, concorrendo como o federal e contrariando novamente dispositivo legal. Havia ainda quem tributasse com alíquotas mais elevadas as mercadorias

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