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Desenvolvimento de uma Escala Básica de Neurorreabilitação Funcional (EBNRF) para avaliação e monitorização de cães com lesão toracolombar

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Academic year: 2021

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Desenvolvimento de uma Escala Básica de Neurorreabilitação

Funcional (EBNRF) para avaliação e monitorização de cães com

lesão toracolombar

Dissertação de Mestrado Integrado em Medicina Veterinária

Rita Penim Polido de Almeida Cruz

Orientador: Professor Doutor Artur Severo Proença Varejão

Coorientadora: Mestre Ângela Paula Neves Rocha Martins

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III

Desenvolvimento de uma Escala Básica de Neurorreabilitação

Funcional (EBNRF) para avaliação e monitorização de cães com

lesão toracolombar

Dissertação de Mestrado Integrado em Medicina Veterinária

Rita Penim Polido de Almeida Cruz

Orientador: Professor Doutor Artur Severo Proença Varejão

Coorientadora: Mestre Ângela Paula Neves Rocha Martins

Composição do Júri:

Professora Doutora Maria da Conceição Medeiros Castro Fontes Professor Doutor Artur Severo Proença Varejão

Professor Doutor João Filipe Martins Freire Requicha

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IV NOME: Rita Penim Polido de Almeida Cruz

C.C.: 14314843

TELEMÓVEL: (+351) 936087813

CORREIO ELETRÓNICO: rita.penim@hotmail.com

DESIGNAÇÃO DO MESTRADO: Mestrado Integrado em Medicina Veterinária

TÍTULO DA DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM MEDICINA VETERINÁRIA: Desenvolvimento de uma Escala Básica de Neurorreabilitação Funcional (EBNRF) para avaliação e monitorização de cães com lesão toracolombar

ORIENTADOR: Professor Doutor Artur Severo Proença Varejão

ANO DE CONCLUSÃO: 2018

Declaro que esta dissertação de mestrado é resultado da minha pesquisa e trabalho pessoal e das orientações dos meus supervisores. O conteúdo é original e as fontes consultadas estão devidamente mencionadas no texto e na bibliografia final. Declaro ainda que este trabalho não foi apresentado em nenhuma outra instituição parra obtenção de qualquer grau académico.

Vila Real, fevereiro de 2018,

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V

Dedicatória

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VII ensinamentos que me transmite diariamente, mas especialmente pela pessoa que é, cheia de força e dinamismo, que se tornou num ídolo e numa amiga, e sem a qual este projeto não teria sido possível.

Ao meu orientador, Professor Doutor Artur Varejão, por ser um grande Professor, por estar sempre disposto a ajudar os alunos e por lutar pelo ensino em Portugal. Obrigada também por ter abraçado este projeto comigo e por toda a ajuda que me deu ao longo deste percurso, foi um privilégio.

À Professora Doutora Inês Viegas, pelo apoio no âmbito da análise estatística e por estar sempre disposta a ajudar os alunos, por ser uma fonte de inspiração profissional.

Aos meus pais, por todo o amor, por toda a paciência e por nunca terem duvidado de mim. Por serem os pilares fortes da minha vida que nunca derrubaram e permitiram-me chegar aqui. Ao meu irmão, por toda a paciência que tem comigo e por todas as discussões intelectuais que me fazem pensar que muitas pessoas deviam ter um bocadinho mais de ti.

À minha avó, por ser a pessoas mais forte e bondosa que conheço, pela família que construiu, por todos os miminhos e por ter estado sempre do meu lado.

À minha família, por todo o entusiamo, carinho e apoio ao longo desta caminhada.

Ao João, que sem perceber nada disto, ouviu-me vezes e vezes sem conta, com toda a paciência e amor que alguém pode ter.

Aos meus amigos, aos verdadeiros, aos de longe e aos de perto, que nunca me abandonaram e que estiveram lá, tanto nos momentos de maior loucura, como nos de maior tristeza.

A toda a equipa do HVA/CRAA, que desde o primeiro dia recebeu-me de braços abertos, mostrando-me que uma equipa também pode ser uma família.

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IX

Resumo

A Neurorreabilitação Funcional (NRF) é uma área da Medicina Veterinária que tem como base científica a neuroplasticidade, a neuromodulação e a memorização do sistema nervoso. Dentro das causas de lesão medular em cães, a doença degenerativa do disco intervertebral, o tromboembolismo fibrocartilagíneo e o trauma são as causas mais comuns que resultam na perda temporária ou permanente de funções motoras, sensoriais e viscerais. Por sua vez, a NRF tem como objetivo primordial promover a funcionalidade desses mesmos doentes através de uma abordagem não invasiva que faz uso de exercícios e modalidades terapêuticas variadas. Na prática clínica de NRF, é essencial determinar se o plano de NRF é o mais adequado e se o animal está a progredir, e para isso, a existência de escalas de avaliação funcional é fundamental.

Assim, o presente estudo clínico tem como principais objetivos o desenvolvimento de uma Escala Básica de Neurorreabilitação Funcional (EBNRF) para avaliação e monitorização de cães com lesão toracolombar, e determinar a taxa e o nível de recuperação funcional dos mesmos cães através da escala desenvolvida.

Para inclusão no estudo, foram considerados 29 cães diagnosticados com lesão medular toracolombar e com classificação, segundo a escala de Frankel Modificada (Frankel, et al., 1969), em grau 0, 1, e 2. Os animais foram integrados num programa de NRF intensivo, ao longo do qual foram avaliados semanalmente segundo a EBNRF.

O estudo permitiu concluir que a EBNRF é sensível quanto à funcionalidade, prática, pois permitiu a avaliação de todos os animais do estudo num curto espaço de tempo, e útil por ter permitido a perceção rápida dos défices sensoriais e motores individuais e a mudança atempada dos protocolos de NRF, o que faz da EBNRF uma possível ferramenta operacional para todos os centros de NRF na conquista da regeneração neural. Através da EBNRF, concluiu-se a eficácia dos protocolos de NRF aplicados na estimulação das propriedades da medula espinhal e no retorno à funcionalidade em 72,4% dos animais da amostra.

Palavras-chave: Neurorreabilitação Funcional, Propriedades da medula espinhal; Lesão medular toracolombar, Funcionalidade

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XI

Abstract

Functional Neurorehabilitation (FNR) is an area of Veterinary Medicine based in the neuroplasticity, neuromodulation and in the memorization of the nervous system. Among the causes of spinal cord injury in dogs, the degenerative intervertebral disc disease, the fibrocartilaginous thromboembolism and the trauma are the most common diseases that result in the temporary or permanent loss of motor, sensory and visceral functions. In turn, FNR aims to promote the functionality of these patients through a non-invasive approach that makes use of multiple exercises and therapeutic modalities. In the clinical practice of FNR, it is essential to determine if the FNR protocol is the most appropriate and if the animal is progressing, and for this, the existence of functional assessment scales is fundamental.

The main objectives of this study are the development of a Basic Functional Neurorehabilitation Scale (BFNRS) for evaluation and monitoring of dogs with thoracolumbar lesion and determine the rate and the level of functional recovery of the same dogs through the developed scale. For inclusion in the study, were considered 29 dogs diagnosed with thoracolumbar spinal cord lesion classified according to the Frankel Modified Scale (Frankel, et al., 1969), in grade 0, 1, and 2. The animals were integrated into an intensive program of FNR, during which they were evaluated weekly according to the BFNRS.

The study concluded that the BFNRS is sensitive with the dog’s functionality, practical because it allowed the evaluation of all the animals in a brief period, and useful because it allowed fast perception of individual’s sensory and motor deficits and the rapid change of the FNR’s protocols, what makes the BFNRS a possible operational tool for all FNR centers in achieving neural regeneration. Through the BFNRS, we concluded the effectiveness of the FNR’s protocols applied in the stimulation of the spinal cord properties and in the return to functionality of 72.4% of the animals.

Keywords: Functional Neurorehabilitation, Spinal cord properties; Thoracolumbar spinal cord injury, Functionality

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XIII

Lista de Abreviaturas, Acrónimos e Siglas

AEC – Almofada de Estimulação Central AF – Anel Fibroso

AMA – Amplitude de Movimento Articular

AMAP – Amplitude de Movimento Articular Passiva BFNRS – Basic Functional Neurorehabilitation Scale CC – Condição Corporal

CCRP – Certified Canine Rehabilitation Practitioner CEP – Centro de Estação Passiva

CFPI – Compressão Fria Pneumática Intermitente CPN – Células Precursoras Neurais

CRAA – Centro de Reabilitação Animal da Arrábida DDIV – Doença do Disco Intervertebral

DHA – Ácido Docosa-Hexaenóico DIV – Disco Intervertebral

DPP – Défice de Posicionamento Propriocetivo

EBNRF – Escala Básica de Neurorreabilitação Funcional EE – Estimulação Elétrica

EEF – Estimulação Elétrica Funcional

EENM – Estimulação Elétrica Neuromuscular EET – Estimulação Elétrica Transcutânea

ENCNP – Extrusão Não Compressiva do Núcleo Pulposo FC – Frequência Cardíaca

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XIV FNR – Functional Neurorehabilitation

FR – Frequência Respiratória GPC – Geradores de Padrão Central HVA – Hospital Veterinário da Arrábida MM – Membranas Mucosas

MP – Membros Pélvicos MT – Membros Torácicos NMI – Neurónio Motor Inferior NMS – Neurónio Motor Superior NP – Núcleo Pulposo

NRF – Neurorreabilitação Funcional NT – Neurotransmissor

OMS – Organização Mundial de Saúde OTG – Órgão Tendinoso de Golgi PAM – Pressão Arterial Média RM – Ressonância Magnética SNC – Sistema Nervoso Central SNP – Sistema Nervoso Periférico SRD – Sem Raça Definida

TC – Tomografia Computadorizada TL – Treino Locomotor

TLB – Treino Locomotor Bípede TLQ – Treino Locomotor Quadrupede

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XV TR – Tapete Rolante

TRA – Tapete Rolante Aquático TRC – Tempo de Repleção Capilar US – Ultrassons

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XVII

Índice Geral

Resumo ... IX Abstract ... XI Lista de Abreviaturas, Acrónimos e Siglas ... XIII Índice de Figuras ... XXI Índice de Tabelas ... XXIII

1. Introdução à NRF ... 1

1.1. Propriedades da Medula Espinhal ... 2

1.1.1. Neuroplasticidade ... 2 1.1.2. Neuromodulação ... 5 1.1.3. Memorização medular ... 6 1.2. Abordagem à Neuroanatomia em NRF ... 7 1.2.1. Introdução ... 7 1.2.2. Sistema Somatossensorial ... 7

1.2.3. Sistema Motor Somático ... 10

1.2.4. Postura Corporal e Locomoção ... 12

1.3. Doenças medulares mais frequentes em NRF ... 14

1.3.1. Doença do Disco Intervertebral ... 14

1.3.2. Extrusão Não Compressiva do Núcleo Pulposo ... 22

1.3.3. Tromboembolismo Fibrocartilagíneo ... 23

1.3.4. Fraturas e Luxações Vertebrais ... 25

1.4. NRF em doenças medulares ... 27

1.4.1. Protocolo de NRF para doentes paraparésicos/paraplégicos com sensibilidade à dor profunda………27

1.4.2. Protocolo de NRF para doentes paraplégicos sem sensibilidade à dor profunda ... 32

1.5. Monitorização dos Doentes em NRF ... 32

1.5.1. Escalas Funcionais ... 33

2. Materiais e Métodos ... 37

2.1. Caracterização da População ... 38

2.1.1. Critérios de Inclusão ... 38

2.1.2. Critérios de Exclusão ... 38

2.2. Admissão da População do Estudo... 38

2.3. Protocolo de NRF ... 39

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XVIII 2.5. Escala Básica de Neurorreabilitação Funcional (EBNRF) de avaliação e monitorização de

cães com lesão toracolombar ... 42

2.6. Análise Estatística ... 44 3. Resultados ... 45 3.1. Caracterização da amostra ... 45 3.1.1. Raça ... 45 3.1.2. Género ... 45 3.1.3. Idade ... 46 3.1.4. Condição Corporal ... 46 3.1.5. Etiologia ... 46 3.1.6. Duração do programa de NRF ... 46

3.1.7. Tempo entre a lesão e a entrada no HVA/CRAA ... 46

3.1.8. Pontuação dos animais à entrada no HVA/CRAA ... 46

3.1.9. Pontuação dos animais à saída do HVA/CRAA ... 47

3.1.10. Pontuação dos animais ao longo do plano de NRF ... 47

3.1.11. Pontuação ao longo do programa de NRF de animais que tiveram alta médica após 4 semanas e animais que tiveram alta médica após 8 semanas ... 48

3.1.12. Funcionalidade no fim do programa de NRF ... 49

3.1.13. Locomoção normal vs. Locomoção Fictícia Funcional ... 49

3.1.14. Melhoria após a alta médica ... 49

3.2. Caracterização da amostra em relação à pontuação, segundo a EBNRF, à entrada e à saída do HVA/CRAA ... 50 3.2.1. Género ... 50 3.2.2. Idade ... 50 3.2.3. Condição Corporal ... 50 3.2.4. Etiologia ... 51 3.2.5. Duração do programa de NRF ... 52

3.3. Caracterização da amostra em relação à melhoria... 52

3.3.1. Género ... 52

3.3.2. Etiologia ... 52

3.3.3. Idade ... 53

3.3.4. Condição Corporal ... 53

3.3.5. Pontuação à entrada do HVA/CRAA ... 53

3.4. Caracterização da amostra em relação à duração do programa de NRF ... 53

3.4.1. Género ... 53

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XIX

3.4.3. Condição Corporal ... 54

3.4.4. Etiologia ... 54

3.5. Análise multivariada ... 55

3.5.1. Pontuação semanal sob a influencia da duração do programa ... 55

3.5.2. Pontuação semanal sob a influência do género ... 55

3.5.3. Pontuação semanal sob a influência da idade ... 56

3.5.4. Pontuação semanal sob a influência da CC ... 56

3.5.5. Pontuação semanal sob a influência da etiologia ... 57

3.6. Análise da amostra por parâmetro da EBNRF ... 57

4. Discussão ... 59

5. Conclusões ... 65

Bibliografia ... 67 Anexo I – Escalas Funcionais ... I Anexo II – Caracterização da População ... V

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XXI

Índice de Figuras

Figura 1 – Esquema representativo dos feixes medulares ascendentes somatosensoriais com destino ao tronco do encéfalo, tálamo e cerebelo ... 8 Figura 2 – Esquema Representativo do Sistema Piramidal e do Sistema Extrapiramidal ... 12 Figura 3 – Imagem ilustrativa do “sistema de 3 colunas”, com identificação da coluna dorsal, medial e ventral ... 26 Figura 4 – Diagrama representativo da fragmentação, progressão e seguimento do estudo clínico ... 45 Figura 5 – Representação gráfica da pontuação da população à entrada no HVA/CRAA e da pontuação da população à saída do HVA/CRAA ... 47 Figura 6 – Representação gráfica da pontuação média da população ao longo das semanas de NRF ... 47 Figura 7 – Representação gráfica da pontuação média da população referente ao 5º parâmetro da EBNRF, “Avaliação dos Defeitos de Movimento”, ao longo das semanas de NRF ... 48 Figura 8 – Representação gráfica da pontuação média da população ao longo das semanas de NRF, da população que teve alta médica após 4 semanas e da população que teve alta médica após 8 semanas ... 49 Figura 9 – Representação gráfica da pontuação média dos animais jovens, adultos e seniores à entrada no HVA/CRAA e dos animais jovens, adultos e seniores à saída do HVA/CRAA .... 50 Figura 10 – Representação gráfica da pontuação média da população consoante a CC à entrada no HVA/CRAA e à saída do HVA/CRAA ... 51 Figura 11 – Representação gráfica da pontuação média da população consoante a etiologia à entrada no HVA/CRAA e à saída do HVA/CRAA... 51 Figura 12 – Representação gráfica da média de melhoria da população consoante a etiologia ... 52 Figura 13 – Representação gráfica da média de melhoria da população consoante a classe de idades ... 53 Figura 14 – Representação gráfica da média de melhoria da população consoante a CC ... 53 Figura 15 – Representação gráfica do número de animais por duração do programa de NRF em relação à classe de idades ... 54 Figura 16 – Representação gráfica do número de animais por duração do programa de NRF em relação à CC ... 54

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XXII Figura 17 – Representação gráfica do número de animais por duração do programa de NRF em relação à etiologia ... 54 Figura 18 – Representação gráfica da pontuação média da população por semana em relação ao programa de NRF ... 55 Figura 19 – Representação gráfica da pontuação média da população por semana em relação ao género ... 55 Figura 20 – Representação gráfica da pontuação média da população por semana em relação à classe de idades ... 56 Figura 21 – Representação gráfica da pontuação média da população por semana em relação à CC ... 56 Figura 22 – Representação gráfica da pontuação média da população por semana em relação à etiologia ... 57 Figura 23 – Representação gráfica da pontuação média da população ao longo do percurso de NRF quanto ao parâmetro de “Avaliação Sensorial” ... 57 Figura 24 – Representação gráfica da pontuação média da população ao longo do percurso de NRF quanto aos diferentes parâmetros avaliados pela EBNRF ... 58

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XXIII

Índice de Tabelas

Tabela 1 – Classificação dos mecanorreceptores principais pertencentes ao sistema somatossensorial ... 8 Tabela 2 – Escala de Frankel Modificada ... 33 Tabela 3 – Escala de Classificação do Movimento ... 34 Tabela 4 – Escala Básica de Neurorreabilitação Funcional (EBNRF) de avaliação e monitorização de cães com lesão toracolombar ... 43 Tabela 5 – Escala BBB ... I Tabela 6 – Escala de Classificação Funcional ... II Tabela 7 – Escala de Análise da Marcha ... III Tabela 8 – Caracterização da População do Estudo ... V Tabela 9 – Pontuação da População do Estudo ao longo do programa de NRF ... VII

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1

1. Introdução à NRF

O conceito de Reabilitação deriva do termo latim habilitare, que significa tornar hábil, atribuir capacidades, sendo que o prefixo “re” sugere novamente. Assim, a Reabilitação é o ato de tornar hábil algo ou alguém que já o foi (Flanagan & Green, 2000). Por sua vez, a Reabilitação Funcional é a área da medicina que visa, através de bases científicas, a recuperação da funcionalidade de um individuo, sendo ela de origem motora, sensorial ou cognitiva (Orsini, 2012).

Antes dos anos 40, a abordagem terapêutica a doenças músculo-esqueléticas e neuromusculares era baseada na estimulação de parte do sistema nervoso e do sistema músculo-esquelético saudável, de forma a compensar a outra parte dos mesmos sistemas não funcional. Posteriormente, já nos anos 80, surgiu a ideia da recuperação de funções perdidas (Edwards, 2002; Hubli & Dietz, 2013).

Em 1986, a Organização Mundial de Saúde (OMS) definiu a Medicina Física e a Reabilitação como um conjunto de medidas sociais, educativas e profissionais designadas a devolver o maior grau de funcionalidade possível ao doente, tratando-se de uma especialidade médica que diz respeito ao diagnóstico, prevenção e tratamento de doenças músculo-esqueléticas e neuromusculares (Martín, 2014).

Assim, nos últimos anos, a Reabilitação Funcional Animal tornou-se numa área da Medicina Veterinária de bases integrativas que promove a prevenção e correção das desordens de movimento, tendo como objetivo a funcionalidade e o bem-estar animal (Lindley & Watson, 2010), sendo baseada na estimulação de centros neurais, feixes neurais sensoriais e motores, e ainda nos recetores sensoriais (Hubli & Dietz, 2013; Martins Â. , 2015ª).

Por sua vez, a reabilitação neurológica funcional, ou Neurorreabilitação Funcional (NRF), tem como base científica a regeneração do Sistema Nervoso Central (SNC) e do Sistema Nervoso Periférico (SNP) que toma o nome de neuroplasticidade (Cecatto & Chadi, 2007; Fong, et al., 2009; Orsini, 2012; Carr, Millis, & Weng, 2013; Thompson & Wolpaw, 2015), sendo também baseada na neuromodulação e memorização do sistema nervoso, propriedades que serão abordadas no capítulo seguinte (Fong, et al., 2009; Brownstone, Bui, & Stifani, 2015; Martins Â. P., 2016).

É de referir que o sistema nervoso e o sistema músculo-esquelético estão interligados de modo a tornar possível a realização de funções básicas como caminhar, comer, urinar e defecar,

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2 funções essas que, realizadas voluntariamente e sem dor, definem a funcionalidade (Edwards, 2002). Assim, para a elaboração de um plano de tratamento de um doente neurológico, é necessário a compreensão do sistema nervoso, do controlo do movimento, do conceito de neuroplasticidade, e o entendimento dos diferentes métodos e modalidades que promovem a NRF (Hubli & Dietz, 2013).

Hoje em dia, com a evolução progressiva da Medicina Veterinária e o desenvolvimento tecnológico, a área da NRF animal tem vindo a crescer, fazendo uso de métodos e modalidades terapêuticas não invasivas, tais como massagens, alongamentos, cinesioterapia, termoterapia, laser, ultrassons (US), estimulação elétrica (EE), ondas-choque, diatermia e compressão fria pneumática intermitente (CFPI) (Millis & Levine, 2014; Krueger, et al., 2017).

1.1.

Propriedades da Medula Espinhal

A medula espinhal é parte integrante do SNC, tendo um papel primordial na recolha e transmissão da informação motora do encéfalo para o SNP, da informação sensorial do SNP para o encéfalo, e na modulação de impulsos sensoriais, possuindo atividade reflexa, essencial para a locomoção (Rossignol & Frigon, 2011; Guertin, 2014).

A lesão medular, por ser uma doença frequente em animais e humanos, e que, dependendo do nível de gravidade, tem impacto na função sensorial, motora e autónoma do individuo, incentivou a realização de vários estudos na pesquisa de tratamentos da lesão medular com vista à recuperação das funções motoras e autónomas perdidas (Hubli & Dietz, 2013; Angeli, Edgerton, Gerasimenko, & Harkema, 2014; Calabrò, Naro, Leo, & Bramanti, 2016).

1.1.1. Neuroplasticidade

A NRF apoia-se na premissa da capacidade de regeneração do SNC e do SNP, capacidade essa que toma o nome de neuroplasticidade (Cecatto & Chadi, 2007; Edgerton & Roy, 2009; Orsini, 2012). Por sua vez, a neuroplasticidade é definida como uma mudança das propriedades morfológicas e funcionais do sistema nervoso como resposta a uma lesão traumática, ou até mesmo a uma alteração subtil resultante de processos de aprendizagem e memória (Draganski,

et al., 2004; Cecatto & Chadi, 2007; Johansson, 2007; Raineteau, 2008; Orsini, 2012; Qi, Kaas,

& Reed, 2014; Power & Schlaggar, 2016).

A possibilidade de poder haver neuroplasticidade incitou a pesquisa e documentação dos processos fisiológicos inerentes a doenças neurológicas e a um maior interesse pela área de

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3 NRF (Edgerton & Roy, 2008; Knikou, 2012; Power & Schlaggar, 2016; Yue, Clark, Li, & Vaillancourt, 2017).

Após uma lesão medular, existe uma tentativa rápida de adaptação do sistema nervoso. Em diversos estudos, foi observado alterações na morfologia celular e nas propriedades bioquímicas das células precursoras neurais (CPN), com aumento do tempo de vida e diferenciação em astrócitos, oligodendrócitos e neurónios. Para além disso, registou-se uma reorganização anatómica das conexões neurais já existentes e a formação de novos circuitos neurais (Raineteau, 2008; Fong, et al., 2009; Rossignol & Frigon, 2011), inclusivamente, observou-se a expansão de feixes motores descendentes envolvidos no movimento e marcha do animal, como do feixe corticoespinhal e do feixe proprioespinhal (Raineteau, 2008; Dietz V. , 2012; Silva, Sousa, Reis, & Salgado, 2013).

Para além da capacidade de neuroplasticidade da medula espinhal, foi demonstrado, tanto em humanos como em animais, que a medula espinhal tem a capacidade de reajustar a perda de impulsos supraespinhais e de utilizar os impulsos periféricos remanescentes para gerar atividade motora rítmica e assim controlar a estação e a locomoção (Grasso, et al., 2004; Edgerton & Roy, 2008; Edgerton & Roy, 2009; Thompson & Wolpaw, 2014), sendo isso possível graças à existência de geradores de padrão central (GPC) (Duysens & Crommert, 1998; Lavrov, et al., 2014; Guertin, 2014), que em muitas espécies são responsáveis pelo padrão cíclico de atividades como caminhar, respirar e mastigar (Duysens & Crommert, 1998). Os GPC consistem num conjunto funcional de neurónios, localizados nas intumescências torácica e pélvica, que interagem com informação sensorial específica, tendo a capacidade de gerar estímulos motores e de criar um padrão de movimento semelhante à locomoção, de forma rítmica e independente de estímulos supraespinhais (Duysens & Crommert, 1998; Dietz & Harkema, 2004; Gerasimenko, Roy, & Edgerton, 2008; Hubli & Dietz, 2013).

Durante a locomoção quadrúpede de um cão saudável, o comando para iniciar e terminar a marcha é gerado a nível supraespinhal, mas depois de iniciada, fibras aferentes dos membros torácicos (MT) e membros pélvicos (MP) conduzem a informação relacionada com o movimento à medula espinhal e a centros supraespinhais, sendo que alguns desses impulsos nervosos atuam diretamente nos GPC, que por sua vez geram o movimento rítmico da locomoção (Duysens & Crommert, 1998; Guertin, 2014).

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4 Em casos de lesão medular com ausência de impulsos supraespinhais, propõe-se que a locomoção possa surgir da interação de estímulos sensoriais com os GPC (Courtine, et al., 2009; Guertin, 2014). Nesses casos, os estímulos sensoriais padronizados têm um papel essencial em facilitar e modular os estímulos motores rítmicos dos GPC, de forma a mimetizar a locomoção voluntária (Dietz & Harkema, 2004; Grasso, et al., 2004; Gerasimenko, Roy, & Edgerton, 2008; Edgerton & Roy, 2009; Lewis, Howard, & Olby, 2017).

A NRF faz uso do treino locomotor (TL) no tapete rolante (TR) e no tapete rolante aquático (TRA) de modo a criar estímulos aferentes padronizados para atingir uma locomoção fictícia funcional (Lewis, Howard, & Olby, 2017). Estudos demonstraram que os GPC localizados na intumescência pélvica podem interpretar a velocidade da passadeira e a carga exercida pelos MP para gerar padrões de movimento semelhantes à locomoção, e por isso, o treino diário no TR e no TRA resulta numa melhoria significativa da locomoção (Duysens & Crommert, 1998; Grasso, et al., 2004; Edgerton & Roy, 2009; Dietz V. , 2012; Hubli & Dietz, 2013; Hinahon, Estrada, Tong, Won, & Leon, 2017).

Durante o TL assistido no TR, o estímulo dos mecanorreceptores localizados na pele, músculos e articulações é essencial para estimular as duas fases da locomoção, a fase de extensão e a fase de suspensão. Os mecanorreceptores da pele localizados na superfície dorsal dos dígitos, quando estimulados, desempenham um papel importante na fase de suspensão. Posteriormente, o impulso sensorial dos mecanorreceptores localizados nas almofadas plantares, quando o membro toca o TR, reforça a atividade extensora dos músculos extensores e a fase de extensão. Durante a fase de extensão, a informação da carga exercida no membro é transmitida pelo impulso propriocetivo dos músculos extensores dos MP, via fibras aferentes Ib provenientes do órgão tendinoso de Golgi (OTG), localizado entre o músculo e o tendão, e que controla a transição da fase de extensão para a fase de suspensão (Hubli & Dietz, 2013).

Por vezes, a incapacidade de produzir padrões de movimento após lesão medular é devido à perda de informação sensorial, tornando-se necessário o desenvolvimento de modalidades e métodos para ativar os GPC para além do TL, como a estimulação elétrica medular e a estimulação eletromagnética medular, juntamente com agentes farmacológicos, entrando assim num conceito de abordagem multimodal (Olby, et al., 2009; Hubli & Dietz, 2013; Gerasimenko,

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5 Foi observado que a estimulação elétrica medular aplicada sobre a zona L2-S1 induz movimentos rítmicos dos MP (Gerasimenko, et al., 2014). Partindo disto, foi demonstrado em mamíferos que o TL, em conjunto com a abordagem farmacológica e a estimulação elétrica, promove mudanças plásticas dos circuitos sensoriais e motores que resultam na recuperação da marcha (Edgerton, Kim, Ichiyama, Gerasimenko, & Roy, 2006; Courtine, et al., 2009; Lavrov,

et al., 2014; Krueger, et al., 2017).

Uma das características que se observou com o treino funcional aplicado em NRF foi que a medula tem capacidade de regeneração e aprendizagem, mas essa aprendizagem é muito dependente da tarefa executada, ou seja, se forem realizados muitos exercícios de estação assistida, o animal terá a capacidade, com o tempo, de possuir estação ativa, mas não de caminhar. Por outro lado, se o treino for baseado inteiramente em TL no TR, o animal será capaz de andar, mas não de manter estação ativa. Por essa razão, o treino funcional não passa só por TL, mas por outros exercícios de cinesioterapia (Dietz & Harkema, 2004; Knikou, 2012). Para além da neuroplasticidade medular, a plasticidade do córtex cerebral e de outros centros supraespinhais desempenham um papel importante no retorno à funcionalidade, uma vez que há a modulação da locomoção por essas mesmas estruturas (Hubli & Dietz, 2013; Qi, Kaas, & Reed, 2014).

1.1.2. Neuromodulação

Durante o processo de neuroplasticidade, a falta de especificidade na formação de novas sinapses nervosas pode levar à recuperação de funções outrora perdidas, mas também à ativação de circuitos anormais, dos quais podem resultar efeitos deletérios ou mal adaptativos, como o aumento das conexões entre neurónios nociceptivos, provocando alodinia, e ainda mudanças na excitabilidade dos neurónios motores, provocando espasticidade (Johansson, 2007; Raineteau, 2008; Fong, et al., 2009; Dietz V. , 2012 Hubli & Dietz, 2013; Martins Â. , 2016; Gouveia, 2017). Com isto, o sucesso da NRF passa também por modular a excitabilidade da medula espinhal (Fong, et al., 2009) através da abordagem multimodal anteriormente descrita (Dietz & Harkema, 2004; Gerasimenko, Roy, & Edgerton, 2008; Edgerton & Roy, 2009; Hubli & Dietz, 2013).

Para além do fenómeno de neuroplasticidade, supõe-se que o TL implementado na área de NRF produza mudanças nas propriedades elétricas dos neurónios e alterações do estado fisiológico e bioquímico de múltiplos sistemas moduladores de neurotransmissores (NT), com consequente

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6 modulação dos feixes sensoriais e motores que permitem a locomoção funcional (Raineteau, 2008; Edgerton & Roy, 2009; Dietz V., 2012). O TL modifica os sistemas GABA e glicina, tendo sido provado que reduz a inibição das conexões espinhais, permitindo que os impulsos sensoriais possam ser integrados para gerar movimento (Dietz & Harkema, 2004). Para além disso, ao longo do TL no TR, foi observado um aumento de um dos recetores do glutamato, o NMDA, e do fator neurotrófico derivado do cérebro (FNDC), cujas funções têm um papel importante na estimulação e plasticidade neural (Edgerton & Roy, 2009; Brownstone, Bui, & Stifani, 2015).

Após lesão medular completa em que foram perdidos todos os impulsos supraespinhais, a combinação de fármacos agonistas da serotonina e a estimulação eletromagnética medular foi capaz de regenerar conexões espinhais outrora não funcionais (Gerasimenko, et al., 2010; Musienko, et al., 2011). Entretanto, foi provado que estas estratégias, juntamente com o TL, são capazes de recrutar populações específicas de circuitos neurais, corrigindo os estímulos sensoriais e remodelando os feixes motores (Courtine, et al., 2009; Angeli, Edgerton, Gerasimenko, & Harkema, 2014; Lavrov, et al., 2014).

Dentro dos fármacos neuromoduladores, a 4-aminopiridina tem sido progressivamente aplicada, uma vez que bloqueia os canais de potássio e restaura a condutividade dos axónios desmielinizados, promovendo a funcionalidade (Blight, Toombs, Bauer, & Widmer, 1991; Olby, et al., 2009). Noutro estudo, o uso de ácido Docosa-Hexaenóico (DHA), um ómega 3, após lesão medular aguda, juntamente com uma abordagem multimodal de NRF, provou promover a neuroplasticidade (Liu, Yip, Priestley, & Michael-Titus, 2016).

1.1.3. Memorização medular

Como já referido, a ativação repetida de determinados feixes somatossensoriais pelo treino funcional pode reforçar circuitos e sinapses usadas com sucesso para a locomoção (Edgerton & Roy, 2009; Hubli & Dietz, 2013), mas em vários estudos, foi demonstrado que se o treino fosse descontinuado numa fase precoce de NRF, o desempenho das funções motoras deteriorava-se, e assim concluiu-se que é necessário haver uma certa repetição para memorização medular através de estímulos suficientes (Dietz & Harkema, 2004; Zbogar, Eng, Miller, Krassioukov, & Verrier, 2017), que segundo Carr, Millis, & Weng (2013) devem consistir em vários treinos de 20 a 60 minutos por dia.

(31)

7 Assim, a abordagem da NRF depende fortemente do tipo de treino, qualidade, ritmo, velocidade e repetição (Edgerton & Roy, 2009; Hubli & Dietz, 2013). Para além disso, foi demonstrado que a medula espinhal não tem apenas capacidade de aprender, mas também possui uma certa inteligência/habilidade de reconhecer um padrão específico de estimulação neural e de realizar os movimentos apropriados que são consistentes com a locomoção funcional (Edgerton & Roy, 2009).

1.2.

Abordagem à Neuroanatomia em NRF

1.2.1. Introdução

Para a elaboração de um plano de NRF é necessário a compreensão do sistema nervoso (Edwards, 2002), principalmente do sistema somatossensorial e do sistema motor somático que, juntamente com os reflexos espinhais miotáticos e os GPC, permitem a manutenção da postura corporal e a locomoção (Glass, 2009; Thomson & Hahn, 2012; Hubli & Dietz, 2013; Guertin, 2014; Uemura, 2015).

1.2.2. Sistema Somatossensorial

O sistema nervoso sensorial, ou somatosensorial, é caracterizado por fibras nervosas aferentes cuja árvore dendrítica funciona como recetor de estímulos sensoriais, sendo o estímulo definido por uma forma de energia que é convertida pelo recetor nervoso num impulso neural. Por sua vez, os estímulos sensoriais podem ser de natureza tátil, térmica, química, luminosa, sonora, de movimento e de pressão, que informam o SNC das características ambientais externas e internas (Glass, 2009; Lorenz, Coates, & Kent, 2011).

Através de fibras nervosas aferentes, os estímulos sensoriais ascendem pelo corno dorsal medular onde são integrados em feixes medulares ascendentes somatossensoriais com destino ao tronco do encéfalo, tálamo e córtex cerebral para a perceção da localização, intensidade e qualidade do estímulo periférico (figura 1) (Lorenz & Kornegay, 2004; Uemura, 2015).

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8 1.2.2.1.Recetores do Sistema Somatossensorial

Dentro do sistema somatossensorial, os recetores mais relevantes na prática de NRF são os mecanorreceptores (tabela 1), os termorreceptores, os nociceptores e os propriocetores (Uemura, 2015; Schenkman, Bowman, Gisbert, & Butter, 2016).

TABELA 1 CLASSIFICAÇÃO DOS MECANORRECEPTORES PRINCIPAIS PERTENCENTES AO SISTEMA SOMATOSSENSORIAL (SEGUNDO UEMURA,2015)

Mecanorreceptores Localização Função

Corpúsculos de Meissner e Corpúsculos de Merkel

Superfícies palmar e plantar

Detetam estímulos superficiais de contacto

Corpúsculos de Pacini Pele, tendões, articulações e órgãos internos

Detetam estímulos por forças de pressão

Corpúsculos de Ruffini Pele Detetam estímulos de distensão da pele e temperaturas altas, agindo também como termorreceptores

Fuso muscular e OTG Músculo-esquelético Propriocetores

FIGURA 1– ESQUEMA REPRESENTATIVO DOS FEIXES MEDULARES ASCENDENTES SOMATOSENSORIAIS COM DESTINO AO TRONCO DO ENCÉFALO, TÁLAMO E CEREBELO (ADAPTADO DE UEMURA,2015)

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9 Os termorreceptores remetem estímulos térmicos, estando localizados essencialmente na pele onde os corpúsculos de Krause são sensíveis ao frio e os corpúsculos de Ruffini são estimulados pelo calor (Schenkman, Bowman, Gisbert, & Butter, 2016).

Os nociceptores localizam-se amplamente pelo organismo, mas principalmente na pele, músculo, capsulas articulares, periósteo e vasos sanguíneos, podendo-se distinguir quatro tipos de nociceptores, os mecânicos, os térmicos, os polimodais e os silenciosos. Por sua vez, os estímulos nociceptivos são transmitidos por dois tipos de fibras, as fibras A que são mielinizadas e transmitem estímulos térmicos e nociceptivos de forma rápida, e as fibras C que não são mielinizadas e transmitem estímulos térmicos e nociceptivos de forma lenta. Por seu lado, os estímulos nociceptivos são integrados em múltiplos feixes somatossensoriais ascendentes, razão pela qual o sinal clinico de perda de sensibilidade aquando uma lesão medular representa um prognóstico reservado (Thomson & Hahn, 2012; Schenkman, Bowman, Gisbert, & Butter, 2016).

1.2.2.2.Feixes Medulares Ascendentes Somatossensoriais

O feixe espinhotalâmico envia informação acerca de estímulos nociceptivos e térmicos da pele, corpo e órgão internos, que pelo funículo lateral medular chega ao tálamo contralateral e, posteriormente ao córtex cerebral (Thomson & Hahn, 2012). O feixe espinhoreticular remete informação sobre estímulos nociceptivos e propriocetivos, que pelo funículo ventral medular ascende à formação reticular e ao núcleo olivar localizados no tronco do encéfalo, e de onde partem fibras nervosas para o córtex cerebral e cerebelo, respetivamente. Os estímulos táteis e propriocetivos das metades cranial e caudal corporais são integrados no fascículo cuneatus e no fascículo espinhomedular, respetivamente, que enviam a informação ao tronco do encéfalo, e posteriormente ao córtex somatossensorial (Dewey & Costa, 2016). Por fim, cada funículo medular possui parte do feixe proprioespinhal que faz a conexão entre segmentos medulares (Snell, 2013).

1.2.2.3.Proprioceção

A proprioceção é descrita como a perceção da posição relativa das diferentes partes do copo pelo SNC, que por sua vez faz uso da informação sensorial aferente proveniente dos mecanorreceptores localizados na pele, músculos, tendões, capsulas articulares e ligamentos, assim como de impulsos aferentes do sistema vestibular e visual, para a regulação da postura corporal e movimento. Por sua vez, os impulsos propriocetivos atingem o cerebelo para a

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10 proprioceção subconsciente, importante na sincronização da atividade muscular, e o córtex cerebral para a proprioceção consciente e interpretação dos mesmos impulsos (Lorenz & Kornegay, 2004; Glass, 2009; Uemura, 2015).

A proprioceção subconsciente é a informação sobre a posição da cabeça, corpo e membros que chega ao cerebelo e é usada para coordenar a postura, locomoção e movimento semiautomático. Por sua vez, o cerebelo também recebe informação referente ao planeamento da atividade motora proveniente do córtex motor e dos centros motores do tronco do encéfalo, que compara com a informação propriocetiva de modo a gerar estímulos de volta aos centros motores para aperfeiçoar a atividade neuromuscular (Lorenz & Kornegay, 2004; Thomson & Hahn, 2012; Uemura, 2015).

A proprioceção consciente proporciona a sensação de posição e movimento em termos de força, ritmo, direção e amplitude, o que permite o animal regular a sua postura e movimento, sendo essencial para o plano motor e aprendizagem motora (Lorenz & Kornegay, 2004).

1.2.3. Sistema Motor Somático

O planeamento do movimento voluntário está centrado no cérebro, que juntamente com o cerebelo, comunica com os centros motores do córtex motor e tronco do encéfalo (Thomson & Hahn, 2012). O córtex motor e o tronco do encéfalo dão origem aos feixes medulares motores descendentes, que anatomicamente são agrupados e classificados em feixes pertencentes ao sistema piramidal e em feixes pertencentes ao sistema extrapiramidal, sendo que o feixe corticonuclear e o feixe corticoespinhal pertencem ao sistema piramidal e os restantes feixes medulares motores descendentes pertencem ao sistema extrapiramidal (Lorenz & Kornegay, 2004; Glass, 2009; Guertin, 2014; Uemura, 2015).

1.2.3.1.Sistema Piramidal

O sistema piramidal consiste em neurónios cujo corpo celular está localizado predominantemente no córtex cerebral, e cujos axónios descendem, pelas pirâmides da medula oblonga, até à medula espinhal (Glass, 2009; Lorenz, Coates, & Kent, 2011). Por sua vez, os feixes pertencentes ao sistema piramidal regulam a atividade motora dos nervos espinhais periféricos no decorrer do movimento voluntário (Guertin, 2014; Schenkman, Bowman, Gisbert, & Butter, 2016).

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11 1.2.3.2.Sistema Extrapiramidal

O sistema extrapiramidal consiste em feixes neurais cujos neurónios têm origem nos núcleos motores localizados em todas as divisões do encéfalo, descendo pela medula espinhal sem passar nas pirâmides da medula oblonga (Glass, 2009; Guertin, 2014). Fazendo referência aos animais domésticos, o sistema piramidal é menos desenvolvido que nos primatas, pelo que o sistema extrapiramidal desempenha um papel muito mais importante nas atividades motoras (Lassek, Dowd, & Weil, 1930; Bucy, Ladpli, & Ehrlich, 1965, Górska & Zalewska-Walkowska, 1980; Glass, 2009; Lorenz, Coates, & Kent, 2011; Thomson & Hahn, 2012; Uemura, 2015).

O tronco do encéfalo contem núcleos motores essenciais para o controlo da postura corporal e da locomoção, dentro deles o núcleo vermelho do mesencéfalo, o núcleo olivar da medula oblonga, os núcleos vestibulares da medula oblonga rostral e a formação reticular (Lorenz & Kornegay, 2004; Uemura, 2015).

Cada feixe medular motor descendente possui certas características e tarefas específicas (figura 2), mas a redundância das atividades motoras é uma das razões que permite a recuperação funcional após lesão medular (Glass, 2009; Uemura, 2015).

Com exceção do feixe vestibuloespinhal e do feixe reticuloespinhal pontino, que são ipsilaterais e estimulam o neurónio motor inferior-α (NMIα) dos músculos extensores ipsilaterais, todos os feixes medulares motores descendentes decussam e enervam o NMIy dos músculos flexores contralaterais, fazendo com que os feixes inibitórios tendam a dominar os feixes excitatórios do sistema motor extensor. Este mecanismo é necessário para diminuir o efeito de dominância dos músculos extensores sobre os músculos flexores, especialmente nos MP (Lorenz, Coates, & Kent, 2011; Thomson & Hahn, 2012).

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12 1.2.4. Postura Corporal e Locomoção

Uma grande quantidade de atividades motoras, como a manutenção da postura corporal, a locomoção e a função visceral, envolve atividade reflexa da medula espinhal, podendo esta ser modulada por impulsos de centros supraespinhais. Os reflexos espinhais podem ser ipsilaterais ou contralaterais, intersegmentais ou intrasegmentais, somáticos ou viscerais (Bucy, Ladpli, & Ehrlich, 1965; Thomson & Hahn, 2012; Morales & Montoliu, 2012).

1.2.4.1.Manutenção da Postura Corporal

A manutenção da postura corporal requer a combinação de vários circuitos neurais que permitem a presença de tónus muscular, tais como de feixes medulares motores descendentes facilitadores dos neurónios motores dos músculos extensores, de reflexos espinhais miotáticos, da coativação alfa-gama e de componentes elásticas inerentes ao músculo (Uemura, 2015; Schenkman, Bowman, Gisbert, & Butter, 2016).

Os reflexos espinhais miotáticos são respostas estereotipadas baseadas na estimulação do fuso muscular, tornando-se o maior mecanismo pelo qual o animal mantém a postura corporal e suporta o seu peso contra a gravidade. A força da gravidade causa flexão dos membros e da coluna vertebral, com estiramento dos músculos extensores e ativação dos fusos musculares correspondentes. Por sua vez, a estimulação das fibras sensoriais Ia do fuso muscular estimula

FIGURA 2 ESQUEMA REPRESENTATIVO DO SISTEMA PIRAMIDAL E DO SISTEMA EXTRAPIRAMIDAL

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13 a contração das fibras musculares extrafusais, via NMIα, e a manutenção do tónus muscular (Glass, 2009; Uemura, 2015).

Para a manutenção da postura corporal, a atividade dos músculos extensores tem de ser dominante perante a atividade dos músculos flexores, dominância essa que é modulada pela ação inibitória de neurónio motor superior (NMS). Desta forma, uma lesão dos feixes medulares motores descendentes resulta na dominância dos músculos extensores e em espasticidade (Thomson & Hahn, 2012). As células de Renshaw também são importantes na medida em que inibem seletivamente grupos de neurónios motores dos músculos extensores, prevenindo a hiperexcitação dos mesmos (Glass, 2009; Schenkman, Bowman, Gisbert, & Butter, 2016). A coativação alfa-gama, para além de atuar para manter o tónus muscular apropriado, permite manter o impulso propriocetivo contínuo que é essencial para uma postura corporal correta e para a locomoção. No fundo, este mecanismo consiste na ativação simultânea do NMIy aquando a estimulação do NMIα, de modo a não haver redução do estiramento do fuso muscular, e consequente diminuição da ativação das fibras sensoriais Ia, que resultaria na diminuição do reflexo espinhal miotático responsável pela manutenção da postura corporal e na diminuição de impulsos nervosos propriocetivos para o SNC (Glass, 2009; Schenkman, Bowman, Gisbert, & Butter, 2016).

1.2.4.2.Locomoção

Quanto à locomoção, o ciclo da marcha é usado para descrever a sua atividade complexa, possuindo duas fases, a fase de extensão quando o membro está em contacto com o solo, e a fase de suspensão quando o membro flete e não está em contacto com o solo. Por seu lado, este padrão rítmico depende de estímulos supraespinhais para ser iniciado, modificado ou terminado, e da informação sensorial aferente, em conjunto com os GPC, para ser mantido (Glass, 2009; Thomson & Hahn, 2012; Uemura, 2015).

A fase de extensão requer a facilitação de neurónios que enervam os músculos extensores e a fase de suspensão requer a facilitação de neurónios que enervam os músculos flexores para iniciar o movimento, e a facilitação de neurónios que enervam os músculos extensores de modo a completar o movimento (Glass, 2009; Lorenz, Coates, & Kent, 2011).

A fase de extensão da locomoção é dependente da ativação dos músculos extensores e da inibição dos músculos flexores, sendo isto da responsabilidade do feixe reticuloespinhal pontino e do feixe vestibuloespinhal. A iniciação da fase de suspensão requer a ativação dos

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14 músculos flexores e a inibição dos músculos extensores para elevar o membro do chão, sendo isto função do feixe reticuloespinhal medular e do feixe rubroespinhal. Assim que a fase de suspensão está completa, a ativação destes sistemas muda de volta para a ativação dos músculos extensores e inibição dos músculos flexores (Glass, 2009; Thomson & Hahn, 2012).

O OTG, localizado nas inserções musculotendíneas, é constituído por recetores nervosos de onde partem fibras aferentes Ib sensíveis ao estiramento do tendão que ocorre aquando a contração das fibras musculares extrafusais. Por sua vez, as fibras aferentes Ib fazem sinapse com interneurónios inibitórios do NMIα dos músculos em contração, e excitatórios do NMIα dos músculos antagonistas. Este reflexo miotático inverso permite a atividade do músculo-esquelético e protege contra o alongamento excessivo dos tendões (Glass, 2009; Lorenz, Coates, & Kent, 2011).

1.3.

Doenças medulares mais frequentes em NRF

Dentro das causas de lesão medular em cães, a doença degenerativa do disco intervertebral (DIV), o tromboembolismo fibrocartilagíneo e o traumatismo são as mais comuns (Levine G. J., et al., 2009). Por sua vez, os gatos sofrem das mesmas doenças, mas com frequências diferentes, sendo o traumatismo e o tromboembolismo arterial as causas mais comuns de lesão medular (Arias, Severo, & Tudury, 2007; Olby, 2010; Moore, et al., 2016). Em suma, a lesão da medula espinhal consiste na perda temporária ou permanente de funções motoras, sensoriais ou viscerais depois de uma lesão traumática ou não traumática da medula espinhal (Calabrò, Naro, Leo, & Bramanti, 2016).

1.3.1. Doença do Disco Intervertebral

A doença do DIV (DDIV) é a causa mais comum de disfunção neurológica em cães, sendo um processo degenerativo que resulta numa serie de mudanças estruturais e fisiológicas do DIV (Penning, Platt, Dennis, Cappello, & Adams, 2006; Brisson, 2010). No gato, a DDIV não é tão comum, no entanto possui as mesmas características fisiopatológicas que no cão (McConnell & Garosi, 2004). As doenças mais comuns relacionadas com a DDIV em cães incluem as hérnias de Hansen tipo I e tipo II, a estenose degenerativa lombossagrada e a espondilomielopatia cervical caudal (Bergknut, et al., 2012).

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15 1.3.1.1.Degenerescência do DIV

A degenerescência do DIV é um processo multifatorial que ocorre com a ancianidade, sendo distinta entre raças condrodistróficas, em que ocorre por metaplasia condroide, e em raças não condrodistróficas, nas quais ocorre por metaplasia fibroide (Olby N. , 1999).

A metaplasia condroide ocorre por dois mecanismos principais. O primeiro mecanismo ocorre por vasculopatia dos vasos que fornecem nutrientes ao núcleo pulposo (NP), o que consequentemente leva à alteração das suas propriedades, com perda de glicosaminoglicanos, aumento do conteúdo de colagénio e diminuição da percentagem de água, e que resulta na perda das propriedades hidroelásticas gerais do DIV, e naturalmente na incapacidade de suportar forças de pressão. O outro mecanismo consiste na condrodistrofia das células do NP com substituição por células semelhantes a condrócitos. Grosseiramente, a substancia gelatinosa do NP é transformada em tecido fibrocartilagíneo calcificado que pode ser observado através de meios de diagnóstico complementares imagiológicos (Jeffery, Levine, Olby, & Stein, 2013). Na metaplasia fibroide, à medida que a quantidade de colagénio do NP aumenta com a idade, as fibras do anel fibroso (AF) começam a separar-se, permitindo a acumulação de fluido e plasma. Progressivamente, este processo degenerativo causa enfraquecimento do AF, especialmente na zona dorsal, o que pode levar à sua protusão no canal vertebral, e consequentemente à compressão da medula espinhal e das raízes nervosas. Ao contrário do que ocorre na metaplasia condroide, a mineralização do DIV não é tão frequente (Brisson, 2010).

1.3.1.2.Extrusão e Protusão do DIV

A extrusão do DIV (hérnia de Hansen tipo I) está tipicamente associada com a metaplasia condroide, envolvendo a extrusão do material do NP através das camadas do AF. As forças anormais geradas pelo NP degenerado e mineralizado causam pequenas fraturas do AF, através das quais o NP sofre extrusão, que pode ocorrer em qualquer direção, mas frequentemente sucede dorsalmente devido ao posicionamento excêntrico do NP no AF (Fingeroth & Thomas, 2015).

A protusão do DIV (hérnia de Hansen tipo II) está associada com a metaplasia fibroide, sendo caracterizada por enfraquecimento e rutura parcial do AF que causa uma extensão focal do AF e do NP sobre o canal vertebral (Fingeroth & Thomas, 2015).

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16 A extrusão do NP resulta numa lesão medular aguda, em contraste com a protusão do AF que causa uma lesão medular crónica. Por sua vez, o material discal, em ambas as situações, pode levar a contusão e compressão medular, compressão das raízes nervosas, inflamação das meninges e lesão da medula espinhal secundária com sinais clínicos neurológicos associados (Olby, et al., 2004; Penning, Platt, Dennis, Cappello, & Adams, 2006; Levine J. M., et al., 2007).

1.3.1.3.Fisiopatologia da Lesão Medular Aguda

As lesões medulares agudas são, na sua maioria, resultado de extrusão do DIV que causa contusão e compressão da medula espinhal, no entanto, outras causas incluem fraturas e subluxações vertebrais que podem causar laceração, contusão e compressão medular (Olby N. , 1999). Por sua vez, o dano mecânico primário inclui uma série de eventos como interrupção anatómica, contusão, compressão e isquemia de axónios, neurónios e células da glia. A interrupção anatómica do parênquima medular refere-se à laceração física do tecido nervoso. A contusão decorre de um impacto agudo medular que causa lesão vascular com rutura da barreira hematoencefálica e dano estrutural, geralmente sem compressão residual, afetando inicialmente a substancia cinzenta da medula espinhal. Por sua vez, a compressão afeta a perfusão da medula espinhal ao limitar o suprimento de sangue arterial e obstruindo o retorno venoso, o que causa lesão direta na mielina dos axónios, acometendo primeiramente a substancia branca da medula espinhal. (Olby N. , 1999; Arias, Severo, & Tudury, 2007; Jeffery, Levine, Olby, & Stein, 2013).

Na prática clinica é difícil classificar as lesões medulares, pois não ocorrem de forma isolada. A extrusão do DIV pode causar contusão, isquémica transitória e compressão pela presença de material discal no interior do canal medular. Numa fratura vertebral, o dano inicial causa lesão do parênquima e contusão, enquanto os fragmentos ósseos e a instabilidade vertebral podem causar compressão medular, sendo que cada uma dessas lesões favorece a ocorrência e propagação de outras, exacerbando o quadro neurológico (Arias, Severo, & Tudury, 2007). A lesão primária é seguida por uma lesão secundária composta por processos vasculares, bioquímicos e inflamatórios que causam dano tecidual, culminando na perda de células neurais, e eventual restabelecimento do tecido destruído por fluido, astrócitos reativos ou ambos (Ducker & Hamit, 1969; Griffiths, 1976; Tator & Fehlings, 1991; Sekhon & Fehlings, 2001; Cruz, Coelho, Antunes-Lopes, & Cruz, 2014).

(41)

17 1.3.1.4.Fisiopatologia da Lesão Medular Crónica

A lesão medular crónica pode decorrer de neoplasias de crescimento lento, protusão do DIV ou de doenças congénitas e degenerativas das vertebras, sendo que muitas vezes pode ocorrer sobreposição de lesões, como contusão e compressão medular crónica (Arias, Severo, & Tudury, 2007).

Na compressão medular crónica, a medula espinhal ativa mecanismos compensatórios de modo a manter o fluxo sanguíneo e os níveis de oxigénio dentro dos parâmetros normais, mas quando a compressão supera este mecanismo, a pressão sanguínea baixa e ocorrem mudanças na permeabilidade celular, o que leva ao desenvolvimento de hipoxia local, assim como de desmielinização axonal, de degenerescência Walleriana e de mielomalacia, principalmente na substancia branca (Arias, Severo, & Tudury, 2007; Marquis, Packer, Borgens, & Duerstock, 2015; Balducci, Canal, Contiero, & Bernardini, 2017). Por seu lado, os sinais clínicos de compressão medular crónica tendem a ser progressivos e menos graves (Jeffery, Levine, Olby, & Stein, 2013).

1.3.1.5.Incidência e Predisposição

Vários estudos demonstram uma predisposição genética das raças condrodistróficas como o Teckel, o Beagle, o Cocker spaniel e o Jack russell terrier para a metaplasia condroide do DIV, com recorrência de hérnias de Hansen tipo I entre os 3 e os 7 anos de idade. Por outro lado, a metaplasia fibroide está associada a raças não condrodistróficas e a um processo degenerativo que leva à ocorrência de hérnias de Hansen tipo II por volta dos 6 a 8 anos de idade (Macias, McKee, May, & Innes, 2002; Olby, et al., 2004; Brisson, 2010). Para além disso, fatores externos como a atividade física e variáveis ambientais influenciam a progressão da DDIV (Bergknut, et al., 2012).

Foi demonstrado, com base em diversos estudos clínicos, que a DDIV tem mais incidência na zona toracolombar (Macias, McKee, May, & Innes, 2002; Olby, et al., 2004; Penning, Platt, Dennis, Cappello, & Adams, 2006; Levine J. M., et al., 2007; Brisson, 2010; Martins Â. P., 2016), tendo sido descrito que 75-80% das hérnias de Hansen tipo I ocorrem entre T11-L1 e as hérnias de Hansen tipo II são mais comuns na região cervical caudal, devido ao aumento das forças rotacionais, na junção toracolombar, por ser uma zona anatómica de transição entre a caixa torácica e a medula espinhal lombar mais flexível, e na zona L7-S1 por ser o foco das forças exercidas pelos MP durante a locomoção (Penning, Platt, Dennis, Cappello, & Adams,

(42)

18 2006; Jeffery, Levine, Olby, & Stein, 2013; Thanigaivel, Ayyapan, Jayaprakash, Balasubramanian, & Thamizhannal, 2017).

1.3.1.6.Diagnóstico

O diagnóstico de DDIV é feito com base na história clínica do animal, nos sinais clínicos, no exame neurológico, na análise do líquido cefalorraquidiano e nos exames complementares imagiológicos como a radiografia, a mielografia, a tomografia computadorizada (TC) e a ressonância magnética (RM) (Macias, McKee, May, & Innes, 2002; Jeffery, Levine, Olby, & Stein, 2013; Masciarelli, et al., 2017).

Em termos radiográficos, nas hérnias de Hansen tipo I, é visível a diminuição do espaço intervertebral e a mineralização do DIV, enquanto nas hérnias de Hansen tipo II, os sinais radiográficos mais percetíveis são a esclerose das faces articulares vertebrais, a espondilose deformante e a diminuição do espaço intervertebral (Macias, McKee, May, & Innes, 2002; Mayhew, et al., 2004; Penning, Platt, Dennis, Cappello, & Adams, 2006; Jeffery, Levine, Olby, & Stein, 2013; Thanigaivel, Ayyapan, Jayaprakash, Balasubramanian, & Thamizhannal, 2017).

1.3.1.7.Sinais Clínicos

Os sinais clínicos neurológicos são variáveis com o nível de lesão medular, havendo uma grande incidência de hiperestesia espinhal (Siddall & Loeser, 2001; Macias, McKee, May, & Innes, 2002) e défices neurológicos motores que podem variar de uma ligeira ataxia propriocetiva a paraplegia com ausência de sensibilidade à dor profunda (Davis & Brown, 2002; Penning, Platt, Dennis, Cappello, & Adams, 2006; Forterre, et al., 2010). Dependendo da localização da lesão medular, a apresentação clínica pode ser típica de lesão de NMS ou de NMI (Brisson, 2010). Outro sinal clínico comumente encontrado é a retenção urinária por dissinergia do músculo detrusor da bexiga, ou incontinência urinária por falta de controlo voluntário da micção e dissinergia do esfíncter uretral (Levine J. M., et al., 2007; Moore, et al., 2016; Ropper & Ropper, 2017; Shaw, et al., 2017). Para além disso, a lesão medular pode levar a outros problemas como infeções recorrentes do trato urinário, úlceras de decúbito, problemas intestinais e disfunção cardíaca e respiratória (Thuret, Moon, & Gage, 2006; Silva, Sousa, Reis, & Salgado, 2013; Jeffery, Levine, Olby, & Stein, 2013).

Em lesões medulares agudas toracolombares, pode ocorrer hipotensão sistémica, postura de Schiff-Sherrington e choque espinhal com hipotonicidade muscular e arreflexia como resultado

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19 de uma interrupção contínua de estímulos supraespinhais (Levine J. M., et al., 2007; Ropper & Ropper, 2017).

Comparando os sinais clínicos de cães com hérnias de Hansen tipo I e cães com hérnias de Hansen tipo II, os primeiros sofrem de variados sinais clínicos com grave disfunção neurológica, mas por um curto período de tempo, uma vez que a maioria dos animais é submetida a uma abordagem cirúrgica precoce. Em casos de hérnia de Hansen tipo II, os cães são geriátricos, na sua maioria, há tendência para o prolongamento dos sinais neurológicos, mas ao mesmo tempo, possuem um grau menor de disfunção neurológica, sendo a paraparésia ambulatória a apresentação clínica mais comum (Macias, McKee, May, & Innes, 2002).

1.3.1.8.Tratamento

O objetivo do maneio cirúrgico é a descompressão da medula espinhal pela remoção do material do DIV que está a comprimir a medula espinhal e as raízes nervosas. Assim, a técnica cirúrgica ideal deve permitir a exposição do canal intervertebral para a remoção desse mesmo material, evitando ao máximo o trauma iatrogénico da medula espinhal e a instabilidade da coluna vertebral após a cirurgia (Shores & Brisson, 2017).

Na zona medular toracolombar, a laminectomia, a hemilaminectomia, a mini-hemilaminectomia ou pediculectomia e a pediculectomia parcial permitem a exposição do canal intervertebral (Shores & Brisson, 2017).

O sucesso da hemilaminectomia no tratamento de hérnias toracolombares está bem documentado, sendo o prognóstico dependente dos défices neurológicos pré-operatórios e da remoção completa do material discal (Scott & McKee, 1999; Davis & Brown, 2002; Macias, McKee, May, & Innes, 2002; Mayhew, et al., 2004; Brisson, Moffatt, Swayne, & Parent, 2004; Brisson, 2010; Henke, Vandevelde, Doherr, Stockli, & Forterre, 2013).

Outra técnica cirúrgica tem sido recomendada como uma medida profilática de recorrência de hérnias de Hansen tipo I, a fenestração do DIV através da remoção de parte do NP por uma fenestração criada no AF, apesar de permanecer controverso devido às possíveis complicações cirúrgicas, ao aumento da anestesia e do tempo anestésico, e ao aumento do custo financeiro para os tutores (Brisson, Moffatt, Swayne, & Parent, 2004).

Com o aperfeiçoamento das técnicas cirúrgicas, a mini-hemilaminectomia ou pediculectomia surge como uma opção de tratamento menos invasivo por apenas remover o processo acessório

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20 e preservar os processos articulares vertebrais, diminuindo assim a instabilidade da coluna vertebral após a cirurgia. Porém, esta técnica pode fornecer uma janela de tratamento muito pequena para a descompressão adequada de lesões medulares extensas (Shores & Brisson, 2017).

Em cães com história crónica de DDIV, a remoção do material discal é uma técnica exigente pelas adesões do AF às estruturas adjacentes, o que faz com que o maneio cirúrgico não seja frequentemente realizado. Nestes casos, a escolha da técnica de corpectomia lateral é mais frequente, permitindo a remoção do material discal do canal vertebral com menor risco de lesões iatrogénicas da medula espinhal (Moissonnier, Meheust, & Carozzo, 2004).

Por seu lado, o maneio conservativo consiste no maneio farmacológico, nos cuidados básicos de enfermagem e na NRF, que para além de melhorar a função motora, foi demonstrado possuir outros benefícios na função cardiovascular, densidade óssea, trato urinário e sistema digestivo (Thuret, Moon, & Gage, 2006; Jeffery, Levine, Olby, & Stein, 2013).

Alguns fármacos têm sido recentemente usados em lesões medulares, como a 4-aminopiridina que possui a capacidade de bloquear os canais de potássio, restaurando a condução de axónios desmielinizados e melhorando a transmissão sináptica, culminando na recuperação de funções motoras (Blight, Toombs, Bauer, & Widmer, 1991; Olby, et al., 2009;). Para além disso, a terapia celular tem vindo a crescer exponencialmente, tendo já sido provado o sucesso do tratamento de lesões medulares com células estaminais (Arias, Severo, & Tudury, 2007; Olby N. , 2010; Gabel, Curtis, Marsala, & Ciacci, 2016; Krueger, et al., 2017; Li, et al., 2017).

1.3.1.9.Prognóstico

Os sinais clínicos comumente associados com lesão grave da medula espinhal são a arreflexia, a perda de sensibilidade à dor profunda e a postura de Schiff-Sherrington. Por sua vez, foi demonstrado que quanto maior a lesão medular, menor é a taxa de recuperação, ou seja, pior é o prognóstico (Henke, Vandevelde, Doherr, Stockli, & Forterre, 2013). Dentro destes sinais clínicos, a presença de sensibilidade à dor profunda tem sido reportada como o fator de prognóstico mais importante no retorno à funcionalidade, sendo reservado na ausência de sensibilidade à dor profunda (Scott & McKee, 1999; Davis & Brown, 2002; Olby, Jay Levine, Muñana, Skeen, & Sharp, 2003; Brisson, 2010; Henke, Vandevelde, Doherr, Stockli, & Forterre, 2013; Shaw, et al., 2017).

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21 Estudos também provaram a associação direta entre o tempo de compressão medular com a percentagem de recuperação dos potenciais do sistema somatossensorial e motor após descompressão cirúrgica, o que foi suportado por estudos histológicos da medula espinhal que demonstraram fibrose epidural e sinais de inflamação crónica ao nível da compressão medular, assim como de degenerescência Walleriana, desmielinização e necrose, proporcionalmente maiores com o tempo de compressão medular (Delamarter, Sherman, & Carr, 1995; Macias, McKee, May, & Innes, 2002; Henke, Vandevelde, Doherr, Stockli, & Forterre, 2013; Grassner,

et al., 2015). Assim, existe uma tendência para que cães submetidos a cirurgia descompressiva

dentro de 12 horas após a lesão medular, tenham um prognóstico melhor (Scott & McKee, 1999).

Em casos de hérnia de Hansen tipo I, um bom prognóstico foi associado a idades jovens, duração curta dos sinais clínicos, maneio cirúrgico precoce e presença de função motora voluntária após o maneio cirúrgico. Não houve evidência de relação direta entre o prognóstico com o peso, sexo, aparência do líquido cefalorraquidiano e exames imagiológicos (Macias, McKee, May, & Innes, 2002; Davis & Brown, 2002; Penning, Platt, Dennis, Cappello, & Adams, 2006). Por outro lado, noutro estudo, a obesidade teve um efeito negativo na recuperação das funções motoras (Forterre, et al., 2010).

Em raças não condrodistróficas, a taxa de mortalidade tende a ser maior, facto que se pode dever a estes cães possuírem uma esperança media de vida mais curta e pelo facto do maneio de um cão paraplégico de raça grande ser mais difícil para os tutores (Bergknut, et al., 2012). Quanto à recuperação de funções motoras e sensoriais, estudos reportaram que 25% a 76% dos cães paraplégicos com ausência de sensibilidade à dor profunda, devido a DDIV, recuperam a locomoção. Por sua vez, a recuperação da locomoção pode indicar desenvolvimento de reflexos espinhais periféricos e o animal apresentar uma locomoção fictícia funcional (spinal walking), ou pode advir da sobrevivência de axónios que cruzam o local lesionado. O primeiro sinal de recuperação observado foi o movimento voluntário da cauda, o que sugere que mesmo que esses cães não tenham sensibilidade à dor profunda, a lesão medular não foi completa (Olby, Jay Levine, Muñana, Skeen, & Sharp, 2003). No entanto, cerca de 40% dos cães que recuperam de lesões medulares agudas permanecem com sinais clínicos de incontinência fecal e urinária (Olby, et al., 2004).

Referências

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