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Medusa ao reverso = corpando mitos = Medusa on reverse: bodying myths

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Academic year: 2021

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INSTITUTO DE ARTES ARTES DA CENA

KAMILLA MESQUITA OLIVEIRA

MEDUSA AO REVERSO: CORPANDO MITOS

MEDUSA ON REVERSE: BODYING MYTHS

CAMPINAS 2016

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MEDUSA AO REVERSO: CORPANDO MITOS

Tese apresentada ao Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Doutora em Artes da Cena na área de concentração em Teatro, Dança e Performance.

ORIENTADORA: MARILIA VIEIRA SOARES ALUNA: KAMILLA MESQUITA OLIVEIRA

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA

ALUNA KAMILLA MESQUITA OLIVEIRA, E ORIENTADA PELA PROFA. DRA. MARILIA VIEIRA SOARES.

CAMPINAS 2016

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Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas Biblioteca do Instituto de Artes Silvia Regina Shiroma - CRB 8/8180

Oliveira, Kamilla Mesquita, 1982-

OL4m OliMedusa ao reverso : corpando mitos / Kamilla Mesquita Oliveira. – Campinas, SP : [s.n.], 2016.

Orientador: Marília Vieira Soares.

Tese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Artes.

Ol i1. Klauss Vianna, Técnica de. 2. Mito. 3. Corpo. 4. Keleman, Stanley. 5. Campbell, Joseph, 1904-1987. I. Soares, Marília Vieira,1950-. II. Universidade

Estadual de Campinas. Instituto de Artes. III. Título

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Medusa on reverse : bodying myths Palavras-chave em inglês:

Klauss Vianna, Technique Myth

Body

Keleman, Stanley

Campbell, Joseph, 1904-1987

Área de concentração: Teatro, Dança e Performance Titulação: Doutora em Artes da Cena

Banca examinadora:

Marília Vieira Soares [Orientador] Elisabeth Baush Zimmermann Adilson Nascimento de Jesus Jussara Correa Miller

Laura Pronsato

Data de defesa: 26-07-2016

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Dedico este trabalho a todos os inspirados pela musa Terpsíscore, sempre sensíveis à poesia que emana do corpo que dança.

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Agradeço a todos que direta ou indiretamente contribuíram para a construção deste trabalho. Meus sinceros agradecimentos à Professora Marília Vieira Soares, pelos afetuosos incentivos e orientações ao longo do caminho. Agradeço também às Professoras Elisabeth Zimmermann e Jussara Miller, pela atenciosa leitura e valorosas contribuições desde o exame de qualificação.

Não poderia deixar de agradecer ao Professor Adilson Nascimento, pela carinhosa acolhida no Grupo GEDAN e por compartilhar com generosidade e talento suas belíssimas imagens de árvores e cadelas, que tanto alimentaram minhas próprias imagens criativas; à Professora Ana Cristina Colla, por aguçar o refinamento do meu olhar à poesia presente nas imagens; às Professoras Laura Pronsato e Gabriela Salvador, pelas leituras, sugestões e encorajamentos incontáveis ao longo de todo o processo, sempre realizados de maneira extremamente amável; à Professora Jussara Xavier, pelas contribuições tão significantes, ainda que em um encontro tão breve; à Professora Regina Favre, pela acolhida em seu espaço de estudo e generosa partilha de conhecimentos; às Professoras Daniela Gatti, como coordenadora do curso de Graduação em Dança, Mariana Baruco e Angela Nolf, como docentes responsáveis pelas disciplinas nas quais atuei como PED, pela acolhida e supervisão ao longo dos estágios docentes que, sem dúvida alguma, me propiciaram a oportunidade de aprender muito mais do que ensinar.

Aos graduandos em Dança da Unicamp (turma 2015), que me acolheram como estagiária docente com paciência e carinho, contaminando-me com o frescor da juventude, da curiosidade e da paixão pela dança, que com certeza reavivou a minha própria. Em especial, agradeço aos sete bailarinos voluntários os quais participaram desta pesquisa: Audrey Lyra, Giovanna Herrera, Letícia Bérgamo, Natália Bíscaro, Sarah Raquel Santos, Thaís Esteves e Vinícius Pianca. A estes sete talentosos bailarinos, agradeço muitíssimo por nossas partilhas criativas.

Ao longo deste processo de quatro anos de pesquisa, tive a felicidade de ter por perto vários amigos artistas, sempre generosos e disponíveis a acompanhar o processo e ajudar no seu desenvolvimento por meio de preciosas críticas e sugestões. Foram tantos: Jussara Miller, Bruna Reis, Isadora Massoni, Raíssa Tomasin, Aline Pinotti, Diogo Camargo, Ana Taglianetti, Adriana Barcellos, Juliana Passos, Anna Reis, Tania Villarroel, Renata Volpato, enfim. Agradeço a todos pela cumplicidade artística.

Meus agradecimentos, também, ao sensível trabalho dos demais colaboradores: Igor Capelatto e Rafael Veron, pelos registros videográficos; Danilo Patzdorf, Fábio Minagawa, Ivana Cubas, Leonardo Lin, Naava Bassi, pelas poéticas imagens fotográficas. E à Flavia Pagliusi pela primorosa revisão.

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possível.

Agradeço à CAPES pelo financiamento desta pesquisa.

Além dos colaboradores diretos, agradeço imensamente a todos aqueles que teceram a teia de suporte emocional ao desenvolvimento deste trabalho. Agradeço a todos os meus familiares pelos estímulos e apoios, principalmente aos meus pais: Graciano Camilo e Elizabeth Mesquita, por todo o afeto com o qual me presenteiam desde meus primeiros instantes de vida e por me ensinarem, dentre tantas outras coisas, a acreditar nos meus sonhos.

Agradeço as minhas queridas alunas de Danças Étnicas pelos momentos de dança compartilhados e também por me permitirem adentrar por tantos universos de aprendizagem acerca da feminilidade, elemento este que se faz presente em cada instante deste processo.

E, por último, mas de maneira alguma menos importante, gostaria de agradecer a Igor Capelatto, por inúmeras contribuições técnicas neste trabalho: trilha sonora, tratamento de imagens, arte gráfica, dentre tantos outros, mas principalmente pela constante e amorosa parceria, não somente na criação artística, mas na partilha de sonhos e de vidas.

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Este é um estudo performativo guiado por um entusiasmo de prática investigativa de possíveis relações entre corpo, imagens visuais e imagens míticas no âmbito da criação artística, tendo, em um primeiro momento, como mote entusiástico da prática, a obra da escultora francesa Camille Claudel.

Inicialmente, parto da pesquisa do meu próprio corpo e, posteriormente, conduzo essa investigação prática junto a um grupo de sete bailarinos voluntários, tendo como instrumental os tópicos corporais presentes na sistematização da Técnica Klauss Vianna. Vislumbro o corpo não somente como mote da criação, mas, simultaneamente, como receptáculo e matriz disparadora de imagens outras que se entrelaçam no processo criativo. Ao longo da pesquisa, vou construindo uma proposta de caminhos e procedimentos criativos – ‘Corpando Mitos’ –, bem como a relação entre o visível (iconográfico) e o invisível (dimensão mítica) da imagem que vai se construindo justamente pela observação e vivência corporal de detalhes refinadamente captados, experienciados e recriados no corpo do ator-bailarino.

Ouso, portanto, parafrasear o mitólogo Joseph Campbell, quando diz que “Mitologia é uma canção, a canção da imaginação inspirada pelas energias do corpo” (CAMPBELL apud KELEMAN, 2001, p.11). No meu caso, diria que a minha dança é uma canção inspirada pela mitologia que encontro em meu próprio corpo. E, como uma Medusa ao Reverso, vou dando vida, por meio do movimento expressivo, aos mitos de pedra vislumbrados pelo meu olhar.

PALAVRAS-CHAVE: Técnica Klauss Vianna; Joseph Campbell; Stanley Keleman; Corpo; Imagem; Mito.

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This is a performative study guided by an enthusiasm of investigative practice of the the possible relations between body, visual images and mythical ones, in the artistic creation context, and, at first, as an enthusiastic practice motto, the artistic work of french sculptor Camille Claudel. Foremost, I have begun with my own body research and, subsequently, I have carried the practical investigation with a group of seven volunteer dancers, taking the corporal topics of the Klauss Vianna Technique systematization as a tool. I consider the body not only as a theme for creation, but simultaneously as a receptacle and a matrix that triggers other images that intertwine during the creative proccess. Throughout the research, I construct a proposal of creative ways and procedures – ‘Bodying Myths’ –, as well as the relation between what is visible (iconographic) and what is invisible (mythical dimension) on the image that is being built exactly by means of observation and body experience of details exquisitely captured, experienced and recreated on the actor-dancer’s body.

I dare to paraphrase the mythologist Joseph Campbell, when he says “Mythology is a song, the song of imagination inspired by the energies of the body” (CAMPBELL apud KELEMAN, 2001, p.11). In my case, I would say that my dance is a song inspired by the mythology I find in my own body. And, like a Medusa on Reverse, I give life by means of my own expressive movement to the stone myths envisioned by my eyes.

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Figura 01 - Montagem Artística de Igor Capelatto a partir de foto de Ivana Cubas e escultura de Camille Claudel : A Tocadora de Flauta.

Figura 02 - Material de Processo (Diário de Criação e Estudos de Imagem) - Foto de Adriana Barcellos.

Figura 03 - Kamilla Mesquita: Diário de Criação – 11 de junho de 2014. Figura 04 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Ivana Cubas.

Figura 05 - Camille Claudel: Perseu e Medusa, 1898/1901. Mármore. 196x11x99cm. Coleção AGF. Figura 06 – Camille Claudel: A Tocadora de Flauta, 1904. Bronze. 53x30x24cm. Coleção Particular.

Figura 07 – Camille Claudel: Aurora, 1893/1908. Mármore. 33x28x28cm. Coleção Particular. Figura 08 – Camille Claudel: Niobe Ferida, 1906. Bronze. 90x50x55cm. Musée Saint-Croix. Figura 09 – Camille Claudel: Sakoutala, 1888. Mármore. 190x110x60cm. Coleção Particular. Figura 10 – Camille Claudel: O Abandono ou Vertumno e Pomona. 1905. Bronze. 43x40x17cm. Coleção Particular.

Figura 11 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Léo Lin. Figura 12 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Naava Bassi.

Figura 13 – Camille Claudel: A Pequena Castelã. 1893/1895. Bronze. 33x28x22cm. Coleção Particular.

Figura 14 – Camille Claudel: Aurora, 1893/1908. Mármore. 33x28x28cm. Coleção Particular. Figura 15 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Léo Lin.

Figura 16 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Léo Lin.

Figura 17 – Camille Claudel: O Gato, 1893. Bronze. 5,5x13, 5x9cm. Coleção Lucile Audouy. Figura 18 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Fábio Minagawa.

Figura 19 – Camille Claudel: A Onda, 1897. Bronze e ônix. 62x56x50cm. Coleção Particular. Figura 20 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Fábio Minagawa.

Figura 21 – Camille Claudel: Detalhe de A Onda, 1897. Bronze e ônix. 62x56x50cm. Coleção Particular.

Figura 22 – Camille Claudel: Jovem com Nenúfares, Hamadríade ou Ofélia, 1897. Mármore e bronze. Dimensão não mencionada. Coleção Particular.

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Figura 24 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Léo Lin.

Figura 25 – Kamilla Mesquita: Diário de Criação – 24 de setembro de 2014.

Figura 26 – Camille Claudel: A Fortuna, 1900. Bronze. 48x25x17cm. Coleção Particular. Figura 27 – Kamilla Mesquita: Diário de Criação – 22 de outubro de 2014.

Figura 28 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Léo Lin. Figura 29 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Léo Lin. Figura 30 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Léo Lin. Figura 31 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Léo Lin. Figura 32 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Léo Lin. Figura 33 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Léo Lin.

Figura 34 – Kamilla Mesquita: Diário de Criação – 12 de novembro de 2014.

Figura 35 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Léo Lin. Figura 36 – Cenas de Medusa ao Reverso – Fotos de Léo Lin. Figura 37 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Léo Lin. Figura 38 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Ivana Cubas. Figura 39 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Léo Lin. Figura 40 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Léo Lin. Figura 41 – Cenas de Medusa ao Reverso – Fotos de Léo Lin. Figura 42 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Léo Lin.

Figura 43 – Montagem Artística de Igor Capelato a partir de foto de Léo Lin e escultura de Camille Claudel: A Fortuna.

Figura 44 – Camille Claudel: Detalhe de A Tocadora de Flauta, 1904. Bronze. 53x30x24cm. Coleção Particular.

Figura 45 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Naava Bassi.

Figura 46 – Camille Claudel: Detalhe de A Fortuna, 1900. Bronze. 48x25x17cm. Coleção Particular.

Figura 47 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Danilo Patzdorf. Figura 48 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Danilo Patzdorf.

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Figura 51 – Camille Claudel: Níobe Ferida. 1906. Mármore. 90x50x55cm. Musée Saint-Croix. Figura 52 – Kamilla Mesquita: Diário de Criação – 07 de novembro de 2014.

Figura 53 – Kamilla Mesquita: Diário de Criação – 07 de novembro de 2014. Figura 54 – Kamilla Mesquita: Diário de Criação – 12 de novembro de 2014. Figura 55 – Kamilla Mesquita: Diário de Criação – 24 de novembro de 2014. Figura 56 – Kamilla Mesquita: Diário de Criação – 13 de maio de 2015.

Figura 57 – Materias de Processo (Diário de Criação e Estudos de Imagem) – Foto Adriana Barcellos.

Figura 58 – Audrey Lyra: Audrey Menina ou Mini Me – Estudos de Imagem. Figura 59 – Audrey Lyra: Ouverboard– Estudos de Imagem.

Figura 60 – Audrey Lyra: Cau Hansen – Estudos de Imagem. Figura 61 – Giovanna Herrera: Sátiro – Estudos de Imagem.

Figura 62 – Giovanna Herrera: Ninfa (Ondina) – Estudos de Imagem. Figura 63 – Giovanna Herrera: Hermes – Estudos de Imagem.

Figura 64 – Natália Bíscaro: Cibele, Terpsícore e Cárites– Estudos de Imagem. Figura 65 – Vinícius Pianca: Prometeu – Estudos de Imagem.

Figura 66 – Vinícius Pianca: As Fofoqueiras – Estudos de Imagem. Figura 67 – Thaís Esteves: Afrodite – Estudos de Imagem.

Figura 68 – Thaís Esteves: Narciso – Estudos de Imagem. Figura 69 – Thaís Esteves: Recolhimento – Estudos de Imagem. Figura 70 – Letícia Bérgamo: Ninfa – Imagem escolhida.

Figura 71 – Letícia Bérgamo: Eros e Psiquê – Imagem escolhida. Figura 72 – Letícia Bérgamo: Danáide – Imagem escolhida.

Figura 73 – Sarah Raquel Santos: Bailarina com Xícaras – Imagem escolhida. Figura 74 – Sarah Raquel Santos: Maquiagem – Imagem escolhida.

Figura 75 – Sarah Raquel Santos: Mãos Cruzadas –Imagem escolhida. Figura 76 – Kamilla Mesquita: Diário de Criação – 22 de outubro de 2014. Figura 77 – Kamilla Mesquita: Sereia – Estudos de Imagem.

Figura 78 – Kamilla Mesquita: Aurora – Estudos de Imagem. Figura 79 – Kamilla Mesquita: Níobe – Estudos de Imagem. Figura 80 – Kamilla Mesquita: Ofélia – Estudos de Imagem.

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Figura 83 – Kamilla Mesquita: A Fortuna – Estudos de Imagem. Figura 84 – Estudo Cênico de Vinícius Pianca – Foto de Ivana Cubas.

Figura 85 – Estudo Cênico de Audrey Lyra, Giovanna Herrera e Natália Bíscaro – Foto de Ivana Cubas.

Figura 86 – Estudo Cênico de Vinícius Pianca – Foto de Ivana Cubas.

Figura 87 – Estudo Cênico de Letícia Bérgamo e Thaís Esteves – Foto de Ivana Cubas. Figura 88 – Estudo Cênico de Sarah Raquel Santos – Foto de Ivana Cubas.

Figura 89 – Estudo Cênico de Sarah Raquel Santos – Foto de Ivana Cubas. Figura 90 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Ivana Cubas.

Figura 91 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Ivana Cubas. Figura 92 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Ivana Cubas. Figura 93 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Ivana Cubas. Figura 94 – Estudo Cênico de Vinícius Pianca – Foto de Ivana Cubas. Figura 95 – Estudo Cênico de Vinícius Pianca – Foto de Ivana Cubas. Figura 96 – Estudo Cênico de Audrey Lyra – Foto de Ivana Cubas.

Figura 97 – Estudo Cênico de Sarah Raquel Santos – Foto de Ivana Cubas. Figura 98 – Estudo Cênico de Sarah Raquel Santos – Foto de Ivana Cubas. Figura 99 – Estudo Cênico de Sarah Raquel Santos – Foto de Ivana Cubas. Figura 100 – Estudo Cênico de Sarah Raquel Santos – Foto de Ivana Cubas.

Figura 101 – Estudo Cênico de Audrey Lyra, Giovanna Herrera e Natália Bíscaro – Foto de Ivana Cubas.

Figura 102 – Estudo Cênico de Audrey Lyra, Giovanna Herrera e Natália Bíscaro – Foto de Ivana Cubas.

Figura 103 – Estudo Cênico de Vinícius Pianca – Foto de Ivana Cubas. Figura 104 – Estudo Cênico de Vinícius Pianca – Foto de Ivana Cubas. Figura 105 – Audrey ‘Corpando’ Audrey Menina.

Figura 106 – Audrey ‘Corpando’ Audrey no Cau Hansen. Figura 107 – Giovana ‘Corpando’ Hermes.

Figura 108 – Giovana ‘Corpando’ Sátiro. Figura 109 – Giovana ‘Corpando’ Ninfa.

Figura 110 – Estudo Cênico de Giovanna Herrera – Foto de Ivana Cubas. Figura 111 – Natália ‘Corpando’ Cibele.

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Cubas.

Figura 114 – Estudo Cênico de Audrey Lyra, Giovanna Herrera e Natália Bíscaro – Frame do Vídeo de Registro dos Processos Criativos.

Figura 115 – Estudo Cênico de Audrey Lyra, Giovanna Herrera e Natália Bíscaro – Foto de Ivana Cubas.

Figura 116 – Estudo Cênico de Audrey Lyra, Giovanna Herrera e Natália Bíscaro – Foto de Ivana Cubas.

Figura 117 – Estudo Cênico de Audrey Lyra, Giovanna Herrera e Natália Bíscaro – Foto de Ivana Cubas.

Figura 118 – Natália; Giovanna e Audrey ‘Corpando’ As Cárites. Figura 119 – Vinícius ‘Corpando’ Prometeu.

Figura 120 – Estudo Cênico de Vinícius Pianca – Frame do Vídeo de Registro dos Processos Criativos.

Figura 121 – Estudo Cênico de Vinícius Pianca – Frame do Vídeo de Registro dos Processos Criativos.

Figura 122 – Vinícius ‘Corpando’ As Fofoqueiras.

Figura 123 – Estudo Cênico de Vinícius Pianca – Frame do Vídeo de Registro dos Processos Criativos.

Figura 124 – Thaís Esteves: Recolhimento – Estudos de Imagem. Figura 125 – Thaís ‘Corpando’ Afrodite.

Figura 126 – Thaís ‘Corpando’ Narciso.

Figura 127 – Estudo Cênico de Thaís Esteves – Foto de Ivana Cubas. Figura 128 – Estudo Cênico de Thaís Esteves – Foto de Ivana Cubas. Figura 129 – Letícia ‘Corpando’ Ninfa.

Figura 130 – Letícia ‘Corpando’ Danáide.

Figura 131 – Estudo Cênico de Letícia Bérgamo e Thaís Esteves – Frame do Vídeo de Registro dos Processos Criativos.

Figura 132 – Estudo Cênico de Letícia Bérgamo e Thaís Esteves – Foto de Ivana Cubas. Figura 133 – Estudo Cênico de Letícia Bérgamo e Thaís Esteves – Foto de Ivana Cubas. Figura 134 – Estudo Cênico de Letícia Bérgamo e Thaís Esteves – Foto de Ivana Cubas. Figura 135 – Estudo Cênico de Letícia Bérgamo e Thaís Esteves – Foto de Ivana Cubas. Figura 136 – Estudo Cênico de Letícia Bérgamo e Thaís Esteves – Foto de Ivana Cubas.

Figura 137 – Estudo Cênico de Letícia Bérgamo e Thaís Esteves – Frame do Vídeo de Registro dos Processos Criativos.

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Figura 141 – Sarah ‘Corpando’ Bailarina com Xícaras. Figura 142 – Sarah ‘Corpando’ Maquiagem.

Figura 143 – Estudo Cênico de Sarah Raquel Santos – Frame do Vídeo de Registro dos Processos Criativos.

Figura 144 – Estudo Cênico de Sarah Raquel Santos – Foto de Ivana Cubas. Figura 145 – Estudo Cênico de Sarah Raquel Santos – Foto de Ivana Cubas.

Figura 146 – Estudo Cênico de Sarah Raquel Santos – Frame do Vídeo de Registro dos Processos Criativos.

Figura 147 – Folder da Mostra de Resultados Cênicos da Pesquisa

Figura 148 – ‘Rito de Prólogo’ antes da Mostra dos Processos Criativos – Foto de Ivana Cubas. Figura 148 – Agradecimentos ao Final da Mostra dos Processos Criativos – Foto de Ivana Cubas. Figura 149 – Cena de Medusa ao Reverso – Foto de Ivana Cubas.

Figura 150 – Cena de Medusa ao Reverso – Detalhe da Foto de Ivana Cubas. Figura 151 – Cena de Medusa ao Reverso –Foto de Ivana Cubas.

Figura 152 – Montagem Artística de Igor Capelatto a partir de foto de Ivana Cubas e escultura de Camille Claudel: Níobe Ferida.

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II. Medusa ao Reverso: O Caminhar... II.1. O Covil de Gorgô... II.2. Recontando o Recontar de Histórias: Diário de Criação... II.2.1. Presença, Articulações e minhas ‘Conchas-Ondas-Mãos’... II.2.2. Peso e as Menininhas... II.2.3. Apoio e a Face Animalesca... II.2.4. Resistência e a Grande Vaga... II.2.5. Oposições e os Dedos da Morte... II.2.6. Eixo Global e a Iminente Queda da Fortuna... II.2.7. Os Pés: Raízes Humanas... II.2.8. Bacia: Centro de Gravidade e Espaço de Poder... II.2.9. Cintura Escapular: Centro de Leveza e Espaço Mágico-Mítico... II.2.10. Mãos: Contadoras de Histórias... II.2.11. Crânio: Morada da Deidade... III. ‘Corpando’ Mitos... III.1. O Corpo como Fonte Mítica... III.2. Praticando o ‘Corpar’... III.3. ‘Corpando’ e (Co) ‘Corpando’ Imagens... III.4. A Bomba Pulsátil: Uma Medusa Aquática... III.5. Corpo Lábil – Corpo Mítico... IV. Revisitando o Caminho... IV.1. Outra Camada da Espiral... IV.2. Partilhando o Entusiasmo... IV.3. O Rito de Prólogo... IV.4. Observação do Visível da Imagem... IV.5. ‘Corpando’ o Visível... IV.6. ‘Corpando’ o Invisível... IV.7. ‘Amálgama Corpo-Imagem-Mito’ na Cena... V. Considerações Contínuas... VI. Bibliografia... VI.1. Referências Bibliográficas... VI.2. Referências Videográficas... VI.3. Referência Fonográfica... VI.4. Bibliografia Complementar... 36 39 44 47 59 66 72 77 87 99 103 106 110 114 120 122 132 142 148 159 169 171 173 193 199 209 218 238 278 285 286 288 289 290

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I

INTRODUÇÃO

ADENTRANDO O CAMINHO

Todo este trabalho tem algo de paradoxal: Falo de coisas que devem ser sentidas e não pensadas. (...). Existe, entretanto, entre livro e realidade, toda a diferença que separa um croqui topográfico do país verdadeiro que esse croqui representa. É difícil e às vezes desnecessário teorizar: a prática é fundamental, sempre. (VIANNA, 2005, p. 147)

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Introdução: Adentrando o Caminho

Trata-se de um trabalho acadêmico. Mais precisamente de uma Tese de Doutorado. Mas trata-se de uma Tese de Doutorado em Artes da Cena, escrita por uma bailarina cuja pesquisa está totalmente atrelada à vivência prática. E que bailarina é essa?

Sou mineira natuarl de Cruzília-MG, filha do Seu Camilo (de quem herdei o nome – Kamilla) e da Dona Beth (de quem talvez eu tenha herdado o gozo na apreciação estética de imagens escultóricas ). Com pai militar, a família se mudou várias vezes, transitando entre diversas cidades do sul de Minas Gerais, mas grande parte da minha infância e adolescência foram vividas em Varginha-MG, onde iniciei meus estudos de dança em escolas de ensino livre. Em 2001, aos 18 anos de idade, mudei-me para Campinas para ingressar na Graduação em Dança na UNICAMP, e alguns anos depois concluí meu Mestrado na mesma instituição, na qual finalizo agora meu Doutorado. Graduada em Dança; Mestre em Artes Cênicas e Doutora em Artes da Cena – uma formação essencialmente artística e extremamente pautada pela vivência prática, na qual leituras e escritas têm sido essencialmente potencializadoras; mas a prática vivencial em sala de trabalho, com pés descalços, suor e respiração ofegante têm sido há anos meu principal objeto, método e motivador de pesquisa.

Portanto, convido o leitor a iniciar seus contatos com este trabalho também pela prática, tendo um contato mais direto possível com o que se passou em sala de trabalho. Isso porque, no âmbito da escrita, o mais próximo da vivência real que posso oferecer são trechos do meu diário de criação que irá permear esta tese caracterizando-se, inclusive, como um dos meus instrumentais.

Mas, neste primeiro momento, gostaria apenas que o leitor se aproximasse minimamente deste processo, enxergando pela via do meu próprio olhar, um dos momentos vivenciados ao longo desta pesquisa artístico-acadêmica.

Talvez as letras trêmulas desenhadas sobre o papel, com a minha respiração ainda ofegante após a vivência prática, seja pouco inteligível aos olhos de terceiros. No entanto, por ora, mais do que compreender racionalmente a minha escrita, convido o leitor a degustá-la de maneira sensível, como um convite de boas-vindas a este caminho que adentrei há quatro anos e que, agora, anseio em partilhar.

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Esse é um trecho do Diário de Criação de Medusa ao Reverso, cujas primeiras linhas começaram a ser escritas no dia 16 de abril de 2014. É claro que o processo criativo em si já se iniciara em um tempo anterior, o qual não saberia precisar em uma data específica, mas com certeza, antes mesmo de adentrar a sala de trabalho no dia 16 de abril, muito do movimento criativo já havia sido realizado das mais diversas maneiras (leituras, reflexões, diálogos, audiências de filmes, apreciação de imagens, sonhos, insônias, crises, insights). Obviamente que, desse dia 16 de abril ao dia 11 de junho (trecho acima escolhido), muitas outras linhas foram escritas neste caderno e, algumas delas, fatalmente permearão esta tese. No entanto, o trecho do dia 11 de junho foi escolhido, a priori, por se tratar da descrição poética de movimentos criados a partir da vivência dos primeiros laboratórios. Trata-se de uma cena curta de no máximo cinco minutos dentro do tempo cronológico, mas trata-se também de quase dois meses de trabalho laboratorial. São dois meses traduzidos em cinco minutos e retraduzidos aqui em duas folhas do diário.

Essas duas páginas foram escritas manualmente em um caderno de capa negra sem pautas, com a minha própria letra sem cuidados ou caprichos estéticos. Caneta segurada por uma mão cansada; e ainda suada, sento-me no próprio chão de madeira da sala de trabalho e escrevo o que me vem à mente, sem preocupações conceituais, mas ainda embebida pelas sensações da vivência corporal que acabara de experienciar.

É desse lugar da experiência vivencial que me coloco a falar desde as primeiras páginas desta tese. Não teço aqui de forma alguma uma crítica, mas reflito acerca da observação de que, como leitora de trabalhos acadêmicos da área de artes, é muito comum deparar-me com um paradoxo organizacional das escritas. Muitas são as pesquisas que se baseiam na prática e nas vivências do pesquisador, mas não é pouco comum encontrarmos teses repletas de discussões conceituais, com um brevíssimo último capítulo relatando o processo criativo vivenciado. Há um desejo do pesquisador de assumir a própria prática como protagonista da pesquisa, mas, na escrita, esta quase sempre se faz coadjuvante. E assumo aqui o risco de cair nesse mesmo paradigma, traindo talvez o meu desejo de que a prática protagonize a escrita, mas lanço-me ao desafio, iniciando por uma inversão de ordem estrutural.

Proponho-me a lançar ao leitor, logo após esta introdução, o relato-análise do meu processo de criação Medusa ao Reverso. Somente a partir do capítulo seguinte (III) é que me debruçarei mais refinadamente acerca dos conceitos que emergem da prática, tentando,

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assim, ser fiel ao meu próprio percurso metodológico que, ao longo do processo, descobri tratar-se de uma “pesquisa performativa guiada pela prática”.

* * *

Já interrompo, no entanto, meu intuito de falar diretamente acerca da minha prática vivencial, pois julgo importante uma pausa para a discussão do caminho metodológico escolhido que, por sua vez, justifica muitas das minhas demais escolhas no que diz respeito ao formato da minha escrita.

Tive contato com o trabalho do Professor Brad Haseman1 no V Seminário de Pesquisas em Andamento PPGAC/USP (Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas/ Universidade de São Paulo) (2015), do qual participei durante o percurso do doutorado. Confesso que encontrar-me com essa perspectiva metodológica teve um sabor de deleite e alívio. Diria alívio de reconhecimento, quase como se eu chegasse em casa, em lugar conhecido e familiar, reconhecendo algo que, de certa forma, eu já fazia intuitivamente, mas não sabia exatamente como nomear.

Haseman discute algo com o qual todos nós, pesquisadores em artes da cena, com certeza já nos deparamos, que é a dificuldade de nossas investigações se enquadrarem dentro dos paradigmas vigentes de pesquisa – pesquisa quantitativa e pesquisa qualitativa. Baseado nessa discussão, Haseman propõe um paradigma inteiramente novo - a “pesquisa perfomativa”. Tal discussão é encontrada pela primeira vez em um artigo publicado em 2006 com o sugestivo título de Manifesto pela Pesquisa Performativa. O termo “manifesto”, que é habitualmente encontrado no âmbito das artes com o sentido de quebra de paradigmas e instauração de novas concepções, traz para essa nova perspectiva metodológica um frescor de inovação e abertura às novas possibilidades.

Em termos gerais, pesquisadores quantitativos não estão tão interessados no fenômeno da prática humana (a menos, claro, que ela possa ser mensurada, diz Masters e Johnson [1966]). De modo semelhante, pesquisadores qualitativos convencionais estabeleceram estratégias de pesquisa posicionando a prática como um objeto de estudo, não como um método de pesquisa. [...]. No entanto, em anos

1

Brad Haseman é um pesquisador australiano, professor na Queensland University of Technology, e autor do

“Manifesto pela Pesquisa Performativa”, escrito originalmente em 2006, o qual aborda as especificidades de pesquisas guiadas pela prática, criando um paradigma inteiramente novo de pesquisa Performativa (que recebe o seu nome a partir da teoria dos atos de fala de J.L. Austin) como uma alternativa aos paradigmas quantitativos e qualitativos de pesquisa. (Caderno de Resumos do V Seminário de pesquisas em Andamento PPGAC/USP, 2015).

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recentes, alguns pesquisadores tornaram-se impacientes com as restrições metodológicas da pesquisa qualitativa e sua ênfase em resultados escritos. Eles acreditam que essa abordagem necessariamente distorce a comunicação da prática. Tem havido um movimento radical não apenas de colocar a prática dentro do processo de pesquisa, mas de guiar a pesquisa através da prática. Originalmente propostas por artistas/pesquisadores e pesquisadores na comunidade criativa, essas novas estratégias são conhecidas como prática criativa como pesquisa, performance como pesquisa, pesquisa através da prática, pesquisa de estúdio, prática como pesquisa ou pesquisa guiada pela prática (Haseman, 2006 apud FERNANDES, 2015, p.25)

A “pesquisa guiada pela prática” é repleta de quesitos de credibilidade a serem contemplados, que são discutidos por Haseman. Não vamos nos ater em pormenores acerca desses quesitos neste trabalho, mas os mesmos apontam para o fato de que a “pesquisa performativa” não é uma escolha mais simples do que as pesquisas quantitativas ou qualitativas guiadas, geralmente, por uma hipótese prévia. Mas confesso que deparar-me com a possibilidade de ser verdadeiramente fiel ao meu processo de pesquisa, cuja hipótese nasce a partir da prática, trouxe em mim aquele alívio anteriormente mencionado. Este nada mais é do que um acalento em poder ser verdadeira, relatando o caminho percorrido de fato pela minha investigação: isenta de uma hipótese num primeiro momento, mas guiada pelo que o próprio Haseman chama de “entusiasmo da prática”2.

[...] muitos pesquisadores guiados-pela-prática não iniciam o projeto de pesquisa com a consciência de “um problema”. Na verdade, eles podem ser levados por aquilo que é melhor descrito como “um entusiasmo da prática”: algo que é emocionante, algo que pode ser desregrado, ou, de fato algo que somente pode tornar-se possível conforme novas tecnologias ou redes permitam (mas das quais eles não podem estar certos). Pesquisadores guiados-pela-prática constroem pontos de partida empíricos a partir dos quais a prática segue. Eles tendem a “mergulhar”, começar a praticar para ver o que emerge. [...] A segunda característica de pesquisadores guiados-pela-prática reside na sua insistência de que os resultados da investigação e as reivindicações de conhecimento devem ser feitos através da linguagem simbólica e forma de sua prática. (HASEMAN, 2015, p.44)

Relato a seguir o mote gerador do meu “entusiasmo da prática”, que foi aos poucos guiando a construção deste trabalho. Para tal, no entanto, torna-se impossível não relatar um processo anterior – minha pesquisa de mestrado –, cujo entusiasmo inegavelmente ressoou no “entusiasmo da prática” desta presente investigação.

2

Entusiasmo da Prática é uma expressão criada por Brad Hanseman para referir-se ao elemento disparador de

uma “pesquisa guiada pela prática”, na qual não existe necessáriamente a definição de uma hipótese prévia, mas sim, um desejo artístico que impulsiona a vivência prática; e é a partir desta vivência que se constroe a pesquisa.

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Na pesquisa de Mestrado, intitulada Mulheres de Pedra: estudos das sensações de movimento presentes na obra de Camille Claudel (2010), foquei nos estudos das sensações de movimento presentes na obra escultórica da artista. E foi a essa tal exuberância do movimento, a priori, creditado grande parte do meu fascínio pela obra de Camille Claudel3, tão pungente e geradora de potência criativa quando de encontro à linguagem da Dança. Mas, ao longo do processo, foram percebidos outros elementos na obra claudeliana que propiciavam relações criativas, como as constantes e intensas aparições de figuras míticas na obra da artista e o fato dessas mesmas imagens permearem de maneira muito natural e até mesmo conciliadora das imagens plásticas, cinéticas e sinestésicas no decorrer do processo criativo.

Sereias, ninfas, parcas, górgonas, deusas e heroínas. Uma infinidade de referências míticas podem ser encontrada na obra de Claudel. E, de fato, pesquisando sua biografia, foi possível constatar que era uma assídua leitora de temas mitológicos, tendo acesso a uma vasta biblioteca sobre o tema organizada pelo seu pai. Muito provavelmente, tais leituras, bem como o fascínio pelo universo mítico, a tenham influenciado na riqueza de referências mitológicas expressas no seu panteão de mulheres escultóricas.

Além disso, referências corporais relacionadas aos mitos são abundantemente encontradas na obra claudeliana. O corpo flácido e carcomido da velha Cloto nos fala muito sobre a parca mítica; ou, ainda, o eixo corporal inclinado e titubeante de A Fortuna nos revela as oscilações dessa deidade mítica do destino. A obra de Camille é capaz de revelar, por meio

3

Camille Claudel nasceu em 08 de dezembro de 1864 em Tardenois- França, desde muito jovem já

demonstrava genial talento para a arte da escultura. Em 1881, a família mudou-se para Paris. Camille tinha 17 anos. Algum tempo depois, tornou-se aluna de Rodin, sendo a primeira mulher a quem o escultor deu aulas. Deste contato entre mestre e aprendiz, nasceu um relacionamento amoroso, no qual Camille e Rodin influenciam um ao outro no desenvolvimento de seus estilos. Camille tornou-se uma importante colaboradora das obras de Rodin, com seus comentários, concepção de diversos trabalhos e sua exímia habilidade para esculpir partes das esculturas do mestre, tais como pés e mãos.

Rodin, não era casado, mas tinha um relacionamento anterior com Rose Beuret. Camille, após 15 anos, inconformada com o fato de Rodin não romper com Rose, terminou a relação com o escultor. Camille estaria grávida na época do rompimento e pouco tempo depois sofreria um aborto.

Frustrada em sua relação amorosa enfrentou sérias dificuldades como artista, pelo fato de ser mulher em uma sociedade e emum meio artístico essencialmente machistas. Camille enfrentou a solidão, a frustração profissional, o preconceito e a pobreza. Com o passar do tempo, foi desenvolvendo um distúrbio, o qual seria diagnosticado pela medicina contemporânea como psicose paranóide, caracterizada por alucinações persecutórias. Ela acreditava ser vítima de um complô para destruí-la, cujo autor seria Rodin. Camille produziu intensamente, mas destruiu várias de suas obras, imaginando que Rodin ou um de seus comparsas as roubariam. Logo após a morte do pai, Camille foi internada pela mãe, em 10 de março de 1913 no Hospital Psiquiátrico de Ville-Evrard e no ano seguinte transferida para o Montdevergues Asylum, onde permaneceu por muitos anos, sem produzir artisticamente. Camille Claudel morre em 19 de outubro de 1943. (WAHBA, 2002)

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de imagens corpóreas, verdadeiros mitos antropomorfizados. Corpos femininos que nos falam de narrativas arcaicas por meio de suas musculaturas, posturas, peles e cabeleiras.

Camille Claudel consegue, com genialidade, unir mitologia e corpo em suas esculturas. Ela nos reconta essas narrativas indeléveis e universais simplesmente revelando-nos a expressividade de corpos escultóricos, que revelando-nos tocam fortemente pela própria sensação corporal de peso, leveza, resistência ou fluidez que acometem ao vislumbrá-las. É como se o contato com aquela obra visual abrisse uma porta de entrada para um ato de ‘recontar vivencial’ do mito, que, no meu caso, faz-se por meio da dança. Afinal, muito além de imagens, trata-se de corpos que podem ser vivenciados no pelo artista/espectador pelo caráter simbólico de suas imagens que, além de ossaturas e musculaturas de vida fremente são mitos corporificados – sereias com pernas humanas, deusas com olhar de criança, górgonas com feições humanas.

Camille Claudel vivenciou os mitos em sua criação e os recriou tornando-os mais próximos de nossos próprios corpos humanos. É como se a escultora, tal qual nas sociedades arcaicas, revivesse o mito por meio da sua obra. Isso instigou-me a revivê-los também em meu corpo. Recitar os mitos por meio da minha dança.

Sou povoada por inúmeras imagens visuais e míticas. Indiscutivelmente, tenho muito material de inspiração. Mas percebo, até mesmo por experiências anteriores, que corro um sério risco em pautar minha investigação criativa nessas imagens aparentemente externas. Corro o risco de uma mimese vazia de posturas escultóricas ou ainda de uma recitação mimética de narrativas míticas sem fazer-me estar de fato imersa no universo mítico.

***

Não quero, na atual pesquisa, partir exclusivamente das imagens externas. Mas de onde partir então? O que haveria de mais verdadeiro e concreto à disposição do que o meu corpo? Além de concreto e verdadeiro, o corpo seria a ponte de relações entre as imagens escultóricas (que representam corpos humanos) e as imagens míticas, que também remetem ao corpo humano o tempo todo (afinal muitos dos mitos são antropomorfizados contendo formas humanas ou híbridas e remetem, de alguma maneira, à forma humana).

Então, decido ter como ponto de partida para a criação o meu próprio corpo. Lanço-me à prática, entusiasmada pelo desejo de dançar não apenas as imagens iconográficas das esculturas, mas também o invisível existente em cada uma delas – as narrativas míticas

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que ressoam dessas imagens e reverberam em mim . Menos preocupada com a projeção prévia de uma hipótese, lanço-me à aventura da prática vivencial, considerando-a minha investigação.

Nesse “paradigma emergente” (Haseman, 2006, p. 5), a prática é, em si mesma, o método de pesquisa, seu eixo principal e meio de organização. Nesse contexto, o impulso criativo é bem mais importante para delinear o desenvolvimento da pesquisa do que a hipótese ou o problema. (FERNANDES, 2015, p. 26)

Nesse processo investigativo guiado pela prática, foi se fazendo todo o meu processo de coleta de dados e construção de relação entre conceitos que serão contemplados nos capítulos seguintes. No entanto, esse processo prático-teórico assume uma configuração de obra artística – uma dança, a qual nomeio Medusa ao Reverso –, que toma emprestada do ser mítico Medusa a metáfora do olhar em seu sentido oposto: transformar os seres míticos de pedra (esculturas míticas claudelianas) em movimento vivo . Medusa ao Reverso torna-se, portanto, parte desta escrita. Não a considero uma coreografia resultante do processo de pesquisa, mas sim a própria pesquisa.

Quando uma forma de apresentação é usada para relatar uma pesquisa, pode-se argumentar que ela é na verdade um “texto” – da mesma forma que qualquer objeto ou discurso cuja função é comunicativa pode ser considerado um texto [...] Nessa terceira categoria de pesquisa (performativa) – ao lado da quantitativa (números simbólicos) e qualitativa (palavras simbólicas) – o dado simbólico funciona performativamente. Ele não só expressa a pesquisa, mas, nessa expressão, torna-se a própria pesquisa. [...] (HASEMAN, 2015, p.46-47)

Neste momento, minha dança; e por consequência eu mesma, caracterizamo-nos como dados simbólicos da minha pesquisa. Aqui, faz-se necessária uma nova pausa para tratar desse dado simbólico e ao mesmo tempo tão concreto do qual tratamos: o corpo. Afinal, de que corpo se fala nesta pesquisa?

(...) a primeira qualidade do corpo é escorregar dos rótulos. Sendo fugidio, é um objeto de estudo desconfiado, que não se deixa agarrar por outro corpo, assim ingenuamente. O que se pode fazer é tentar dançar com ele - um dançar semiótico, que não queira buscar a trapaça metodológica de transformar o que é complexo em simples, mas que revele o que há para se revelar em movimentos, alguns ainda até desconhecidos de quem dança: um movimento que nasce não da inteligência neocortical do bailarino, mas dessa inteligência biológica, que tudo tem feito, desde o primeiro pulsar há milhões de anos na cadeia em que se desenrola sua trama, para, apesar de tudo, permanecer. (CAMPELO, 1999, p. 9)

O corpo se apresenta como um objeto de estudo extremamente complexo repleto de camadas e pontos de vista possíveis. Ao longo das minhas investigações bibliográficas, disciplinas cursadas e idas a seminários de pesquisa, fui me deparando com inúmeras investigações de artistas da cena que nomeiam esse objeto de estudo, o corpo, das mais

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diferentes maneiras, por vezes unindo ao termo um hífen e um nova palavra que ressalta o caráter enfocado: “corpo-mídia”; “corpo-subjétil”; “corpo-memória”; “corpo mitológico”; “corpo-interface”; “corpo-ubíquo” “corpo-máscara”; “corpo-político”; “corpo-ético”; para citar apenas alguns dos tantos corpos encontrados nos cenários das pesquisas em artes da cena.

O corpo realmente propicia uma infinidade de enfoques e, muitos deles, indubitavelmente, alimentam e perpassam minhas investigações. No entanto, quando paro para pensar a que corpo me refiro, percebo que falo um pouco de cada um dos citados acima e de tantos outros mais. Verifico que meu corpo é subjétil (FERRACINI)4, mitológico (SANTINHO)5 e interface (SANTAELLA)6 ao mesmo tempo durante minha criação. Então, na busca por um termo que revele o corpo que trata a minha pesquisa, retomo um vocábulo de origens arcaicas: soma.

[...]. Em 1976, Hanna reinterpretou as palavras gregas soma (o corpo em sua completude) e somatikos (corpo vivido) como corpo experienciado e regulado internamente, usando-as para descrever abordagens de integração corpo-mente que ele e outros terapeutas e educadores estavam desenvolvendo. [...]. Nesse sentido, soma é uma interação que dilui a objetificação do corpo em prol da autonomia do ser vivo integrado em todas as suas instâncias, multiplicidades e idiossincrasias, inclusive constituído como paradoxal e metafísico, autocoordenando-se

4

Corpo Subjétil é um termo cunhado pelo ator, professor e pesquisador Renato Ferracini, que descreve uma definição suscinta em seu artigo O Corpo-Subjétil e as micropercepções – um espaço-tempo elementar: “O Corpo Subjétil é o corpo-em-arte, corpo integrado e vetorial em relação ao corpo com comportamento cotidiano. Nesse sentido, sugiro chamar esse corpo integrado expandido como corpo-em-arte, esse corpo inserido no Estado Cênico de corpo-subjétil. Explico: ao ler uma obra de Derrida, chamada Enlouquecer o Subjétil, essa imagem ‘corpo-subjétil’ me surgiu de uma maneira extremamente natural. Subjétil seria, segundo Derrida, retomando uma suposta palavra inventada por Artaud, aquilo que está no espaço entre o sujeito, o subjetivo e o objeto, o objetivo. Não nem um nem outro, mas ocupa o espaço ‘entre’. Outra questão é que essa palavra subjétil pode, por semelhança, ser aproximada da palavra projétil, o que nos leva à imagem de projeção, para fora, um projétil que, lançado para fora, atinge o outro e, como ficará mais claro adiante, também se auto atinge. Essa aproximação pode ser realizada já que ‘subjétil’ é uma palavra intraduzível, pois, como foi supostamente inventada por Artaud, não existe tradução possível em outras línguas. Para mais informações acerca deste termo, vide Café com Queijo: Corpos em Criação (FERRACINI, 2006)

5

Corpo Mitológico é um termo cunhado pela bailarina Gabriela Salvador Santinho que, segundo ela própria, “é o resultado de um trabalho teórico-prático da autora, que o entende como um tipo específico de corpo cênico que interpreta o mito na dança de maneira a aproximar a forma e o conteúdo, ou seja, usando os conteúdos mitológicos presentes no inconsciente do artista e transformando-os em movimentos expressivos” (SANTINHO, 2014, p. 24). Para mais informações, vide O Corpo Mitológico na Dança: quando o mito atravessa o corpo (SANTINHO, 2014).

6

Corpo Interface é um termo cunhado pela pesquisadora em Semiótica, Lúcia Santaella. Trata-se de um interessante e complexo termo que, basicamente, se refere à hibridização do corpo do artista, mais especificamente nos contextos de relações intrínsecas à tecnologia na criação artística. Para mais informações, vide Corpo e Comunicação: Sintoma da Cultura (SANTAELLA, 2004).

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holisticamente rumo ao próprio crescimento com o/no meio. (FERNANDES, 2015, p. 13)

Creio que o termo soma nomeia com justiça o corpo ao qual me refiro e que se faz permeável às imagens visuais e míticas que o rodeiam. Meu interesse não está na relação corpo-imagem, corpo-mitologia ou, ainda, imagem-mitologia; mas na indissociável integração de todos esses elementos que têm o corpo vivido, o soma, simultaneamente como ponto de origem e culminância. Essas relações serão mais amplamente discutidas no capítulo III.

É interessante destacar um caráter curioso em relação ao termo soma, que é, provavelmente, anterior à etimologia grega da palavra. Refiro-me à sua origem sânscrita.

Apesar de o termo somática ter sido inspirado nas palavras gregas descritas acima, a palavra soma tem origem na bebida sagrada relatada no Rig Veda (Griffith, 1896, p. 368-420), com o significado de inspiração ou força motivadora, correspondendo justamente ao que Laban (1950) denominou de Antrieb, ímpeto ou impulso interno (traduzido para effort em inglês, mas não com o sentido de esforço, e sim de expressividade ou dinâmica expressiva): Soma, na tradição védica, portanto, representa essencialmente um estimulante mental não físico e um impulso. A força motivadora para o intelecto e também a reserva de conhecimento científico de buscas que são fonte de capacidade como uma facilitadora de ações para a prosperidade da sociedade (Hindu Revolution, 2011, s.p., tradução nossa). Nessa tradição cultural milenar, soma é também uma divindade e uma bebida responsável pela imortalidade, além de uma substância constitutiva de todos os seres viventes. (FERNANDES, 2015, p. 14)

Esse amplo sentido do termo soma, remetendo a uma divindade e, também, a uma bebida sagrada que adentra o corpo e lhe propicia a inspiração, vem ao encontro de meu entusiasmo investigativo. O ato de beber, simbolicamente, traria algo de fora para dentro; e essa inspiração que adentra o corpo o impulsiona à expressão (de dentro para fora) de algo. Esse algo que adentra e esse outro que emerge do corpo traduziriam-se, talvez, nessa “força motivadora” descrita por Fernandes na citação acima. Pessoalmente a traduziria como um “entusiasmo da prática” que, como uma bebida sagrada, adentra o meu corpo propiciando o início de um processo de vivências, experiências desse corpo vivido e entusiasmado pela prática, ou seja, do soma em sua completude de sentidos. É a este corpo que me refiro a partir de agora sempre que mencionar o termo. Um corpo que se coloca em estado de criação e produção de conhecimento por meio da vivência prática, aberto aos entusiasmos que lhe atravessam.

(30)

No que diz respeito às vivências práticas, e na visão dessas vivências como produção de conhecimento, exponho aqui uma das minhas escolhas e entusiasmos, motivadores de minha prática há vários anos. Desde 2008, venho vivenciando a sistematização da Técnica Klauss Vianna7, tendo a Professora Doutora Jussara Miller8 como mestra nessa abordagem técnica no Salão do Movimento em Campinas, SP. Desde então, além da vivência semanal dos elementos constituintes da Técnica Klauss Vianna, realizei, nesse mesmo local, os cursos de Processo Didático (2011/2012) e Processo Criativo (2009/2010 e 2014/2015) sob a orientação da mesma professora.

Levando-se em consideração todo esse histórico vivencial, não teria como negar tantos anos de contato com a técnica e desprezá-la neste momento. Pelo contrário, a intimidade que foi sendo construída com os seus elementos dotou-me, agora, de um arsenal maior de possibilidades de exploração do movimento dançado por meio dessas, digamos, ‘ferramentas’ já bem conhecidas.

Opto, portanto, por iniciar meu processo criativo partindo da vivência laboratorial dos temas corporais9 da Técnica Klauss Vianna. Embora haja o inegável “entusiasmo de prática” impulsionado pelas imagens escultóricas e suas ‘invisibilidades míticas’, escolho colocar o corpo como protagonista deste estudo. Sendo assim, as vivências dos temas corporais da técnica mencionada acabaram funcionando, primeiramente, como estímulos, portas de entrada de um estado de criação em dança, e, em segundo lugar, como “âncoras”10

7

Esse trabalho foi desenvolvido pelo bailarino e pesquisador do corpo Klauss Vianna (Brasil, 1928-1992), com valiosas contribuições de sua companheira, Angel Vianna (Brasil, 1928), e de seu filho, Rainer Vianna (Brasil, 1958-1995), também bailarinos. No entanto, é importante destacar que a sistematização da técnica não foi realizada pelo próprio Klauss, mas pelo seu filho Rainner e mais outros colaboradores ex-alunos, talentosos pesquisadores e bailarinos que, atualmente, dão continuidade a esse trabalho tão repleto de possibilidades, cada qual com sua singularidade. Dentre estes, não posso deixar de destacar a Professora Doutora Jussara Miller, a primeira a escrever acerca da sistematização da Técnica Klauss Vianna em sua obra A escuta do Corpo: sistematização da Técnica Klauss Vianna (2007).

8

Jussara Miller é bailarina, coreógrafa e educadora somática. Professora Doutora do Curso de Especialização na Técnica Klauss Vianna, na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Também é diretora e professora do Salão do Movimento, espaço de dança e educação somática situado em Campinas, SP.

9

No próximo capítulo será abordado o conceito de temas corporais e a diferenciação deste em relação ao do termo tópicos corporais, sendo ambos presentes na sistematização da Técnica Klauss Vianna.

10

O termo “âncora” é uma das terminologias presentes na sistematização da Técnica Klauss Vianna, referindo-se à perspectiva integrada de estudo técnico e criativo do corpo. Desta maneira, referindo-segundo Miller (2012, p. 133), “O enfoque criativo está no uso dos temas corporais que o próprio corpo estrutural pode oferecer como âncora da criação e recriação da cena dançada (...) O objetivo é tornar permeável o ensinamento técnico em sala de aula

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para que não me perdesse puramente no fascínio das imagens externas, mas continuasse atenta à escuta do corpo e o que este tinha a dizer neste processo de criação.

Assim, no âmbito de uma abertura mais refinada ao universo das percepções do soma, não poderia deixar de mencionar as óbvias influências de abordagens somáticas nesta pesquisa, que trazem essa qualidade de priorização da vivência do corpo e suas conexões vivas e dinâmicas com o meio no processo de construção do conhecimento.

Como fundamento epistemológico, a somática dissolve dicotomias e ensina-nos a viver no paradoxo de um “mundo de constante mudança” (Hackney, 1998, p. 17), território eminente de pesquisas vivas. Nesse campo somático, a sabedoria está em perceber (-se) e cocriar as conexões mutáveis e performativas que, como uma bebida sagrada, imortalizam sintonias multiplicando diferenças cada vez mais plenas de si no/com o todo. (FERNANDES, 2015, p. 30)

A Técnica Klauss Vianna foi, sem dúvida, o meu primeiro ‘gole da bebida sagrada’, minha porta de entrada para a vivência somática no âmbito da criação; e minha escolha como caminho técnico-metodológico para as vivências práticas deste trabalho. E, embora esta pesquisa não tenha como enfoque a educação somática, é interessante mencionar que essa mesma técnica é tida por muitos pesquisadores como tal, tendo em vista sua abordagem integral do corpo, que rompe paradigmas estéticos e dualismos entre técnica e criação.

A Técnica Klauss Vianna faz parte da Escola Vianna, uma escola de pensamento sobre o corpo, que tem como base o trabalho de pesquisa desenvolvido por Angel e Klauss Vianna há mais de 50 anos e, de diferentes formas, tem continuidade no trabalho de um grande número de pesquisadores. A pesquisa dos Vianna ficou conhecida como um trabalho de consciência corporal, e hoje pode ser entendida como arte do corpo e educação somática. Na sua prática, o movimento é trabalhado com base no conceito de soma, que reconhece a unidade corpo-mente e se apoia nas relações em rede que estão presentes no funcionamento do corpo, entre seus diversos sistemas e do corpo com o ambiente. A atenção e a escuta são desenvolvidas na construção de um movimento consciente, sem ignorar a conexão entre os conteúdos conscientes e inconscientes na produção de movimento e comunicação (MILLER & NEVES, 2013, p. 01).

Com esta escolha, ao longo do próximo capítulo (II), todo o relato da prática é entrelaçado pelos dados simbólicos do próprio processo criativo em relação aos elementos conceituais da Técnica Klauss Vianna e, ainda, relações entre conceitos (corpo-imagem-mito) que vão sendo desenvolvidos a partir da vivência prática, caracterizando a abordagem de “pesquisa guiada pela prática” ou “prática como pesquisa”.

para que ele vigore em um trabalho estético, ancorado na ideia de indivisibilidade do organismo humano, o soma” (Grifo nosso).

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Prática como pesquisa é uma forma de pesquisa acadêmica em que se busca descobrir e estabelecer novos conhecimentos através da prática, com resultados, muitas vezes, em formas simultaneamente práticas e teóricas. Através de abordagens exploratórias práticas, estabelecem-se os percursos, desdobramentos e escolhas da pesquisa (inclusive aqueles relacionados à coleta de dados, construção de rede de informações e criação de obras artísticas). (FERNANDES, 2015, p. 26)

* * *

Ao longo do capítulo III, desenvolvo mais pormenorizadamente relações que foram sendo vislumbradas entre duas abordagens somáticas: a Técnica Klauss Vianna e a abordagem de Stanley Keleman11 a respeito do soma. Keleman é biólogo e terapeuta somático, ele desenvolve um interessante método nomeado “Prática de Corpar”, no qual também está presente todo um refinamento de percepções corporais que propiciam ao indivíduo uma conquista de autorregulação somática. É claro que não me atenho ao âmbito terapêutico da abordagem de Keleman, mas aproprio-me de alguns elementos da sua “Prática de Corpar”, relacionando-os com os da Técnica Klauss Vianna e desenvolvendo o que nomeio como o processo de ‘Corpando Mitos’, no gerúndio, reafirmando o caráter dinâmico e lábil do corpo de infindáveis formações e transformações da própria forma.

Tal encanto pela forma (imagem) e o caráter mítico das constantes mutações da forma-corpo vão guiando essas tessituras conceituais que vou construindo mais especificamente no capítulo III, a partir das vivências pautadas na prática descritas no capítulo II. Daí se faz a escolha em iniciar pela descrição da prática, para que o leitor percorra o caminho real da pesquisa que se deu primeiramente por essa via. A própria prática foi guia para tessitura das hipóteses de relação entre corpo-imagem-mito, resultando no desenvolvimento desse ‘conceito-processo’ chamado ‘Corpando Mitos’, o qual, posteriomente à vivência pessoal, foi aplicado junto a um grupo de participantes- colaboradores. Isso, por sua vez, agregou novas e mais refinadas descobertas e reflexões acerca do processo. A descrição dessa partilha da pesquisa vivencial com o grupo é relatada no capítulo IV.

Porém, antes de encerrar este momento introdutório, gostaria de elucidar brevemente como se deu meu encontro com a abordagem de Keleman. O mesmo aconteceu

11

Stanley Keleman nasceu no Brooklyn, Nova Iorque, em 1931, é o diretor do Center for Energetic Studies em Berkeley, Califórnia. Pratica e desenvolve terapia somática há mais de 35 anos e é pioneiro no estudo da vida do corpo e sua conexão com os aspectos sexuais, emocionais e imaginativos da experiência humana. (KELEMAN, 2001)

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através de pesquisas acerca do mitólogo Joseph Campbell12, uma das minhas principais referências para as investigações acerca da mitologia, tendo em vista sua abordagem corporal do mito, onde afirma que todos eles teriam, de alguma maneira, uma origem na própria estrutura corporal humana.

Para mim, a mitologia é uma função da biologia [...] um produto da imaginação do soma. O que os nossos corpos dizem? E o que eles estão nos contando? A imaginação humana está enraizada nas energias do corpo. E os órgãos do corpo são os determinantes dessas energias e dos conflitos entre os sistemas de impulso dos órgãos e a harmonização desses conflitos. Esses são os assuntos de que tratam os mitos. (CAMPBELL apud KELEMAN, 2001, p. 25)

E qual não foi minha surpresa ao descobrir um livro chamado Mito e Corpo: conversas com Joseph Campbell, e que tais conversas eram travadas com um terapeuta somático, Stanley Keleman, que compartilha com Campbell – e comigo também – a opinião de que a mitologia teria, concomitantemente, origem e reverberações no corpo humano em sua concepção integral, relacionando a estrutura corporal, as vivências, as memórias, o imaginário, enfim, o soma.

Para mim, mitologia é a poética do corpo cantando a nossa verdade celular. O mito é um poema sobre a experiência de ser corporificado e sobre a nossa jornada somática. É a canção da criação, a experiência genética que organizou um jeito de cantar, dançar, pintar, contar histórias, que transmitem essa experiência aos outros. [...] Sei que a experiência é um evento corporificado e o mito, como um processo organizador, é um modo de criar ordem a partir da experiência somática. (KELEMAN, 2001, p. 17)

A Obra Mito e Corpo, de Keleman, é o resultado do encontro de dois grandes homens, como poeticamente descrito na apresentação da mesma em sua edição brasileira.

Em meados dos anos 70, dois homens se apertam as mãos pela primeira vez, em meio à neblina de um píer à margem do Pacífico. Desse encontro mítico, nasce a amizade entre um homem já maduro, Joseph Campbell e o então jovem, Stanley Keleman. (FAVRE apud KELEMAN, 2001, p. 11)

Um encontro de ideias. Mãos que se apertam num gesto de polidez social, mas também de firmação de uma parceria, pois realizariam um seminário sobre mito e corpo.

12

Joseph Campbell (1903-1987), mitólogo, educador, autor e editor, nasceu em Nova Iorque. Estudou nas universidades de Colúmbia, Paris e Munique. Durante quase quarenta anos deu aulas no Sarah Lawrence College, onde foi membro do Departamento de Literatura. É autor de grandes obras de mitologia comparada, tais como As Máscaras de Deus, O herói de Mil Faces, dentre tantas outras. Realizou, com Bill Moyers, a série de televisão O Poder do Mito, que foi ao ar após sua morte, em 1987 e, posteriormente, foi publicada como livro. Essa foi, provavelmente, a obra que popularizou seu trabalho pelo mundo.

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Esse foi apenas o primeiro dos 14 anos de diálogos e seminários anuais sobre o tema. Keleman nomeia essa parceria de aventura e descreve de maneira interessante a complementariedade de seus estudos.

Nessa aventura, Joseph Campbell e eu fomos irmãos, a química entre nós foi imediata. Eu era o idealista prático; ele, o trovador idealista. O meu método somático-emocional fundamentou o seu conhecimento do literário e da imaginação no corpo. Sua compreensão da visão ancestral mudou minha perspectiva somática e aprofundou minha compreensão da nossa realidade interna, somática. (KELEMAN, 2001, p. 17)

Idealista Prático e Trovador Idealista. Confesso que, ao longo da presente pesquisa, por diversas vezes senti-me ora como um, ora como outro. Percebo, aos poucos, que a união do idealismo prático e do trovadorismo idealista foi extremamente potente para o contexto da presente investigação, que se propôs, justamente, ao entrelaçamento da prática com a reflexão sem criar uma hierarquia entre ambas. Pelo contrário, assumiu que a reflexão, embora muitas vezes concomitante, só foi possível a partir da prática e, inegavelmente, das leituras que propiciaram esses encontros potentes da forma de pensar que, por sua vez, potencializaram também a prática.

E, falando em encontros, outro encontro de caráter afetivo que tem relação com Joseph Campbell, muito instigante para mim, sendo eu uma bailarina, é de que sua esposa, Jean Erdman, é também bailarina e muitas de suas obras coreográficas retratam a temática mítica (inclusive a figura mítica de Medusa). Talvez esses encontros de vidas aparentemente tão distintas favoreçam os encontros de pensamentos – Mito, Imagem, Corpo, Dança. Também estabeleço uma rede de afetos com esses pensadores – Keleman e Campbell –, além de outros mais específicos do universo da Dança – Klauss Vianna e Jussara Miller – e, ainda, afetos de cunho visual – neste caso refiro-me mais especificamente à obra claudeliana –, enfim, trata-se de uma complexa rede de afetos, pensamentos, imagens, vivências corporais, que não posso negar. Afinal, todos fazem parte do ser somático que sou EU.

“Soma” não quer dizer “corpo”; significa “Eu, o ser corporal”. [...] O Soma é vivo; ele está sempre se contraindo e distendendo-se, acomodando-se e assimilando, recebendo energia e expelindo energia. Soma é a pulsação, fluência, síntese e relaxamento _ alternando com o medo e a raiva, a fome e a sensualidade. (HANNA, 1972 apud MILLER, 2012, p. 13)

E é esse meu ‘Eu-Somático’ que compartilho no capítulo seguinte. Esse ser atravessado pelo “entusiasmo da prática” e por toda essa rede de afetos conceituais e bibliográficos brevemente apontados até aqui. É esse ser que se mostra nas páginas seguintes

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recontando as histórias vivenciadas ao longo deste processo de investigação guiado pela experiência corporal, pela aventura da prática como pesquisa.

A experiência corporal é a chave. A experiência do seu corpo. O contar histórias sintetiza a experiência somática. Organiza os elementos da experiência numa forma corporal que nos dá uma configuração pessoal, uma direção e até mesmo um senso de significado que você pode vivenciar. (KELEMAN, 2001, p. 99)

Compartilho, então, nas próximas páginas, parte dessa ‘aventura investigativa’, dessa história vivenciada. Parte desse caminho percorrido, dessa jornada permeada de erros e acertos, cuja maneira de trilhá-lo foi de fato descoberta ao longo da trilha, excluindo, portanto, um capítulo que aborde especificamente a metodologia e os procedimentos metodológicos desta pesquisa.

Convido o leitor a acompanhar os registros desta caminhada que foi se fazendo por vezes com avanços, outras com retrocessos, tropeços, caminhadas em círculos, mas que, definitivamente, foi ‘fazendo-se’. E é nesse caminhar que vão se construindo também as conceituações, reflexões, relações, enfim, a pesquisa em si, com a instigante e desafiante singularidade de ter o corpo e sua práxis como protagonistas da investigação acadêmico-criativa.

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II

MEDUSA AO REVERSO: O CAMINHAR

Joseph Campbell achava que tudo começava com uma história. Esta série [O Poder do Mito] começa com uma de suas favoritas.

(Campbell) Estava no Japão, numa conferência sobre religião, quando ouviu um filósofo social nova-iorquino dizer a um monge xintoísta:

− Já estive em suas cerimônias e templos. Mas não compreendi sua ideologia, nem sua teologia.

O japonês refletiu e disse, balançando a cabeça:

− Nós não temos uma ideologia. Nem uma teologia. Nós dançamos. (MOYERS, 1988)

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Figura 5 - Perseu e Medusa Camille Claudel

Referências

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