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Quebrando a conspiração do silêncio: belas velhices em Natal

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS. SHEILA DINNAH SOUZA DA SILVA ALVARENGA. QUEBRANDO A CONSPIRAÇÃO DO SILÊNCIO: BELAS VELHICES EM NATAL. NATAL-RN 2016.

(2) SHEILA DINNAH SOUZA DA SILVA ALVARENGA. QUEBRANDO A CONSPIRAÇÃO DO SILÊNCIO: BELAS VELHICES EM NATAL. Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre, sob a orientação da Prof. Dra. Josimey Costa da Silva.. NATAL-RN 2016.

(3) Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes - CCHLA Alvarenga,. Sheila. Dinnah. Souza. da. Silva.. Quebrando a conspiração do silêncio: belas velhices em Natal / Sheila. Dinnah. Souza. da. Silva. Alvarenga.. -. 104f.:. 2016. il.. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de Pós-graduação Orientadora:. em Prof.ª. Ciências Dr.ª. Josimey. Sociais.. Costa. da. Silva.. 1. Envelhecimento. 2. Velhice - aspectos sociais. 3. Cuidado de. si.. I.. RN/UF/BS-CCHLA. Silva,. Josimey. Costa. da.. II.. Título.. CDU 612.67(813.2).

(4) SHEILA DINNAH SOUZA DA SILVA ALVARENGA. QUEBRANDO A CONSPIRAÇÃO DO SILÊNCIO: BELAS VELHICES EM NATAL. Apresentada em: __ /__/ 2016. BANCA EXAMINADORA. _________________________________________________________________________________ Profa. Dra. Josimey Costa – Orientadora Presidente da banca _________________________________________________________________________________ Prof. Dra. Isolda Belo da Fonte – Fundação Joaquim Nabuco/UFPE Membro externo _________________________________________________________________________________ Prof. Dra Vânia de Vasconselos Gico - UFRN Membro interno _________________________________________________________________________________ Prof. Dra Lore Fortes - UFRN Suplente externo. NATAL-RN 2016.

(5) [...] A vida é uma coisa que tem de passar, uma obrigação de que é preciso dar conta. Uma dívida que se vai pagando todos os meses, todos os dias. Parece loucura lamentar o tempo em que se devia muito mais. [...] Qual será, nesta vida, o jovem satisfeito? Um jovem pode nos fazer confidências de exaltação, de embriaguez; de felicidade, nunca. Mocidade é a quadra dramática por excelência, o período dos conflitos, dos ajustamentos penosos, dos desajustamentos trágicos. A idade dos suicídios, dos desenganos e, por isso mesmo, dos grandes heroísmos. É o tempo em que a gente quer ser dono do mundo – e ao mesmo tempo sente que sobra nesse mesmo mundo. A idade em que se descobre a solidão irremediável de todos os viventes. [...] Não sei mesmo como, entre as inúmeras mentiras do mundo, se consegue manter essa mentira maior de todas: a suposta felicidade dos moços. Por mim, sempre tive pena deles, da sua angústia e do seu desamparo. Enquanto esta idade a que chegamos, você e eu, é o tempo da estabilidade e das batalhas ganhas. Já pouco se exige, já pouco se espera. E mesmo quando se exige muito, só se espera o possível. Se as surpresas são poucas, poucos também os desenganos. A gente vai se aferrando a hábitos, a pessoas e objetos. Ai, um dos piores tormentos dos jovens é justamente o desapego das coisas, essa instabilidade do querer, a sede do que é novo, o tédio do possuído. E depois há o capítulo da morte, sempre presente em todas as idades. Com a diferença de que a morte é a amante dos moços e a companheira dos velhos. Para os jovens ela é abismo e paixão. Para nós, foi se tornando pouco a pouco uma velha amiga, a se anunciar devagarinho: o cabelo branco, a preguiça, a ruga no rosto, a vista fraca, os achaques. Velha amiga que vem de viagem e de cada porto nos manda um postal, para indicar que já embarcou.. A Velha Amiga - Rachel de Queiroz.

(6) DEDICATÓRIA. Às mulheres de minha vida, a quem devo tudo que sou e a todas as conquistas: Às minhas velhinhas Nininha (in memorian) e Dada; À minha futura velhinha, minha mãe Fatima Souza; À minha irmã Maria Helena; À minha filha Marina, minha inspiração..

(7) AGRADECIMENTOS. Ao Deus Pai Todo Poderoso por sua presença, providência e amor em minha vida. À professora Dra. Josimey Costa da Silva, pela parceria, ensinamentos, orientações, pela compreensão e apoio ao longo da correria do mestrado. Que nossa parceria perdure! Aos professores Alysson Carvalho e Alex Galeno pelas colaborações no momento da qualificação da pesquisa. E aos demais professores do Programa, pelos ensinamentos passados, em especial a professora Norma por sua compreensão em aceitar minha filha em suas aulas quando precisei e sua flexibilidade de modo geral com minha maternagem. Aos queridos Otânio e Jefferson, por sempre estarem disponíveis e solícitos em nos ajudar a cumprir as burocracias e regras do jogo. Aos amigos de mestrado pela colaboração e apoio ao longo da jornada, em especial Vinhu e Mariano. À Maria Rita pelo trabalho de revisão desse trabalho. À minha mãe, pelo apoio e suporte com minha filha, por entender minha ausência, pela leitura e ajuda na elaboração desse trabalho. Ao meu marido pelo apoio, amor e paciência na realização desse meu sonho e de tantos outros que ainda realizaremos juntos..

(8) RESUMO. Os novos discursos sobre a velhice contrariam as representações tradicionais que associam essa fase de vida a decreptude, doenças e limitações ao apresentá-la como um processo que engloba a atividade, novas aprendizagens, flexibilidade, satisfação pessoal e novos vínculos afetivos e amorosos. Desse modo, engendra-se uma nova perspectiva sobre o processo de envelhecimento e a velhice se transforma em terceira idade. Essa nova perspectiva estimula os idosos a se manterem saudáveis e ativos, transformando a juventude em um valor que pode ser alcançado independentemente da idade cronológica. Nesse contexto, a mídia exerce grande poder na construção da imagem das diversas etapas da vida, impõe aos idosos uma nova relação com o consumo e com o corpo, buscando aproximá-los da ideia de juventude. Como pressuposto, assume-se que o idoso que se mantém ativo para o consumo é o idoso que a mídia valoriza e a imagem que a mesma perpetua em seus canais. No primeiro capítulo, são apresentados os dados demográficos sobre a velhice, discutem-se as palavras que designam o velho e os seus usos ao longo da história, de acordo com a concepção de Silva (2008) e Debert (1997, 1998, 2012), assim como a evolução da velhice como centro do discurso político e social. No segundo capítulo, discorre-se sobre o envelhecimento do corpo na sociedade atual, na perspectiva de Le Breton (2007); e as implicações para a autoimagem que os velhos constróem sobre si mesmos a partir do conceito de biopolíticas, biopoder e cuidado de si de Foucault (1998, 1999). No terceiro capítulo, de acordo com a ideia de Simone de Beauvoir (1990) de “conspiração do silêncio”, busca-se romper esse silêncio dando voz aos velhos, que de maneiras distintas encontraram o seu modelo de bela velhice, conceito cunhado pela autora e desenvolvido por Goldenberg (2013). Através da pesquisa etnográfica e da sociologia compreensiva, a presente dissertação busca investigar como esses velhos, consumidores de serviços e produtos de cuidado com o corpo em geral, estabeleceram modelos de “bela velhice”, através da adoção de um estilo de vida que foge das representações sociais tradicionais do envelhecimento e engendram uma nova representação ao longo dos últimos anos.. Palavras-chave: Envelhecimento. Velho. Corpo. Consumo. Cuidado de si. Bela velhice..

(9) ABSTRACT. New discourses on old age contradict the traditional representations that associate this stage of life to decrepitude, illnesses and limitations by presenting it as a new process that includes activity, learning, flexibility, personal satisfaction and new affective and loving relationships. Thus, a new perspective on the aging process is engendered and old age turns into third age. This new perspective stimulates the elderly to keep healthy and active, transforming the youth into a value that can be reached independently of chronological age. In this context, the media exerts great power in the construction of the image of the various stages of life, imposes a new relation with consumption and with the body to the elderly, aiming to bring them together to the idea of youth. As a premise, it is assumed that the elder that remains active for consumption is the elder that the media values and perpetuates in its channels. In the first chapter demographic data about the elderly is presented, the words that design the old and their uses throughout history is discussed, according to the conception of Silva (2008) and Debert (1997, 1998, 2012), the same way the evolution of elderly as a center of the political and social discourse. In the second chapter, according to the idea from Simone de Beauvoir (1990) of the “conspiracy of silence”, it is sought to break this silence by giving voice to the old, in which distinct way they found their version of “beautiful old age” concept coined by the author and developed by Goldenberg (2013). Through ethnographic research and comprehensive sociology, this dissertation aims to investigate how these old, consumers health and beauty products and services, established models of “beautiful old age”, by adopting a lifestyle that escape the traditional social representations of aging and engender a new representation over the last years.. KEY WORDS: Old. Elder. Body. Consumption. Self care. Beautiful old age..

(10) LISTA DE SIGLAS ARPI. Associação Riograndense Pró-Idoso. BPC. Benefício de Prestação Continuada. CEASI. Centro Especializado de Atenção à Saúde do Idoso. CEI. Conselho Estadual do Idoso. CMI. Conselho Municipal do Idoso. CRAS. Centro de Referência da Assistência Social. CREAS. Centro de Referência Especializado em Assistência Social. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. ILPIs. Instituição de Longa Permanência para Idosos. LAE. Lar do Ancião Evangélico. OAB. Ordem dos Advogados Brasileiros. OMS. Organização Mundial de Saúde. ONU. Organização das Nações Unidas. PAIF. Programa de Atenção Integral à Família. PID. Programa de Internamento Domiciliar. PNI. Política Nacional do Idoso. RENADI. Rede de Proteção e Defesa da Pessoa Idosa. SCFV. Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos. SEDH. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. SECA. Sociedade Espírita de Cultura e Assistência. SEEC. Secretaria da Educação e da Cultura. SEEL. Secretaria de Esporte e Lazer. SEMTAS. Secretaria Municipal de Trabalho e Assistência Social. SEJUC. Secretaria de Justiça e Cidadania. SESAP. Secretaria da Saúde Pública. SESED. Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social. SME. Secretaria Municipal de Educação. SMS. Secretaria Municipal de Saúde. STTU. Secretaria de Transporte e Trânsito Urbano. UNP/UNATI. Universidade Potiguar/Universidade Aberta à Terceira Idade.

(11) LISTA DE TABELAS. TABELA 1 PROPORÇÃO DE IDOSOS NO NORDESTE, NO RIO GRANDE DO NORTE E NATAL DE 1970 - 2010. - 62 TABELA 2 PROPORÇÃO (%) DE IDOSOS POR BAIRRO EM NATAL, 2000 - 2010. ------------------------------------ 63 TABELA 3 ILPIS CONVENIADAS COM A SECRETARIA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL DO MUNÍCIPIO DE NATAL ------ 69.

(12) LISTA DE FIGURAS. FIGURA 1 CONVITE DE FORMATURA DE DONA LOURDES--------------------------------------------------------------- 79 FIGURA 2 DONA NILZE NO VIII CONGRESSO BRASILEIRO DE ALZHEIMER ------------------------------------------- 82 FIGURA 3 ALONGAMENTO NO PILATES: DONA SUZETE COM OUTRA ALUNA DO ESPAÇO SALUTTE -------------- 84 FIGURA 4 DONA GINA COM A TURMA DA ACADEMIA --------------------------------------------------------------------- 86 FIGURA 5 ELIANE EM HAPPY HOUR COM AMIGOS --------------------------------- ERROR! BOOKMARK NOT DEFINED. FIGURA 6 CARNAVAL NA ARPI --------------------------------------------------------------------------------------------- 92 FIGURA 7 FORRORESTA NA ARPI ----------------------------------------------------------------------------------------- 93.

(13) SUMÁRIO. INTRODUÇÃO ............................................................................................. 12 1 A VELHICE: UM DUELO ENTRE O VELHO E NOVO ............................. 17 1.1 O ENVELHECIMENTO: ALGUNS DADOS DEMOGRÁFICOS ........... 17 1.2 CONCEITUANDO VELHICE ............................................................... 21 1.3 ALGUNS ASPECTOS SOCIAIS DA VELHICE .................................... 26 1.4 VELHICE OU TERCEIRA IDADE? ...................................................... 30 1.5 A SOCIALIZAÇÃO DA VELHICE ......................................................... 39 2 CORPO, CUIDADO DE SI, VELHICE E CONSUMO .............................. 44 2.1 O CORPO VELHO NA SOCIEDADE ATUAL ....................................... 44 2.2 O CUIDADO DE SI E BIOPOLÍTICA NA VELHICE .............................. 48 2.3 O CONSUMO NA VELHICE NA SOCIEDADE ATUAL ........................ 55 3 O OUTRO LADO DA VELHICE: SUA BELEZA ..................................... 61 3.1. A. REALIDADE. DA. VELHICE. EM. NATAL:. ROMPENDO. A. CONSPIRAÇÃO DO SILÊNCIO ................................................................ 61 3.2 A GARANTIA DOS DIREITOS DO IDOSO: O INÍCIO DA QUEBRA DA “CONSPIRAÇÃO DO SILÊNCIO” NO BRASIL E EM NATAL .................... 65 3.3 CONHECENDO BELAS VELHICES EM NATAL ................................. 72 3.4 BELAS VELHICES EM NATAL ............................................................ 77 3.4.1 PROJETOS DE VIDA ................................................................... 77 3.4.2 PROJETOS DE VIDA NA ARPI.................................................... 91 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................... 96 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................ 98 ANEXOS .................................................................................................... 104.

(14) 12. INTRODUÇÃO. Estudos sobre o envelhecimento e os velhos vem sendo cada vez mais realizados desde que as projeções demográficas relacionadas `a questão envelhecimento populacional tem se concretizado em todo mundo. Às Ciências Sociais, cabe o papel de investigar de que forma essas mudanças na pirâmide etária transformam também a sociedade hodierna e suas relações nos mais diversos aspectos da vida social. Simone de Beauvoir é considerada, em muitos desses trabalhos, como pioneira nos estudos sobre envelhecimento com sua obra “A velhice”, de 1970. Em seus escritos, a autora afirma que sua intenção ao escrever aquele livro era de trazer o tema da velhice à superfície, fazê-lo entrar no centro das atenções, quebrando o que chama de “conspiração do silêncio”, que paira em torno da velhice nas sociedades em geral. Todo este trabalho é também e ainda, mesmo quase 50 anos depois dos escritos da pensadora francesa, uma tentativa de colaborar para o fim dessa conspiração, ainda que nos limites que condicionam uma dissertação de mestrado. Ao buscar o estado da arte sobre o tema, é possível observar que, embora estudos cada vez mais numeroso sobre o envelhecimento humano se desenvolvam nas mais diversas áreas de conhecimento, da medicina à psicologia, da engenharia às ciências sociais, é possível constatar que tais estudos sobre o envelhecimento ainda deixam a desejar quanto a dar voz aos velhos para que falem em seu próprio nome. Assim, surgiu o primeiro propósito desse trabalho: dar voz aos velhos, fazê-los falar sobre o processo de envelhecimento, sobre a velhice, para que tenhamos mais elementos empíricos a apoiar a teoria. Ainda buscando estudos já realizados, pode-se verificar que também é grande o número de pesquisas que se desenvolvem a respeito dos problemas que envolvem a velhice, das perdas que a velhice acarreta, ou seja, de seu lado negativo, deletério. Esse fato é consequência histórica de como estudos sobre a velhice se desenvolveram, que tipo de aspecto é analisado prioritariamente. Uma outra abordagem é proposta aqui e será mais desenvolvida ao longo desta dissertação, pois foi a partir dessa observação que surgiu o segundo propósito deste trabalho: buscar dar ao tema da velhice outras possibilidades analíticas, para que seja possível.

(15) 13. enxergar se envelhecer pode ser também ganho de tempo de vida, se há de fato um ganho, algo a se comemorar individualmente e socialmente, em contraste com a visão de que só haveria perdas e preparação estéril para o fim. Para alcançar esse propósito, utilizamos mais uma vez de Simone e sua obra “A velhice” com seu conceito de “bela velhice”, posteriormente aprofundado por Mirian Goldenberg (2013) e utilizado aqui como norteador da velhice que queríamos encontrar e apresentar neste trabalho. Tendo esses pressupostos teóricos como fio condutores deste trabalho, foi preciso pensar nos pressupostos metodológicos que seriam usados na construção da presente pesquisa. Partimos, então, da ideia de Morin (2014, p. 278) de sociedade como “formada por concidadãos e sujeitos que tem problemas ou necessidades”. Utilizamos a sua perspectiva da sociologia que, trata de “atores, de sujeitos, de tomada de consciência, de problemas éticos”, cientes de que se trata de uma postura metodologicamente não ortodoxa. Usamos como pressuposto metodológico sua ideia de “um método que saiba distinguir, mas não separar dissociar, e que saiba promover a comunicação do que é distinto [...] que respeite o caráter multidimensional da realidade antropossocial, isto é, que possa enfrentar as questões do sujeito e da autonomia” (MORIN, 2014, p. 279), que são próprios de seu pensamento complexo e que, segundo ele, “tenta dar conta daquilo que os tipos de pensamentos mutilantes se desfaz, excluindo o que eu chamo de simplicadores” (2014, p. 176). A complexidade, de acordo com Morin é aquilo que tenta conceber a articulação, a identidade e a diferença de todos os aspectos (físicos, biológicos, sociais, culturais, psíquicos e espirituais). É uma tendência ao conhecimento multidimensional tendo como princípios a incompletude e a incerteza. Já o pensamento simplificante separa esses aspectos ou os uni por uma redução mutiliante, ou seja, os cortes das disciplinas, categorias cognitivas e tipos de pensamentos. Por conseguinte, cabe a complexidade respeitar as diversas dimensões do fenômeno estudado sem querer dar conta de todas as suas informações. Portanto, em consonância com a proposta de Morin, temos um método que foi definido ao longo da pesquisa. A partir da ideia de dar voz aos sujeitos sempre silenciados, de fazê-los falar, e sobretudo, fazê-los serem ouvidos, vistos, considerados. Os procedimentos aqui utilizados foram uma busca de captar a expressão das singularidades dos velhos aqui apresentados. Buscar belas velhices, é buscar cidadanias em exercício, pessoas empoderadas por seus direitos, vozes que.

(16) 14. tem necessidades que só poderão ser plenamente entendidas se ouvidas e analisadas. Para tal, o fizemos a partir da escolha de palavras-chaves que refletissem a perspectiva mais abrangente da pesquisa, ou seja, a velhice como possibilidade de ganhos, entre os quais experiência, prazer, alegria, energia vital, afetos, solidariedade.. As palavras-chave escolhidas foram velhice, corpo, cuidado e. consumo que nortearam as perguntas que se tornaram ponto de partida da ação da pesquisa. Perguntas definidas, era preciso delimitar o locus da pesquisa e, para tal, escolheu-se a observação dos lugares de socialização dos velhos relacionados com cuidados com o corpo, como estúdios de pilates, academias, salões de beleza e shopping centers, por exemplo. Depois disso, escolheu-se locais mais específicos, em que seria possível observar mais sistematicamente os sujeitos que seriam depois selecionados para participarem das pesquisas. Foram escolhidos dois estúdios de pilates – Espaço Salutte, localizado em Nova Parnamirim e Corpo & Saúde, localizado em Lagoa Nova; uma academia – Pique, localizada em Lagoa Nova, e posteriormente a Associação Riograndense Pró-idoso (ARPI) com o intuito de contemplar velhos que tiveram acesso de diferentes formas aos serviços de cuidado com o corpo. A partir de tais observações, encontrou-se diversos sujeitos que poderiam ter sido utilizados nessa pesquisa, mas a escolha se deu por sua acessibilidade maior, ou seja, foram escolhidos os velhos mais abertos a falarem sobre a velhice, que traziam nos momentos de observação de alguma forma as palavras-chave em conversas informais livres e que se mostraram dispostos a participar de nossa entrevista. Esse caminho foi um pouco diferente na ARPI, pois lá as velhas se voluntariaram e entrevistei todas, para não excluir ninguém que queria participar. Os entrevistados são: Lourdes, 73 anos; Nilze, 76 anos; Melo, 76 anos; Suzete, 69 anos; Gina, 60 anos; Eliane, 69 anos; Lúcia de Fátima 60 anos; Maria do Socorro, 71 anos; Damares, 87 anos; Ana, 77 anos; Ivanilda 69 anos. Assim, foram entrevistados 10 velhas e 1 velho. Apenas 1 devido ao fato dos lugares serem de presença predominantemente feminina e dos homens se mostrarem de fato menos acessíveis a nossa conversa. A amostra, embora pequena, é significativa, uma vez que reflete as diferentes dimensões e aspectos do objeto estudado, conforme o preconizado em uma pesquisa qualitativa e serve para auxiliar a reflexão sobre o tema. As entrevistas tiveram duração variada (entre 4 e 30 minutos), utilizou-se como instrumento um questionário semiestruturado com perguntas abertas.

(17) 15. (no capítulo 3, o período em que as entrevistas foram realizadas será apresentado mais detalhadamente). Utilizando mais uma vez o pensamento de Morin (1999), temos a analogia que o autor faz da aplicação dos princípios do pensamento complexo à nossa realidade social com o corpo humano, quando trata de fragmentos que contém o todo. O autor argumento que as células, sejam da pele, dos músculos ou os neurônios, embora tenham funções diferentes, possuem todas o mesmo núcleo de DNA, código genético responsável por determinar como se configura o ser como um todo, isto é, o todo encontra-se dentro de cada célula do próprio corpo. Com base nessa percepção do corpo e das células, Morin (1999) desenvolve seu princípio hologramático e explica que o holograma é uma imagem física projetada no espaço em três dimensões, o que produz uma sensação de cor e relevo onde cada ponto do holograma é memorizado pelo holograma como um todo. Em resumo: o todo está nas partes, que estão incluídas no todo, capacitando a parte a regenerar o todo. Isto posto, partindo da complexidade e do princípio do holograma de Morin, entendemos que a amostra dos 11 velhos é capaz de fornecer uma ideia significativa daquilo que é contemplado pelo todo. Depois de realizadas as entrevistas, foi necessário definir de que modo essas vozes seriam apresentadas para que fosse possível que cada voz fosse ouvida de fato. A intenção, ao apresentar essas vozes escritas aqui, é trazer à tona um novo olhar sobre a velhice e sobre o velho, ter escuta ativa de quem é sujeito de si e pode, deve e precisa de escuta para ter seus direitos de fato garantidos e respeitados. Tendo como base as considerações de Rockwell (1986) e todo o processo de construção da presente pesquisa, escolheu-se como método para análise dos dados colhidos: a etnografia, por sua capacidade de abordagem do fenômeno ou do processo particular sem excluir o processo da totalidade maior que o determina e com o qual se relaciona. Metodologicamente, isso implica na interpretação e explicação do contexto. para. complementar. as. informações. do. campo,. respeitando. a. multidimensionalidade da realidade. As descrições do comportamento humano que se originam das análises etnográficas requerem a compreensão dos significados locais. Rockwell (1991) caracteriza a etnografia por documentar o não documentado, ter uma descrição como produto de sua análise, a longa permanência do pesquisador no campo, a interpretação e a integração dos conhecimentos locais à descrição.

(18) 16. elaborada, a construção de conhecimentos que descrevem realidades particulares que se relacionem a inquietações teóricas mais gerais. Segundo ele: O etnógrafo observa e paralelamente interpreta. Seleciona do contexto o que há de significativo em relação à elaboração teórica que está realizando. Cria hipótese, realiza uma multiplicidade de análises, reinterpreta, formula novas hipóteses. Constrói o conteúdo dos conceitos iniciais, não o pressupondo. Ao deparar-se com o aparente "caos" da realidade, que costuma provocar de imediato juízos etnocêntricos, o pesquisador aprende a abandonar a formulação abstrata e demasiadamente precoce, pois é necessário "suspender o juízo" por um momento. Assim é possível construir um objeto que dê conta da organização peculiar do contexto, incluindo as categorias sociais que expressam relações entre os sujeitos. No duplo processo de observação e interpretação, abre-se a possibilidade de criar e enriquecer a teoria (Rockwell, 1986, p. 50).. Assim, temos as técnicas e as ferramentas de pesquisa aqui utilizadas: o olhar, a observação: documentada em diário de campo; a escuta, as entrevistas: documentadas pelo gravador, e a voz dos sujeitos entrevistados aqui apresentados de forma escrita por meio da análise etnográfica. O trabalho foi então dividido em três capítulos. O primeiro, apresenta os dados demográficos sobre a velhice na realidade local, traz uma discussão sobre as palavras que designam o velho e seus usos, inclusive políticos ao longo da história à luz dos conhecimentos teóricos desenvolvidos por Silva (2008) e Debert (1997, 1998, 2012), principalmente. O segundo capítulo trata do envelhecimento do corpo na sociedade atual de acordo com a perspectiva de Le Breton (2007), e das implicações para a autoimagem que os velhos constróem sobre si mesmos a partir do conceito de biopolíticas, biopoder e cuidado de si de Foucault (1998, 1999). No terceiro capítulo, de acordo com a ideia de Simone de Beauvoir (1990) de “conspiração do silêncio”, busca-se romper esse silêncio dando voz aos velhos, que de maneiras distintas encontraram o seu modelo de bela velhice, conceito cunhado pela autora e desenvolvido por Goldenberg (2013)..

(19) 17. 1 A VELHICE: UM DUELO ENTRE O VELHO E NOVO. “[...] a velhice, como todas as situações humanas, tem uma dimensão existencial: modifica a relação com o mundo e com sua própria história. Por outro lado, o homem nunca vive em estado natural: na sua velhice, como em qualquer idade, um estatuto lhe é imposto pela sociedade a qual pertence”. Simone de Beauvoir. 1.1 O ENVELHECIMENTO: ALGUNS DADOS DEMOGRÁFICOS. Fenômeno observado em todo mundo, em países com diferentes níveis de desenvolvimento, o envelhecimento populacional no século XXI é considerado uma das maiores conquistas culturais do ser humano em seu processo civilizatório por ser consequência das melhorias das condições de vida em sociedade. Essas melhoras abrangem os mais diversos aspectos da vida, desde condições alimentares, sanitárias, imunológicas, econômicas, educacionais, até as condições habitacionais, de qualidade de vida, cuidados com o corpo e avanços da medicina. Uma população é considerada em processo de envelhecimento quando o número de pessoas idosas se torna uma parcela proporcionalmente maior da população total. Isso ocorre devido ao declínio na taxa de fecundidade e ao aumento da longevidade. Segundo projeções feitas pela Organização das Nações Unidas (2012) no relatório “Envelhecimento no século XXI: celebração e desafio 2010-2015” temos que:. A cada segundo 2 pessoas celebram seu sexagésimo aniversário – em um total anual de quase 58 milhões de aniversários de 60 anos. Uma em cada 9 pessoas no mundo tem 60 anos de idade ou mais, e estima-se um crescimento para 1 em cada 5 por volta de 2050: o envelhecimento da população é um fenômeno que já não pode mais ser ignorado. (ONU, 2012, p. 3)..

(20) 18. No relatório, o Secretário-Geral da ONU1 destaca que “as implicações sociais e econômicas deste fenômeno são profundas, estendendo-se para muito além da pessoa do idoso e sua família imediata, alcançando a sociedade mais ampla e a comunidade global de forma sem precedentes” (ONU, 2012, p. 3). De acordo com os dados apresentados, a expectativa de vida ao nascer passou a ser de 78 anos nos países desenvolvidos e 68 anos nas regiões em desenvolvimento. As projeções apontam que até 2045-2050, os recém-nascidos podem esperar viver até os 83 anos nas regiões desenvolvidas e 74 nos países em desenvolvimento. O relatório também apresenta as diferenças regionais, que se mostram bastante acentuadas. No ano de 2012 apenas 6% da população da África era maior de 60 anos, na América Latina e Caribe esse número chega a 10%, na Ásia a 11%, na Oceania a 15%, na América do Norte a 19% e na Europa a 22%. As estimativas dizem que em 2050 a população maior de 60 anos será de 10% na África, 24% na Ásia e na Oceania, 25% na América Latina e Caribe, 27% na América do Norte e 34% na Europa. Isso quer dizer que em maior ou menor proporção o número de velhos vem crescendo em todas as regiões do mundo. Com relação ao sexo, é tendência mundial que as mulheres sejam maioria na população idosa. Pois em todo o mundo, para cada 100 mulheres com 60 anos ou mais existem 84 homens. Esse número é ainda menor quando tratamos de idosos longevos, ou seja, com 80 anos ou mais, para cada 100 mulheres nessa faixa etária existem 61 homens. Tal fenômeno se justifica porque o envelhecimento acontece de maneira diferente entre homens e mulheres, uma vez que as relações de gênero são responsáveis por estruturar todo o curso de vida. Ser homem ou mulher na sociedade ocasiona uma visão de vida diferente e um modo de vivenciar o processo de envelhecimento de forma única. No Brasil, a Coordenação Geral dos Direitos do Idoso, vinculada à Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, destaca esse cenário como a feminilização da velhice.. 1. Ban Ki-moon é o oitavo e atual secretário-geral da Organização das Nações Unidas, tendo sucedido ao ganês Kofi Annan em 2007..

(21) 19. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) 2,. a população com 60 anos ou mais superou o seu dobro em 10 anos. Em 1991 a. faixa etária alcançava o número de 10,7 milhões de pessoas, entre 2009 e 2011 houve um aumento de 7,6% o que contabiliza 1,8 milhões de pessoas a mais. O número chega aos 23,5 milhões de pessoas no país atualmente. Já no que diz respeito ao número de crianças de até 4 anos houve um declínio, os 16,3 milhões passaram a ser 13,3 milhões entre 2000 e 2011. Segundo o último censo do Brasil, o coletivo idoso é formado em sua maioria por mulheres (55,7%), brancos (54,5%), moradores de áreas urbanas (84,3%) e correspondem a 12,6% da população total do país considerando a participação relativa das pessoas com 60 anos ou mais. Em relação ao aumento do envelhecimento populacional, os países desenvolvidos demonstram notória diferença de comportamento em relação aos países em desenvolvimento. Enquanto nos primeiros a mudança se deu de forma gradual e lenta ao longo de 2 séculos, nos países em desenvolvimento a expectativa de vida aumentou mais de 20 anos em 5 décadas. De acordo com dados do IBGE, passou de 40 anos nos anos 1940 para 62 anos nos anos 1990. As estatísticas do IBGE para a população do Rio Grande do Norte apresentadas no Censo de 2011 mostram um crescimento de 52,7% no número de pessoas idosas entre 2001 e 2011 e uma redução de 21,3% na quantidade de crianças na faixa etária de 0 a 4 anos. Em Natal, local da realização da presente pesquisa, a população idosa em 20103 totalizava 97.764 pessoas, em torno de 12% da população total de 803.739 habitantes. Dos 97.764 idosos, 59.784 são mulheres, ou seja, 61,1% do total. São 37.980 mulheres a mais que homens. Esse dado comprova que a feminilização da velhice também ocorre na cidade e é um dos fatores que faz com que as mulheres sejam a maioria nos espaços escolhidos para a realização desta pesquisa. De acordo com Salgado (2002) a feminilização da velhice é decorrente da desigualdade de gênero na expectativa de vida. As mulheres vivem, em média, sete anos a mais que os homens e estão vivendo cada vez mais. Outro ponto observado pela autora é que existe nessa faixa etária da população uma proporção maior de viúvas que em qualquer outra faixa. 2 BRASIL. Dados sobre envelhecimento no Brasil. Secretaria de Direitos Humanos. Disponível em: <http://www.sdh.gov.br/assuntos/pessoa-idosa/dados-estatisticos/DadossobreoenvelhecimentonoBrasil.pdf>. Acesso em março/2015. 3 Ano do último censo do IBGE..

(22) 20. etária. Isso poderia ser explicado pelo fato de que há certa tradição de que as mulheres se casem com homens mais velhos do que elas, junte-se a isso a taxa de mortalidade masculina ser maior que a feminina como um fator que aumenta a probabilidade de sobrevivência da mulhere em relação ao seu parceiro. Outra explicação para que o número de viúvas seja maior que o de viúvos é que os homens tendem a voltar a se casar mais que as mulheres e essa mesma situação se estende para os casos de divórcio. O envelhecimento populacional é consequência da chamada transição demográfica, isto é, o declínio das taxas de fecundidade e mortalidade da população. Ocorreu uma queda na taxa de mortalidade infantil, responsável pela expansão da base da pirâmide etária e consequente rejuvenescimento populacional, seguido de redução da fecundidade devido a mudanças diversas no padrão familiar e no papel da mulher na sociedade, o que causou progressiva dimuinição da base da pirâmide, tornando grupos etários mais velhos proporcionalmente mais numerosos que o resto da população. Alie-se a isso, o aumento da longevidade em idades avançadas e fechamos o quadro que contribui para as mudanças aqui apresentadas no padrão de faixas etárias da população mundial. A figura a seguir mostra a evolução da população de pessoas maiores de 60 anos no Brasil nos anos 2000, 2030, 2060 e 2100.. A observação dessas análises e projeções demográficas é um dos fatores responsáveis por tornar a velhice tema de estudos, de mudanças políticas e sociais.

(23) 21. que transformam o modo como esse sujeito que envelhece é visto nas sociedades ocidentais; e que também modifica subjetivamente os sujeitos que passam a pensar em maior ou menor grau na própria velhice.. 1.2 CONCEITUANDO VELHICE. Como pesquisadora do envelhecimento, desde a graduação me deparei com as mais diversas nomenclaturas para o termo velho. Senescente, idoso, terceira idade, melhor idade e maturidade são termos que permeiam o universo da velhice. Velho e velhice são termos tidos como depreciativos, uma vez que estão historicamente associados à decreptude e morte. O uso de outros termos é uma tentativa de minimizar a carga negativa que as palavras velho e velhice carregam. No entanto, há a postura política no uso ou não uso desses termos. Terceira idade denota pessoas que mantêm uma velhice ativa do ponto de vista mental, cognitivo, físico e do consumo, por exemplo. A partir de uma análise simplista, todas as palavras apresentadas poderiam ser consideradas sinônimas. Contudo, existe muito mais por trás da escolha teórica do uso dessas palavras nos estudos sobre o envelhecimento. Costa (1998) afirma que desde o início de seus estudos sobre o tema percebeu diferentes empregos para os diversos vocábulos relacionados ao envelhecimento e ao velho e que em um determinado momento achou necessário definir, sobretudo para si mesma, esse campo terminológico controverso. Assim a autora define que:. Envelhecimento é para diversos autores, com os quais concordo, um processo evolutivo, um ato contínuo, isto é, sem interrupção, que acontece a partir do nascimento do indivíduo até o momento de sua morte. Envelhecer é marcha natural pela qual todo ser humano obrigatoriamente passa; é o processo constante de transformação. Uma pessoa poderá vir a falecer com 5, 18, 40 anos e mesmo assim, terá envelhecido durante os anos em que viveu (COSTA, 1998, p. 26).. A definição também abarca o termo velhice como “o estado de ser velho”, “o produto do envelhecimento, o resultado do processo de envelhecer”. Mas destaca a complexidade de sua designação devido a sua relatividade de pessoa para pessoa, dependendo do contexto. Ela diferencia a velhice patológica da velhice normal e assim.

(24) 22. classifica a velhice normal como senescência e a velhice patológica como senilidade (COSTA, 1998). Nessa perspectiva, o uso do termo velho deve ser dissociado de palavras que trazem uma conotação negativa como enfraquecimento, incapacidade, caduquice, perdas, limitações, ou até mesmo, do termo doença. Veras e Caldas (2004) enfatizam que no final dos anos 1980 o movimento de valorização do idoso se intensificou em razão das análises demográficas a respeito do envelhecimento populacional nas mais variadas áreas do conhecimento. A partir da obra de Simone de Beauvoir (1970), “A velhice” e no Brasil, das obras de Eneida Haddad (1986), “A ideologia da velhice” e de Ecléa Bosi (1987), “Memória e sociedade: Lembranças de velhos” passou-se a discutir a perda do valor social da pessoa idosa causada pelo capitalismo e sua evolução, tornando-a descartável para um sistema que prioriza a capacidade produtiva em detrimento de outros aspectos humanos. O. envelhecimento. é. um. conceito. multidimensional. e. determinado. socialmente, tanto no que diz respeito aos fatores econômicos quanto ao plano do simbólico, na percepção coletiva sobre envelhecer. Junto com a idade cronológica, os fatores biopsicossociais são imprescindíveis para a definição do processo de envelhecimento populacional. Papaléo Netto e Borgonovi (2000) afirmam que o envelhecimento se caracteriza como um processo dinâmico e progressivo em que ocorrem alterações bioquímicas, morfológicas, funcionais e psicológicas. Tais alterações levam à perda da capacidade de adaptação do indivíduo ao meio ambiente, o que provoca maior vulnerabilidade e incidência de doenças que podem levar à morte. Inicia-se no final da segunda década da vida e é imperceptível até o final da terceira década, quando ocorrem as primeiras alterações funcionais e estruturais provenientes do envelhecimento. No entanto, não há um consenso sobre quando se inicia a fase da velhice. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), 65 anos é o limite inicial dessa fase, já para a Organização das Nações Unidas (ONU) os 60 anos são considerados o marco inicial para essa fase da vida. Para Neri (1991), “idades funcionam como ‘relógios sociais’, estabelecendo agendas para o tempo e o ritmo esperados” (NERI, 1991, p. 79). Neri e Wagner (1985) consideram a velhice como um “estado de espírito” que é condicionado aos mais variados fatores, como a personalidade, por exemplo..

(25) 23. A classificação de um indivíduo como idoso não deve limitar-se a idade cronológica, é preciso levar em conta aspectos biológicos, sociais e psicológicos que não coincidem necessariamente com a idade cronológica. Para Silva (2003), o entendimento dessas diferenças entre as idades é importante para a compreensão das múltiplas dimensões que compõem a velhice. Duarte (1999) corrobora ao afirmar que: Cronologicamente, devemos considerar antes de tudo que os calendários são diversificados e a idade cronológica é adotada de maneira também distinta, conforme a sociedade considerada. Em nosso caso a utilização do calendário greco-romano dá a cada um e à nossa sociedade a idade própria da civilização euroamericana. Seria diverso se pertencêssemos à cultura egípcia, terena ou fenícia. (DUARTE, 1999, p. 38).. Somos marcados cronologicamente pela cultura na qual estamos inseridos e as influências dessa cultura são fundamentais para a forma como envelhecemos. No Brasil, consideram-se como idosas pessoas a partir dos 60 anos, de acordo com o corte definido pela OMS para países subdesenvolvidos ou em vias de desenvolvimento. Essa também é a idade considerada pelo Estatuto do Idoso em seu artigo 1º. A idade biológica refere-se aos aspectos ligados às transformações físicas e biológicas e pode se diferenciar de indivíduo para indivíduo dentro de uma mesma sociedade. Aragó (1995 apud DUARTE, 1999) argumenta que:. Não se pode centrar nesta faceta biológica a noção de senectude, apesar do declive biológico ser real e em certa medida irreversível. Portanto, não existe momento algum em que o crescimento psicológico do indivíduo deva cessar. O desenvolvimento psicológico pode conservar uma real independência no que tange à irreversibilidade do processo biológico. Assim, o fator biológico terá maior ou menor peso conforme seja a personalidade do indivíduo (1995 apud DUARTE, 1999, p. 42).. A idade psicológica relaciona-se às modificações afetivas e cognitivas que ocorrem ao longo do tempo. Se a capacidade de reserva do sistema nervoso não for comprometida por nenhuma demência, esse potencial continua mesmo na velhice. O que significa que existe um grande potencial latente para o rendimento intelectual na velhice (SILVA, 2003). Já o aspecto da idade social:. Designa papéis que se pode, se deve, se pretende e se deseja que venham a desempenhar na sociedade. Determinados papéis sociais podem entrar em.

(26) 24. conflito com aspectos arbitrários da idade cronológica. Este conflito entre as idades social, psicológica e cronológica constitui uma forma de dissonância, sobretudo quando se faz referência ao item isolamento social do idoso, podendo ser ocasionado muitas vezes, por exemplo, pela aposentadoria ou morte de parentes, antecipando assim a morte social frente à biológica (MISHARA e RIEDEL 1995 apud DUARTE, 1999, p. 43).. Beauvoir (1970) discorre sobre o fenômeno da exclusão do coletivo idoso como sendo global e local, global no que tange a busca do seu entendimento e local à medida que varia de uma observação relativizada das culturas que o concebem. Ela atenta também para as diferenças de gênero, ressaltando que a velhice tem sentido e consequências diferentes para homens e mulheres. Salgado (2002) ressalta que as leis e políticas sociais voltadas para esse público sofrem influências da gerofobia e do sexismo que permeiam nossa sociedade dando ênfase a produtividade, ao atrativo sexual e físico que não se mantém nas pessoas com idade avançada. Assim, a mulher velha é encarada por sua carga negativa e tem suas necessidades emocionais, econômicas e físicas negligenciadas pela maioria. Ao longo da história, as representações sociais sobre a velhice estão diretamente relacionadas aos níveis de relações entre pessoas idosas e os interesses da coletividade, ou seja, é o sistema global de valores que as pessoas possuem. A autora apresenta dois sentidos para a palavra velhice: É uma certa categoria social, mais ou menos valorizada segundo as circunstâncias. É, para cada indivíduo, um destino singular – o seu próprio. O primeiro ponto de vista é a dos legisladores, dos moralistas; o segundo, o dos poetas; quase sempre, eles se opõem radicalmente um ao outro. [...] Os ideólogos [referindo-se aos primeiros] forjam concepções da velhice de acordo com os interesses de sua classe (BEAUVOIR, 1970, p. 109).. Beauvoir (1970) justifica a escrita da obra “A velhice” como uma tentativa de quebrar “a conspiração do silêncio”. A velhice é frequentemente negada das mais variadas formas: “Nada deveria ser mais esperado e, no entanto, nada é mais imprevisto que a velhice” (BEAUVOIR, 1970, p. 11). A autora afirma que quanto às pessoas idosas, a sociedade é criminosa; pois trata seus velhos como párias e não os considera como homens. Até quando nos tornemos velhos e muitas vezes mesmo quando já o somos, a velhice é sempre tratada como uma coisa que só concerne aos outros. E reitera que “se lhes ouvíssemos a voz, seríamos obrigados a reconhecer que é uma voz humana” (BEAUVOIR, 1970, p. 9). Essa voz, poucas vezes é ouvida quando se trata dos estudos sobre o envelhecimento. Anos após os dizeres de Beauvoir (1970), numa sociedade em que.

(27) 25. seus indivíduos estão cada vez mais velhos, ainda se faz necessário quebrar “a conspiração do silêncio” e dar voz a esses sujeitos. O trabalho aqui apresentado é uma tentativa de quebrar essa conspiração do silêncio, numa busca por saber como esse velho se vê na sociedade contemporânea, ainda que no universo de uma amostra de pesquisa qualitativa que é limitado, embora significativo. A velhice é uma categoria social e um destino do indivíduo, conceituar a velhice é difícil devido ao fato de o declínio do ser humano ter seu significado variado de sociedade para sociedade. As relações de produção na sociedade industrial é um dos fatores que orientam as posturas sociais com relação à pessoa idosa causando a sua desvalorização social e até sua rejeição (BOSI, 2001). Para Featherstone (1998) hodiernamente vem acontecendo um processo de descontrução da velhice enquanto categoria, através do igualamento entre velhos e adultos jovens e isso ocorre em dois sentidos. Um é o de que ambos podem ser acometidos por doenças, o outro é através do surgimento de uma imagem mais positiva dos velhos nas sociedades ocidentais. Desse modo, a gerontologia muda o foco da velhice enquanto problema social tornando-a objeto do discurso científico, colocando em evidencia as múltiplas dimensões do processo de envelhecimento, desde o desgaste fisiológico e o prolongamento da vida até o desequilíbrio demográfico e os custos financeiros das políticas sociais (DEBERT, 1998). Beauvoir (1970) afirma que a compreensão da condição dos velhos não pode levar apenas a um contentamento com a reivindicação de uma política da velhice mais generosa, que abarque o aumento das pensões, habitações sadias e lazeres organizados, pois o que está em jogo é o sistema e o que deve ser reivindicado é uma mudança da vida. Desde a publicação da obra de Simone de Beauvoir (1970), houve mudanças na percepção social da velhice, bem como certa valorização e reconhecimento do valor e da posição do velho, ao menos no que tange ao consumo; através da adoção de um estilo de vida que privilegia a manutenção da atividade física e mental em busca do controle corporal. No entanto, ainda temos significativo número de idosos doentes, abandonados, pobres, solitários e sem acesso à assistência social e assistência à saúde de qualidade. Pois, as desigualdades ainda são fortes e as políticas públicas vigentes estão longe de conseguir superá-las..

(28) 26. 1.3 ALGUNS ASPECTOS SOCIAIS DA VELHICE. Um dos maiores desafios que o envelhecimento populacional traz à realidade social diz respeito à associação que se faz entre velhice e doença. Sobretudo pela necessidade de que se compreenda que limitações e incapacidades não são problemas exclusivos dos velhos. Já que nas demais etapas de vida, também existem pessoas com dificuldades devido às mais variadas condições. Desse modo, a velhice não está diretamente relacionada com limitação ou deficiência e é preciso que se desassocie essa etapa de vida dos estereótipos negativos que alteram a auto percepção do próprio velho enquanto incapaz. Sobre isso Beauvoir (1970) afirma que “a doença é um acidente; a velhice é a própria lei da vida” (BEAUVOIR, 1970, p. 37). É claro que o aspecto biológico do envelhecimento traz limitações físicas, cognitivas e até emocionais, mas essas limitações não os tornam incapazes da realização de tarefas. A autora coloca que:. Há uma relação de reciprocidade entre velhice e doença; esta última acelera a senilidade e a idade avançada predispõe a perturbações patológicas, particularmente os processos degenerativos que a caracterizam. É muito raro encontrar o que poderíamos chamar de “velhice em estado puro”. As pessoas idosas são acometidas de uma polipatologia crônica (BEAUVOIR, 1970, p. 37).. Cabe ressaltar que essas polipatologias carcterísticas da velhice são frutos do estilo de vida adotados ao longo de todo curso de vida. De acordo com Veloz, Schulze e Camargo (1999), apesar do envelhecimento populacional constituir umas das maiores conquistas do homem neste século, as sociedades não se prepararam para as consequências dessa mudança demográfica. Apreciam valores como autonomia funcional, capacidade para o trabalho, independência e competitividade em detrimento da nova realidade que se aproxima. Somos uma sociedade que está envelhecendo, Oliveira (2002) destaca que esses valores e a neurose por velocidade da atual sociedade é incompatível com o ritmo mais lento da pessoa idosa, sendo sua contribuição social deixada em segundo plano. Para Pinheiro Junior (2003), a categoria “idoso” representa para a sociedade sinônimo de gastos e complicações, principalmente nos setores de previdência e.

(29) 27. saúde pública. Apesar da grande evolução tecnológica e social ainda existem muitos problemas que dizem respeito ao envelhecimento. Silva (2003) acrescenta que,. A condição de velho na atualidade não tem revelado grandes alterações dos tempos remotos (...) a urbanização e a industrialização acentuaram as desigualdades que, associadas aos preconceitos e estigmas, vêm demonstrando que as experiências acumuladas durante a vida não estão sendo aceitas pelos mais jovens (SILVA, 2003, p. 110).. Nessa perspectiva, para que os fatores negativos da velhice sejam superados ou amenizados é fundamental reconhecer o novo papel social da pessoa idosa, como esse papel foi desempenhado ao longo da sua trajetória de vida e qual é a representação desse sujeito na sociedade atual (SILVA, 2003). O papel da pessoa idosa tanto é determinado por costumes e ações provenientes da cultura quanto do contexto histórico no qual está inserido. De acordo com Ferrigno (2006), a função social do idoso foi culturalmente formada através do estabelecimento de valores morais e expectativas de conduta. Bazo (1996) afirma ainda que a velhice é um processo de evolução do nascimento à morte e que por ser uma construção reveste-se de valores. Todavia, enfatiza que o mais comum é que o valor atribuído à velhice apresente aspectos negativos como incapacidade, fragilidade e até inadequação da pessoa idosa à sociedade. A cultura da valorização do novo predomina na sociedade atual, como consequência há a desvalorização do velho e da sua experiência acumulada ao longo da trajetória da sua vida. Os papéis sociais vivenciados pelo velho em sua juventude e na fase adulta vão aos poucos sendo apagados ou desconsiderados de sua existência. Assim, esse novo/velho sujeito precisa descobrir novas maneiras de se posicionar no mundo atual enquanto velho. Souza et al (2002) acrescenta o papel da imprensa na construção das representações sociais sobre o coletivo idoso como fomentadora da formação da opinião pública sobre tal realidade. Muitas vezes a exclusão é institucionalizada, pois que o outro é visto a partir da exposição pública de sua identidade e a imprensa poderia ter uma postura positiva com relação a pessoa idosa, fazendo-o ser reconhecido como produtivo, capaz, experiente, sem deixar de lado suas necessidades especiais específicas e ressaltando a importância do respeito ao velho enquanto pessoa e cidadão. Mazza e Lefevre (2005) reiteram que a preocupação com.

(30) 28. a velhice percorre toda a história da civilização. O avanço da idade promove alterações estruturais e funcionais nos indivíduos, no entanto, essas mudanças são próprias do processo de envelhecimento considerado normal, podendo variar de acordo com as características particulares a cada um. Ramos (2000) afirma que ao se tornar consciente sobre o seu envelhecimento a pessoa idosa passa a direcionar seus objetivos de vida em função das alterações biológicas, sociais e emocionais. Apesar de este processo ser diferente de pessoa para pessoa, há um consenso que considera vantajoso vivenciar esta etapa da vida de maneira positiva e priorizando a qualidade de vida. Esse é o novo velho que se pretende ter: consciente de seu processo de envelhecimento, que busca manter-se saudável, ativo, com laços sociais sempre renovados seja com pessoas que já eram de seu ciclo, seja com pessoas que começam a fazer parte de seu ciclo. O ideal é que esses direcionamentos dos objetivos de vida não comecem apenas na velhice, mas que faça parte de todo o curso da vida. Ao nos tornamos conscientes de que não podemos escapar ao processo de envelhecimento podemos encará-lo de forma positiva, aceitando-o e nos preparando para a velhice em busca de uma maior qualidade de vida. Néri e Cachioni (1999) consideram a velhice e o envelhecimento como realidades heterogêneas que variam conforme os tempos históricos, as culturas, a classe social, o nível educacional, o estilo de vida, a história pessoal, o gênero, a profissão, a etnia, dentre outros fatores. Diversos estudos buscam compreender como se constituiu o bom envelhecer observando os padrões diferenciados de envelhecimento e os determinantes da longevidade com qualidade de vida. A partir disso, surgem classificações sobre o padrão de velhice, embora possuam limitações. Um dos modelos classificatórios considera como velhice normal a que se caracteriza por perdas e alterações biológicas, psicológicas e sociais que são próprias da velhice, mas não chegam a ser patológicas. A velhice ótima ocorreria quando se tem a possibilidade de sustentar um padrão comparável ao de indivíduos jovens e a velhice patológica diria respeito à presença de síndromes típicas da velhice, como Parkinson ou Alzheimer, ou do agravamento de doenças já existentes como diabetes e hipertensão (BALTES, 1990 apud NÉRI e CACHIONI, 1999). De acordo com outro modelo classificatório, a velhice pode ser primária ou normal quando ocorrem mudanças. consideradas. progressivas,. irreversíveis. e. universais,. mas. não.

(31) 29. patológicas. O envelhecimento secundário ocorre quando mudanças causadas por doenças relacionadas à idade por fatores intrínsecos e extrínsecos; e o envelhecimento terciário corresponderia ao declínio terminal na velhice em processo avançado (ASSIS, 2005). A saúde é uma das questões mais relevantes sobre o envelhecimento, aparece como fator preponderante devido ao seu forte impacto sobre a qualidade de vida e constitui um dos mais fortes estigmas e preconceitos com relação à velhice. Pois, há uma representação social negativa baseada no declínio biológico, na possibilidade de doenças e dificuldades funcionais com o aumento da longevidade (ASSIS, 2005). No entanto, o declínio fisiológico que ocorre na velhice não é fator determinante de doenças e incapacidade, uma vez que o organismo trabalha com reservas e superávit. O controle de problemas de saúde comuns nessa fase da vida pode se dá através de uma assistência adequada que permita ao idoso conviver com as possíveis doenças e limitações, tendo preservada sua perspectiva de vida pessoal e social (LAZEATA, 1994 apud ASSIS, 2005). A atenção para as questões de saúde no envelhecimento tem crescido nas últimas décadas em virtude do já citado aumento da longevidade da população mundial. Em todo o mundo, especialmente nos países periféricos marcados por acentuada pobreza e desigualdades, a busca de qualidade de vida dos idosos emerge como um desafio. Já que é através de um envelhecimento com qualidade que se poderá considerar vantajoso o aumento na expectativa de vida, tornando-se assim, uma conquista humana e social e não um problema (ASSIS, 2005). O conceito de promoção à saúde é um novo paradigma para as políticas de saúde pública, uma vez que desvia o foco de atenção do controle de doenças e dá uma dimensão positiva da saúde. Ter qualidade de vida na velhice converge com esse ideal de promoção a saúde, considerada uma estratégia mais apropriada para o enfrentamento dos problemas de saúde no mundo (TERRIS, 1996). No final dos anos 1990, a Organização Mundial de Saúde (OMS) deixou de usar o termo “envelhecimento saudável” e passou a usar o termo “envelhecimento ativo” como o conceito para o processo de otimização de oportunidades de saúde, participação e segurança objetivando a melhoria da qualidade de vida, conforme as pessoas ficam mais velhas. Vale ressaltar que a palavra “ativo” não diz respeito apenas a capacidade de estar fisicamente ativo ou de contribuir com a força de.

(32) 30. trabalho, mas também com a capacidade de participação contínua em questões sociais, econômicas, culturais, espirituais e civis. O envelhecimento ativo é considerado um elemento indispensável em todos os programas de desenvolvimento (KALACHE E KICKBUSCH, 1997 apud WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2005). A OMS enfatiza ainda que saúde se refere ao bem-estar físico, mental e social. Desse modo, as políticas e programas de promoção à saúde mental e promoção das relações sociais são tão importantes quanto às políticas que visam à melhoria das condições físicas de saúde. O envelhecimento ativo envolve políticas públicas que promovam modos de viver mais saudáveis em todas as etapas da vida e baseiam-se nos direitos, necessidades, preferências e habilidades do idoso. O que inclui uma perspectiva do curso de vida que reconheça a importância das experiências pregressas e do estilo de vida desde a mais tenra idade, na forma como as pessoas envelhecem (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2005).. 1.4 VELHICE OU TERCEIRA IDADE?. Em seu artigo “A invenção da terceira idade e a rearticulação de formas de consumo e demandas políticas”, Debert (1997) explica que pesquisas recentes não conseguem fazer uma revisão das concepções da velhice em períodos históricos distantes, devido à precariedade dos dados disponíveis. De acordo com a autora, etnografias sobre a experiência do envelhecimento em sociedades primitivas apontam que nesse contexto social a solidão não faz parte da experiência de envelhecer. No entanto, não é o suficiente para se afirmar que nessas sociedades a experiência do envelhecimento seja algo gratificante para todos os velhos, pois isso irá depender das posições de poder e prestígio ocupado pelas pessoas ao longo da vida. Silva (2008) atrela o surgimento da velhice, enquanto uma etapa de vida delimitada, ao processo de modernização das sociedades ocidentais. Assim tem-se que as transformações históricas intrínsecas ao processo de modernização atingiram a periodização da vida, diferenciando suas etapas e a sensibilidade que passou a caracterizar cada uma delas provocando mudanças constitucionais da própria compreensão do curso da vida como uma instituição social relevante (DEBERT,.

(33) 31. 2012). Houve um período de transição de uma cultura em que a forma de organização não atribuía função relevante à idade cronológica, para uma cultura cuja idade passou a ser um fator fundamental para a distinção social, ganhando destaque enquanto categoria e enquanto modelo de identidade para os sujeitos. Nesse processo, a transformação das idades é um mecanismo privilegiado na criação de atores políticos e na definição de novos mercados de consumo (DEBERT, 2012). A institucionalização das aposentadorias é outro ponto fundamental para tornar o velho um ator social, que entra no cerne das discussões políticas e sociais. A geriatria com seu interesse sobre o corpo velho e a gerontologia com seus estudos sobre os aspectos sociais da velhice surgem como saberes emergentes que determinam o envelhecimento como categoria social. Katz (1995, apud SILVA, 2008) afirma que a geriatria só viria a se firmar como saber científico e como especialidade médica no século XX, mas identifica um “discurso sobre a senescência” como sendo um saber pré-geriátrico. Em sua obra “O nascimento da clínica”, Foucault (1998) remonta as transformações ocorridas na Medicina nos séculos XVIII e XIX e Katz (1995) por sua vez se utiliza dessa perspectiva de Foucault ao indicar a surgimento de uma forma de compreensão da doença que tem o corpo como objeto do saber médico e como sede das transformações que caracterizam a patologia e determinam o corpo envelhecido. Paulatinamente, a velhice é entendida como um estado fisiológico específico, a senescência. Surgem discursos que reconhecem o corpo envelhecido e o identificam como um corpo em decomposição. No período renascentista, a morte era entendida como um obstáculo a ser superado e a longevidade, sobretudo dos centenários, era tida como um evento mágico e revelador da racionalidade própria do corpo humano. Os estudos sobre velhice, longevidade e morte partiam de um entendimento médico-filosófico. Com o advento da Medicina moderna, os estudos sobre velhice e envelhecimento passam a ser considerados como problemas clínicos, certezas biológicas e processos invariáveis. A morte é tida como consequência de doenças específicas da velhice e a longevidade como detentora de limites biológicos insuperáveis (SILVA, 2008). A velhice passa a ser considerada uma etapa necessária da vida em que o corpo se degenera; é desse discurso sobre senescência que surge a geriatria por volta de 1910, como um saber médico que tem o corpo velho como objeto de estudo e que.

(34) 32. tem como marco teórico o trabalho do médico Ignatz Nascher, fisiologista que pioneiramente estabeleceu as bases clínicas para a identificação da velhice. A partir desse momento, a velhice é instituída como etapa de vida identificada segundo o saber médico (SILVA, 2008). Para além da distinção da velhice como etapa de vida, a geriatria também é responsável pela sua definição como decadência física, produzindo assim a identificação entre velhice e doença (LASLETT, 1991 apud SILVA, 2008). A metáfora médica da velhice não definiu apenas o envelhecimento físico por sua acentuada influência social, também definiu as representações sobre a experiência de envelhecer. Esse discurso perpassa os discursos do Estado, as políticas de assistência e a formação de outras disciplinas, por exemplo, a gerontologia. Esse campo como disciplina especializada tem um surgimento mais complexo e mais difuso que o da geriatria, seu nome foi criado por Elie Metchnikoff em 1913 e se limitava ao campo das intervenções médicas que prolongassem a vida (SILVA, 2008). Com o passar dos anos, durante o século XX, influenciada pela demografia e pelas ciências sociais, a gerontologia se estabelece como disciplina científica e área de saber multidisciplinar; e recebe grande influência da psicologia e da sociologia ao direcionar o olhar para os aspectos psicossociais da velhice. Assim, a gerontologia surge como uma disciplina especializada, capaz de dar novos aspectos à categoria velhice. Para além do corpo envelhecido, os hábitos, as práticas, as necessidades sociais e psicológicas dos velhos passam a ser alvo desse saber que torna mais complexa a definição de velhice (SILVA, 2008). Durante a segunda metade do século XIX na França, a velhice entra na roda de discussão dos legisladores sociais. Assim surge a institucionalização das aposentadorias e a especialização progressiva de determinados hospícios em asilos para velhos, frutos do processo de industrialização e do envelhecimento da primeira leva de operários (SILVA, 2008). Nesse processo, a velhice dos trabalhadores foi assimilada à invalidez e a incapacidade de produzir e passou a ser confundida com todas as formas de invalidez que atingiam a classe trabalhadora, sendo utilizada para identificar todos os trabalhadores que, ao fim da vida, não estão mais aptos para o trabalho. Nesse contexto, a aposentadoria é uma estratégia para assegurar aos patrões a manutenção da disciplina e da rentabilidade dos trabalhadores. Já para Lenoir (1979.

Referências

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