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Domenico Scarlatti ao piano : estudo interpretativo e implicações sobre autenticidade

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE ARTES

ANDRÉ LEME PÉDICO

DOMENICO SCARLATTI AO PIANO: ESTUDO INTERPRETATIVO E IMPLICAÇÕES SOBRE AUTENTICIDADE

CAMPINAS 2016

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ANDRÉ LEME PÉDICO

DOMENICO SCARLATTI AO PIANO: ESTUDO INTERPRETATIVO E IMPLICAÇÕES SOBRE AUTENTICIDADE

Tese apresentada ao Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Doutor em Música, na área de concentração Música: Teoria, Criação e Prática.

ORIENTADORA: MARIA JOSÉ DIAS CARRASQUEIRA DE MORAES

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELO

ALUNO ANDRÉ LEME PÉDICO, E ORIENTADO PELA

PROFA. DRA. MARIA JOSÉ DIAS CARRASQUEIRA DE MORAES

CAMPINAS

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BANCA EXAMINADORA DA DEFESA DE DOUTORADO

ANDRÉ LEME PÉDICO

ORIENTADOR(A): PROFA. DRA. MARIA JOSÉ DIAS CARRASQUEIRA DE MORAES

MEMBROS:

1. PROFA. DRA. MARIA JOSÉ DIAS CARRASQUEIRA DE MORAES 2. PROF(A). DR(A). ADRIANA GIAROLA KAYAMA

3. PROF(A). DR(A). ANGELO JOSÉ FERNANDES 4. PROF(A) DR(A.) SONIA RUBINSKY

5. PROF(A) DR(A). MARCELO MORAES REGO FAGERLANDE

Programa de Pós-Graduação em Música na área de concentração: Música: Teoria, Criação e Prática do Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas.

A ata de defesa com as respectivas assinaturas dos membros da banca encontra-se no processo de vida acadêmica do aluno.

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AGRADECIMENTOS

À minha orientadora Maria José, por sua confiança, atenção e grande cuidado durante o trabalho de elaboração desta pesquisa e preparação para os recitais.

Aos funcionários da pós-graduação do Instituto de Artes da Unicamp pelo rápido atendimento das minhas questões e dúvidas.

Aos membros da banca examinadora, por suas preciosas observações durante a defesa e pela atenção na leitura deste trabalho.

A Júlia Tygel, Barthold Kuijken, Livia Lanfranchi, Alessandro Santoro, Rosana Lanzelotte e Pedro Persone, por sua atenção.

Ao grande mestre e amigo Silvio Baroni, pelo inestimável apoio e pela constante parceria na minha vida musical.

À Orquestra de Câmara L´Estro Armonico, pela parceria na realização do recital final.

À minha família e amigos, pelo apoio no desenvolvimento deste trabalho. Ao Pedro, pelo companheirismo, afeto, paciência e incentivo.

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e no salão de música ficaram Domenico Scarlatti e o Padre Bartolomeu de Gusmão. O italiano dedilhou o cravo, primeiro sem destino, depois como se estivesse à

procura de um tema ou quisesse emendar os ecos, e de repente pareceu fechado dentro da música que tocava, corriam-lhe as mãos como uma barca florida na corrente, demorada aqui e além pelos ramos que das margens se inclinam, logo velocíssima, depois pairando nas águas dilatadas de um lago profundo, baía luminosa de Nápoles, secretos e sonoros canais de Veneza, luz refulgente e nova do Tejo.

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RESUMO

A obra para teclado de Domenico Scarlatti (1685-1757), constituída por cerca de 550 sonatas, tem sido objeto de permanente interesse entre pianistas e cravistas. Contudo, esse repertório tem recebido pouca investigação musicológica, em parte pela escassa documentação histórica referente ao compositor, e, em parte, pela dificuldade na compreensão estilística de suas sonatas. Além disso, Scarlatti deixou pouquíssimas indicações interpretativas em seus textos, fazendo com que seus intérpretes tomem decisões de execução de maneira bastante especulativa. Considerando esse panorama, este trabalho apresenta um estudo interpretativo para cinco sonatas de Scarlatti ao piano. Busca-se, principalmente, uma melhor compreensão da linguagem do compositor, a fim de embasar uma performance coerente com a complexa gama estilística e com a desenvolvida escrita tecladística identificadas nesse repertório. Adicionalmente, nota-se que Scarlatti jamais teve contato com o piano contemporâneo, o que nos leva a investigar a adequabilidade das ferramentas expressivas desse instrumento em face das particularidades estéticas de sua obra. A fim de englobar os diversos campos de pesquisa pertinentes a esta investigação, estruturamos esta tese em cinco capítulos. No primeiro deles, descrevemos alguns fatos biográficos referentes ao compositor, sua possível relação com os primeiros fortepianos e aspectos da disseminação de sua obra entre os pianistas, a partir do século 19. No segundo capítulo, empreendemos um estudo estilístico e elencamos possíveis referenciais interpretativos para essas sonatas, advindos tanto de documentos históricos quanto de investigações musicológicas recentes. No terceiro capítulo, apresentamos alguns elementos referentes à fisicalidade exigida dos intérpretes na performance dessas obras, relacionando-os a aspectos da técnica pianística moderna e ao idiomático do piano. No quarto capítulo, situamos nossa abordagem em face das discussões contemporâneas sobre a autenticidade na performance musical, notadamente no caso de obras musicais interpretadas em instrumentos distintos daqueles para os quais foram compostas. O quinto capítulo, cerne desta tese, apresenta um estudo interpretativo para cinco sonatas de Scarlatti, considerando os aspectos estilísticos, performativos, estéticos e instrumentais investigados nos capítulos anteriores. Na conclusão, analisamos como nossas decisões interpretativas para a performance dessas obras se tornaram mais fundamentadas em face dos resultados desta pesquisa. Objetivamos que este trabalho possa se tornar um possível referencial aos músicos interessados na obra de Scarlatti, sendo um acréscimo à bibliografia existente sobre o compositor.

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ABSTRACT

The keyboard works by Domenico Scarlatti (1685-1757), constituted by about 550 sonatas, has been an object of permanent interest among pianists and harpsichordists. However, this repertoire has received little musicological investigation, partly due to the scarce historical documentation concerning the composer, and partly due to the difficulty of reaching a stylistic understanding about his sonatas. Besides, Scarlatti has left very few interpretative marks, so the interpreters usually build their performances in a very speculative way. Considering this background, this work presents an interpretative study on five Scarlatti sonatas at the piano. It aims, essentially, at a better understanding of the Scarlatian language, in order to take coherent decisions regarding the stylistic complexity and the developed keyboard writing found in his works. Scarlatti has never known the contemporary piano, so we also investigate the suitability of the pianistic resources in face of the aesthetic particularities of Scarlatti´s works. In order to include all the research fields related to this investigation, we have structured this thesis in five chapters. The first describes some biographical facts about the composer, his possible relation to the newly arisen fortepianos, as well as some aspects of the dissemination of his work among pianists, from the XIXth century on. In the second chapter, we undertake a stylistic study and we list possible interpretative references for these sonatas, from historic documents and from recent musicological investigations. In the third chapter, we present some elements regarding the physical engagement demanded for the performance of these works, relating these elements to some aspects of the modern pianistic technique, and to the idiomatic of the piano. In the fourth chapter, we situate our approach in face of the contemporary discussions about authenticity in musical performance, most specifically in the cases where musical works are played in instruments which are different from the original ones. The fifth chapter, which is the core of this thesis, presents an interpretative study for five Scarlatti sonatas at the piano, considering the stylistic, performative, aesthetic and instrumental aspects investigated in the former chapters. In the conclusion, we analyze how our performance decisions for these works have become more structured in face of the results of this research, intending this thesis to become a possible reference to the musicians and performers interested in Scarlatti´s work, and also collaborating to the bibliography about the composer. Keywords: Scarlatti, Sonatas, Piano, Performance, Authenticity

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 01 Scarlatti, trecho da Sonata K, 208. Edição Gilbert. 28

FIGURA 02 Scarlatti, trecho da Sonata K. 15. Edição Gilbert. 31

FIGURA 03 Scarlatti, trecho da Sonata K. 213. Edição Gilbert. 32

FIGURA 04 Scarlatti, trecho da Sonata K.213, (L. 108). Edição Longo. 33

FIGURA 05 Scarlatti, trecho da Sonata K. 141. Edição Gilbert. 34

FIGURA 06 Scarlatti, trecho da Sonata K. 141 (L. 422). Edição Longo. 34

FIGURA 07 Scarlatti, trecho da Sonata K. 09 em transcrição de C. Tausig. 35

FIGURA 08 Scarlatti, trecho da Sonata K. 09. Edição Gilbert. 36

FIGURA 09 Scarlatti, trecho da Sonata K. 215. Edição Ogeil. 50

FIGURA 10 Scarlatti, trecho da Sonata K. 518. Edição Ogeil . 51

FIGURA 11 Scarlatti, trecho da Sonata K. 490. Edição Ogeil . 52

FIGURA 12 Scarlatti, trecho da Sonata K. 24. Edição Gilbert. 55

FIGURA 13 Scarlatti, trecho da Sonata K.470. Edição Kirkpatrick. 58

FIGURA 14 Scarlatti, trecho da Sonata K. 216. Edição Kirkpatrick. 59

FIGURA 15 Scarlatti, trecho da Sonata K. 366. Edição Gilbert. 66

FIGURA 16 Scarlatti, trecho da Sonata K. 96. Edição Gilbert. 67

FIGURA 17 Scarlatti, trecho da Sonata K. 524. Edição Gilbert. 67

FIGURA 18 Scarlatti, trecho da Sonata K. 469. Edição Gilbert. 68

FIGURA 19 Scarlatti, trecho da Sonata K. 10. Edição Gilbert. 68

FIGURA 20 Scarlatti, trecho da Sonata K. 223. Edição Gilbert. 69

FIGURA 21 Scarlatti, trecho da Sonata K. 229. Edição Gilbert. 69

FIGURA 22 Scarlatti, trecho da Sonata K. 487. Edição Gilbert. 70

FIGURA 23 Scarlatti, trecho da Sonata K. 96. Edição Gilbert. 70

FIGURA 24 Scarlatti, trecho da Sonata K. 175. Edição Gilbert. 70

FIGURA 25 Scarlatti, trecho da Sonata K. 65. Edição Gilbert. 74

FIGURA 26 Scarlatti, trecho da Sonata K. 65. Edição Gilbert. 75

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FIGURA 28 Scarlatti, trecho da Sonata K. 120. Edição Gilbert. 77

FIGURA 29 Scarlatti, trecho da Sonata K. 517. Edição Gilbert. 79

FIGURA 30 Scarlatti, trecho da Sonata K. 29. Edição Gilbert. 82

FIGURA 31 Scarlatti, trecho da Sonata K. 120. Edição Gilbert. 83

FIGURA 32 Scarlatti, Sonata K. 141. Compassos 01 a 26. Edição Gilbert. 111

FIGURA 33 Scarlatti, Sonata K. 141. Compassos 27 a 52. Edição Gilbert. 112

FIGURA 34 Scarlatti, Sonata K. 141. Compassos 53 a 88. Edição Gilbert. 113

FIGURA 35 Scarlatti, Sonata K. 141. Compassos 89 a 123. Edição Gilbert. 114

FIGURA 36 Scarlatti, Sonata K. 141. Compassos 124 a 158. Edição Gilbert. 115

FIGURA 37 Comparação entre o modo frígio mourisco e a escala menor harmônica. 116

FIGURA 38 Sugestões interpretativas para os compassos 01 a 18 da Sonata K. 141. 121

FIGURA 39 Sugestões interpretativas para os compassos 19 a 28 da Sonata K. 141. 122

FIGURA 40 Sugestões interpretativas para os compassos 29 a 39 da Sonata K. 141. 123

FIGURA 41 Sugestões interpretativas para os compassos 40 a 42 da Sonata K. 141. 123

FIGURA 42 Sugestões interpretativas para os compassos 43 a 52 da Sonata K. 141. 124

FIGURA 43 Sugestões interpretativas para os compassos 53 a 62 da Sonata K. 141. 125

FIGURA 44 Sugestões interpretativas para os compassos 63 a 71 da Sonata K. 141. 126

FIGURA 45 Scarlatti, trecho da Sonata K. 141. Edição Gilbert. 126

FIGURA 46 Scarlatti, trecho da Sonata K. 141. (L. 422). Edição Longo. 127

FIGURA 47 Sugestões interpretativas para os compassos 72 a 74 da Sonata K. 141. 127

FIGURA 48 Sugestões interpretativas para os compassos 75 a 85 da Sonata K. 141. 128

FIGURA 49 Scarlatti, trecho da Sonata K. 141 (L. 422). Edição Longo. 129

FIGURA 50 Sugestões interpretativas para os compassos 86 a 112 da Sonata K. 141. 130

FIGURA 51 Sugestões interpretativas para os compassos 113 a 136 da Sonata K. 141. 131

FIGURA 52 Sugestões interpretativas para os compassos 137 a 158 da Sonata K. 141. 132

FIGURA 53 Scarlatti, Sonata K. 144. Compassos 01 a 16. Edição Gilbert. 133

FIGURA 54 Scarlatti, Sonata K. 144. Compassos 17 a 34. Edição Gilbert. 134

FIGURA 55 Escrita original e resolução sugerida para a apojatura do compasso 01. 141

FIGURA 56 Escrita original e resolução sugerida para a apojatura do compasso 06. 141

(11)

FIGURA 58 Sugestões interpretativas para os compassos 01 a 06 da Sonata K. 144. 143

FIGURA 59 Sugestões interpretativas para os compassos 06 a 07 da Sonata K. 144. 144

FIGURA 60 Sugestões interpretativas para os compassos 08 a 15 da Sonata K. 144. 145

FIGURA 61 Sugestões interpretativas para os compassos 16 a 18 da Sonata K. 144. 146

FIGURA 62 Sugestões interpretativas para os compassos 19 a 22 da Sonata K. 144. 147

FIGURA 63 Sugestões interpretativas para os compassos 23 a 29 da Sonata K. 144. 148

FIGURA 64 Sugestões interpretativas para os compassos 30 a 31 da Sonata K. 144. 148

FIGURA 65 Sugestões interpretativas para os compassos 32 a 34 da Sonata K. 144. 149

FIGURA 66 Scarlatti, Sonata K. 87. Compassos 01 a 34. Edição Gilbert. 150

FIGURA 67 Scarlatti, Sonata K. 87. Compassos 35 a 71. Edição Gilbert. 151

FIGURA 68 Sugestões interpretativas para os compassos 01 a 07 da Sonata K. 87. 158

FIGURA 69 Sugestões interpretativas para os compassos 08 a 26 da Sonata K. 87 160

FIGURA 70 Sugestões interpretativas para os compassos 26 a 34 da Sonata K. 87. 161

FIGURA 71 Sugestões interpretativas para os compassos 35 a 44 da Sonata K. 87. 162

FIGURA 72 Sugestões interpretativas para os compassos 45 a 58 da Sonata K. 87. 164

FIGURA 73 Sugestões interpretativas para os compassos 59 a 61 da Sonata K. 87. 165

FIGURA 74 Sugestões interpretativas para os compassos 62 a 70 da Sonata K. 87. 166

FIGURA 75 Scarlatti, Sonata K. 119. Compassos 01 a 33. Edição Gilbert. 167

FIGURA 76 Scarlatti, Sonata K. 119. Compassos 34 a 65. Edição Gilbert. 168

FIGURA 77 Scarlatti, Sonata K. 119. Compassos 66 a 101. Edição Gilbert. 169

FIGURA 78 Scarlatti, Sonata K. 119. Compassos 102 a 142. Edição Gilbert. 170

FIGURA 79 Scarlatti, Sonata K. 119. Compassos 143 a 177. Edição Gilbert. 171

FIGURA 80 Scarlatti, Sonata K. 119. Compassos 178 a 207. Edição Gilbert. 172

FIGURA 81 Sugestões interpretativas para os compassos 01 a 15 da Sonata K. 119. 178

FIGURA 82 Sugestões interpretativas para os compassos 16 a 35 da Sonata K. 119. 179

FIGURA 83 Sugestões interpretativas para os compassos 36 a 53 da Sonata K. 119. 180

FIGURA 84 Sugestões interpretativas para os compassos 54 a 72 da Sonata K. 119. 181

FIGURA 85 Sugestões interpretativas para os compassos 73 a 95 da Sonata K. 119. 182

(12)

FIGURA 87 Sugestões interpretativas para os compassos 116 a 142 da Sonata K. 119. 185

FIGURA 88 Sugestões interpretativas para os compassos 143 a 188 da Sonata K. 119. 186

FIGURA 89 Sugestões interpretativas para os compassos 189 a 207 da Sonata K. 119. 187

FIGURA 90 Scarlatti, Sonata K. 135. Compassos 01 a 24. 188

FIGURA 91 Scarlatti, Sonata K. 135. Compassos 25 a 52. 189

FIGURA 92 Scarlatti, Sonata K. 135. Compassos 53 a 87. 190

FIGURA 93 Scarlatti, Sonata K. 135. Compassos 88 a 114. 191

FIGURA 94 Sugestões interpretativas para os compassos 01 a 18 da Sonata K. 135. 196

FIGURA 95 Comparação entre o modo frígio mourisco e a escala menor harmônica. 197

FIGURA 96 Sugestões interpretativas para os compassos 19 a 40 da Sonata K. 135. 198

FIGURA 97 Sugestões interpretativas para os compassos 40 a 52da Sonata K. 135. 199

FIGURA 98 Sugestões interpretativas para os compassos 53 a 78 da Sonata K. 135. 201

FIGURA 99 Sugestões interpretativas para os compassos 79 a 87 da Sonata K. 135. 202

FIGURA 100 Sugestões interpretativas para os compassos 88 a 109 da Sonata K. 135. 203

(13)

LISTA DE TABELAS

TABELA 01 Cronologia dos principais eventos biográficos de D. Scarlatti. 22-23

TABELA 02 Histórico da publicação de algumas edições dos Essercizi. 29-30

TABELA 03 Análise motívica da Sonata K. 141. 117

TABELA 04 Detalhamento da progressão harmônica da Sonata K. 141. 124

TABELA 05 Análise motívica da Sonata K. 144. 136

TABELA 06 Análise motívica da Sonata K. 87. 153-154

TABELA 07 Análise motívica da Sonata K. 119. 173-174

(14)

LISTA DE ABREVIATURAS

AF Autenticidade fenomenológica

AI Autenticidade intencionalista

AP Autenticidade prática

AS Autenticidade sônica

EHI Execução historicamente informada

Fator CT Fator calm/tension Fig. Figura

K Classificação Kirkpatrick

L Classificação Longo

N.A. Nota do autor

N.T. Nota do tradutor

O Unidade orgânica

p. Página

(15)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 19

CAPÍTULO 01 – PANORAMA HISTÓRICO E BIOGRÁFICO: A DISSEMINAÇÃO DA OBRA DE SCARLATTI ENTRE OS PIANISTAS ... 22

1.1 Breve biografia ... 22

1.2 Domenico Scarlatti e o fortepiano. Apontamentos sobre os instrumentos de teclado disponíveis ao compositor ... 24

1.3 A disseminação e a recepção da obra de Scarlatti entre os pianistas: histórico e comparação entre edições ... 28

CAPÍTULO 02 – INVESTIGAÇÕES ESTILÍSTICAS E SUGESTÕES INTERPRETATIVAS ... 39

2.1 Domenico Scarlatti por Dean Stucliffe. Heteroglossia e estilo misto ... 39

2.2 Referências para a interpretação das sonatas de Scarlatti ... 41

2.3 Sugestões interpretativas ... 45

2.3.1 Articulação ... 45

2.3.2 Dinâmica ... 47

2.3.3 Andamentos ... 52

2.3.4 Ornamentação ... 55

CAPÍTULO 03 – DOMENICO SCARLATTI AO PIANO. FISICALIDADE E O GESTO INTERPRETATIVO ... 62

3.1 Aspectos do desenvolvimento da execução tecladística até a época de Scarlatti ... 62

3.2 Aspectos instrumentais presentes na obra de Scarlatti em face do conceito de fisicalidade ... 65

(16)

3.3 Um enredo visual: Domenico Scarlatti e algumas concepções contemporâneas

sobre o gesto musical ... 79

CAPÍTULO 04 – IMPLICAÇÕES SOBRE AUTENTICIDADE ... 85

4.1 As diferentes compreensões sobre a obra musical e a mudança paradigmática a partir de Beethoven . ... 85

4.2 O conceito de autenticidade na execução musical ... 89

4.3 Das possibilidades e desirabilidades das quatro espécies de autenticidade classificadas por Lopes ... 91

4.3.1 Das possibilidades e desirabilidades de uma autenticidade intencionalista ... 91

4.3.2 Das possibilidades e desirabilidades de uma autenticidade fenomenológica ... 95

4.3.3 Das possibilidades e desirabilidades de uma autenticidade sonora ... 98

4.3.4 Das possibilidades e desirabilidades de uma autenticidade prática .... 100

4.4 Da execução em meios sônicos distintos dos instrumentos de época ... 101

4.5 Domenico Scarlatti ao piano. Implicações sobre autenticidade ... 103

CAPÍTULO 05 – ESTUDO INTERPRETATIVO ... 108

5.1 Introdução ... 108 5.2 Sonata K. 141 ... 111 5.2.1 Partitura ... 111 5.2.2 Estudo analítico ... 116 5.2.2.1 Microanálise ... 116 5.2.2.2 Média-análise ... 117 5.2.2.3 Macroanálise ... 118 5.2.3 Aspectos gerais ... 119 5.2.4 Estudo interpretativo ... 120

5.2.4.1 Primeira parte (compassos 01 a 85) ... 120

5.2.4.2 Segunda parte (compassos 86 a 157) ... 128

5.3 Sonata K. 144 ... 133

(17)

5.3.2 Estudo analítico ... 135 5.3.2.1 Microanálise ... 135 5.3.2.2 Média-análise ... 137 5.3.2.3 Macroanálise ... 137 5.3.3 Aspectos gerais ... 138 5.3.4 Estudo interpretativo ... 142

5.3.4.1 Primeira parte (compassos 01 a 18) ... 142

5.3.4.2 Segunda parte (compassos 19 a 35) ... 146

5.4 Sonata K. 87 ... 150 5.4.1 Partitura ... 150 5.4.2 Estudo analítico ... 152 5.4.2.1 Microanálise ... 152 5.4.2.2 Média-análise ... 154 5.4.2.3 Macroanálise ... 155 5.4.3 Aspectos gerais ... 155 5.4.4 Estudo interpretativo ... 158

5.4.4.1 Primeira parte (compassos 01 a 34) ... 158

5.4.4.2 Segunda parte (compassos 35 a 70) ... 161

5.5 Sonata K. 119 ... 167 5.5.1 Partitura ... 167 5.5.2 Estudo analítico ... 173 5.5.2.1 Microanálise ... 173 5.5.2.2 Média-análise ... 175 5.5.2.3 Macroanálise ... 175 5.5.3 Aspectos gerais ... 175 5.5.4 Estudo interpretativo ... 177

5.5.4.1 Primeira parte (compassos 01 a 95) ... 177

5.5.4.2 Segunda parte (compassos 96 a 207) ... 182

5.6 Sonata K. 135 ... 188

5.6.1 Partitura ... 188

5.6.2 Estudo analítico ... 192

5.6.2.1 Microanálise ... 192

(18)

5.6.2.3 Macroanálise ... 194

5.6.3 Aspectos gerais ... 194

5.6.4 Estudo interpretativo ... 195

5.6.4.1 Primeira parte (compassos 01 a 52) ... 195

5.6.4.2 Segunda parte (compassos 53 a 114) ... 200

CONCLUSÃO ... 205

Referências Bibliográficas ... 208

ANEXO 01: Programa do Recital...212

(19)

INTRODUÇÃO

A obra para teclado de Domenico Scarlatti (Nápoles, 1685 – Madri, 1757) tem desfrutado de permanente popularidade1 entre os instrumentistas, desde a sua criação. Apesar disso, pouco esforço de investigação musicológica tem sido empreendido em relação à compreensão de aspectos estilísticos e interpretativos de suas sonatas. A comparação entre as opiniões de Ralph Kirkpatrick (1911-1984) e Dean Stucliffe, escritas com quase 50 anos de diferença, revelam algumas constatações referentes ao panorama de pesquisa sobre o compositor:

Poucos compositores da estatura de Domenico Scarlatti têm sido tão negligenciados na literatura musical. Bem antes de eu ser solicitado, em 1940, a escrever um livro sobre ele, eu já estava aflitivamente ciente da inadequação dos textos disponíveis e da falta de informações fundamentalmente necessárias para mim, como intérprete de suas obras. (KIRKPATRICK, 1953, p. v, tradução do autor)2

(...) há, sem dúvidas, uma grande lacuna entre o interesse geral do público e dos intérpretes em relação ao compositor, e o volume de escritos disponíveis para atendê-los. (STUCLIFFE, 2002, p. vii, tradução do autor)3

Entre as razões para tal, podemos citar a falta de informações sobre a sua biografia e sobre a cronologia de suas composições; a absoluta ausência de manuscritos autógrafos de suas sonatas4, a falta de predecessores e sucessores do seu estilo musical e, especialmente, a compreensão estilística de sua obra, que tem se mostrado desafiadora aos musicólogos5. Contudo, tais dificuldades não têm impedido que a obra de Scarlatti seja frequentemente interpretada, tanto por cravistas como por pianistas.

1

Citamos, como evidência, a continua publicação internacional de suas sonatas, em especial a série dos Essercizi, desde a edição original de 1738, como será detalhada na seção 1.3 do primeiro capítulo desta tese.

2

Texto original: “Few composers of the stature of Domenico Scarlatti have been so neglected in the literature of music. Long before I was asked in 1940 to consider writing a book on him, I had become painfully aware of the inadequacy of the available texts and the absence of information fundamentally necessary to me as a performer of his works.”

3

Texto original: “(…) there is undoubtedly a wide gap between the general public’s and performer’s

interest in the composer and the amount of writing available to answer that.” 4

Para Stucliffe (2002, p. 3), a falta de autógrafos é responsável pela impossibilidade do estabelecimento de uma cronologia para as sonatas de Scarlatti. Os principais volumes de manuscritos, hoje nas bibliotecas de Parma e Veneza, parecem ter sido realizados pelo mesmo copista. Nenhum dos volumes contém a integral das sonatas, e a ordem das peças é diferente nas coleções encontradas em cada biblioteca.

5

Um estudo aprofundado sobre as características estilísticas da obra de Scarlatti encontra-se no capítulo 02 desta tese.

(20)

Este trabalho apresenta um estudo interpretativo, ao piano contemporâneo, de cinco sonatas de Domenico Scarlatti. Objetivamos, em nossa abordagem pianística, utilizar os recursos expressivos do nosso instrumento de forma a obter uma coerente realização desses textos, que, em geral, apresentam raríssimas indicações de dinâmica e articulação. Ao mesmo tempo, sabemos que Scarlatti jamais teve contato com o piano atual, cujos maiores desenvolvimentos técnicos ocorreram no século 19. Dado tal panorama, acreditamos que este trabalho deve enfrentar algumas questões cruciais. Em que basear nossas decisões interpretativas? Quais particularidades da escrita desse compositor a tornam adequada aos recursos expressivos e técnicos dos instrumentos contemporâneos? De que maneira a nossa performance pianística pode revelar, aos ouvintes, aspectos retóricos, afetivos e formais desses textos?

A fim de englobar essa variedade de campos para pesquisa, optamos por estruturar nossa tese em cinco capítulos, os quais descreveremos a seguir. Inicialmente, situaremos o leitor no contexto biográfico do compositor, em que serão descritos o panorama histórico e o ambiente musical vivenciados por Scarlatti; além de discorrer sobre os instrumentos de teclado que ele teve à sua disposição. Em seguida, discutiremos o histórico da disseminação e recepção de suas sonatas, especialmente entre os pianistas, através de uma análise das edições dessas obras. A observação dessas edições nos mostra de que maneira esse repertório foi compreendido pelos pianistas durante o Romantismo, época em que tais obras se consolidaram como parte do repertório desse instrumento.

No segundo capítulo, empreenderemos uma investigação estilística e interpretativa para as sonatas de Scarlatti, a fim de referenciar teoricamente nossas sugestões de execução. Em relação ao estudo estilístico, apresentaremos uma descrição sobre as principais características desse repertório, marcado pela transição entre os períodos Barroco e Clássico e pela influência de elementos da música popular, com a absorção de padrões fraseológicos e sintáticos díspares. Em seguida, apresentaremos alguns referenciais interpretativos, onde elencaremos algumas sugestões de execução obtidas da investigação de intérpretes historicamente orientados. Consideramos que tal investigação pode ser um rico manancial de informações aos pianistas, especialmente no que tange à

(21)

comunicação da sintaxe e prosódia particulares da música do século 18. De que maneira este conhecimento pode se somar aos recursos expressivos do meio instrumental contemporâneo?

No terceiro capítulo, exploraremos algumas relações do texto de Scarlatti com a técnica pianística contemporânea, em especial no que diz respeito à fisicalidade exigida do intérprete na execução dessas sonatas. Objetivamos compreender os gestos indicados por Scarlatti como elementos expressivos na pontuação de seu discurso musical, elencando alguns exemplos extremos de cruzamento de mãos e saltos identificados em sua obra.

No quarto capítulo, situaremos nossa abordagem em relação ao conceito de autenticidade, considerando referenciais apresentados por autores como Lydia Goehr e Antonio Correia de Jesus Lopes. A leitura de tais pensadores nos instiga a realizar alguns questionamentos. Como compreender nossa abordagem interpretativa neste panorama de sujeição aos ideais do compositor? Quais os limites da idealização de uma interpretação autêntica na realização desse repertório ao piano? Será necessário que uma interpretação efetiva desse repertório se proponha autêntica, mesmo em meios sônicos distintos daqueles intencionados pelo compositor?

No capítulo final, apresentaremos o estudo interpretativo de cinco sonatas, cuja seleção pretende abranger uma variedade significativa de aspectos composicionais pertinentes a esse corpo de obras. Tal estudo será baseado em três eixos básicos: a análise musical, em que a descrição e compreensão das estruturas musicais de Scarlatti nos parecem ser úteis a uma coerente realização de suas intenções formais e retóricas; a análise estilística, em que elencaremos algumas sugestões de execução que nos parecem adequadas a uma efetiva comunicação da prosódia desse repertório; e o emprego dos recursos expressivos do piano contemporâneo, meios com os quais nos propomos a realizar a elaborada escrita tecladística desse compositor.

(22)

CAPÍTULO 01 - PANORAMA HISTÓRICO E BIOGRÁFICO: A

DISSEMINAÇÃO DA OBRA DE SCARLATTI ENTRE OS PIANISTAS

1.1 Breve biografia

A escassez de documentos biográficos tem obrigado os estudiosos de Scarlatti a investigar sua trajetória baseando-se em diferentes alternativas, tais como a análise de contratos de trabalho e a observação dos espaços em que o compositor viveu e trabalhou. Para Kirkpatrick (1953, p. v), é necessário produzir um retrato do compositor baseando-se também nos personagens históricos que sabemos ser associados a ele. Nesse sentido, apresentamos, na tabela a seguir, uma sucinta descrição dos principais eventos em sua biografia.

Ano Principais eventos biográficos

1685 Nascimento de Giuseppe Domenico

Scarlatti em Nápoles, filho do célebre compositor de óperas Alessandro Scarlatti (1660 – 1725).

1704 - 1711 Não há registros disponíveis sobre

postos de trabalho regulares assumidos pelo compositor. Alguns relatos de seus contemporâneos apontam que ele já era considerado um tecladista virtuoso, com viagens constantes entre Roma, Florença e Veneza. Possível duelo instrumental com Handel, em Roma, em que Scarlatti foi considerado superior ao cravo, e Handel, ao órgão.

1711 - 1719 Scarlatti assume funções musicais em

Roma, destacando-se a direção da Cappella Giulia, no Vaticano.

(23)

Ano Principais eventos biográficos

1719 - 1722 Há incerteza sobre os trabalhos

assumidos pelo compositor, com evidências conflituosas entre Palermo, Londres e Lisboa.

1722 ou 1723 Scarlatti assume a direção musical da

Capela Real de Lisboa, tendo como funções a composição de música sacra, música para a corte, e a instrução musical dos príncipes Antonio de Bragança, (1695-1757), irmão mais jovem do rei Dom João V (1689-1750), e da princesa Maria Bárbara de Bragança (1711-1758), filha do rei Dom João V.

1729 Scarlatti muda-se para Sevilha, a

serviço de Mária Bárbara (1711-1758), que havia acabado de se casar com o príncipe e herdeiro da Coroa Espanhola, Fernando (1713-1759).

1733 - 1757 Scarlatti acompanha a família real em

sua mudança para Madrid, onde o compositor passa os 25 anos finais de sua vida, como tutor musical da Rainha. A extrema escassez de documentos biográficos referentes a esse longo período revelam que o compositor assumiu, essencialmente, funções musicais privadas à sua patrona. Suas únicas obras para teclado publicadas em vida, os Essercizi, datam de 1738.

Tabela 01 – Cronologia sucinta dos principais eventos da biografia de Domenico Scarlatti (SUTHERLAND, 1995, pp. 244 - 246).

(24)

O contato de Scarlatti com a cultura ibérica influenciou consideravelmente a sua produção, com implicações nas construções rítmicas e harmônicas de suas sonatas6. Ao que parece, o compositor encontrou na corte da Rainha Maria Bárbara um ambiente bastante propício à intensa atividade composicional, onde teve à sua disposição uma grande variedade de instrumentos de teclado, entre eles, o fortepiano.

1.2 Domenico Scarlatti e o fortepiano. Apontamentos sobre os instrumentos de teclado disponíveis ao compositor

Ralph Kirkpatrick, em seu pioneiro estudo sobre o compositor, defende a ideia de que as sonatas de Scarlatti foram compostas para o cravo, refutando a possibilidade de elas terem sido dedicadas ao fortepiano. Seus argumentos se baseiam, especialmente, nas características do fortepiano no século 18, instrumento que o teórico considera “não possuir as cores orquestrais do cravo, parecendo um pouco parco em relação a ele. Ele [fortepiano] não tinha nem o poder nem o brilhantismo; sua principal vantagem era a flexibilidade7” (KIRKPATRICK, 1953, p. 183, tradução do autor). Kirkpatrick (1953, p. 179) também afirma que a extensão dos fortepianos iniciais não era adequada à tessitura das Sonatas de Scarlatti.

Alguns estudiosos, entretanto, têm apontado evidências de que esse instrumento estava disponível ao compositor, elencando, inclusive, algumas características dessas obras que são adequadas ao idiomático do fortepiano. Inicialmente, pode-se considerar o inventário de instrumentos pertencentes à Rainha Maria Bárbara. Pela leitura desse documento, verifica-se que, dos doze instrumentos de teclado pertencentes à rainha, três eram fortepianos florentinos (SUTHERLAND, 1995, p. 361). Pelo menos um desses fortepianos foi legado pela monarca ao castrato Carlo Broschi (1705-1782), notadamente conhecido como Farinelli, que

6

As principais características ditas “ibéricas” da música de Scarlatti tem sido descritas e exploradas por alguns autores, destacando-se, por exemplo, o trabalho de Maria Fadini: Domenico Scarlatti:

integrazione tra lo stile andaluso e lo stile italiano, integrante da coletânea de ensaios Domenico Scarlatti adventures. Essays to commemorate the 250th anniversary of his death (2008).

7

Texto original: “(…) lacking in orchestral colors of the harpsichord, and seemed rather sober in

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também herdou os dois principais volumes de manuscritos, não autógrafos, de sonatas de Scarlatti, hoje nas bibliotecas de Parma e Veneza (SUTHERLAND, 1995, p. 249).

David Sutherland (1995, p. 244), em Domenico Scarlatti and the Florentine piano, apresenta uma revisão sobre os principais estudos que relacionam a produção de Scarlatti ao fortepiano. Entre eles, são citados os trabalhos de Joan Sheveloff (1970), Eva Badura-Skoda (1985), e Stewart Pollens (1984), que elencaram evidências de que os instrumentos de Bartolomeo Cristofori (1655-1731) gozavam de grande prestígio nas cortes portuguesa e espanhola. Em seguida, Sutherland contesta de forma veemente o veredito de Kirkpatrick e afirma que Scarlatti foi o primeiro grande advogado do florentino cembalo com piano e forte.

Para defender seus argumentos, Sutherland apresenta uma série de eventos da trajetória de Scarlatti em que suas atividades se entremeiam à história do fortepiano, considerando sua disseminação pela Itália e pela Península Ibérica.

O envio de um piano de Florença, em 1709, para a casa do grande patrono romano de Scarlatti, Cardeal Ottoboni, ocorreu quando Domenico era um personagem familiar nas noites musicais do Cardeal. Os pianos portugueses da década de 1760, baseados no modelo de Cristofori de 1720, apontam para a presença do piano em Lisboa durante a posição de Scarlatti como mestre de capela do Rei D. João V. Os primeiros pianos espanhóis tiveram sua origem em Sevilha, onde Scarlatti passou seus primeiros três anos a serviço de Maria Barbara. (SUTHERLAND, 1995, p. 250, tradução do autor)8

Sutherland (1995, pp. 250-52) apresenta objeções às opiniões de Kirkpatrick sobre o potencial limitado dos primeiros fortepianos e contesta o argumento de que esses instrumentos não possuíam uma tessitura adequada à execução das sonatas de Scarlatti. Ele destaca o argumento de Sheveloff, que alega

8

Texto original: “The export of a piano from Florence, in 1709, to the house of Scarlatti´s great Roman

Patron, Cardinal Ottoboni, occurred when Domenico was a familiar figure at the Cardinal´s musical evenings. The Portuguese pianos of the 1760´s, based on the Cristofori´s model of the 1720s, point to the presence of the piano in Lisbon during Scarlatti´s tenure as chapel master to King João V. The early Spanish pianos had their origin in Seville, where Scarlatti spent the first three years of his service to Maria Barbara”.

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que apenas 73 das 550 sonatas não podem ser executadas em fortepianos florentinos, considerando a tessitura instrumental desses instrumentos. Enfaticamente, ele conclui que Scarlatti tocou e compôs para o piano durante toda sua carreira, sendo seu primeiro advogado.

O campo para a investigação, portanto, mostra-se vasto. Entretanto, observamos que muitos dos argumentos desses teóricos, embora bastante incisivos, são bastante especulativos, não trazendo consenso nem conclusões definitivas. Jacqueline Ogeil, em Did Domenico Scarlatti compose the first great piano music?, nos oferece um novo ponto de vista. A autora analisa a escrita de Scarlatti a fim de identificar possíveis características pianísticas na textura de suas obras, além de compará-las com a produção de contemporâneos do compositor que já estavam nomeadamente dedicando sua produção ao fortepiano. A autora menciona, por exemplo, o volume de Sonatas publicado por Lodovico Giustini da Pistoia (1685-1743), em 1732, composto para explicitamente ser executado ao cimbalo di piano e forte detto volgarmente di marteletti. Essa obra foi dedicada ao Príncipe Dom Antonio de Portugal, tio da Rainha Maria Bárbara, o que, para Ogeil (2008, p. 345), traz razoável evidência da importância do piano na corte portuguesa. Ao analisar tais obras, Ogeil (2008, p. 365) menciona que há pouco a ser comparado com as sonatas de Scarlatti, especialmente pelo fato de Giustini ser um compositor bastante conservador. Contudo, ela apresenta algumas figurações retóricas encontradas em Giustini relacionando-as a alguns trechos identificados nas sonatas de Scarlatti. Entre tais figurações, por exemplo, está a Epizeuxis9, que requer a necessidade de gradação dinâmica na declamação de notas repetidas para uma realização mais convincente, e cuja execução é bastante adequada aos recursos expressivos do fortepiano. A autora também faz uma análise das Sonates pour le clavecin pour le gout italien, de Giovanni Benedetto Platti (1697-1763), opus 01, de 1742. Para ela, tais obras apresentam uma série de características idiomáticas do fortepiano, tais como:

Seus movimentos mais lentos, em particular, exibem o que viria a se tornar uma textura pianística típica: uma melodia ornamentada e cantábile na mão

9

Figura de retórica em que uma palavra, ou grupo de palavras, é repetida por duas ou mais vezes, de forma veemente e enfática.

(27)

direita, apoiada por um acompanhamento lento na mão esquerda, frequentemente com acordes repetidos pulsantes. (…) Há uso ocasional de acordes de quatro notas em cada mão, e também o reforço de oitavas no baixo. (OGEIL, 2008, p. 353, tradução do autor)10

Entre as supramencionadas publicações de Giustini (1732) e Platti (1742) estão os 30 Essercizi per gravicembalo, de Scarlatti, publicados em Londres, em 1738. Ogeil (2008, p. 354) aponta que 21 dos Essercizi possuem uma tessitura adequada ao fortepiano de Cristofori, de 1720. Sabe-se que, nessa época, o Rei D. João V comprou instrumentos de Cristofori, e que há, portanto, razões para acreditar que um instrumento dessa extensão já estivesse à disposição de Scarlatti em Portugal. Ogeil (2008, p. 356) aponta como elementos pianísticos nos Essercizi as inovações técnicas e de virtuosismo, tais como escalas, arpejos por toda a extensão do instrumento, terças e sextas, tanto duplas quanto alternadas, oitavas na mão esquerda e uso considerável de notas repetidas e acordes repetidos.

Para a execução de elementos cantábiles na produção de Scarlatti, Ogeil (2008, p. 359) acredita que o maior trunfo do fortepiano está na possibilidade da realização sutil do acompanhamento de notas e acordes, citando como exemplo, a Sonata K. 208 (fig. 1).

Nota-se que o texto de Scarlatti possui raríssimas indicações de dinâmica, o que, de certa forma, poderia ser uma evidência de sua destinação ao cravo. Contudo, Ogeil (2008, p. 362) aponta que a falta dessas notações não é indicativa de ausência de variação dinâmica na performance, citando, como referenciais, os tratados de C. P. E. Bach (1714-1788) e de J.Quantz (1697-1773).

A descrição dos recursos pianísticos adequados a uma efetiva realização das sonatas de Scarlatti, tais como apontados por Ogeil, torna-se um ponto de referência e embasamento às nossas sugestões de execução. Na disputa especulativa entre qual foi, de fato, o instrumento para que o compositor dedicou sua obra, Stucliffe oferece uma alternativa convincente, que reflete o atual panorama de

10

Texto original: “His slower movements, in particular exhibit what was to become a typical piano

texture, an ornate cantabile melody in the right hand supported by a chordal accompaniment to the left, often featuring pulsating repeating chords. (..) There is occasional use of four-note chords in each hand, and also of octaves reinforcement of the bass.”

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performance, em que Scarlatti é adotado e executado tanto ao cravo quanto ao piano: “talvez se possa afirmar que as sonatas de Scarlatti são tecladísticas em primeiro lugar, que o gesto possa ser tão importante quanto a sonoridade para a concepção e a realização dessas obras” (STUCLIFFE, 2002, p. 47, tradução do autor) 11.

Figura 01: Início da Sonata K. 208, de Scarlatti, marcado pela melodia cantábile suportada por um acompanhamento em acordes. Edição Gilbert.

1.3 A disseminação e recepção da obra de Scarlatti entre os pianistas: histórico e comparação entre edições

A frequente incidência de publicações dos 30 Essercizi per gravicembalo, nas décadas posteriores ao surgimento da edição original londrina de 1738 (tabela 02), revela que Scarlatti nunca deixou de ser editado, mesmo no Romantismo. Todd Decker, em The essercizi and the editors: visual virtuosity, large-scale form and editorial reception, oferece uma comparação entre as edições dessas obras, considerando um período de mais de dois séculos.

11

Texto original: “perhaps one might claim the sonatas of Scarlatti are keyboardistic in the first stance,

(29)

Em sua análise, Decker (2008, p. 329) afirma que algumas publicações dos Essercizi revelam certa incompreensão dos editores em relação à concepção original do compositor. Primeiramente, Decker considera que essas obras foram cuidadosamente concebidas como um ciclo, em que as dificuldades e inovações técnicas foram sendo dispostas gradativamente a cada sonata. Para ele, as últimas sonatas apresentam uma justaposição e intensificação dos problemas técnicos desenvolvidos pelo compositor. Contudo, desde a publicação de Roseingrave, de 1739, a ordem original das peças foi alterada em várias edições, tais como nas de Carl Czerny (1791-1857), Louise Farrenc (1804-1875) e Alessandro Longo (1864-1945).

Edição Data da primeira publicação

Título da publicação

ORIGINAL 1738 Essercizi per gravicembalo (Londres).

ROSEINGRAVE 1739 XLII Suites de pieces [sic] pour le clavecin, editado por T.

Roseingrave (Londres), com reimpressões nas décadas de 1750 e 1790.

WITVOGEL 1742 XXX Sonate per il clavicembalo (Amsterdam, G. F.

Witvogel).

PITMAN Década de 1780 The beauties of Domenico Scarlatti, editado por A. Pitman

(Londres). BUREAU

D´ARTS

1803 - 1804 Ouvres de Dominique Scarlatti por le clavecin ou pianoforte, cahiers II – V (Viena, Bureau d´Arts ed d´Industrie).

CZERNY 1839 Sammtliche Werke für das Piano-Forte, editado por C.

Czerny (Viena, Haslinger).

FARRENC 1861 - 1872 Les trésor de pianistes, editado por A. & L. Farrrenc (Paris).

BREITKOPF 1866 Breitkopf & Härtel (Leipzig), reeditado por Kalmus na década

de 1950.

LONGO 1906 - 1910 Opere complete per gravicembalo, editado por A. Longo

(Milão, Ricordi).

DUKAS 1912 Essercizi per gravicembalo (Sonates pour piano), editado

por Paul Dukas (Paris, A. Durand & Fils).

(30)

Edição Data da primeira publicação

Título da publicação

FADINI 1978- Sonate per clavicembalo, editado por E. Fadini (Milão,

Ricordi).

VALENTI 1979 Essercizi (1738): 30 Sonatas for keyboard, editado por F.

Valenti (Nova York, Schirmer).

Tabela 02: Histórico da publicação de algumas edições dos Essercizi de Scarlatti (DECKER, 2008, p. 331).

Decker enfatiza que alguns editores tentaram atenuar alguns aspectos incomuns dos Essercizi, pela remoção de “técnicas muito virtuosísticas, que são o tópico central de muitas dessas sonatas, e pela alteração do texto de Scarlatti de forma que só podem ser agrupadas sob o termo recomposição” (DECKER, 2008, p. 331, tradução do autor) 12.

Para compreendermos melhor essas alterações, alguns exemplos podem ser elencados. Elementos comuns em algumas sonatas são as longas seções de cruzamento de mãos, em texturas a duas e três vozes, como mostradas na figura 2. Tais seções poderiam ser tocadas, perfeitamente, sem o uso desse efeito acrobático, com o registro médio executado pela mão esquerda e os agudos pela mão direita.

Decker (2008, p. 334) apresenta uma série de exemplos em que os editores removeram a indicação do compositor na execução de tais cruzamentos de mãos, como nos casos de Ambroise Pitman (1763-1867) e Alessandro Longo (1864-1945). Longo também alterou disposições nos períodos fraseológicos de Scarlatti, adicionando compassos de forma que as duas partes de algumas sonatas parecessem mais simétricas. Dessa maneira, o editor ignora que a irregularidade métrica possa ter sido um elemento intencional na escrita do compositor (DECKER, 2008, p. 338).

12

Texto original: “(…) by removing the very virtuoso techniques that are the central topic of many of

these sonatas and by changing Scarlatti´s text in ways that only can be grouped under the term recomposition.”

(31)

Figura 02: trecho da Sonata K. 15, de Scarlatti, com indicação expressa da execução com mãos cruzadas, a partir do compasso 09. Edição Gilbert.

Apesar dos primeiros editores de Scarlatti estarem sujeitos a críticas por suas alterações no texto original, acreditamos que muitas das revisões realizadas por tais músicos revelam o pensamento corrente no século 19, considerando a expressão musical através do uso de dinâmicas e articulações. Acreditamos que, em vez de condenar tais editores por suas liberdades, devemos observar tais trabalhos como uma oportunidade de investigação sobre a recepção desse corpo de obras pelos pianistas no século 19, em um movimento que culminará nas primeiras gravações da obra do compositor ao piano, no início do século 20.

A edição Longo é digna de nota pelo monumental trabalho do revisor, que publicou, pela primeira vez, a quase totalidade das sonatas de Scarlatti, organizando-as em suítes. Longo sugeriu a realização detalhada de dinâmicas, articulação, andamento e pedalização para cada uma dessas obras. Como mencionado, suas decisões interpretativas são reflexo das práticas de performance

(32)

de seu tempo, como, por exemplo, o uso de longas ligaduras, de forma que a sintaxe fosse baseada em períodos extensos13, em uma concepção similar à dos compositores românticos. Nas figuras a seguir, por exemplo, comparamos a edição Gilbert, sem o acréscimo de indicações interpretativas, com a edição Longo.

Figura 03: Scarlatti, Sonata K. 213. Edição Gilbert, sem adição de articulações e dinâmicas.

13

A consulta a referênciais teóricos do sécuIo 18, contudo, revela que muitos aspectos da articulação musical do período eram baseados na pontuação por pequenos motivos, em uma disposição variada entre legato e staccato, como descrito nesta tese, no capítulo 02.

(33)

Figura 04: Scarlatti, Sonata K. 213 (L.108), com a marcação de longas ligaduras em todos os registros, dinâmicas anotadas por A. Longo.

Além disso, Longo pareceu estranhar algumas características harmônicas de Scarlatti, especialmente o uso extensivo da acciaccatura14. Ele corrigiu diversos acordes escritos pelo compositor, suavizando o impacto das dissonâncias, como evidenciado nas figuras a seguir.

14

Para Roland Jackson, (2005, p.4) o termo acciaccatura se refere, na música para teclado, a uma nota dissonante adicionada a um acorde, sendo que uma ou mais dessas notas podem ser realizadas de forma arpejada, ou tocadas simultaneamente.

(34)

Figura 05: Scarlatti: Sonata K. 141, Edição Gilbert.

Figura 06: Scarlatti: Sonata K. 141, (L. 422). Edição Longo, com a retirada das dissonâncias na harmonia.

Apesar de controverso à luz dos estudos musicológicos atuais, o trabalho de Longo revelou-se bastante influente para gerações de pianistas. A numeração sugerida por esse revisor na ordenação das sonatas foi adotada extensivamente pelos intérpretes, vindo a ser substituída, gradativamente, pela classificação de Kirkpatrick, a partir da década de 1950.

O tratamento pianístico observado nas edições supracitadas pode ser identificado de forma ainda mais acentuada em algumas transcrições dessas obras

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realizadas para o piano. Nessas transcrições, observamos alterações no texto ainda mais expressivas do que aquelas realizadas nas primeiras edições das sonatas.

Citamos, por exemplo, a transcrição de Carl Tausig (1841-1871), para a Sonata K. 09. Tausig alterou a tonalidade original de ré menor para mi menor, aumentou a tessitura, ampliou a ressonância dos acordes do acompanhamento e incluiu terças e sextas nos trinados:

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Figura 08: Scarlatti, Sonata K. 09, compassos finais. Edição Gilbert.

Outras evidências sobre a recepção e disseminação da obra de Scarlatti entre os pianistas, no século 19, podem ser depreendidas da opinião de alguns eminentes compositores do Romantismo.

Para Chopin (1810-1949):

Meus colegas, os professores de piano, não estão satisfeitos que estou ensinando Scarlatti aos meus alunos. Mas estou surpreso que eles são tão cegos. Em sua música há muitos exercícios para os dedos e grande quantia de sublime alimento espiritual. Ele, às vezes, alcança até Mozart. (...) Eu acredito que haverá um tempo em que Scarlatti será frequentemente tocado em concertos, e as pessoas irão apreciá-lo e desfrutá-lo. (MISWA, 1949, APUD HINSON, 1989, p. 08, tradução do autor)15

15

Texto Original: “My colleagues, the piano teachers, are dissatisfied that I am teaching Scarlatti to

my pupils. But I am surprised that they are so blind. In his music there are exercises in plenty for the fingers and a good deal of lofty spiritual food. He sometimes reaches even Mozart. (…) I maintain that there will come a time when Scarlatti will often be played in concerts, and people will appreciate and enjoy him.”

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Apesar do entusiasmo de Chopin em relação à obra de Scarlatti, inclusive em termos pedagógicos, suas palavras revelam algo de descrédito em relação a esse repertório entre seus contemporâneos. Talvez, algumas das razões para isso estejam relacionadas à forma bastante livre com que o compositor trata os períodos musicais, em disposições métricas irregulares e com uso extremamente livre do conteúdo temático. Para Stucliffe:

Muitos músicos, entretanto, não podem ver além da desordem do compositor, com frequência, diretamente ou subliminarmente, considerado como primitivo ou negligente. Robert Schumann não era capaz de entender esse aspecto de Scarlatti – “é difícil às vezes segui-lo, tão rapidamente ele amarra e desamarra as linhas”. (STUCLIFFE, 2002, p. 168, tradução do autor)16

Já Brahms (1833-1897), por outro lado, parecia apreciar as liberdades composicionais adotadas por Scarlatti. Ao comentar sobre a Sonata K. 394, ele observou:

Quão engenhoso ele é, com suas figuras arpejadas na inesperada parte em lá maior, e a modulação longa, que não tem referência com a peça em si, e sua súbita recordação do sujeito e pronto retorno a ele! Ah, um talento robusto pode tomar liberdades que seriam absurdas em mãos mais fracas. (BRAHMS APUD OGEIL, 2008, p. 367, tradução do autor)17

Opiniões adversas à parte, as Sonatas de Scarlatti consolidaram-se como parte do repertório pianístico no século 19. A partir do século 20, com o advento da gravação, tais obras foram registradas por gerações de pianistas, e jamais deixaram de fazer parte do repertório desse instrumento. Um exemplo emblemático dá-se na observação da carreira de Vladimir Horowitz (1903-1989), cuja primeira gravação de Scarlatti ocorre em 1928, e a última em 1986.

Apesar de muito executadas, nos chama a atenção a dificuldade em encontrar estudos sobre a interpretação desse repertório ao piano, motivo que nos leva a desenvolver esta pesquisa. A fim de embasar muitas de nossas decisões,

16

Texto original: “Many musicians, however, cannot see past the composer´s untidiness, often directly or subliminally accounted for as being primitive or negligent. Robert Schumann was unable to come to terms with this aspect of Scarlatti – “it is difficult sometimes to follow him, so quickly does he tie and untie the threads.”

17 Texto original: “What an ingenious fellow he is, with his arpeggio figures in the unexpected A major part, and the long modulation, which has no reference to the piece itself, and his sudden recollection of the subject and prompt return to it! Ah, yes, a robust talent may take liberties which become preposterous in weaker hands.”

(38)

apresentaremos, no próximo capítulo, uma série de investigações estilísticas em relação às sonatas de Domenico Scarlatti.

(39)

CAPÍTULO 02 - INVESTIGAÇÕES ESTILÍSTICAS E SUGESTÕES

INTERPRETATIVAS

2.1 Domenico Scarlatti por Dean Stucliffe. Heteroglossia e estilo misto

O musicólogo Dean Stucliffe, ao situar as sonatas de Scarlatti no panorama estilístico do século 18, inicia seu estudo afirmando que “Domenico Scarlatti não se enquadra”:

Domenico Scarlatti não se enquadra. Se perguntarmos a quem, aonde, ou a que ele se enquadra, e até mesmo se questionarmos com a ligeira desconfiança própria de qualquer forma de investigação histórica, não se poderá obter respostas confortáveis. (STUCLIFFE, 2002, p. 1, tradução do autor)18

As sonatas de Scarlatti, em sua imensa maioria em forma binária, revelam uma linguagem que é construída por fontes diversas. Para Stucliffe, Scarlatti não pertence com clareza a um estilo musical específico, causando estranhamento a discordância entre diferentes teóricos ao tentar definir suas fontes estilísticas19. Stucliffe afirma que há dificuldades em delimitar sucessores e antecessores ao estilo de Scarlatti, e de contextualizar sua produção nos estilos musicais do século 18. Ele apresenta uma revisão da literatura produzida sobre o compositor, enfatizando as diversas possibilidades de classificação de sua obra:

Nas tentativas (dos críticos) para uma classificação estilística, eles escolheram enfatizar ingredientes diferentes: o passado (Barroco, mas às vezes também a polifonia do Renascimento), o presente incerto (Galante, Rococó, pré-Clássico, pós-Barroco, o estilo do meio do século), o futuro próximo (Clássico), o futuro distante (Modernismo) ou nada dos acima

18

Texto original: “Domenico Scarlatti does not belong. Whether we ask to whom, to where, or to what

he belongs, and even if we ask the questions with the slight diffidence proper to any such form of historical enquiry, no comfortable answers can be constructed.”

19

Notem-se as possíveis descrições realizadas sobre a Sonata K. 238, já classificada, dependendo do autor, como Portuguesa, Espanhola, Italiana ou Francesa (STUCLIFFE, 2002, p. 81).

(40)

citados (originalidade). O definitivo nesse posicionamento estilístico incerto é, claro, a ausência. (STUCLIFFE ,2002, p. 51, tradução do autor)20

Assim, encontra-se nas sonatas uma variedade de construções. Observamos tanto aspectos tradicionais do Barroco, como contraponto, linhas de baixo contínuas, sequências harmônicas, (como verificamos nas sonatas K. 30, K. 37, K. 218); elementos do estilo Galante, como linhas melódicas reminiscentes da realização vocal da opera buffa sobre acompanhamentos esparsos, (como identificamos nas sonatas K. 308, K. 309); além de estruturas fraseológicas e construções rítmicas cujos padrões muito diferem do que é encontrado no contexto da época, derivadas, possivelmente, da relação do compositor com a música popular ibérica (como visto nas sonatas K. 218, K. 213)21.

Em muitas sonatas, é marcante uma pluralidade de temas coexistindo, muitas vezes bastante contrastantes entre si. Tal diversidade, certamente, diferencia a produção de Scarlatti de mestres barrocos como J.S.Bach (1685-1750) e Handel (1685-1759), os quais nasceram, inclusive, no mesmo ano em que ele. Stucliffe aponta tal característica, em sua análise da Sonata K. 193, como “uma relutância em dar uma elaboração completa a um afeto – sugerindo uma forte orientação anti-barroca (STUCLIFFE, 2002, p. 18, tradução do autor) 22.

Stucliffe, ao buscar uma maneira de descrever o estilo do compositor, utiliza o termo Heteroglossia23, referindo-se à coexistência de diversas variedades

20

Texto original: “In their (critics) attempt at stylistic classification, they have chosen to emphasize

different ingredients: the past (Baroque, but sometimes also Renaissance polyphony), the uncertain present (Gallant, Rococo, pre-Classical, Pos-baroque, Mid-century style), the near future (Classical), the far future (Modernism) or none of the above (originality). The ultimate in uncertain stylistic placement is, of course, absence.”

21

Tal incomum distribuição dos períodos musicais, com uso aparentemente improvisado e extensivo de repetições e ostinatos, tem recebido atenção em estudos recentes. Sua análise mostra-se bastante útil à compreensão das intenções retóricas do compositor, com implicações na construção da performance em termos de articulação, agógica e gradações de intensidade. Como exemplo desses estudos, citamos One man show: improvisation as theatre in Domenico Scarlatti´s Keyboard

Sonatas, de Chris Willis (2008) e Temporality in Domenico Scarlatti, de Dean Stucliffe (2008),

integrantes da coletânea de artigos Domenico Scarlatti adventures. Essay to commemorate the 250th

aniversary of his death. 22

Texto original: “reluctance to give full elaboration to an affect – suggesting a strongly anti-baroque

orientation.”

23 “[Heteroglossia é] a operação de múltiplas forças discursivas operando em sistemas culturais. Para

Batkin, a heteroglossia é claramente evidente no funcionamento da linguagem, onde a ficção de uma única linguagem nacional está sempre tentando conter a estratificação, diversidade e aleatoriedade,

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de elementos estilísticos dentro de uma única linguagem. Assim, as possibilidades distintas de interpretação, análise e recepção da obra scarlatiana são resultado de tal estilo “misto”.

Nesse contexto estilístico, em que muitas linguagens coexistem simultaneamente, apresentam-se ao intérprete de Scarlatti questões artísticas e intelectuais que certamente devem ser consideradas em um estudo interpretativo. Além disso, a notação do compositor, no que tange à performance, apresenta raríssimas indicações de dinâmica e de articulação. Sua escrita de ornamentos é menos detalhada se comparada à dos mestres germânicos e franceses, assim como as notações de andamento.

O estudo em questão busca achar premissas para a interpretação de sonatas escolhidas ao piano contemporâneo. Inicialmente, entendemos que a busca de uma autenticidade puramente sônica é descartada, já que Scarlatti nunca teve contato com esse instrumento em sua forma atual. Contudo, de que maneira os resultados obtidos pela investigação da performance histórica podem contribuir para uma execução mais coerente desses textos, mesmo ao piano? Nas próximas seções, apresentaremos uma discussão relativa a possíveis referenciais teóricos e históricos para a performance das sonatas de Scarlatti, e elencaremos sugestões interpretativas obtidas da leitura desses documentos.

2.2 Referências para a interpretação das sonatas de Scarlatti

Com o intuito de definir referências para a interpretação das sonatas de Scarlatti, consideramos necessário, inicialmente, situar o compositor cronológica e geograficamente. No século 18, os estilos interpretativos apresentavam diferenças entre os diversos países. Contudo, muitos dos músicos empreendiam viagens pela

produzidas no confronto diário dos discursos profissionais, de classe, de geração e de época” (DOCKER, 1994, p.71, APUD STUCLIFFE, 2002, p. 82, tradução do autor). Texto original:

“[Heteroglossia is] the operation of of multi-voiced discursive forces at work in whole culture systems. For Batkin heteroglossia is clearly evident in the workings of language, where the fiction of a unitary national language is always trying to contain the stratification, diversity and randomness produced in the daily clash of professional, class, generational and period utterances.”

(42)

Europa, promovendo influências mútuas na execução musical24. Na herança da formação de Scarlatti como compositor, apesar da escassez biográfica, pode-se inferir a presença de seu pai, Alessandro Scarlatti (1660-1725), notável autor de óperas barrocas e também de música instrumental. O próprio Domenico experimentou a composição no formato operístico, especialmente no período em que esteve em Roma, além de produzir música sacra, sendo contratado como mestre de capela no Vaticano. É possível, portanto, relacionar a execução de padrões melódicos e líricos, presentes em muitas de suas sonatas, a essa forte herança da tradição vocal italiana. Identificamos, nesse sentido, as sonatas K. 208, K. 132 e K .14425. Ao mesmo tempo, pode-se perceber a influência de estilos instrumentais italianos na disposição textural de algumas sonatas, as quais lembram concertos de autores como Albinoni (1671-1751) e Vivaldi (1678-1741) (Ex: sonatas K.17, K. 31, K. 82). A tais aspectos comuns à música italiana no século 18, mesclam-se as extraordinárias inovações da escrita tecladística do compositor, cujo desenvolvimento de saltos, arpejos, notas repetidas e notas duplas criou efeitos instrumentais marcantes no desenvolvimento da técnica para teclado. Além disso, a já mencionada influência da música popular ibérica26 enriquece o estilo misto de Scarlatti, tendo o autor passado os 38 anos finais de sua vida em Portugal e na Espanha.

Essa amplitude de influências torna impossível delimitar apenas um tratado ou obra como referência de execução. Assim, foram selecionados documentos fundamentais de três autores de época como fontes primárias de investigação histórica da interpretação da música no século 18.

O primeiro deles é o Versuch einer Anweisung die Flöte Traversiere zu spielen, de Johann Joachin Quantz (1697-1773), publicado em 1752 . O autor teve

24

Badura-Skoda observa, por exemplo, que, nos séculos 17 e 18, a Itália era o principal país musical na Europa. Os músicos italianos (e não franceses) predominavam nas orquestras das cortes germânicas, com a exceção de poucos centros no noroeste, como, por exemplo, em Celle (BADURA SKODA, 1995, p. 277).

25

Para essa sonata apresentamos um estudo interpretativo, no quinto capítulo desta tese.

26 Stucliffe (2002, p. 112) aponta alguma das características comumente consideradas “ibéricas” nas

sonatas de Scarlatti. Inicialmente, ele relaciona elementos indicativos do flamenco, citando aspectos melódicos e melismáticos, como, por exemplo, a incessante repetição de uma única nota que é decorada por apojaturas acima e abaixo, em um alcance melódico limitado e com efeitos de portamento (como nas Sonatas K. 548 e K. 107). Como elemento harmônico, é mencionada a progressão ou cadência frigia, como notada na Sonata K. 313 (STUCLIFFE, 2002, p. 116).

Referências

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