• Nenhum resultado encontrado

Caracterização molecular de cepas de Vibrio cholerae O26, isoladas de processos entéricos humanos no nordeste do Brasil

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Caracterização molecular de cepas de Vibrio cholerae O26, isoladas de processos entéricos humanos no nordeste do Brasil"

Copied!
92
0
0

Texto

(1)Programa de Pós-Graduação em Genética Universidade Federal de Pernambuco Centro de Ciências Biológicas Departamento de Genética. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio cholerae O26, Isoladas de Processos Entéricos Humanos no Nordeste do Brasil. Francisco André Marques de Oliveira Cariri. RECIFE – PE 2008.

(2) Francisco André Marques de Oliveira Cariri. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio cholerae O26, Isoladas de Processos Entéricos Humanos no Nordeste do Brasil. Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Genética da Universidade Federal de. Pernambuco,. como. parte. dos. requisitos. necessários para a obtenção do grau de Mestre em Genética. Orientador: Prof. Dr. Osvaldo Pompílio de Melo Neto, Depto. de Microbiologia, Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães, CPqAM – FIOCRUZ. Co-Orientadora: Profa. Dra. Nilma Cintra Leal, Depto. de Microbiologia, Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães, CPqAM – FIOCRUZ.. RECIFE – PE ABRIL, 2008.

(3) Cariri, Francisco André Marques de Oliveira Caracterização molecular de cepas de Vibrio cholerae O26, isoladas de processos entéricos humanos no nordeste do Brasil. / Francisco André Marques de Oliveira Cariri. – Recife: O Autor, 2008. 90 fls. .: il. Dissertação (Mestrado em Genética) – UFPE. CCB 1. Vibrio cholerae 2. Filologia 3. Cólera I.Título 575.86 576.88. CDU (2ª. Ed.) CDD (22ª. Ed.). UFPE CCB – 2008 –065.

(4) Universidade Federal de Pernambuco Programa de Pós-Graduação em Genética PARECER DA COMISSÃO EXAMINADORA DA DEFESA DE DISSERTAÇÃO DE MESTRADO DE FRANCISCO ANDRÉ MARQUES DE OLIVEIRA CARIRI. “Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio cholerae O26, Isoladas de Processos Entéricos Humanos no Nordeste do Brasil” Área de Concentração: BIOLOGIA MOLECULAR. RECIFE - PE 2008.

(5) DEDICATÓRIA. Aos meus pais, Abidias e Maria, que, que, acreditando no meu potencial, me prepararam para a vida. Eles são exemplos e estímulos estímulos para a longa e contínua caminhada; caminhada; E à Carol por todo carinho, apoio e compreensão, compreensão, aceitando terter-me pela metade durante a realização deste trabalho. trabalho..

(6) Sonhar, mais um sonho impossível, Lutar, quando é fácil ceder, Vencer, o inimigo invencível. Negar, quando uando a regra é vender... Voar, no limite improvável. Tocar o inacessível chão... E assim seja lá como for, Vai ter fim a infinita aflição E o mundo vai ver uma flor Brotar do do impossível chão. in: Sonho Impossível de Chico Buarque e Rui Guerra. artes,, isto é, um veículo “O processo criativo científico não é assim tão diferente do processo criativo das artes de autodescoberta que se manifesta ao tentarmos capturar a nossa essência e lugar no universo.” in: A Dança do Universo Marcelo Gleiser ... Hoje me sinto mais forte, mais feliz quem sabe Só levo a certeza de que muito pouco eu sei Ou nada sei Penso que cumprir a vida seja simplesmente Compreender a marcha e ir tocando em frente... ... Cada um de nós compõe a sua história Cada ser em si carrega o dom de ser capaz E ser feliz ... É preciso amor pra poder pulsar, É preciso paz pra poder sorrir, É preciso a chuva para florir in: Tocando em Frente Almir Sater e Renato Teixeira.

(7) AGRADECIMENTOS A Deus pela minha saúde, pela minha família, pelos meus amigos e por permitir que eu realize meus sonhos; Aos meus orientadores, Dr. Osvaldo Pompílio de Melo Neto e Dra. Nilma Cintra Leal, pela oportunidade, pela confiaça, pela paciência, pelo incentivo, pelos ensinamentos, pelos conselhos e, sobretudo, pela amizade. Por eles tenho a mais sincera admiração pelo brilhantismo acadêmico e um profundo respeito. Serei sempre grato pelas orientações científicas criteriosas e críticas que muito contribuíram para a minha formação. Às doutoras Alzira, Cris e Marise (mãe de Luise) pela consideração, pela amizade e pelos ensinamentos diários; Aos colegas de bancada (Alexandra Farias, Ana Paula Campos, Betânia, Bruna Caiado, Carlos Júnior, Érika Costa, Gerlane Souza, Maria Adelaide Barbosa, Maria Paloma Barros, Mirele Araújo, Patrícia Rosa, Rosanny Benevides e especialmente à Ana Paula Costa, Camylla Melo, Carina Mendes, Christian Reis - Negão, Danielle Moura - Danona, Éden Freire, Eduardo Nunes, Dr. Franklin Magalhães, Isabelle Luz, Dr. José Ronnie Vasconcelos, Larissa Nascimento, Mariana Andrade, Mariana Marques Pereira [companheira de disciplinas do mestrado], Mariana Palma, Marília Nascimento, Patrícia Toniolo, Rafaela Andrade, Rodrigo Lima, Tamara De' Carli Lima, Vladimir Silveira Filho, Wagner Oliveira e Wellington Silva) pelas experiências trocadas e por compartilharmos o dia-a-dia. Aos amigos do Departamente de Entomologia; À Dra. Cássia Docena pela ajuda com o seqüenciamento e pela constante troca de idéias; e ao Dr. Valdir Balbino pelas valiosas dicas de bioinformática; Aos funcionários do Departamento de Microbiologia (Bruna Lima, Cláudio Araújo, Edson Dantas, Fernanda Melo, Isaac Martins - Martináutico, José Dantas, Kátia Farias, Marcos Marques, Nélson Santos, Patrícia Silva, Tarcísio Oliveira, Rita Silva, Silvana Santos e Yara Nakazawa) pela ajuda substancial e pela paciência. À Bruna e Raimundo pelo suporte técnico fotográfico. Ao Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães – FIOCRUZ por ser minha segunda casa, durante esses nove anos, onde encontrei minha vocação e aprendi que vale a pena investir cada segundo naquilo que gostamos de fazer; Aos órgãos de fomento (CNPq, CAPES, FACEPE e FIOCRUZ), pela bolsa concedida e pelo apoio financeiro para realizar os nossos experimentos; Aos doutores Antonio Carlos e Valdir Balbino, membros da pré-banca, pelas sugestões dadas à esta dissertação; Aos amigos do CCB, em especial, Adri, Airton, Plínio, Pabyton e Wal; À minha família e à “Carolinda” pelo apoio incondicional, pelo incentivo e pelos conselhos, quando necessário; E a todos que não foram citados, mas que foram igualmente importantes nesta jornada..

(8) ÍNDICE TABELA.....................................................................................................................VIII LISTA DE FIGURAS................................................................................................... IX LISTA DE ABREVIATURAS.......................................................................................X RESUMO GERAL ....................................................................................................XIII ABSTRACT ............................................................................................................... XIV 1 – INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 15 2 – OBJETIVO GERAL .............................................................................................. 17 2.1 – OBJETIVOS ESPECÍFICOS............................................................................. 17 3 – REFERENCIAL TEÓRICO ................................................................................. 18 3.1 – CÓLERA............................................................................................................ 18 3.1.1 – SINTOMAS, TRANSMISSÃO E TRATAMENTO ................................ 18 3.1.2 – EPIDEMIOLOGIA DA CÓLERA............................................................ 19 3.1.3 – HISTÓRICO DA CÓLERA ...................................................................... 20 3.1.4 – DIAGNÓSTICO DA CÓLERA ................................................................ 23 3.2 – AGENTE ETIOLÓGICO................................................................................... 25 3.2.1 – ECOLOGIA DO Vibrio cholerae.............................................................. 25 3.2.1.1 – RESERVATÓRIO AMBIENTAL ...................................................... 26 3.2.1.2 – ESTADO VIÁVEL MAS NÃO CULTIVÁVEL................................ 27 3.2.2 - FATORES DE VIRULÊNCIA .................................................................. 29 3.2.2.1 – A VPI................................................................................................... 29 3.2.2.2 – O PROFAGO CTXφ............................................................................ 30 3.2.2.3 – OUTROS FATORES DE VIRULÊNCIA........................................... 32 3.2.3 – TAXONOMIA DO DOMÍNIO BACTÉRIA ............................................ 33 3.2.3.1 – FAMÍLIA VIBRIONACEAE ............................................................. 33 3.2.3.2 – GÊNERO Vibrio.................................................................................. 34 3.2.4 – ESPÉCIE Vibrio cholerae ......................................................................... 35 3.2.4.1 – CLASSIFICAÇÃO ANTIGÊNICA .................................................... 35 3.2.4.2 – Vibrio cholerae O1 .............................................................................. 37 3.2.4.3 – Vibrio cholerae O139 .......................................................................... 37.

(9) 3.2.4.4 – Vibrio cholerae NÃO-O1/ NÃO-O139 ............................................... 38 3.2.4.5 – Vibrio cholerae O26 ............................................................................ 38 3.2.5 – MÉTODOS MOLECULARES USADOS NA CLASSIFICAÇÃO BACTERIANA ......................................................................................... 39 3.2.6 – OS GENES DE rRNA COMO MARCADORES MOLECULARES....... 39 3.2.7 – REGIÃO ESPAÇADORA INTERGÊNICA DO rRNA 16S-23S ............ 41 4 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................. 44 5 – ARTIGO CIENTÍFICO A SER SUBMETIDO................................................... 56 RESUMO ................................................................................................................... 57 INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 58 MATERIAL E MÉTODOS ........................................................................................ 60 RESULTADOS .......................................................................................................... 63 DISCUSSÃO .............................................................................................................. 68 TABELAS .................................................................................................................. 71 FIGURAS ................................................................................................................... 72 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 79 6 – INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES........................................................... 83 7 – CONCLUSÕES....................................................................................................... 84 8 – ANEXO.................................................................................................................... 85.

(10) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio... VIII. TABELA. Página. Tabela 1 – Métodos moleculares usados para classificar Vibrio cholerae............................................................................................................................... 40.

(11) CARIRI, F.A.M.O.. IX. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... LISTA DE FIGURAS. Página Figura 1 – Paciente apresentando sinais típicos da forma grave da cólera ......................... 18 Figura 2 – Esquema evidenciando: A - A secreção da CT no lúmen intestinal; B - O aumento da concentração intracelular de cAMP; C - A secreção de sódio, cloro e água do meio intracelular para o lúmen ....................................................................................... 19 Figura 3 – Número de casos de cólera no Mundo e taxa de mortalidade, entre 1991 e 2006 ..................................................................................................................................... 21 Figura 4 – Distribuição da cólera no Brasil, entre 1990 e 1996, evidenciando a rota da epidemia ............................................................................................................................... 22 Figura 5 – Número de casos de cólera em Brasil e taxa de mortalidade, entre 1991 e 2006 …................................................................................................................................. 23 Figura 6 – Bacias hidrográficas do Estado de Pernmbuco – Brasil .................................... 23. Figura 7 – Esquema do método tradicional de diagnóstico ................................................ 24. Figura 8 – Esquema da Ilha de Patogenicidade evidenciando o conjunto de genes TCP, responsável pela expressão do fator de colonização, e demais genes envolvidos com a regulação .............................................................................................................................. 29 Figura 9 – A - Esquema representativo da cascata regulatória que controla a expressão da toxina colérica (CT), evidenciando a ativação do gene ctxA pelo ToxT e a síntese da CT. B - Região intergênica onde se encontra as sequências repetidas de heptanucleotídeos. C - Seqüências parciais de nucleotídeo a montante do gene ctxA das cepas 0395 (Vibrio cholerae O1 Clássico) e 10259 (V. cholerae não-O1/não-O139) ........ 30 Figura 10 – Esquema do profago CTXφ evidenciando a região central e a região RS2 ..... 31. Figura 11 – Fotomicrografia eletrônica evidenciando a morfologia do V. cholerae .......... 35 Figura 12 – Esquema da região intergênica do rDNA (rrn), evidenciando a região espaçadora intergênica (ISR) composta de genes de tRNA e regiões não codificadores .... 41.

(12) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... LISTA DE ABREVIATURAS µm. Micrômetro. °C. Grau Celsius. A. Adenina. AFLP. Amplified Fragment Length Polymorphism – Polimorfismo do Comprimento dos Fragmentos Amplificados. Ágar TCBS. Ágar Tiossulfato/Citrato/Bile. APA. Água Peptonada Alcalina. ARDRA. Amplified Ribosomal DNA Restriction Analysis – Análise de Restrição do DNA Ribossomal Amplificado. C. Citosina. cAMP. Cyclic Adenosine Monophosphate – Adenosina Monofosfato Cíclico. CT. Cholera Toxin – Toxina Colérica. DNA. Deoxyribonucleic Acid – Ácido Desoxirribonucléico. G. Guanina. gap. gene da gliceraldeído-3-fosfato desidrogenase. gyrB. gene da subunidade B da DNA Girase. HSP. Heat Shock Protein - Proteínas de Choque Térmico. ISR. Intergenic Spacer Regions – Região Espaçadora Intergênica. LPS. Lipopolissacarídeo. MLEE. Multilocus Enzyme Electrophoresis – Eletroforese de Enzima Multilocus. MLST. Multilocus Sequence Typing – Tipagem por Seqüenciamento de Multilocus. mM. Milimolar. NaCl. Cloreto de Sódio. NaHCO3. Bicarbonato de Sódio. X.

(13) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... NH4Cl. Cloreto de Amônio. ORF. Open reading frame – Região gênica codificadora. pb. Pares de Base. PBS. Phosphate Buffered Saline - Tampão Fosfato-Salino. PCR. Polymerase Chain Reaction – Reação em Cadeia da Polimerase. pH. Potencial hidrogeniônico. PVDF. Polyvinylidene Difluoride Membrane - Membranas de Polifluoreto de Vinilideno. RAPD. Random Amplified Polymorphic DNA – DNA Polimórfico Amplificado Aleatoriamente. rDNA. Ribosomal DNA – DNA Ribossomal. recA. gene da Recombinase A. REP. Repetitive Extragenic Palindromic – Palíndromos Repetitivos Extragênicos. RFLP. Restriction Fragment Length Polymorphism – Polimorfismo do Comprimento dos Fragmentos de Restrição. RNA. Ribonucleic Acid – Ácido Ribonucléico. rpoB. gene da subunidade beta da RNA polimerase. rrn. operon de RNA ribossomal. rRNA. Ribosomal RNA – RNA Ribossomal. RS. Repeats Sequences – Seqüências Repetidas. RTX. Repeat in toxin – Toxina em repetição. TCA. Trichloroacetic Acid - Ácido Tricloroacético. TCBS Agar. Thiosulfate Citrate Bile Salts Sucrose Agar – Agar Tiossulfato Citrato Bile Sacarose. TCP. Toxin-Coregulated Pilus – Pílus Corregulador de Toxina. tRNA. Transfer RNA – RNA Transportador. tRNAAla. tRNA que transporta o aminoácido Alanina. XI.

(14) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... tRNAGlu. tRNA que transporta o aminoácido Ácido glutâmico. tRNAIle. tRNA que transporta o aminoácido Isoleucina. tRNALys. tRNA que transporta o aminoácido Lisina. tRNAVal. tRNA que transporta o aminoácido Valina. U. Uracila. VNC. Viable but Nonculturable – Viável mas não Cultivável. VPI. Vibrio Pathogenicity Island – Ilha de Patogenicidade de Vibrio. VSP. Vibrio seventh pandemic island – Ilha de patogenicidade do Vibrio da sétima pandemia. XII.

(15) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio... XIII. RESUMO GERAL. A emergência do Vibrio cholerae sorogrupo O139 como um segundo agente etiológico da cólera serviu de alerta para o surgimento de outros clones epidêmicos que possam passar despercebidos pelos métodos tradicionais de diagnóstico da cólera, geralmente baseados no uso de antissoro contra o sorogrupo O1 tradicional. Em estudos prévios, a partir da análise de 179 cepas de V. cholerae não-O1/não-O139 isoladas de casos clínicos de cólera no Brasil, foram selecionadas sete cepas de V. cholerae O26, e outra cepa de sorogrupo não tipável (17155), que possuíam genes de virulência associados ao desenvolvimento desta enfermidade. Destas, duas cepas (4756 e 17155) possuíam o gene rfb, específico do sorogrupo O1, sugerindo serem genotipicamente deste sorogrupo, e também expressaram a toxina colérica (CT) em cultura. Este trabalho buscou uma análise genética mais detalhada destas oito cepas comparando a classificação sorológica com outros marcadores moleculares. Neste sentido foi realizada a amplificação, clonagem e seqüenciamento da região espaçadora ribossomal 16S-23S (ISR) de diferentes operons de V. cholerae. A partir da análise da seqüência de cinco grupos de operons distintos (de um total de 210 clones seqüenciados), foram construídas três árvores filogenéticas em que as cepas 4756 e 17155 ficaram agrupadas no mesmo clado com cepas O1 controle, e as demais cepas O26 foram agrupadas separadamente. Conclui-se, desta forma, que as cepas 4756 e 17155 são filogeneticamente do sorogrupo O1 e a diferença nos resultados de sorologia pode ser uma conseqüência de soroconversão provocada por mudanças em genes de biossíntese do antígeno O.. Palavras-chaves: Vibrio cholerae não-O1/ não-O139, conversão sorológica, região espaçadora intergênica rRNA16S-23S, sistemática molecular.

(16) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio... XIV. ABSTRACT. The emergence of the Vibrio cholerae O139 serogroup as a second ethiologic agent for cholera served as an alert to the rise of other epidemic strains that may pass unnoticed by traditional methods of diagnosis, usually based on the use of antiserum directed against the traditional O1 serogroup. In previous studies, out of 179 non-O1/ non-O139 V. cholerae strains isolated from clinical cases during the cholera outbreak in Brazil, seven strains classified as V. cholerae O26 and one strain defined as not-typable (17155) were selected which contained virulence genes associated with the development of this disease. Two strains (4756 and 17155) contained the gene rfbN specific to the O1 serogroup, suggesting that genotypically they belonged to this serogroup, and were also able to express the cholera toxin in culture. Here a more detailed genetic analysis of these eight strains was carried out comparing the serological classification with other molecular markers. In this respect the 16S-23S rRNA intergenic spacer regions (ISRs) from the various V. cholerae operons were amplified, cloned and sequenced from each strain. From the analysis of the sequence of five operons (totalizing 210 sequenced clones), three phylogenetic trees were built in which strains 4756 and 17155 always clustered with control O1 strains, whilst the remaining O26 strains clustered separately. Thus, the two strains 4756 and 17155 phylogenetically belong to the O1 serogroup and the difference in the serological results may be a consequence of seroconversion caused by changes in the genes required for the biosynthesis of the antigen O.. Keywords: Vibrio cholerae non-O1/ non-O139, serological conversion, 16S/23S rRNA intergenic spacer regions, Molecular systematic.

(17) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... 1 – INTRODUÇÃO A cólera é uma doença infecciosa intestinal exclusiva dos seres humanos (Kaper et al., 1995). O seu agente etiológico é o Vibrio cholerae, que foi identificado por Koch, a partir da correlação entre a etiologia e a transmissão da doença (Sack et al., 2004). A espécie Vibrio cholerae Pacini, 1854 utiliza a glicose, sacarose e manitol nas suas vias metabólicas anaeróbicas. A base da identificação e da classificação sorológica desta espécie é o antígeno “O”, um polissacarídeo termoestável integrante do lipopolissacarídeo (LPS) de superfície que apresenta uma enorme diversidade (Yamai et al., 1997). Os determinantes antigênicos do LPS são aglutinados com antissoro para o antígeno “O” específico. Desta forma, mais de 200 sorogrupos de V. cholerae foram identificados (Sack et al., 2004) e o primeiro deles foi denominado de V. cholerae sorogrupo O1. Os genes de biossíntese do antígeno O estão localizados no conjunto de genes wbe, que apresenta entre outras características, regiões conservadas nas suas extremidades. Isso permite que cepas de diferentes sorogrupos possam ser soroconvertidas em outro sorogrupo após a recombinação homóloga desta região, aglutinando assim com o mesmo antissoro O (Colwell, 1996). Desta forma, é destacado o caráter falho da classificação sorológica, que não é coerente com aspectos filogenéticos. Historicamente, as cepas de V. cholerae O1 têm sido responsabilizadas pelas sete pandemias ocorridas (Karaolis et al., 1995). No entanto, em 1992, com a emergência do novo clone epidêmico, o V. cholerae O139, surgiu um novo modelo de classificação epidemiológica: V. cholerae O1, V. cholerae O139 e V. cholerae nãoO1/não-O139 (Nair, 1994). O interesse na estrutura patogênica dos sorogrupos de V. cholerae não-O1/não-O139 só foi concretizado com a emergência deste novo sorogrupo, que funcionou como um alerta para o surgimento de outros clones epidêmicos. A patogenicidade de V. cholerae, em nível molecular, é um processo multifatorial, que envolve diversos genes que codificam os fatores de virulência, permitindo sua colonização no intestino (gene tcpA), a expressão coordenada destes fatores e a secreção da toxina colérica - CT (genes ctxAB). Os principais genes de virulência estão localizados em duas regiões distintas do cromossomo maior do V. cholerae: a Ilha de Patogenicidade de Vibrio (VPI - Vibrio Pathogenicity Island) e o. 15.

(18) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... profago CTXφ. Tais regiões podem propagar-se horizontalmente e dispersar-se entre diferentes cepas (Waldor e Mekalanos, 1996), permitindo, assim, que cepas de V. cholerae não-O1/ não-O139 possuam genes de virulência. Theophilo e colaboradores (2006), a partir da análise de 179 amostras de V. cholerae não-O1/não-O139, isoladas de casos clínicos e ambientais durante surto de cólera ocorrido no Brasil (entre 1991 a 2000), destacam 14 cepas de V. cholerae do sorogrupo O26 e uma cepa de V. cholerae não-O1/não-O139 por possuirem genes do profago CTXφ. Destas, oito cepas que apresentaram o profago completo foram selecionadas para o presente trabalho. Uma vez que a classificação sorológica, utilizada como um importante critério epidemiológico, não permite a inferência do grau de parentesco entre diferentes sorogrupos, este trabalho buscou uma análise genética mais detalhada de cepas de V. cholerae não-O1/não-O139, abordando a região espaçadora intergênica 16S-23S (ISR) presente nos operons de rRNA. Neste contexto, a região espaçadora se enquadra por ser um marcador filogenético robusto, diante da possibilidade de soroconversão de uma cepa de sorogrupo O1 em outro sorogrupo, mantendo, contudo, o potencial de virulência do V. cholerae O1. Este trabalho teve então como objetivo principal analisar região espaçadora intergênica 16S-23S do rDNA, a fim de estabelecer uma relação de parentesco entre as cepas de V. cholerae O26 e compará-las com o sorogrupo O1.. 16.

(19) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... 2 – OBJETIVO GERAL Analisar região espaçadora intergênica 16S-23S do rDNA, a fim de estabelecer uma relação de parentesco entre as cepas de V. cholerae O26 e compará-las com o sorogrupo O1.. 2.1 – OBJETIVOS ESPECÍFICOS  Amplificar as oito regiões espaçadoras 16S-23S de cepas de V. cholerae nãoO1/não-O139 e V. cholerae O1;  Clonar e sequenciar os fragmentos amplificados.  Analisar as seqüências obtidas, comparando-as com aquelas disponíveis de genomas seqüenciados de V. cholerae e outras bactérias;  Correlacionar os resultados obtidos com a presença ou não de fatores de virulência e a proximidade destas cepas com o sorogrupo O1.. 17.

(20) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... 3 – REFERENCIAL TEÓRICO 3.1 – CÓLERA 3.1.1 – SINTOMAS, TRANSMISSÃO E TRATAMENTO A cólera é uma doença infecciosa intestinal aguda de transmissão fecal-oral, que acomete os seres humanos (Kaper et al., 1995). Essa infecção é causada pela enterotoxina do Vibrio cholerae dos sorogrupos O1 e O139, podendo apresentar manifestações clínicas diversas, que variam da forma branda, que se manifesta com diarréia leve, à forma grave com diarréia aquosa e profusa, com ou sem vômitos, dor abdominal e câimbras, que pode evoluir para desidratação, podendo levar a morte em horas (Nitrini et al., 1997; Fundação Nacional de Saúde, 2002) (Figura 1).. Figura 1 – Paciente apresentando sinais típicos da forma grave da cólera com severa desidratação. Adaptado de Sack et al., 2004.. A infecção começa com a ingestão de água ou alimentos contaminados com o V. cholerae. Após atravessar a barreira ácida do estômago, o V. cholerae coloniza o epitélio do intestino delgado, por meio do Pílus Corregulador de Toxina (TCP) e outros fatores de colonização, que ainda não estão bem conhecidos, multiplica-se no intestino delgado proximal e produz enterotoxina. A Toxina Colérica (CT) secretada age sobre o mecanismo fisiológico de transporte de íons nas células do epitélio intestinal, elevando a concentração intracelular de cAMP, o qual aumenta a secreção do íon cloro (Cl-) e diminui a absorção do íon sódio (Na+) pelas células das vilosidades (Field, 1980), formando um gradiente osmótico que contribui para perda de água intracelular e resulta na diarréia característica (Figura 2). O vibrião não é invasivo e permanece no lúmen do intestino durante toda a progressão da doença.. 18.

(21) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... A. A B. C. Figura 2 – Esquema do mecanismo de ação da toxina colérica (CT) nos enterócitos: A - Secreção da CT no lúmen intestinal; B - Aumento da concentração intracelular de cAMP; C - Secreção de sódio, cloro e água do meio intracelular para o lúmen. Adaptado do site <http://www.techno.msu.ac.th/fn/ecenter/ pathogens/images/anim-cholera.gif>, acesso 28 abr 2008.. 3.1.2 – EPIDEMIOLOGIA DA CÓLERA A cólera, sendo uma doença de veiculação hídrica, apresenta uma disseminação influenciada pelos aspectos climáticos que afetam a disponibilidade de água. Nas áreas endêmicas, as taxas anuais de indivíduos com cólera variam de acordo com as mudanças ambientais e climáticas (Pascual et al., 2000). Tal comportamento sazonal pode ser observado em Bangladesh, local endêmico, em que ocorrem anualmente dois surtos de cólera: um registrado antes da estação quente e o outro depois das monções chuvosas (Siddique et al., 1992; Sack et al., 2003). No Peru, as epidemias de cólera são restritas às estações quentes (Tauxe et al., 1995). Esta sazonalidade pode estar relacionada à habilidade do gênero Vibrio em crescer rapidamente sob elevadas temperaturas ambientais (Faruque et al., 1998a; Pascual et al., 2000). O registro de casos de cólera, no Brasil, foi maior nos períodos mais secos do ano, quando registrado. 19.

(22) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... um baixo volume de água nos reservatórios e mananciais, proporcionando a concentração de vibriões. A elevação da temperatura da água neste período favorece o rápido crescimento da população de V. cholerae (Sack et al., 2004). Em algumas áreas, as condições sócio-econômicas e ambientais favorecem a instalação e rápida disseminação do V. cholerae. Assim, a deficiência do abastecimento de água tratada, destino inadequado dos dejetos, alta densidade populacional, carências de habitação, higiene, alimentação e educação, favorecem a ocorrência da doença (Fundação Nacional de Saúde, 2002; Gonçalves e Hofer, 2005). Outro aspecto que favorece a disseminação da doença é a forma atenuada da virulência do V. cholerae O1 biotipo El Tor, que apresenta um elevado número de portadores assintomáticos. O quadro clínico da cólera provocada pelo V. cholerae O1, biotipo El Tor, responsável pela pandemia atual, é uma síndrome diarréica mais branda do que a provocada pelo biotipo Clássico, responsável pelas outras seis pandemias (Kaper et al., 1995). Para causar a cólera em voluntários saudáveis é necessária a ingestão de uma elevada dose infecciosa (108 bactérias), porém uma dose baixa (105) pode ser suficiente para causar os mesmos sintomas, se for associada com antiácido ou bicarbonato de sódio (NaHCO3), que neutralizaram a acidez gástrica dos indivíduos. Logo, a suscetibilidade do indivíduo aumenta elevando-se o pH gástrico. Ainda assim, sob circunstâncias naturais, um inóculo menor que 108 bactérias pode causar a doença, visto que outros fatores interferem na infecção (Sack et al., 1998; Fundação Nacional de Saúde, 2002).. 3.1.3 – HISTÓRICO DA CÓLERA As seis primeiras pandemias da cólera se originaram na Índia, considerada o “Berço da cólera”, tendo como agente etiológico o V. cholerae O1 biotipo Clássico. A disseminação destas pandemias foi associada às peregrinações, às guerras e às rotas comerciais e migratórias entre os continentes europeu, asiático e americano (Lacey, 1995). Já a atual pandemia, a sétima, com quase cinco décadas de duração, atingiu mais de 130 países, tendo como agente etiológico o V. cholerae O1 biotipo El Tor (Kaper et al., 1995; Karaolis et al., 1995). Esta pandemia, originária da Indonésia em 1961, atingiu a Ásia em 1964, a África e o sul da Europa em 1970, e América do Sul em 1991. A doença tornou-se agora endêmica em muitos destes lugares, particularmente no sul da Ásia e na África (Shears, 1994; Faruque et al., 1998a; Sack et al., 2004).. 20.

(23) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... Em janeiro de 1991, após uma ausência de quase 70 anos na América Latina, uma grande epidemia de cólera desenvolveu-se no Peru, caracterizada por elevados números de casos e rápida disseminação, nunca vista igual nas outras epidemias (Nitrini et al., 1997). Estima-se que, no período de 1991 até 1999, o continente americano notificou 44% dos casos ocorridos mundialmente e no período de 2000 até 2003, apenas 0,65% dos casos (Griffith et al., 2006; World Health Organization, 1992, 1993, 1994, 1995). Griffith e colaboradores (2006) constataram que, entre o período de 1995 a 2005, 66% dos casos de cólera tiveram origem na África subsaariana, seguido pelos 16,8% originados do sudeste asiático. Os casos de cólera notificados na África tendem a apresentar grandes proporções, devido às precárias condições sócio-econômicas da população. O número de casos notificados de cólera em 2006 aumentou consideravelmente, assumindo proporções típicas de surto da doença (Figura 3). Foram notificados na África aproximadamente 99% dos casos mundiais. Os três países africanos mais atingidos não tiveram casos de cólera registrados em 2005 (World Health. 24.000. 18.000 15.000 12.000. 100.000. 9.000. Número de óbitos. 131.943. 111.575. 101.383. 184.311. 236.896. 254.310. 27.000. 21.000 142.311. 150.000. 30.000 Nº de Casos Nº de Óbitos. 137.071. 143.349. 200.000. 147.425. 208.755. 277.056. 180.348 172.790. Número de casos. 250.000. 216.555. 300.000. 293.121. Organization, 2007).. 6.000. 50.000. 3.000 2006. 2005. 2004. 2003. 2002. 2001. 2000. 1999. 1998. 1997. 1996. 1995. 1994. 1993. 1992. 0 1991. 0 Ano. Figura 3 – Número de casos de cólera no Mundo e taxa de mortalidade, entre 1991 e 2006. Adaptado da World Health Organization, 1993 – 1995, 2007 e de Griffith et al., 2006.. A re-introdução da cólera no Brasil, em 1991, aconteceu pela selva amazônica, na fronteira com o Peru e a Colômbia. A partir daí, alastrou-se progressivamente pela região Norte, seguindo o curso do Rio Solimões/Amazonas e seus afluentes, principal via de deslocamento de pessoas na região; e para as regiões Nordeste em 1992 e Sudeste e Sul em 1993, através dos principais eixos rodoviários (Figura 4). Na região Nordeste,. 21.

(24) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... a epidemia assumiu um caráter acelerado disseminando-se por todos os estados da região até o fim de 1993 (Hofer, 1993; Toledo, 1993). A chegada desta doença em áreas indenes e com precárias condições de vida, teve quase sempre características explosivas, o que justifica esse rápido avanço da cólera no Nordeste.. Figura 4 – Distribuição da cólera no Brasil, entre 1990 e 1996, evidenciando a rota da epidemia. Adaptado da World Health Organization (1993 - 1997).. A epidemia atingiu o ápice em 1993 com 60.340 casos notificados (Figura 5). Foi desenvolvida uma campanha nacional de combate à cólera e, em 1994, a doença começou a retroceder (Guthmann, 1995; Nitrini et al., 1997). A partir de 1995 reduziuse significativamente, tendendo a limitar-se às regiões Nordeste e Norte, onde prevalecem condições sócio-econômicas menos satisfatórias, sugerindo a tendência de endemização da doença (Brasil, 2000). Em 1998 e 1999, a seca no Nordeste provocou uma severa crise de abastecimento de água, favorecendo ao aumento de número de casos (Figura 5). Em 2004, ocorreu um pequeno surto em Pernambuco, no município de São Bento do Una, onde foram notificados 21 casos; e no ano seguinte, foram confirmados mais quatro no mesmo município e um caso no município de Recife (Figura 6) (Brasil, 2005). A doença, atualmente, está sendo detectada pela presença do V. cholerae em águas ambientais em localidades do estado de Pernambuco monitoradas pela Secretaria estatual de Saúde. Este monitoramento isolou em 2006 uma cepa ambiental toxigênica e em 2007, quatro cepas de V. cholerae O1 biotipo El Tor (uma no rio Una, duas no rio Ipojuca e outra no rio Bituri, afluente do rio Ipojuca) (Figura 6). É sempre preocupante a possibilidade de recrudescimento da epidemia, já que as dimensões continentais do país, as deficiências de saneamento básico e a precária situação sócio-econômica de grande parcela da população constituem-se elementos propícios à disseminação e à persistência da cólera (Brasil, 1992; Gonçalves e Hofer, 2005).. 22.

(25) Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... 800. 37.572. 50.000. 900. 40.000. 700. Nº de Casos Nº de Óbitos. 600 500. 15.915. 30.000. 200 7. 0. 0. 21. 5. 0. 2002. 2003. 2004. 2005. 2006. 2000. 1999. 1998. 1997. 1996. 1995. 1994. 1993. 1992. 1991. 0. 100. 2001. 715. 3.233. 2.571. 300 2.881. 10.000. 400 4.634. 20.000 2.103. Número de casos. 60.000. 1000. Número de óbitos. 70.000. 51.324. 60.340. CARIRI, F.A.M.O.. 0. ano Figura 5 – Número de casos de cólera em Brasil e taxa de mortalidade, entre 1991 e 2006. Adaptado da World Health Organization, 1993 – 1995; 2007 e de Griffith et al., 2006.. Brasil. Figura 6 – Bacias hidrográficas do Estado de Pernmbuco – Brasil. Adaptado de Leal et al., 2008.. 3.1.4 – DIAGNÓSTICO DA CÓLERA O diagnóstico da cólera é a peça fundamental para o êxito das atividades de prevenção e controle da doença. O diagnóstico laboratorial é o mais indicado para a identificação do V. cholerae O1, El Tor, responsável pelos casos de cólera branda. Os países recém-afetados pela doença, quando não estabelecem o diagnóstico laboratorial nos primeiros casos, prejudicam consideravelmente a implantação de medidas sanitárias indispensáveis ao controle da doença (Brasil, 1992). Portanto, este diagnóstico deve ser utilizado para investigação de todos os casos suspeitos, principalmente, quando a área é considerada livre de circulação do V. cholerae (Fundação Nacional de Saúde, 2002).. 23.

(26) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... O V. cholerae pode ser isolado, a partir da cultura de amostras de fezes ou vômito de doentes, de fezes de portadores e da cultura de amostras ambientais. Os métodos tradicionais de diagnóstico da cólera, tanto em fezes, quanto em material proveniente do ambiente (água do mar, de rios e alimentos) consistem em análises bacteriológicas que visam isolar e identificar o V. cholerae, baseado nas características fenotípicas (Brasil, 1998). As amostras analisadas pelo método tradicional passam por dois enriquecimentos sucessivos do vibrião em água peptonada alcalina (APA) e semeio em meio seletivo indicador (ágar TCBS - ágar tiossulfato/citrato/bile), conforme a Figura 7. Posteriormente, são realizados testes bioquímicos, confirmando a presença de características metabólicas e a capacidade de produzir a toxina colérica, e sorológicos, soroaglutinações frente aos antissoros polivalentes (O1) e monovalentes (Inaba e Ogawa) (Brasil, 1998).. Figura 7 – Esquema do método tradicional de diagnóstico. Adaptado do Ministério da Saúde (Brasil, 1998).. 24.

(27) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... 3.2 – AGENTE ETIOLÓGICO Em 1883, durante a quinta pandemia, o V. cholerae foi identificado como agente etiológico da cólera por Koch, a partir da correlação entre a etiologia e a transmissão da doença (Sack et al., 2004). O V. cholerae O1, biotipos Clássico ou El Tor (sorotipos Inaba, Ogawa ou Hikojima) e o V. cholerae O139 são os agentes etiológicos de cólera epidêmica.. 3.2.1 – ECOLOGIA DO Vibrio cholerae O ciclo de vida do V. cholerae consiste em duas fases: uma fase no hospedeiro humano e outra, no ambiente aquático, onde o V. cholerae pode ser encontrado como célula de vida livre ou associado ecologicamente com fanerógamas aquáticas, algas, zoobentos, fungos, zoo e fitoplânctons (principalmente copépodes, cladóceros, rotíferos, clorófitas e cianobactérias), insetos, entre outros organismos (Huq et al., 1984; Islam et al., 1990; Tamplin et al., 1990; Islam et al., 1993; Colwell, 1996). Acreditou-se por muito tempo que a distribuição global do V. cholerae estivesse exclusivamente relacionada à rota da cólera. No entanto, estudos sugerem que o deslocamento destas bactérias em associação com plânctons é o principal fator de distribuição global (McCarthy e Khambaty, 1994). Assim, o V. cholerae ambiental sobrevive e se multiplica em associações ecológicas independentemente do início das infecções humanas (Sanyal, 2000; Bartlett e Azam, 2005). Estudos do ambiente aquático mostraram que o V. cholerae, incluindo os sorogrupos O1 e O139, habita ecossistemas aquáticos, contribuindo para a flora bacteriana de vida livre em rios e estuários (Colwell e Spira, 1992). Enquanto que as cepas de V. cholerae toxigênicas podem também habitar o trato gastrointestinal, pois produzem fatores de colonização que permitem tal feito, as cepas não-O1/não-O139 são mais freqüentemente isoladas em habitats ambientais. A maioria das cepas toxigênicas ambientais é isolada em regiões que foram contaminados por indivíduos infectados. Já as cepas isoladas de ambientes distantes das regiões com casos notificados, geralmente não possuem os genes da toxina colérica. O V. cholerae ambiental pode formar biofilme (Watnick et al., 2001) e pode se apresentar no estado viável mas não-cultivável (VNC), em resposta a um estresse físico ou nutricional (Colwell, 2000), facilitando a persistência do V. cholerae, em habitats aquáticos durante períodos interepidêmicos (Reidl e Klose, 2002). Islam e. 25.

(28) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... colaboradores (1993) verificaram que as cepas de V. cholerae epidêmicas, durante períodos interepidêmicos, fazem associações ecológicas com organismos aquáticos, na forma VNC, até o próximo período epidêmico, quando os fatores ambientais estimulam a multiplicação bacteriana, resultando em um novo surto de cólera. Embora não se conheça o que determina a sazonalidade da cólera, acredita-se que a sua presença endêmica no subcontinente indiano e sua re-emergência em outros continentes pode estar relacionada a fatores ambientais (Pascual et al., 2000; Colwell, 1996). Estudos associam períodos interepidêmicos à alta concentração de bacteriófagos no ambiente aquático. Tais fagos, além de possuírem importantes genes de virulência da cólera, como as subunidades da toxina colérica, atuam no controle populacional do V. cholerae (Faruque et al., 1998b). Assim, a ausência de fagos no ambiente aquático potencializará a cólera epidêmica, em especial, quando o V. cholerae é introduzido pela primeira vez em uma dada região. Isso justifica o caráter explosivo das epidemias de cólera quando o agente etiológico foi recém introduzido em áreas livre da doença, como ocorreu na América Latina e, mais recentemente, na África (Faruque et al., 2005). O ciclo de vida do fago pode explicar grande parte da enigmática sazonalidade da cólera endêmica. Duas hipóteses são sugeridas para justificar a sazonalidade dos surtos em áreas endêmicas: seja pelo surgimento periódico das mesmas cepas de V. cholerae, seja pela emergência contínua de novos clones toxigênicos (Faruque et al., 1997).. 3.2.1.1 – RESERVATÓRIO AMBIENTAL As associações ecológicas prolongam a sobrevivência do V. cholerae, pois são importantes fontes de nutrientes para o vibrião. No entanto, ainda não se sabe se tais associações são fenômenos gerais para todos os sorogrupos ou são específicas para os sorogrupos epidêmicos, tratando-se de um mecanismo seletivo (Bartlett e Azam, 2005). A infecção do V. cholerae provocada pelo consumo de frutos do mar, crus ou mal cozidos, é um indício do quão diversificados são os reservatórios ambientais deste organismo. A ingestão de peixes, ostras, camarões e caranguejos constituem fontes de infecção, sendo identificados como causa de epidemias ou casos isolados de cólera nos Estados Unidos, Itália, Portugal e Austrália, entre outros países (Feachem, 1982; Lowry et al., 1989).. 26.

(29) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... O V. cholerae possui vários reservatórios ambientais porque desenvolveu ao longo da evolução mecanismos que o permitem sobreviver no ambiente. Pode-se citar como exemplo, a produção de quitinase, que permite o uso da quitina como fonte de carbono bastante abundante no exoesqueleto dos crustáceos (Colwell e Spira, 1992). A adesão direta de V. cholerae a superfícies contendo quitina permite a formação de biofilmes favorecendo sua proteção contra os efeitos do pH ácido encontrado ocasionalmente no ambiente (Nalim et al., 1979; Faruque et al., 2006). É relatado que existe uma seletiva especificidade da quitinase extracelular do V. cholerae, contribuindo para a formação preferencial de biofilmes em copépodes (Huq et al., 1990). Assim, a produção desta enzima permite a relação ecológica entre o V. cholerae e os crustáceos. Estudos mostram que copépodes marinhos albergam uma flora bacteriana em seu exoesqueleto e que esta interação pode ser decisiva na sobrevivência ambiental do V. cholerae por longo período, visto que o mesmo é transportado para o sedimento, sempre que a coluna de água apresenta grande concentração de matéria orgânica (Huq et al., 1983; 1984; Araújo et al., 1996; Tamplin et al., 1990). Os víbrios, quando associados à copépodes vivos em laboratório, sobreviveram por mais tempo e permaneceram cultiváveis (Huq et al., 1983). A concentração de bactérias do gênero Vibrio dissolvidas na água estuarina cai consideravelmente na presença de quitina particulada (Kaneko e Colwell, 1975), demonstrando o quão benéfica é esta associação para o V. cholerae. A alta adaptabilidade às variações de temperatura e salinidade favorece a ocorrência de elevadas concentrações de víbrios em águas com características estuarinas (Colwell, 1996). Outro mecanismo de persistência desta espécie no ambiente é a sua capacidade de assumir formas de sobrevivência, como a forma rugosa e o estado viável mas não-cultivável.. 3.2.1.2 – ESTADO VIÁVEL MAS NÃO CULTIVÁVEL Investigando as condições físico-químicas das regiões estuarinas, verificou-se que esses ambientes apresentam características que tornam possível a sobrevivência do V. cholerae O1 (Colwell e Spira, 1992; Colwell e Huq, 1994). A forma como irá sobreviver pode diferir e a persistência dos fatores envolvidos na conservação dos genes de virulência não é certa. A sobrevivência depende de diversos fatores, tais como as. 27.

(30) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... propriedades físico-químicas do ambiente e as associações ecológicas específicas das bactérias, envolvendo diversos componentes do ambiente aquático. Fatores ambientais, como pH, temperatura, salinidade e concentração de nutrientes, exercem importante influência nas interações ecológicas do V. cholerae, principalmente se tais condições ambientais forem parecidas com as encontradas no estuário (Huq et al., 1984; Patel et al., 1995). Os vibriões coléricos sob circunstâncias de estresse (falta de nutrientes, elevação da salinidade ou redução de temperatura) assumem como estratégia de sobrevivência um estado de latência. Esta estratégia é conhecida como estado viável mas não cultivável (VNC) nos meios de culturas convencionais, impossibilitando seu isolamento por técnicas microbiológicas, embora ainda causem a infecção colérica (Colwell e Huq, 1994). Trata-se, portanto, de uma estratégia da resistência à ambientes aquáticos oligotróficos, em que a bactéria reduz de tamanho, torna-se ovóide e entra no estado de dormência permitindo a sua sobrevivência nas condições ambientais adversas por períodos prolongados (Colwell, 1996). Existe uma hipótese de que o V. cholerae sobreviveria no meio ambiente durante períodos interepidêmicos no estado VNC. No entanto, como já foi discutido, a sua interação com o plâncton desempenha um papel importante na ecologia do microrganismo e facilita a sobrevivência (Lobitz et al., 2000). O estado viável mas não cultivável pode ser induzido em laboratório, incubando a cultura de V. cholerae sob condições de estresse salino a 48 °C, por vários dias. Segundo estudos preliminares, estas células podem se tornar viáveis quando ingeridas por voluntários humanos (Colwell e Spira, 1992). A manutenção do potencial infeccioso da bactéria nessa condição, o torna de grande importância epidemiológica (Colwell, 1996; Binsztein et al., 2004). O emprego da imunofluorescência indireta para a demonstração da bactéria em amostras de água e, posteriormente, a associação com a contagem direta de células viáveis permitiu a detecção de formas VNC do vibrião colérico em ambientes aquáticos (Colwell et al., 1985; Xu et al., 1984).. 28.

(31) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... 3.2.2 - FATORES DE VIRULÊNCIA No V. cholerae, os principais genes de virulência requeridos para a patogenicidade estão agrupados e podem aparentemente propagar-se horizontalmente e dispersar-se entre diferentes cepas. Análises genéticas revelaram a presença de duas regiões principais que participam diretamente dos mecanismos de virulência: a Ilha de Patogenicidade de Vibrio (VPI) e o profago CTXφ (Waldor e Mekalanos, 1996).. 3.2.2.1 – A VPI A VPI (Figura 8) é uma região do DNA adquirida, apresentando o conjunto de genes tcpAHP (toxin-coregulated pilus), que codificam o fator de colonização; e genes de regulação que atuam em cascata, como o toxR, acfABCD, toxT, aldA e tagAB. A expressão de genes de virulência em V. cholerae envolve um grande número de etapas que culminam na ativação do promotor do toxR (Skorupski e Taylor, 1997). O ToxR liga-se a um motivo de DNA repetido em tandem (TTTTGAT) (Figura 9), localizado entre os genes zot e ctxA do profago CTXφ para ativar a transcrição dos genes ctxAB (Withey e Dirita, 2006). Cepas epidêmicas dos sorogrupos O1 e O139 possuem três ou mais cópias do heptanucleotídeo nessa região. Cepas de V. cholerae que possuem apenas duas cópias do heptanucleotídeo não são capazes de expressar a CT (Sarkar et al., 2002).. Figura 8 – Esquema da Ilha de Patogenicidade do Vibrio, evidenciando o conjunto de genes TCP, responsável pela expressão do fator de colonização, e demais genes envolvidos com a regulação. Adaptado de Zhang et al. (2003).. 29.

(32) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... A. C. Figura 9 – A - Esquema representativo da cascata regulatória que controla a expressão da toxina colérica (CT), evidenciando a ativação do gene ctxA pelo ToxT e a síntese da CT. RNAP, a RNA polimerase. Pequenas setas abaixo das caixas indicam promotores, assim como a direção da transcrição. A linha ondulada grossa indica mRNA. B - Região intergênica onde se encontra as sequências repetidas de heptanucleotídeos. C - Seqüências parciais de nucleotídeo a montante do gene ctxA das cepas 0395 (Vibrio cholerae O1 Clássico) e 10259 (V. cholerae não-O1/não-O139), evidenciando o número de cópias do heptanucleotídeo nessa região presente em cada uma destas. Adaptado de Sarkar et al. (2002) e de Sanchez et al. (2004).. 3.2.2.2 – O PROFAGO CTXφ φ Os genes ctxAB, que codificam a CT, principal fator de virulência do V. cholerae, estão localizados em um bacteriófago lisogênico conhecido como CTXφ ou elemento genético CTX (Figura 10). Esse bacteriófago possui uma região central (core), que é flanqueada por uma ou múltiplas cópias das seqüências repetidas – RS (Pearson et al., 1993). O profago CTXφ compreende a região do core e a do RS presente antes do core, denominada RS2. A região central (core) codifica a CT, que não contribui para a manuntenção do profago, e outros genes que codificam proteínas, como psh, cep, orfU e ace, que atuam no empacotamento e na liberação do fago (Waldor e Mekalanos, 1996).. 30.

(33) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... Central. Profago CTX Figura 10 – Esquema do profago CTXφ evidenciando a região central e a região RS2. A região núcleo apresenta genes ctxAB, codificadores da toxina colérica, e outros genes de virulência. A região RS2 codifica proteínas estruturais do profago. Já região RS1, embora não faça parte do profago, o flanqueia nas duas estremidades e possui o gene rstC, que traduz uma proteína anti-repressora do profago. Adaptado de Nandi et al. (2003) e de Maiti et al. (2006).. A molécula da CT é constituída por cinco subunidades B (codificado pelo gene ctxB) e uma subunidade A (ctxA). A subunidade B é responsável pela ligação da toxina a um receptor da célula intestinal e a subunidade A é a parte enzimaticamente ativa que atua sobre as células da mucosa intestinal provocando desequilíbrio hidroeletrolítico, resultando na secreção abundante de líquido isotônico. Outros peptídeos codificados pelos genes zot e ace, presentes na região core do CTXφ, também apresentam atividade enterotóxica (Fasano et al., 1991). Já a região RS2 codifica proteínas que estão envolvidas na regulação (gene rstR), na replicação (gene rstA) e na integração (gene rstB) de CTXφ no genoma de V. cholerae (Waldor et al., 1997). A RS1 flanqueia as extremidades do profago. Embora a forma lisogênica do profago CTXφ seja mantida pela proteína repressora fágica RstR, a proteína anti-repressora RstC, que influencia a replicação e transmissão do CTXφ, é codificada na RS1, região adjacente ao seu genoma (Davis et al., 2002). Por outro lado, a região RS1 necessita de cópias dos genes de manuntenção do CTXφ (rstR, rstA e rstB) para produzir partículas RS1 (Figura 10), demonstrando que existe uma interação simbiótica e parasitária entre o fago e a região RS1 (Faruque et al., 2002). Portanto, a interação entre o profago CTXφ e RS1 promove a eficiente propagação dos genes produtores da CT, intensificando a virulência e as relações evolutivas das cepas de V. cholerae. São relatados diferentes alelos para o gene rstR, estando cada alelo associado a um tipo distinto de profago CTXφ. O profago que apresenta o alelo rstR El Tor, típico do V. cholerae O1 El Tor, é denominado CTXETφ. Assim, o CTXclassφ é típico do V. cholerae O1 Clássico; o CTXCalcφ do V. cholerae O139 (Davis et al., 1999); o CTXEnvφ. 31.

(34) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... do V. cholerae não-O1/ não-O139 (Mukhopadhyay et al., 2001); e o CTXvarφ presentes nos isolados de V. cholerae El Tor pré-O139 (Nandi et al., 2003). O profago CTXφ pode ser encontrado intracelularmente como um plasmídeo ou incorporado a um dos cromossomos do V. cholerae. Sob condições apropriadas, as cepas toxigênicas do V. cholerae podem ser induzidas a produzir várias partículas do CTXφ (Waldor e Mekalanos, 1996; Faruque et al., 1998b). Nas culturas de V. cholerae, que apresentam o CTXφ na fase de replicação, são encontradas elevadas concentrações deste fago no sobrenadante. As cepas ambientais não toxigênicas podem ser convertidas por transdução, surgindo assim novas cepas toxigênicas (Reidl e Klose, 2002).. 3.2.2.3 – OUTROS FATORES DE VIRULÊNCIA É evidente o papel crucial desempenhado pelos fagos filamentosos na transferência horizontal de genes entre cepas de V. cholerae. Isto não ocorre apenas porque alguns fagos possuem em seu genoma grupos gênicos associados à virulência, mas também porque a estrutura flexível do capsídeo permite transferir DNA heterólogo (Faruque e Mekalanos, 2003). Os clones de V. cholerae patogênicos evoluíram, provavelmente, de clones aquáticos de vida livre que adquiriram a capacidade de colonizar o intestino humano pela aquisição de novas informações genéticas (Colwell e Spira, 1992). A ausência de conjuntos de genes associados à virulência nas cepas não patogênicas é uma evidência que corrobora a hipótese evolutiva acima. De fato, a análise da estrutura, do conteúdo GC e da freqüência de códons (codon usage) da VPI sugere que esta região foi recentemente adquirida pelo V. cholerae. O CTXφ, que codifica CT, utiliza a TCP como sua receptora para infectar novas cepas (Waldor e Mekalanos, 1996), e, portanto, estes dois elementos adquiridos horizontalmente estão ligados evolutivamente. Outros conjuntos de genes que têm papéis adicionais hipotéticos na patogênese do V. cholerae também foram relatados, e segundo alguns indícios, foram também recentemente adquiridos. Estes incluem o conjunto de genes RTX (toxina em repeat) (Lin et al., 1999), o novo conjunto de genes pílus tipo IV (Fullner e Mekalanos, 1999) e as Ilhas do Vibrio da sétima pandemia (VSP-1 e VPS-2) (O’Shea et al., 2004).. 32.

(35) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... 3.2.3 – TAXONOMIA DO DOMÍNIO BACTÉRIA O Manual de Sistemática Bacteriológica de Bergey descreve 32 agrupamentos de bactérias pertencentes ao domínio Bactéria (Eubactéria), compreendendo 384 gêneros. Segundo Woese (1987), a análise de seqüências de rDNA 16S de organismos cultivados permite descrever 12 divisões para o domínio Bactéria. O termo divisão é aplicado para um grupo filogenético contendo duas ou mais seqüências de rDNA 16S monofiléticas e não similar a outros grupos filogenéticos que integram o domínio. Utilizando o mesmo marcador molecular, Hugenholtz e colaboradores (1998), acrescentou ao domínio Bactéria 12 novas divisões hipotéticas, descritas em um levantamento metagenômico do meio ambiente e outras 12 divisões descendentes descritas em outros estudos (Maidak et al., 1999). Assim, este Domínio compreende 36 divisões. A divisão Proteobacteria, também conhecida como bactérias púrpuras, é merecedora de destaque por constituir o maior e mais diverso grupo de bactérias cultivadas, com cerca de 1.600 espécies descritas (Thompson et al., 2004a). Segundo Kersters e colaboradores (2003), a classificação das Proteobactérias na categoria taxonômica “divisão” teria caído em desuso, sendo recomendado o uso da categoria “filo”. De acordo com esta nova classificação, o filo Proteobacteria é dividido em 5 classes fenotipicamente indistinguíveis (Thompson et al., 2004a): Alfa (α), Beta (β), Gama (γ), Delta (δ) e Epsilonproteobacteria (ε). As Proteobactérias apresentam coloração Gram-negativa e uma enorme diversidade morfológica e fisiológica (sobretudo metabólica), apesar de estarem no mesmo clado. As estratégias para obtenção de energia são variadas, incluindo organismos com metabolismo quimiolitotrófico, quimiorganotróficos e fototrófico, além de outras vias metabólicas especializadas em organismos adaptados a diversos nichos ecológicos. A classe Gamaproteobacteria compreende várias famílias, entre estas Aeromonadaceae, Chromatiaceae, Enterobacteriaceae, Legionellaceae, Pasteurellaceae, Xanthomonadaceae e Vibrionaceae (Thompson et al., 2004a).. 3.2.3.1 – FAMÍLIA VIBRIONACEAE O V. cholerae é uma bactéria Gram-negativa toxigênica pertencente à família Vibrionaceae. O gênero-tipo desta família é Vibrio Pacini, 1854 (Baumann e Schubert, 1984). As espécies pertencentes a esta família são bacilos retos ou curvos, móveis por. 33.

(36) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... meio de flagelo polar. Quando cultivadas em meio de cultura sólido apresentam flagelos laterais, podendo cada célula possuir até 100 flagelos. Não formam endósporos nem microcistos.. São. organismos. quimiorganotróficos. e. anaeróbios. facultativos,. apresentando metabolismo oxidativo e fermentativo. O oxigênio é o aceptor universal de elétrons durante a respiração. A maioria das espécies desta família é oxidase positiva. Todos utilizam a D-glicose como principal fonte de carbono e energia. A maioria dos indivíduos utiliza sais de amônio como fonte de nitrogênio. Originalmente, são habitantes aquáticos encontrados no mar, em água doce e em associações ecológicas com seres aquáticos. Algumas espécies são patogênicas para vertebrados e invertebrados (Baumann e Schubert, 1984). Uma importante função ecológica dessas bactérias é a degradação da quitina, o segundo biopolímero mais comum no mundo e o mais abundante no ambiente aquático (Meibom et al., 2004). Quando a família Vibrionaceae foi proposta por Véron em 1965, compreendia vários gêneros que apresentavam indivíduos oxidase positivos e que se deslocavam por meio de flagelo polar. Tais características sinapomórficas não implicam numa relação evolutiva entre as espécies, mas foi proposto por conveniência para diferenciação das espécies pertencentes à família Enterobacteriaceae, que são, por sua vez, oxidase negativas e possuem flagelos peritriquiais. Estudos posteriores de fisiologia e genética comparada, com membros das duas famílias, sugerem que evoluíram de um ancestral comum próximo (Baumann e Schubert, 1984). A origem evolutiva comum foi evidenciada a partir comparação de seqüências 5S do RNA ribossomal e hibridização do rRNA utilizando sonda de DNA (Baumann e Baumann, 1981). A família Vibrionaceae abriga oito gêneros (Vibrio, Allomonas, Catenococcus, Enterovibrio, Grimontia, Listonella, Photobacterium e Salinivibrio), sendo o gênero Vibrio o mais abundante (Thompson e Swings, 2006).. 3.2.3.2 – GÊNERO Vibrio A espécie-tipo deste gênero é Vibrio cholerae Pacini, 1854 (Baumann et al., 1984). As espécies do gênero Vibrio são bacilos com 0,5-0,8 µm de diâmetro e 1,4-2,6 µm de comprimento. Algumas espécies podem crescer em meio mineral contendo apenas D-glicose e NH4Cl. Os íons de sódio estimulam o crescimento de todas as espécies e são de extrema importância para algumas. Algumas espécies crescem bem em meio à base de água do mar. Todas as espécies utilizam D-glicose, D-frutose,. 34.

(37) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... maltose e glicerol. A fermentação de D-glicose, geralmente, não produz gás. A maioria das espécies cresce a 20ºC (Baumann et al., 1984). Os membros deste gênero são encontrados em associações ecológicas com organismos bênticos, fito e zooplâncton e em ambientes marinhos e estuarinos, com ampla faixa de variação de salinidade. São encontradas também algumas espécies em habitats de água doce. Algumas espécies deste gênero são patogênicas para o homem e outras para os animais marinhos (Baumann et al., 1984). Este gênero compreende 47 espécies (Euzéby, 1997), entre as quais se destaca o V. cholerae por ser o agente etiológico de sete pandemias de cólera. O V. cholerae e o V. mimicus são filogeneticamente próximos dentro do gênero Vibrio (Thompson et al., 2004a). Estas duas espécies apresentam genomas bastante relacionados, sugerindo um ancestral comum recente.. 3.2.4 – ESPÉCIE Vibrio cholerae O Vibrio cholerae Pacini, 1854 (Figura 11) utiliza em suas vias metabólicas anaeróbicas glicose, sacarose e manitol e é lisina e ornitina descarboxilases positivas. Esse organismo é classificado por testes bioquímicos e é subdividido em sorogrupos baseados no antígeno somático “O” (Sack et al., 2004).. Figura 11 – Fotomicrografia eletrônica evidenciando a morfologia do V. cholerae. Adaptado de Albert (1994).. 3.2.4.1 – CLASSIFICAÇÃO ANTIGÊNICA O antígeno “O” é um polissacarídeo termoestável integrante do lipolissacarídeo (LPS) da parede celular das bactérias Gram-negativas, sendo constituído de três frações (“A”, “B” e “C”). Por apresentar uma enorme diversidade, este antígeno é a base da identificação e da classificação sorológica da espécie V. cholerae (Yamai et al., 1997). Os determinantes antigênicos de superfície são aglutinados com antissoro para o. 35.

(38) CARIRI, F.A.M.O.. Caracterização Molecular de Cepas de Vibrio.... antígeno “O” específico, sendo identificados mais de 200 sorogrupos de V. cholerae (Sack et al., 2004). O primeiro a ser identificado foi denominado de V. cholerae sorogrupo O1. Os diferentes sorogrupos “O” de V. cholerae não podem ser distingüidos bioquimicamente, portanto a sua identificação baseia-se no fato de que o sorogrupo O1 possui apenas um antígeno “O”, o qual reagirá especificamente aglutinando-se com o antissoro O1. Epidemiologicamente, a espécie V. cholerae tem sido dividida em cepas do sorogrupo O1 e de sorogrupos diversos, denominados não-O1, as quais se imaginou, por muito tempo, que tinham diferentes capacidades patogênicas (Colwell, 1996). Porém, em 1992, surgiu um novo clone epidêmico, o V. cholerae O139, dando origem a um novo modelo de classificação epidemiológica: V. cholerae O1, V. cholerae O139 e V. cholerae não-O1/ não-O139 (Nair, 1994, Sack et al., 2004). O conjunto de genes wbe de V. cholerae O1, constituído de genes de biossíntese do antígeno O (O-PS), está localizado no cromossomo maior, entre as ORFs VC0240 (gene gmhD) e VC0264 (gene rjg) (Heidelberg et al., 2000). Este conjunto de genes consiste em cinco regiões: 1 – biossíntese da perosamina, compreendendo os genes manC, manB, gmd e wbeE (Stroeher et al., 1995); 2 – transportador do antígeno O, compreendendo os genes wbeG, wzm e wzt (Manning et al., 1994; Manning et al., 1995); 3 – biossíntese do tetronato, compreendendo os genes wbeK, wbeL, wbeM, wbeN e wbeO (Stroeher et al., 1998); 4 – modificador de antígeno O, compreendendo o gene wbeT (Stroeher et al., 1992; Hisatsune et al., 1993); e 5 – genes adicionais, compreendendo o gene wbeU, wbeV e wbeW (Fallarino et al., 1997). A possibilidade de recombinação homóloga entre o conjunto de genes de biossíntese do antígeno O foi testada em 300 cepas de V. cholerae não-O1 e não-O139 (Li et al., 2002). Destas, quatro cepas não-O1, sorogrupos O27, O37, O53 e O65, apresentaram a organização genética similar à do sorogrupo O1, sugerindo a recombinação desta região. Yamasaki e colaboradores (1999) sugerem que a emergência do sorogrupo O139 é resultado da transferência horizontal de genes do sorogrupo O1 e O22. O estreito parentesco genético da linhagem ancestral do V. cholerae O1 El Tor com o novo serogrupo O139 (Stroeher et al., 1995; Li et al., 2002), a existência de diferentes cassetes codificadores do antígeno O presentes no mesmo locus cromossômico (Stroeher et al., 1995; Li et al., 2002), bem como a presença de regiões similares em ambos os lados deste cluster (Stroeher et al., 1997), apoiam firmemente a. 36.

Referências

Documentos relacionados

O relatório encontra-se dividido em 4 secções: a introdução, onde são explicitados os objetivos gerais; o corpo de trabalho, que consiste numa descrição sumária das

Sendo assim, pretende-se conhecer as características das pessoas idosas com DA e seus cuidadores, no que concernem os impactos a saúde bem como a sobrecarga, destacando

Durante uma pesquisa de monitoramento da população dos anfíbios na República Checa, uma nova associação putativa patogênica entre sapos e Gregarina (Apicomplexa,

No Brasil, tem-se observado um aumento no número de criações destinadas a produção de leite, especialmente a caprinocultura leiteira, sendo de fundamental importância a realização

O tema proposto neste estudo “O exercício da advocacia e o crime de lavagem de dinheiro: responsabilização dos advogados pelo recebimento de honorários advocatícios maculados

Delisle &amp; Vincent (2002) em seu trabalho, diagnosticaram que a produ¸c˜ao de feromˆonio foi significativamente menor em fˆemeas de Choristoneura rosaceana (Harris,

Com um orçamento municipal girando por volta de R$ 623 milhões em 2012, segundo o boletim on-line Sua Cidade 9 , o município de Limeira conta, após quinze anos

Molecular analysis of Vibrio cholerae O1, O139, non-O1, and non-O139 strains: clonal relationships between clinical and environmental isolates.. Antimicrobial resistance