O que será tratado
nesta aula
Nesta aula, vamos abordar o conceito de “ação” a
partir das quatro causas de Aristóteles, com base em um texto de Mário Ferreira dos Santos.
Presença e
neutralidade
Estar presente é estar “diante de”.
A presença não é uma substância, é uma situação. Um conceito teatral que nos ajuda a compreender isso é a neutralidade. O ator tem de ser capaz de ficar neutro, ou seja, não estar expressando algo. Alguns entendem a neutralidade
equivocadamente, como anular-se. Mas estar neutro é estar presente no espaço diante de alguém, pronto para agir.
A percepção do homem
contemporâneo
Somos cartesianos, no sentido de
pensarmos que o “eu” é uma espécie de universo fechado que se relaciona com o cosmos fora de si, mas não acontece desse modo. Em uma sala com várias pessoas, por exemplo, o ar não passa pelos pulmões de um só indivíduo, mas de todos os outros.
Também imaginamos o Universo conforme a descrição da Física newtoniana.
Pensamos em estrelas, a Terra girando em torno do Sol, o sistema planetário, ou seja, em forças materiais, mas não incluímos pessoas. Em geral, a pessoa sequer
inclui a si mesma, ou seja, pensa em um Universo onde não há “eu”. É verdade que o Universo existiria se não houvesse um
indivíduo específico, mas isso é apenas uma possibilidade. A realidade inclui o sujeito
que está pensando. As pessoas também não imaginam anjos, quando pensam no Universo. Até porque os anjos não
têm corpo, e não podemos imaginar algo imaterial.
Imaginar, por definição, é produzir uma imagem. Ou seja, algo que passou pelos
sentidos e está na memória, na imaginação.
Ao falar dos anjos, pensamos em uma
representação (barroca, por exemplo). Do mesmo modo, é impossível imaginar o amor, pois é imaterial; podemos somente usar símbolos. É importante abordar
o simbolismo, pois todo o universo é simbólico.
Forma e imagem
A aula anterior mostrou que tudo é composto de forma e matéria. O
aspecto formal, a ideia de algo, também é um símbolo. Forma e ideia são a mesma coisa, são um princípio estrutural. Mas há distinção entre ideia e imagem, que representa um objeto específico.
A ideia é imaterial. A ideia de triângulo, por exemplo, é um gênero que compreende
espécies dentro de si (triângulo isósceles, equilátero, etc). Portanto, não se pode
desenhar a ideia de triângulo em geral, somente de cada uma das suas espécies.
Ao mesmo tempo, se alguém pensa em um triângulo, não pensa só na ideia abstrata,
mas produz a imagem de um triângulo específico porque, como disse Aristóteles, pensamos por imagens.
Uma pessoa que vive no campo ou em uma cidade com menos artifícios
mecânicos, eletrônicos, tem mais facilidade para não ficar no mundo puramente
abstrato do discurso, porque está mais
próxima da realidade. O mundo urbano, por outro lado, coloca as pessoas em perspectiva horizontal, faz com que se esqueçam da
transcendência, das relações verticais.
As pessoas não olham mais para o céu, não conhecem as constelações, o que acarreta
Observação do céu como exercício de presença
uma falta de consciência, pois se reduz o Universo àquilo que está ao alcance. Isso é normal em certo sentido, porém, não
podemos nos esquecer completamente de que estamos cercados por um Universo
imensurável.
Este também é um problema da imaginação.
Como a trabalhamos pouco, ela acaba se tornando abstrata quando, na verdade, é corporal. Uma pessoa que está com fome se orienta pela imaginação para buscar a comida na geladeira, por exemplo. A imaginação recorta, amplia ou diminui
determinada zona do espaço. Alguns atores não se situam no palco sem uma marca
no chão, o que é uma falta de orientação
radical, uma desconexão entre a consciência e a realidade psicofísica.
Observar o céu (especialmente o céu
permanece e que muda, respectivamente.
Há também a analogia de que a inteligência é o Sol e a Lua, a razão, pois os raciocínios são uma espécie de movimento, enquanto que a inteligência capta o que é imutável.
Além da permanência e imutabilidade, a
observação do céu carrega a ideia de infinito, pois é um símbolo. Porém, o céu não nos
lembra somente do tamanho do Universo, mas de nosso próprio tamanho, da relação em que estamos inseridos no mundo que nos garante presença.
A presença depende de uma espécie de enraizamento no mundo concreto, no solo. Quem entende a neutralidade como esvaziar-se não está presente de fato, pois estar presente é agir diante de alguém. A desconexão com a realidade é uma das
causas da falta de consciência corporal.
Tendemos a ficar na mente abstrata,
raciocinante. Daí a necessidade de lembrar- se do mundo concreto, pois quem está em relação com o cosmos é o indivíduo como um todo.