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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO O Judiciário como Potencial Reformador Democrático Educação para a Cidadania

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

O Judiciário como Potencial Reformador Democrático

Educação para a Cidadania

René Bernardes de Souza Júnior

Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade de

São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor

em Curso de Pós-Graduação em Direito do Estado sob a orientação

da Profa. Dra. Maria Garcia.

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René Bernardes de Souza Júnior

O Judiciário como Potencial Reformador Democrático Educação para a Cidadania

Tese apresentada à Banca

Examinadora da Pontifícia

Universidade de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Curso de Pós-Graduação em Direito do Estado sob a orientação da Profa. Dra. Maria Garcia.

Aprovado em:

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_______________________________________________

_______________________________________________

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AGRADECIMENTOS:

Antes de qualquer, a Deus pela vida, saúde e as circunstâncias que me permitiram a realização deste estudo.

Aos professores e colegas da PUC/SP que colaboraram e influenciaram o Autor na reflexão e na origem das idéias que restam cristalizadas neste trabalho, homenageadas na pessoa da professora orientadora Doutora Maria Garcia.

À minha família – pais, irmãos, esposa, filho e enteado - pelo apoio, compreensão, suporte material e espiritual que me foram prestados, ainda que de forma despercebida.

A todos que colaboraram com a pesquisa realizada pelo Autor que, pela impossibilidade de enumeração, faço-o apontando as bibliotecas consultadas e seu pessoal, sempre disponíveis ao auxílio sem qualquer contraprestação.

(4)

Do meu saudoso pai a lembrança dos ensinamentos, dos quais destaco: ‘... filho só há uma coisa que posso dar-lhe que nunca poderá ser-lhe tirada:

educação...’

De tudo ficaram três coisas:

A certeza de que estamos sempre começando; A certeza de que é preciso continuar;

E a certeza que podemos ser interrompidos antes de terminar. Portanto, é necessário fazer:

Da interrupção um novo caminho; Da queda um passo de dança;

Do medo uma escada; Do sonho, uma ponte; E da procura um encontro

(5)

RESUMO

O Judiciário como Potencial reformador Democrático Educação para a cidadania

O presente trabalho foi realizado tendo por objetivo a apuração do potencial educador democrático do Judiciário enquanto órgão estatal, a justificar a compreensão de uma atuação afinada ao paradigma instituído no Brasil a partir da Constituição de 1988.

As hipóteses que foram observadas no desenvolvimento deste mister envolveram a existência, ou não, de potência educadora na ação judiciária, tanto processual como extra processual, da diferença entre a educação voltada ao autoritarismo e à democracia, a possibilidade e o modo de gradual ativação da cidadania nacional pela atuação judicial.

A metodologia adotada procurou conciliar o idealismo e o pragmatismo, na avaliação da realidade pesquisa e análise de procedimentos propícios ao alcance do ideal democrático fundado no Direito, pelo que envolveu o estudo da realidade nacional e internacional contemporânea e dos objetivos dispostos na Constituição, enquanto ideal brasileiro consensual.

O estudo comparado dos sistemas jurídicos, direito e órgãos judiciais permitiu a compreensão dos procedimentos e reformas e qual o acréscimo que trazem à relação autoritarismo/democracia, força/consenso, na relação política entre povo e aparato estatal, procedimentos judiciais e na imagem do Judiciário.

O resultado obtido demonstrou que o processo judicial tem as características próprias para a educação democrática, desde que adaptado à compreensão e participação ativa do jurisdicionado e, por extensão, da população no aprendizado do direito, em especial o Constitucional na forma como é efetivado no processo e na decisão judicial em seus objetivos.

(6)

ABSTRACT

The Judiciary as a Democratic Reforming Power Education for Citizenship

The present study has been developed aiming at evaluating the democratic educational power of the Judiciary while a state organ, and justifying the understanding of a matching performance to the paradigm set in Brazil after the Federal Constitution in 1988.

The hypothesis observed during this work development involved the existence or not of educational power in the Judiciary action, both processual and extra processual, the difference between education to the authoritarism and democracy, the possibility and manner of gradual activation of the national citizenship through the judicial performance.

The used methodology tried to conciliate the idealism and pragmatism on evaluating reality, research and analysis of proper proceedings at the democratic ideal reach based on law, which involved the contemporary national and international reality study and the objectives established in the Constitution as a consensual Brazilian ideal.

The compared study of the juridical systems, law and judicial organs allowed the proceedings and reform understanding and which plus they bring to the authoritarism/democracy, power/consensus relationship in the political relation between the people and the state apparatus, judicial proceedings and the Judiciary image.

The result showed that the judicial process has its particular features for the democratic education, as long as it is adapted to the active participation and understanding of the legally protected and, widely, of the population in the law learning, specially the Constitution the way it is activated in the judicial decision and process and in their objectives.

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SUMÁRIO

I. O ESTADO... 004

1.1 ESTADO DEMOCRÁTICO IDEAL E REAL... 017

1.2 DESAFIOS DO ESTADO CONTEMPORÂNEO... 027

1.3 SOCIEDADE CIVIL E SOCIEDADE POLÍTICA... 033

1.4 A PESSOA NO PROCESSO GLOBALIZANTE... 042

II. A DEMOCRACIA... 050

2.1 ESPÉCIES DE DEMOCRACIA... 051

2.1.A – DEMOCRACIA DIRETA... 051

2.1.B – DEMOCRACIA SEMIDIRETA... 053

2.1.C – DEMOCRACIA INDIRETA... 056

2.1.D – TEORIAS E CONCEPÇÕES DA DEMOCRACIA... 060

2.2 O REDESENHO DO ESTADO... 067

2.3 LEGITIMIDADE E AUTORIDADE: PROCEDIMENTO E COMUNICAÇÃO... 081

2.3.A - LEGITIMIDADE DA NORMA JURÍDICA: PARÂMETROS DE AVALIAÇÃO E CONTROLE... 089

(8)

III. A EDUCAÇÃO... 107

3.1 EDUCAÇÃO, INSTRUÇÃO E ENSINO... 107

3.2 PILARES DA EDUCAÇÃO... 111

3.3 EDUCAÇÃO E LIBERTAÇÃO... 115

3.4 EDUCAÇÃO E DIREITO... 118

3.5 A EDUCAÇÃO ENQUANTO FUNÇÃO ESTATAL... 123

3.6 A PESSOA NO PROCESSO EDUCACIONAL... 132

IV. A FUNÇÃO JUDICIÁRIA ESTATAL... 138

4.1 ESCOPOS DO PROCESSO JUDICIAL... 152

4.2 A LEGITIMIDADE NA FUNÇÃO JUDICIÁRIA... 164

4.3 PRINCIPAIS SISTEMAS DO DIREITO:... 178

4.3.A - SISTEMA DO DIREITO DA COMMON LAW... 178

4.3.B - SISTEMA DO DIREITO ROMANO-GERMÂNICO... 182

4.3.C -SISTEMA DE DIREITO SOCIALISTA... 186

(9)

V. A EDUCAÇÃO COMO INSTRUMENTO REFORMADOR

DEMOCRÁTICO: A CIDADANIA... 212

5.1 A FUNÇÃO JUDICIÁRIA COMO POTENCIAL REFORMADOR DEMOCRÁTICO... 223

5.2 O JUDICIÁRIO E O JUIZ NA REFORMA DEMOCRÁTICA DO ESTADO BRASILEIRO... 235

5.3 O POVO E O PODER JUDICIÁRIO... 253

5.4 EDUCAÇÃO ENQUANTO FUNÇÃO JUDICIÁRIA... 264

CONCLUSÕES... 280

(10)

O Judiciário como Potencial Reformador Democrático

Educação para a Cidadania

I. O ESTADO

Estado é a organização política sob a qual vive o ser humano desde a Idade Moderna; já que foi a partir das evoluções históricas e dos respectivos pensadores políticos da época que se passou a fazer uso do termo ‘Estado’1. Foi desse momento histórico em diante que a organização política foi tomando gradualmente a feição que detém até nossos dias, caracterizada pela resultante de um povo, vivendo sobre um território delimitado e governado por leis fundadas no poder soberano proveniente e exercido com o fim de proporcionar o bem comum2.

1 Mais precisamente, o Autor a incluir o termo Estado foi MAQUIAVEL, Nicolau. O

PRÍNCIPE, Atlântida-Livraria Editora, 1935, Coimbra, página 7: “... todos os estados, todos os domínios que tiveram e têm poder sobre os homens, são estados e são ou repúblicas ou principados...”.

Interessante, ainda e a respeito, transcrever os ensinamentos de BITTAR, Eduardo C.B.. DOUTRINAS E FILOSOFIAS POLÍTICAS: CONTRIBUIÇÕES PARA A HISTÓRIA DAS IDÉIAS POLÍTICAS, Editora Atlas, 2.002, páginas 30/31:

(11)

O Estado Moderno é o resultado de um longo e complexo processo histórico de integração crescente e progressiva até que, finalmente, fundando-se sobre o primado da lei - igualdade de todos perante a Lei, contrário ao primitivo direito consuetudinário, pluralista e regional - para um povo que se declara independente dos demais, tendo, pelo poder e pelo Direito, como seu um determinado território onde passam a viger segundo essa unidade cultural e decorrente da integração formadora do Estado soberano.

A unidade, orgânica e de ordem, proveniente da integração do cidadão ao Estado, sem confusão entre o indivíduo e o todo na união, tem como ponto culminante a ordem jurídica a discriminar, atribuindo direitos e deveres, nascente da necessidade da interferência do poder - distinto da força pois decorrente de exigência ética, jurídica e, fundamentalmente, consensual3.

É a apreciação racional e a eleição de valores que determinaram a direção na vontade, nos centros diretores, da sociedade que determinou a passagem do fato da ‘solidariedade social’, para a ’ordem jurídica’, onde a evolução geral do Direito e do Estado é a realização gradual e progressiva dos valores éticos da pessoa humana4.

2 BASTOS, Celso Ribeiro. CURSO DE TEORIA DO ESTADO E CIÊNCIA POLÍTICA, Celso

Bastos Editora, 6ª Edição, São Paulo, páginas 41 e seguintes.

3 Também: ARENDT, Hannah. SOBRE A VIOLÊNCIA, editora Relume Dumará, tradução de André

Duarte, 2.001, páginas 36 e seguintes, distingue ‘Poder’ como a capacidade de agir em concerto, no conjunto, fundado no consenso dos participantes de um grupo; diferentemente do vigor, por ser próprio de indivíduo, pessoa (subjetivo) ou objeto e de ‘força’, em que pese o uso vulgar, deveria estar reservada para ao estar obrigado por fenômenos naturais ou circunstanciais (força da natureza, força das circunstâncias) .

4 MIGUEL Reale, TEORIA DO DIREITO E DO ESTADO, Livraria Martins – Editora, 1940, São

(12)

Dessa forma, há conciliação das teorias natural e contratual para a origem da sociedade e, posteriormente, formação estatal, pois teria se originado natural e regularmente fundada nos costumes que brotam do meio social até o momento que, na necessidade de uniformização e de consagração do poder – decorrente do desenvolvimento e da crescente complexidade da sociedade política - será objeto de formalização racional do que é consenso fundado no costume, decorrendo da vontade vigente no meio humano.

Não há como afirmar que antes da integração política não havia direito consuetudinário e, exatamente por isso, consensual, a partir daí e que foi possível a formalização da normas e generalização a todos em parâmetros uniformes de convivência e segurança jurídicas.

Mas o tempo e a evolução tornou cada vez mais complexo e difícil definir o Estado contemporâneo, frente as múltiplas relações que se criaram entre o Estado e o complexo social5, ou, melhor dizendo entre o governo e o corpo político. É quando a análise parte da difícil coexistência entre o Estado de Direito e os conteúdos do Estado social, onde a forma do Estado oscila entre a liberdade e a participação e os direitos fundamentais são a garantia de manutenção de um status quo da sociedade burguesa e dos direitos sociais, a via pela qual a sociedade participa do Estado modificando-lhe a estrutura formal.

Tal modificação foi e é gradual, dando-se a partir da segunda metade do Século XIX alterando a forma jurídica do

5 BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola e PASQUINO, Gianfranco. DICIONÁRIO DE

POLÍTICA, editora UNB e Imprensa Oficial de SP, 12ª edição, tradução Carmem C. Varriale, Brasília

(13)

Estado, os processos de legitimação e a estrutura da administração, determinadores da crescente integração do Estado político (governo) com a sociedade civil6 (corpo político).

Além disso, questão que é sempre e naturalmente controversa debate a extensão do poder exercido no Estado pelo Governo e o proveniente do Povo, pois há quem defenda a inexistência da Soberania7, pelo fato de o termo designar8: independência suprema e supremo poder, como direito natural e inalienável que, em sua própria esfera, são supremos de modo absoluto ou transcendente, portanto divinos9. Assim, Jacques Maritain reconhece a autonomia plena por parte do corpo político dividida em interna, no que respeita às decisões e ações nacionais, e externa, referentemente às relações internacionais.

É de esclarecer que a controvérsia decorre da preocupação metafísica quanto ao titular originário do Direito,

6 BOBBIO, MATTEUCCI e PASQUINO, obra citada, páginas 401 e seguintes, os autores apontam os

caracteres do Estado contemporâneo em vários setores da vida pública e ‘frentes’ de atuação : I. Estado de Direito e Estado Social; II. Capitalismo organizado; III. O poder Legal-Racional; IV. O problema social do Estado Contemporâneo; V. O Estado Fiscal; VI. Teoria Marxista do Estado; VII. A crise da planificação política; VIII. Estado de Vigilância e Controle; IX. Os Critérios da Racionalidade administrativa. A “politização da administração; X. A legitimação por procedimento e XI. O Estado de segurança nacional.

7 MARITAIN, Jacques. O HOMEM E O ESTADO, livraria AGIR Editora, 1952, tradução de Alceu

Amoroso Lima, Rio de Janeiro, páginas 48 e seguintes.

8 DICIONÁRIO CONTEMPORÂNEO DA LÍNGUA PORTUGUESA – CALDAS AULETE, Editora

Delta, 3ª Edição, Rio de Janeiro, 5º volume, página 3.392:

Soberania, s. f. qualidade ou caráter do que é soberano.// Autoridade suprema: E a

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teoria de ponto de vista unitário e que compreende existir uma vontade suprema a reger a comunidade humana por inteira e naturalmente, seria a ‘soberania divina´; ao passo que noutra teoria, a contratualista, a soberania é popular fundada no poder decorrente do consenso10.

Doutro lado, a utilização do termo soberania é ampla e antes de pretender-se modificá-lo, já que historicamente estabelecido11, tende-se a compreendê-lo em suas várias perspectivas possíveis de análise conceitual, assim flexibilizá-lo, deixando de lado um eventual rigorismo e engessamento de significado para o conceituar, preferindo adotar o proceder natural e histórico no uso da linguagem12.

9 FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. ESTUDOS DE FILOSOFIA DO DIREITO: REFLEXÕES

SOBRE O PODER, A LIBERDADE, A JUSTIÇA E O DIREITO, editora Atlas, São Paulo, 2002, páginas 22 e seguintes: aponta o autor como conceito metafísico do termo soberania.

10 FERRAZ JÚNIOR, obra citada, páginas 22 e seguintes; apontando as demais teorias contratualistas,

a saber: hobessiana, transferência dos poderes (liberdade em vigor e capacidade) ao Estado não tendo o poder civil, daí decorrente, nenhuma limitação e a teoria lockiana onde há limitação, pois ‘o poder civil foi fundado com o objetivo de assegurar melhor o gozo dos direitos naturais’. Trata-se a teoria do consenso uma teoria média e alternativa entre as anteriores, pois assegura, fundamenta e justifica a obediência civil. Pede-se a vênia em transcrever:

O poder originário nunca é um poder ilimitado, já pelo fato de se conhecerem ordenamentos precedentes (fontes reconhecidas). Por isso, quando o jurista fala em poder originário, o caráter primeiro é jurídico e não histórico. Da mesma forma que a noção de estado de natureza para os jusnaturalistas era um conceito racional, uma exigência da razão justificadora, para o jurista moderno atua a noção de poder originário, o qual é, de fato, sempre limitado – limite externo do poder soberano. e adiante:

A alternativa do consenso permite ao jurista, nos termos da teoria da soberania, ver o poder como um misto de força e consentimento, donde o direito aparecer como regulação do exercício da força, fundado no consentimento (contrato). Aqui , as tendências variam no detalhe, mas a base é uma só: o poder é, na sociedade, uma qualidade imanente aos indivíduos (força, capacidade) que é limitada à medida que se exige seu agrupamento (consenso).

11 DALLARI, Dalmo de Abreu. ELEMENTOS DE TEORIA GERAL DO ESTADO, Editora Saraiva,

19ª Edição, páginas 64 e seguintes: Aponta o surgimento histórico do termo soberania demonstrando

ter surgido apenas no final da Idade Média, com o amadurecimento conceitual e sistemático trazidos pela obra ‘Os seis livros da República’ de Jean Bodin.

12 BASTOS, Celso Ribeiro, obra citada, página 98:

(15)

Realça, ainda, Jacques Maritain, a perda fática e gradual de tal caráter auto-suficiente do Estado, que só mantém essa plena autonomia enquanto remanescente pela não suficiente integração numa sociedade política mais ampla, internacional13.

Miguel Reale, por sua vez, aponta como característicos da Soberania a independência no ponto de vista externo e supremacia no ponto de vista interno, adotando o seguinte conceito sob o ponto de vista político: ”Soberania é o poder que tem uma Nação de se constituir em Estado, declarando, de maneira originária e exclusiva, o seu Direito.”14

De fato, o Estado, criado e mantido pelo ser humano, nunca deixou, como não poderia, de modificar-se historicamente. Foi e é a progressiva judicialização e a correspondente redução a ordenamento jurídico que fez com que Soberania passasse a ser vista como o poder constituinte originário (supremo, independente). Adiante, foi o constitucionalismo um fenômeno histórico, político, jurídico e social que enfraqueceu a força de coesão e unidade do corpo político, que determina a Soberania, ao dispor: o Estado misto, a separação dos poderes, supremacia da lei e, em especial, o federalismo e o pluralismo - o federalismo por compreender a divisão e subdivisão do poder para limitá-lo e a teoria pluralista como um grande adversário da Soberania, por contrariar o princípio da unidade e o monismo15.

porque embora exercida com limitações não foi igualada por nenhuma ordem de direito interna, nem superada por nenhuma outra externa.

13 Obra citada, página 53.

14 Obra citada, páginas 134/135; da mesma forma MENEZES, Anderson. TEORIA GERAL DO

ESTADO, editora Forense, Rio de Janeiro, 4ª edição, página 152. 15 DALLARI, obra citada, página 35:

(16)

Tipologicamente podem ser indicadas as espécies ‘ditadura soberana’16 e ‘soberania popular’, dependendo de quem seja o que exercita o poder constituinte, quando o povo acaba por tratar da

‘... última e mais amadurecida expressão do contratualismo democrático: um contrato entre os cidadãos e as forças políticas e sociais, que define as

formas pelas quais os representantes ou

comissionados do povo devem exercer o poder, bem como os limites dentre os quais eles devem se movimentar. Se a ditadura soberana constitui um mero fato, produtor do ordenamento, o poder constituinte do povo é uma síntese de poder e de direito, de ser e dever ser, de ação e consenso, uma

admite num mesmo Estado a convivência de duas soberanias. Seja ela poder incontrastável, ou poder de decisão em última instância sobre a atributividade das normas, é sempre poder superior a todos os demais que existam no Estado, não sendo concebível a convivência de mais de um poder superior no mesmo âmbito. É

indivisível porque, além das razões que impõe sua unidade, ela se aplica à universalidade dos fatos ocorridos no Estado, sendo inadmissível, por isso mesmo, a existência de várias partes separadas da mesma soberania. Não se deve confundir a teoria da divisão do poder, de que mais adiante se tratará pormenorizadamente, com uma forma de divisão da soberania, pois a chamada divisão do poder é, na verdade, uma distribuição de funções. A soberania é inalienável, pois aquele que a detém desaparece quando ficar sem ela, seja o povo, a nação, ou o Estado. Finalmente, é

imprescritível porque jamais seria verdadeiramente superior se tivesse prazo certo de duração. Todo poder soberano aspira a existir permanentemente e só desaparece quando forçado por uma vontade superior.

16 Neste ítem classificatório seria de se incluir um subitem que explica as ditaduras Teocráticas

existentes no oriente, fundadas na ‘teoria teocrática’ para justificação e titularidade do poder estatal, a opor-se à democrática, a saber, conforme ensinamento de DALLARI, obra citada página 70:

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vez que fundamenta a criação de nova sociedade no iuris consensu.’.17

Outro aspecto interessante dos ensinamentos de Maritain reside na perda gradual de autonomia, de acordo com a evolução na integração numa sociedade política mais ampla, que passa a ser objeto de estudo nas relações internacionais e que toma maior relevo diante do processo de globalização a que as organizações políticas, econômicas e culturais têm estado sujeitas, com a criação de comunidades internacionais, a limitar a Soberania interna e externa dos Estados-membros; os novos meios de comunicação em massa, a formar opinião pública internacional ou mundial; os Estados liberal, democrático, neoliberal, determinaram uma politização da sociedade. De fato, ‘as velhas fronteiras físicas dos Estados cederam lugar a novas fronteiras ideológicas, que ultrapassam os Estados a nível planetário,’ inclusive na atuação determinante da economia de empresas, indústrias e sindicatos, a exercerem atividades concessivas de poderes públicos18 e do próprio capital no mercado de investimentos19.

Ora, as limitações externas e internas ao poder soberano decorrem, inicial e simplesmente, do fato de ser absoluto, mas não arbitrário e ilimitado, eis porque decorrentes da própria natureza do poder e dos objetivos estatais, pois o Estado (Governo) não é um fim em si mesmo, mas um meio de os indivíduos atingirem seus objetivos consubstanciados na

17 BOBBIO, MATTEUCCI e PASQUINO, obra citada, 2º volume, página 1185. 18 BOBBIO, MATTEUCCI e PASQUINO, obra citada, 2º volume, página 1187. 19 BASTOS, obra citada, página 99:

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expressão ‘bem comum’ implicando nos bens políticos, morais, materiais, espirituais e intelectuais a serem preservados e desenvolvidos individualmente ou em grupo, tendo o poder político como instrumento para tanto; além dos imperativos da coexistência pacífica entre os Estados na órbita internacional20.

Sendo assim, tendo em vista que os objetivos para a existência da sociedade política é o aspecto essencial a ser observado no sistema de governo do Estado, a bem de que permita a realização de tais interesses; é fundamento que se tenha como valores fundamentais e princípios justificadores: liberdade, igualdade e participação política. Pois, de outra forma,

20 AZAMBUJA, Darcy. TEORIA GERAL DO ESTADO, editora Globo, Rio de Janeiro, 23ª edição,

páginas 82 e seguintes. MALUF, Sahid. TEORIA GERAL DO ESTADO, editora Saraiva, São Paulo, 23ª edição, páginas 37/38. Vale reproduzir o seguinte trecho da obra de Darcy Azambuja:

O Estado é uma sociedade natural, mas não é a única; o homem não é apenas um animal político, mas também um animal metafísico, como disse Fouliée. O Estado existe para realizar o bem temporal dos homens no terreno político. Mas, o homem precisa de outros bens temporais, que o Estado não é apto a realizar, e de bens espirituais que o Estado não pode desconhecer mas de que não deve cuidar, porque lhe falta competência. Por isso, há outras sociedades, ou formas de sociedade, tendo cada uma delas autoridade própria no respectivo domínio. O Estado coordena a atividade exterior dessas sociedades, para que não entrem em conflito, mas não lhes pode usurpar a autoridades e os objetivos. ‘A família é uma sociedade natural, que preexistiu ao Estado e que pode mesmo sobreviver a ele quando uma catástrofe o destrói. Os direitos fundamentais da família, célula da sociedade, limitam o poder do Estado. ...’... A autoridade religiosa é igualmente legítima e necessária e tem campo de ação próprio. ...

BASTOS, obra citada, páginas 97/98:

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não haveriam como manifestarem-se os interesses individuais, grupais ou coletivos, existiriam apenas os interesses dos poderosos que os imporiam autoritariamente, daí não haveria povo, mas população.

Eis porque o elemento humano do Estado é o ‘povo’, termo relacionado ao exercício da cidadania, conquista recente a partir do fortalecimento da democracia no Planeta. Tal sistema de governo tem o ‘povo’ como seu elemento fundamental, terminológico e conceitual, a fazer nascer a necessidade de disciplina jurídica de sua presença e atuação, ainda que paradoxalmente trate-se de entidade mítica, nebulosa, concreta e influente no governo21.

É Friedrich Müller22 quem formulou estudo Constitucional,

de Direito comparado no Brasil e na Alemanha, apurando os vários modos conceituais em que o termo “povo” é utilizado, encontrando quatro acepções, a saber:

1. ‘Povo’ como povo ativo: como sendo o conjunto de eleitores enquanto sujeitos da dominação do governo no exercício do poder, a limitar, fiscalizar, escolher representantes e decidir.

2. ‘Povo’ como instância global de atribuição de legitimidade: ‘os titulares de nacionalidade’, entidade legitimadora das ações estatais; a exemplo de funcionários públicos e juízes que chegam ao cargo e exercem poder público sem a participação popular. 3. ‘Povo’ como Ícone: inexiste de fato, quando se trata o

termo ‘povo’ como se mediatamente legitimasse a

21 DALLARI, obra citada, página 53.

22 QUEM É O POVO – A QUESTÃO FUNDAMENTAL DA DEMOCRACIA, editora Max

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decisão ou ação estatal sem o necessário fundamento em qualquer previsão normativa, a exemplo ‘o faço por obra e graça do povo’, conduzindo em regra a práticas extremadas, tornando a população inofensiva para o poder governamental.

4. ‘Povo’ como destinatário de prestações civilizatórias do Estado: a totalidade de pessoas que, estando no território estatal, são atingidas efetivamente pelo direito vigente e pelos atos decisórios do poder governamental.

Mas o que é povo? Desde a antiga Grécia, quando surgiu a Democracia, tal conceito tem diversificado ao sabor dos preconceitos, desconfianças e autoritarismo, pois há, ainda hoje, a tendência de reduzir o ‘povo’ ao significado de ‘cidadãos’, entidade abstrata desvinculada da realidade, que é o corpo eleitoral, como simples técnica na designação dos agentes governamentais, massificadora e distante do indivíduo vinculado e influenciado a uma realidade de fato, pessoal e ideológica, pois povo ‘há de ser concebido como o conjunto de indivíduos concretos, situados, com suas qualidades e defeitos, e não como entes abstratos’ a, inclusive, exigir maior concreção da representação política23.

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Governo - para o bem que deve ser comum a servir a pessoa humana que, por sua vez, tem como fundamento de existência e evolução a vida: familiar, econômica, cultural, educativa, religiosa, laborativa, ‘em integração sociológica de toda consciência cívica, - virtudes políticas e senso de lei e da liberdade – de toda atividade: prosperidade material e riqueza espiritual, de toda sabedoria hereditária operando de modo inconsciente, da retidão moral, da justiça, da amizade, da felicidade, da virtude e do heroísmo nas vidas individuais', para, daí, obter-se o progresso do corpo político como um todo24; pois “o bem comum não se realiza a não ser mediante uma integração dos elementos individuais no todo social sem que o todo absorva as partes, e sem que as partes se ergam contra o todo”25. Ou, de forma

sintética: ‘O bem comum é o conjunto de todas as condições de vida social que consintam e favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade humana’26.

Vale, no entanto, transcrever o ensinamento de Brian Thompson27 onde:

“O Estado e suas instituições básicas são um pacto social que deveria emergir de uma concepção do que em um momento histórico determinado se entende por bem comum. Se o Estado é o resultado

23 SILVA, José Afonso da. CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL POSITIVO, Malheiros, São

Paulo, 19ª edição, páginas 139/141.

24 MARITAIN, obra citada, páginas 18 e seguintes. 25 REALE, obra citada, página 101.

26 Papa João XXIII, Encíclica Pacem in Terris, I, 58.

27 REESTRUCTURACIÓN DEL ESTADO, in livro ‘El Rediseño del Estado – Una Perspectiva

Internacional’, Instituto Nacional De Administración Pública de México e Fondo de Cultura Econômica, compilador Bernardo Kliksberg, tradução de: Simy Juliette Benarroch, Mônica Vaisberg e Marie Toulian, 1994, México, página 146, versão livre deste Autor, que no original:

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de um processo baseado na maximização de algo menos que o bem comum, se produz uma divergência básica entre fins e meios.”

Eis o porque da opção política do constituinte ao proclamar o Brasil como um ‘Estado Democrático de Direito’, na expressão do Artigo 1º da Constituição Federal Brasileira.

Eis porque, e ainda, que Constituição é diploma legal de máxima hierarquia a subordinar todo o ordenamento jurídico e, em conjunto, limitar o exercício do poder político, estruturá-lo atribuindo-lhe funções e competências a garantir o exercício dos direitos e o cumprimento dos deveres por parte dos governantes e cidadãos.

A limitação do poder político começa pela tripartição do poder soberano nas funções executiva, legislativa e judiciária, denominadas enquanto ‘poderes’ pela Constituição brasileira (Artigo 2º), cabendo, tipicamente, ao Legislativo elaborar as leis, ao Executivo executá-las e ao Judiciário dirimir as controvérsias decorrentes da elaboração, execução e desrespeito às leis, já que sem ele seriam facilmente transformadas em instrumentos do autoritarismo, pelo que acaba por ser a sede da cidadania ativa, a cobrar dos ocupantes dos cargos públicos o respeito e cumprimento da Constituição e do ordenamento jurídico, a preservar a democracia28.

28 ROCHA, Cármem Lúcia Antunes. A REFORMA DO JUDICIÁRIO, in Cidadania e Justiça –

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1.1 ESTADO DEMOCRÁTICO IDEAL E REAL

Assim como qualquer ideologia, a Democracia se estruturou intelectualmente sobre atividade social e histórica concretas, a partir da consciência factual e direta de seus pensadores e realizadores, vindo da antiga Grécia até nossos dias, exprimindo na prática democrática muito mais em profundidade e verdade do que a ideologia democrática permite perceber29.

A democracia é, pois, o regime político fundado em base que tem como pressupostos a idéia de que o povo é senhor do seu destino, podendo viver em conformidade com as leis que livremente adotar, escolhendo as pessoas que em nome dele e de acordo com sua opinião irão tratar dos interesses coletivos; para tanto supondo a liberdade, civil e política, de cada um e a igualdade perante a lei. É onde cada um tem o direito de fazer tudo o que não prejudique a liberdade dos outros, portanto limitada pela coexistência e a ordem social. E a igualdade democrática, conforme dispõe a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789, será quando:

29 CHAUI, Marilena, CONVITE À FILOSOFIA, Editora Ática, 12ª Edição, São Paulo,

páginas 430/431 cita exemplos como:

- eleições: além de determinar a alternância no poder indica que o poder não se identifica com os ocupantes do governo, o cargo que ocupa não lhes pertence, mas ao povo que periodicamente nomeia novo representante, podendo revogar o mandato havendo infidelidade quanto aos objetivos determinadores da nomeação/eleição;

- situação e oposição, assim como maioria e minoria: devem ter suas vontades respeitadas e garantidas pela lei, o que indica que a comunidade é internamente dividida e que tais divisões são legítimas e devem poder expressar-se livre e publicamente.

(24)

“A lei deve ser a mesma para todos, quer quando protege, quer quando pune. Todos os cidadãos são iguais perante ela e são igualmente admissíveis a todas as dignidades, cargos e funções públicas, conforme a sua capacidade, e sem outras distinções senão as de suas virtudes e talentos.”

Dessa forma, a negação das desigualdades artificiais criadas originando privilégios a qualquer classe, grupo ou indivíduo sociais30.

No mesmo sentido e reunindo os conceitos formal e substancial Sahid Maluf31 ensina que a “... democracia consiste

em um sistema de organização política no qual:

) todo o poder emana do povo, sendo exercido em seu

nome e no seu interesse;

) as funções de mando são temporárias e eletivas;

3º ) a ordem pública baseia-se em uma Constituição escrita, respeitando o princípio da tripartição do poder do Estado;

4o ) é admitido o sistema de pluralidade de partidos políticos, com a garantia de livre crítica;

5º ) os direitos fundamentais do homem são reconhecidos e declarados em ato constitucional, proporcionando o Estado os meios e as garantias tendentes a torná-los efetivos;

6o ) o princípio da igualdade se realiza no plano jurídico, tendo em mira conciliar as desigualdades humanas, especialmente as de ordem econômica;

(25)

7º ) é assegurada a supremacia da lei como expressão da soberania popular;

8o ) os atos dos governantes são submetidos permanentemente aos princípios da responsabilidade e do consenso geral como condição de validade.”

No entanto, José Afonso da Silva32 aponta que a igualdade e a liberdade não são princípios, mas valores democráticos, pois é o que a democracia pretende, como instrumento, atingir, ou seja, ‘democracia é o regime de garantia geral para a realização dos direitos fundamentais do homem’, não de onde ela principia.

Dessa forma afirma que a questão de princípios democráticos deve ser re-elaborada, pois funda-se num elemento reacionário que é o da maioria como princípio do regime, mas não é princípio, é mera técnica utilizada pela democracia para a tomada de decisões governamentais de interesse geral, e não da maioria, pois contingente.

A ‘maioria’ é técnica muito utilizada para nomeação de representantes, porém:

não corresponde à maioria do povo, mas a uma minoria dominante. Esta situação fica muito clara no processo de formação de leis, que é aspecto importante do regime político, notadamente nas estruturas sociais divididas em classes de interesses divergentes, onde dificilmente se consegue atinar com o que seja o interesse geral. Aí é que as leis exercem um papel de arbitragem importante, nem

(26)

sempre mais democrático, porque, no mais das vezes, tem por interesse geral o da classe dominante. ... ‘a verdade, a que se chega através da lei, é apenas formal, como na sentença judicial, pois que a lei jurídica nem sempre corresponde ao direito sócio-cultural, nem sempre interpreta a realidade social segundo um princípio de justiça. Várias vezes,

o Direito legislado representa tão-só um

compromisso entre os interesses em choque.

Concluindo: “... As classes dirigentes, embora constituindo concretamente uma minoria, conseguem, pelo sistema eleitoral, impedir a representação, nos Parlamentos, da maioria do povo, razão por que, fazendo a maioria parlamentar, obtém legislação favorável” dessa forma, aponta o Autor como princípios fundamentais, ou primários, para a democracia: a) o da soberania popular, e b) a participação direita ou indireta do povo no poder, derivando na democracia indireta o princípio da representação, sempre variando em conformidade com a evolução do processo histórico33.

Numa análise histórica da evolução dos Estados capitalistas e das ideologias socialistas, tendo como principal expoente o marxismo, determinaram o surgimento do chamado

33 SILVA, obra citada, páginas 134/135, acrescente-se outro trecho:

(27)

‘Estado do bem estar social’, ou social democracia, em oposição ao Estado Liberal, pois tratam diferentemente as questões dos direitos, mas guardando semelhanças no que respeita a questão ‘democracia’, pois ambos identificam:

• liberdade e competição, no que respeita a competição econômica da ‘livre iniciativa’, e a competição política, entre partidos a disputar eleições;

• lei e potência judiciária, na limitação do poder político e proteção da tirania;

• ordem e potência, no executivo e no judiciário, a conter e limitar os conflitos sociais pela repressão ou atendimento à demandas sociais;

• “embora a democracia apareça justificada como ‘valor’ ou como ‘bem’, é encarada, de fato, pelo critério da eficácia. Em outras palavras, defendem a democracia porque lhes parece um regime favorável à apatia política”34

Dessa forma, a democracia é reduzida a um regime político eficaz, institucionalizada formalmente, mas materialmente sustentada em soluções técnicas - não políticas - aos problemas sociais; o que, aliás, já foi dito antes por Max Weber, como uma das formas de domínio do homem pelo homem no Estado, a autoridade/violência com legitimação fundada na legalidade, ou seja, na crença de validade de preceitos legais e na competência objetiva fundada em normas racionalmente criadas para a orientação numa obediência às obrigações legalmente estabelecidas.

34 CHAUI, obra citada, página 430, em continuação:

(28)

Niklas Luhmann, por sua vez, desenvolveu o ensinamento weberiano a conceber a legitimidade como uma ilusão funcionalmente necessária baseada na ficção, de que existe a possibilidade de decepção rebelde que, porém, não se realiza de fato, estando o direito legitimado na medida em que seus procedimentos garantem esta ilusão35.

Vale observar as diferenças entre direito, necessidade e interesse, pois estes são particulares e específicos, a serem satisfeitos mediante reivindicações e ações do indivíduo ou do grupo, no entanto quando as mesmas necessidades (ex.: falta d’água ou de alimentos) ou interesses (ex.: de um proprietário de terra inativa com o intuito de aguardar valorização) tornar-se Direito (a falta d’água e de comida torna-se direito à vida) passa a ter caráter geral e universal, autorizando a cada cidadão o direito de exigi-lo, da mesma forma no que respeita a igualdade e da liberdade36.

No entanto, os obstáculos à democracia se avultam com as desigualdades sociais, sustentadas pela exploração entre classes sociais nacional e internacionalmente37 - contrário senso

cabe a direção do Estado, evitando, dessa maneira, uma participação política que traria à cena os ‘extremistas’ e ‘radicais’ da sociedade.

35

WEBER, Max. O POLÍTICO E O CIENTISTA, Editorial Presença, 2ª edição, tradução de Carlos

Grifo, páginas 51 e seguintes; LUHMANN, Niklas. LEGITIMAÇÃO PELO PROCEDIMENTO, Editora Universidade de Brasília, 1969, página 30 e, no mesmo sentido, FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. CONSTITUINTE. ASSEMBLÉIA, PROCESSO, PODER. Revista dos Tribunais, 2ª Edição,

1986, páginas 64/65.

36 CHAUI, obra citada, página 431 37 CHAUÍ, obra citada, página 434:

É verdades que as lutas populares nos países de capitalismo avançado ampliaram os direitos e que a exploração dos trabalhadores diminuiu muito, sobretudo com o Estado do Bem-Estar social. No entanto, houve um preço a pagar: a exploração mais violenta do trabalho pelo capital recaiu sobre as costas dos trabalhadores nos países do Terceiro Mundo.

(29)

a igualdade e liberdade – ainda agravada pelo ideal liberal, o neoliberalismo adotado em combate à recessão no capitalismo, com o abandono das políticas sociais e do planejamento econômico pelo Estado, pondo em risco os direitos econômicos e sociais conquistados nas lutas populares. Elementos dessa transformação capitalista são a tecnologia de ponta e a separação entre dirigentes e executantes, imposta na organização industrial da segunda metade do Século XX.

A educação dada aos dirigentes é a científica e tecnológica, tornando-os portadores de saberes que os tornam ‘competentes’ e com poder de mando, enquanto os executantes apenas foram treinados para executar tarefas, desconhecendo suas razões, finalidade e importância, assim tornados ‘incompetentes’ e destinados a obedecer, implantando a ideologia da competência técnico-científica, fortalecida pelos meios de comunicação de massa38.

No Brasil, além de tudo, temos o autoritarismo social, fundado em nossa sociedade hierárquica, sem percepção ou prática da igualdade como um Direito, dessa forma, ainda, com a Liberdade e a violência39. É o autoritarismo e as desigualdades

nos países capitalistas avançados cresciam o Estado do Bem-Estar e a democracia social, no Terceiro Mundo eram implantadas ditaduras e regimes autoritários, com os quais os capitalistas desses países se aliavam aos das grandes potências econômicas.

38 CHAUÍ, obra citada, página 435:

Ora, como já vimos, os meios de comunicação de massa não informam, desinformam. Ou melhor, transmitem as informações de acordo com os interesses de seu proprietários e das alianças econômicas e políticas destes com grupos detentores de poder econômico e político. Assim, por não haver respeito ao direito de informação, não há como respeitar o direito à verdadeira participação política.

39 CHAUÍ, obra citada, página 436, nos ensina:

(30)

que nos polarizam entre carências populares e os interesses das classes dominantes, entre ‘despossuídos’ e os ‘privilegiados’, sem alcançar-mos a esfera dos direitos que próprios de alguns, e não gerais, tornam-se privilégios. O autoritarismo se manifesta na forma democrática, pelo modo de operar.

Os partidos políticos são clientelistas, mantendo relações de favor com seus eleitores, vanguardistas, ao substituir a vontade dos eleitores pela dos dirigentes partidários, e os populistas, a tratar os eleitores como um pai de família.

Assim, o princípio da representação não se vê na prática, pois “... . Os representantes em lugar de cumprir o mandato que lhes foi dado pelos representados, surgem como chefes, mandantes, detentores de favores e poderes, submetendo os representados, transformando-os em clientes que recebem favores dos mandantes.”40

É Karl Loewenstein41 que, já na década de sessenta, alertava-nos a respeito dos meios de comunicação de massa, pelos quais as ideologias políticas passam a penetrar no meio social, oferecendo risco à democracia, com a adoção de técnicas de propaganda - a excluir o racional fazendo apelos emocionais, tendo por único objetivo tornar receptível e consumível o produto veiculado – utilizadas pelos profissionais do ramo, além da iniciativa privada enquanto detentora dos meios de comunicação em massa, com único compromisso no lucro.

mundo, exclusões culturais e políticas. Não há percepção nem prática do direito à liberdade.

40 CHAUÍ, obra citada, página 436.

41 LOEWENSTEIN, Karl. TEORÍA DE LA CONSTITUCIÓN, Editorial Ariel S.A., Barcelona,

(31)

A ‘indústria política’ – isto é, a criação da imagem dos políticos pelos meios de comunicação de massa para a venda do político aos eleitores-consumidores -, aliada à estrutura social do país, alimenta um imaginário político autoritário. As lideranças políticas são sempre imaginadas como chefes salvadores da nação, verdadeiros messias escolhidos por Deus e referendados pelo voto dos eleitores. Na verdade, não somos realmente eleitores (os que escolhem), mas meros votantes (os que dão voto para alguém).42.

No entanto, não são os obstáculos à democracia que a inviabilizam, pois somente nela podemos ver os obstáculos e lutar contra eles, dessa forma, para Marilena Chauí43:

Dizemos que uma sociedade – e não um simples regime de governo – é democrática, quando além de eleições, partidos políticos, divisão dos poderes da república, respeito à vontade da maioria e das minorias, institui algo mais profundo, que é condição do próprio regime político, ou seja, quando

institui direitos. (Grifo no original)

A respeito é de reiterar as palavras de Maria Victoria de Mesquita Benevides44:

Os costumes, não há como negar, representam um grave grave obstáculo à legitimação

42 CHAUÍ, obra citada, páginas 435 e 436. 43 Obra citada, página 431.

44 A CIDADANIA ATIVA – REFERENDO, PLEBBISCITO E INICIATIVA POPULAR, editora

(32)

dos instrumentos de participação popular. Daí observar-se a importância da educação política como condição inarredável para a cidadania ativa – numa sociedade republicana e democrática.

A democratização em nosso país depende, nesse sentido, das possibilidades de mudança nos costumes – e nas “mentalidades” – em uma sociedade tão marcada pela experiência do mando e do favor, da exclusão e do privilégio. A expectativa de mudança existe e se manifesta na exigência de direitos e de cidadania ativa; que se traduz, também, em exigências de maior participação política – na qual se inclui a institucionalização dos mecanismos de democracia semidireta.

Pelo que devemos ter sempre presente que o Estado Democrático é a eterna evolução, impulsionada pelo conflito pluralista e criador de direitos capazes de institucionalizar socialmente o debate elevando os múltiplos interesses sociais a categoria de Direito, a partir da chance procedimentalizada por onde possam os indivíduos e grupos sociais expressar e veicular tais necessidades e interesses no ideal da transformação social, instrumentalizada no Estado institucionalmente democrático e democratizador da sociedade.

(33)

Constituição, realizando o disposto em consenso fundamental, em domínio do Poder nas mãos de homens.

É onde, seguro da garantia de seus direitos, o ser humano sai da barbárie e progride à civilidade, pois

... É desta segurança que nasce o acatamento do Direito pelo indivíduo e a sua incursão ao Estado (basicamente ao Poder Judiciário) ao invés de fazer justiça pelas próprias mãos. Da confiança, pois, de que a Constituição garante a jurisdição independente e eficiente e que o Poder Judiciário garante a Constituição suprema e eficaz deriva a civilização constitucional a dominar as instituições políticas e a impor os princípios

democráticos que presidem as sociedades

modernas.45

Daí a excelência fundamental de estrutura estatal político-institucional capaz de tornar efetiva a realização de Direitos, com sede judiciária capaz de atender e satisfazer os anseios de seus descumprimentos.

1.2 DESAFIOS DO ESTADO CONTEMPORÂNEO

A partir da queda do Muro de Berlim e do desaparecimento da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas deu-se certa hegemonia do modo de sistema capitalista fundado nos princípios do liberalismo econômico, com a roupagem ‘neoliberal’, e dos princípios democráticos a

(34)

ele relacionados. No entanto, uma profunda recessão se anunciou nas principais estruturas econômicas mundiais, gerando crescente desemprego a gerar graves dificuldades e propostas inimagináveis, nos ditos ‘países desenvolvidos’, a exemplo da diminuição da semana de trabalho.

A democracia, o regime de governo eleito pela grande maioria de pessoas e países tem avançado a tropeços, como as guerras fratricidas, o renascer das xenofobias e do racismo, avanços incríveis no conhecimento científico e tecnológico, ao mesmo tempo em que surgem questões inquietantes a respeito da ordem no equilíbrio ecológico e ético, a exporem risco à dimensão vital da própria sociedade humana.

Enquanto isso, e ainda mais, nos ditos ‘países em desenvolvimento’, em especial os dos continentes latino americano e africano, os flagelos assumem grandes proporções com o sofrimento social, o número de pessoas que passam a viver na miséria aumenta a determinar migrações impostas pela necessidade de sobrevivência, a fome e as enfermidades decorrentes da desnutrição e do analfabetismo, a precariedade das condições básicas de vida da maior parte das crianças do mundo: é o descaso e a marginalização ao tratar o desenvolvimento do ser humano de forma superficial pelos governos da maioria desses Estados46.

46 Vide a respeito os sites: http://www.onu-brasil.org.br e http://www.um.org em especial nas páginas

da UNICEF e do PNUD.

A respeito, interessante e pertinente reportagem publicada na revista VEJA aos 16/02/2005, no. 1892, noticiando a arrancada e o desenvolvimento sócio-econômico da Coréia do Sul a partir do investimento maciço na educação, a saber:

7 LIÇÕES DA CORÉIA PARA O BRASIL – O que o país pode aprender com o bem sucedido modelo de educação implantado na Coréia do Sul:

(35)

A internacionalização de todos os campos do Planeta, face ao ‘novo’ sistema geo-econômico mundial, a chamada globalização, vem tornando todos esses problemas ainda mais complexos e muitas das soluções incertas, pois determina a sensibilidade de cada outra parte do Planeta ao que ocorre em uma47, o que presenciamos em vários países onde se estabelecem crises pela volatilidade dos investimentos estrangeiros.

De fato, debilitam-se os sistemas econômicos nacionais com o ‘remédio econômico’ do modelo FMI-Banco Mundial, a gerar conseqüências econômicas sociais devastadoras, além do descuido para com os excluídos, famintos, por fim, a falta de investimento público nas áreas sociais.

O ressentimento planetário pela exploração

desordenada, predatória e incompatível com a regeneração dos recursos naturais, como base e condição da vida.

Ainda e mais, o Direito, como instrumento de controle social e político do estado nacional passa a sofrer forte influência internacional, a orientar substancial e formalmente as constituições de acordo com o interesse de uma nova

2. Premiar os melhores alunos com bolsas e aulas extras para que desenvolvam

seu talento.

3. Racionalizar os recursos para dar melhores salários aos professores 4. Investir em pólos universitários voltados para a área tecnológica

5. Atrair o dinheiro das empresas para a universidade, produzindo pesquisa afinada com as demandas de mercado.

6. Estudar mais. Os brasileiros dedicam cinco horas por dia aos estudos, menos da metade do tempo dos coreanos.

(36)

ordem econômica mundial, alterando-se o eixo de produção e de fontes jurídicas, onde mais e mais espaço vai sendo ocupado pelos interesses das organizações e corporações internacionais; uma mão invisível a manipular o poder político de forma direta ou indireta com a visão simplista de que o mundo é um grande mercado, apenas; mantendo os que não são capazes para o consumo, longe do pretenso auge para a civilização, excluídos inclusive de toda a evolução e desenvolvimento tecnológicos e científicos dos últimos séculos48.

Naturalmente, como animal político49 que é, o ser

humano reage e aspira mais intensa e generalizadamente uma real participação nos sistemas políticos, onde o povo possa crer numa democracia genuína e tenha controle de seu próprio destino50.

47 KLIKSBERG, Bernardo. UNA AGENDA ESTRATÉGICA, no livro ‘El rediseño del Estado ...,

obra citada, páginas 09/10.

48 SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. TEORIA GERAL DO ESTADO, Editora Atlas, São Paulo,

2.001, páginas 48 e seguintes.

49 ARISTÓTELES. POLÍTICA, Editora UNB, 3a. Edição, Tradução de Mário da Gama Kury, páginas

14/16: Ensina Aristóteles ser o homem um ser naturalmente social por viver, inicialmente, em família, em seguida, povoados a formar comunidades políticas que evoluem até a definitiva formação da cidade, estágio final e caracterizador do homem em sua formação, como parte do todo; é a maior evolução em organização pela autosuficência que traz em condições de garantir a vida e proporcionar vida melhor a todos que nela vivem.

O homem tem o poder de falar, assim pode externar: a dor, o prazer, o conveniente e o nocivo, o justo e o injusto. Tem, ainda, o sentimento do bem e do mal, dentre outras qualidades morais determinantes das características da comunidade política, inclusive pelo seu natural impulso em dela participar, frente a sua insuficiência em solidão, assim, também é animal político, de fato não procura a cidade apenas se é um selvagem ou se é um deus, pois:

... o homem, quando perfeito, é o melhor dos animais, mas também é o pior de todos quando afastado da lei e da justiça, pois injustiça é a mais perniciosa quando armada, e o homem nasce dotado de armas para serem bem usadas pela inteligência e pelo talento, mas podem sê-lo em sentido inteiramente oposto. Logo, quando destituído de qualidades morais o homem é o mais impiedoso e selvagem dos animais, e o pior em relação ao sexo e à gula. Por outro lado, a justiça é a base da sociedade, sua aplicação assegura a ordem na comunidade social, por ser o meio de determinar o que é justo.

(37)

Aí é onde acaba por dar de encontro com outros desafios: saber a verdade por trás da propaganda e vida política, orientada e estruturada sobre a ilusão do eleitorado na propaganda eleitoral a criar a imagem vista como ideal ao candidato do cargo político a ser ocupado, formulada a partir da manipulação do imaginário do eleitorado, em especial, na propaganda televisiva que prima por lidar com o emocional das pessoas, por onde tira do foco de observação o racional e o crítico ao cobrar a atenção do emocional51.

51 SWARZENBERG, Roger-Gérard. O ESTADO ESPETÁCULO, editora Difel, tradução de Heloysa

de Lima Dantas, Rio de janeiro – São Paulo, 1978, onde às páginas 294/298 analisando a propaganda política:

Durante muito tempo, a propaganda foi uma questão de idéias e opiniões. Difundia doutrinas e programas. Apelando para a faculdade de julgamento e raciocínio do cidadão

Hoje em dia, a persuasão difunde mais imagens que idéias. Reduz a luta política a uma rivalidade entre pessoas. Substitui o difícil confronto das teses, a lenta comparação de argumentos, por uma espécie de jogo dramatizado e vedetizado. O poder personalizado finge sistematicamente a facilidade. Reduz o debate público a

formas elementares ou paródicas diretamente assimiláveis sem o menor esforço. Joga com o supostamente escasso gosto do público pelo exercício da reflexão, pela manipulação de conceitos abstratos e pela análise de argumentos puramente lógicos. ...

A direita, seja lá onde for, restringe suas ambições a gerir a sociedade tal como ela é. Criando falsas impressões através de algumas reformazinhas de nonadas. Por conseguinte, ela jamais brilha pela precisão doutrinal ou pela invenção ideológica. Seu programa passa, com freqüência de uma Carta aberta às pessoas felizes. A direita se empenha por isso, regularmente, em transferir o debate público dos programas para as pessoas. Como sucedeu nas eleições presidenciais de 1974 (em França).

Somam-se assim a falta de participação, a falta de programação e o que se poderia qualificar de “des-razão”. Emoções, intuições, impulsões: a política personalizada não se baseia nos componentes cognitivos e sim nos componentes efetivos das atitudes políticas. Ela deflagra um processo de “des-secularização cultural”. A paixão sobrepõe-se novamente à razão. E o critério racional se desvanece por trás dos sentimentos de atração ou de antipatia.

(38)

É de recordar, ainda que em tópicos a facilitar futura análise, das demais críticas e deficiências mencionadas anteriormente neste trabalho, a saber:

• O grau de complexidade do Estado ao necessitar do ponto de equilíbrio harmônico entre o Estado social e o Estado liberal;

• A mesma complexidade nos assuntos a serem objeto de decisões políticas, a exigir conhecimentos especializados distantes da massa de eleitores, absorvidos em suas profissões, a exigir a representação;

• A opção pelos representantes muito ‘mais formal que material’ por fundar-se na propaganda e campanha políticas, e não ações;

• Representação fictícia da vontade popular pela liberdade no mandato representativo;

• Falta de capacidade organizativa frente a falta de politização de grande parte da população;

• A redução do regime de governo democrático à regime político eficaz sustentado em soluções técnicas, apenas, e favorável à apatia política.

• A exploração entre classes sociais em âmbito nacional e internacional, fundada na separação entre dirigentes e executantes, determinada pela educação;

• No Brasil, ainda e mais, temos o autoritarismo social, a colaborar na criação da mentalidade de serem os representantes políticos escolhidos pelo povo como meros votantes;

(39)

Vimos, ainda, que a democracia, muito mais que uma forma de governo estática, é movimento, melhora e aperfeiçoamento, é um processo que tem como metas o estabelecimento da máxima liberdade privada e política para todos em igualdade de condições; na prática, o requisito a determinar que tal igualdade se dê é econômico, ainda que admitamos a desigualdade material humanizada, nunca a mecanizada, num modo de produção econômico neoliberal; já que impróprio ao atendimento dos pressupostos social e econômico da democracia, quais sejam: amadurecimento político de autogoverno pelo povo a partir do desenvolvimento econômico inclusivo a permitir-lhe, após a satisfação das necessidades corpóreas, a instrução em alfabetização e prática político democrática a criar-lhe capacidade política52;

portanto muito mais que a ideologia neoliberal promete em teoria e prática.

1.3 SOCIEDADE CIVIL E SOCIEDADE POLÍTICA

A ‘sociedade civil’ só pode ser compreendida a partir da

dicotomia que conserva com a ‘sociedade política’, de fato, ‘é a esfera

das relações sociais distintas da esfera de relações políticas’.

52 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL, editora

(40)

Tal concepção restou fortalecida pelo ideal Liberal moderno

a afirmar a existência de direitos naturais pertencentes ao ser humano

e aos grupos sociais, anterior e independentemente do Estado.

É a tese contratualista, de associação voluntária e

pactuada, onde o homem teria vivido inicialmente em ‘estado de

natureza’, onde não havia instituições políticas, optando por viver em

sociedade política pela necessidade de proteção aos seus interesses –

liberdade, vida e propriedade – com o fim, portanto, de dar

cumprimento e atendimento à vontade geral, enquanto síntese das

vontades individuais.

Por outro lado, há a tese que defende a origem natural da

sociedade, onde o homem é, por natureza, um ser social e político,

que só sendo vil ou muito elevado o ser humano viveria fora da

sociedade, no primeiro caso porque não aceito e no segundo porque

em contato com a sua divindade interior ou, ainda, por isolamento

decorrente de acidente, como no caso do náufrago numa ilha deserta.

Fundam-se seus seguidores ser da essência do ser humano a

associação a outros, pois o único meio de satisfazer suas

necessidades está na convivência e cooperação com seus

semelhantes, que beneficiará a todos, pois permite que seja

aproveitado e beneficiado, o homem, das energias, dos

(41)

através gerações, obtendo assim os meios necessários para que

possa atingir os fins de sua existência, desenvolvendo todo o seu

potencial de aperfeiçoamento, no campo intelectual, moral ou técnico.

Ambas as teses têm grande valor na atualidade, pois se a

última tem grande número de adeptos enquanto origem histórica da

sociedade a primeira fundamenta e justifica a origem político

democrática, sem, de qualquer forma, haver como excluir do ser

humano a característica de ser social53.

Três acepções, a respeito da sociedade civil, acabam por

sobressair das várias ideologias envolvendo o tema54:

1. a apontar a preexistência ao Estado de diversas formas

de associações humanas formadas para a satisfação

dos mais diversos interesses. Com o surgimento do

Estado dá-se a regulamentação, não podendo, no

entanto, impedir-lhes o posterior desenvolvimento e

contínua renovação;

2. a sociedade civil é onde se manifestam as instâncias de

modificação das relações de dominação, inclusive a

originar grupos de contra-poder, a procurar emancipar-se

do poder político;

(42)

3. onde há o ideal social da ausência estatal que

predomina, pretendendo, assim, a dissolução do Estado

com a sua reabsorção pela sociedade política.

De qualquer maneira, é na sociedade civil que surgem os

conflitos econômicos, sociais, ideológicos, religiosos, dentre outros

que justificam a existência do Estado com a função de dar-lhes

solução pela mediação ou repressão.

É formada de indivíduos, classes sociais, grupos de

interesse, associações, ideologias, valores, ação e reação,

movimentos contínuos previsíveis, imprevisíveis e originais.

Com o surgimento do Estado social surgiu o debate se

haveria razão em procurar distinguir o Estado da sociedade civil,

pois a re-apropriação da sociedade por parte daquele, a regular as

relações econômicas e no surgimento de grandes organizações de

massas a exercer direta ou indiretamente poder político, donde

deu-se a interpenetração entre Estado e sociedade55.

No entanto, em tal movimento, seja qual for o sentido, dá-se

certa a contradição entre o Estado totalitário - com o Estado

54 BOBBIO, Norberto. ESTADO GOVERNO SOCIEDADE – PARA UMA TEORIA GERAL DA

(43)

incorporando a sociedade -, e o desaparecimento estatal – quando a

sociedade incorporasse o Estado. É contradição própria da dicotomia

antes apontada e que reflete-se na postura individual enquanto na

mesma pessoa não pode só existir a postura de cidadão protegido ou

de cidadão ativo, participante do Estado, pois daí seria, apenas, servo

ou senhor56.

A sociedade, portanto e de qualquer forma, implica na união

de homens, pois só existe dentre seres humanos, pois destinada a

objetivos permanentes pelos quais é estatuído o poder, donde estão

seus elementos característicos57. Tais objetivos estariam contidos na

expressão ‘bem comum’, a envolver um conjunto de condições,

inclusive “... ordem jurídica e a garantia de possibilidades, que

consintam e favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade

humana, onde está compreendido tudo, inclusive valores materiais e

espirituais, que cada homem julgue necessário para a expansão de

sua personalidade.”58.

55 BOBBIO, obra citada, páginas 51 e 52.

56 KANT, Immanuel. À PAZ PERPÉTUA, LPM editores, tradutor Marco A. Zingano, 1989, Brasil,

páginas 36 a 38.

57 Para Dalmo Dallari, a saber: a finalidade ou valor social, manifestações de conjunto ordenadas e o

poder social - obra citada, páginas 16/17; Celso Ribeiro Bastos – obra citada página 20 -, indica como características os elementos materiais (homens e base física), formais (normas jurídicas, organização e poder) e finalísticos (variados, a exemplo do bem comum, o progresso, a cultura).

58 Dalmo de Abreu Dallari – obra citada página 19 – explica logo após transcrever o conceito de bem

(44)

Para Celso Ribeiro Bastos59: “Sociedade política é aquela

que tem em mira a realização dos fins daquelas organizações mais

amplas que o homem teve a necessidade de criar para enfrentar o

desafio da natureza e das sociedades rivais.”

Dalmo de Abreu Dallari60 ensina que a diferença entre

sociedade e sociedade política são seus objetivos, a saber,

respectivamente:

- sociedades de fins particulares, escolhidos

voluntariamente por seus membros, com ações diretas e objetivas no

sentido do objetivo conscientemente estabelecido.

- sociedades de fins gerais, indefinidos e genérico no

sentido de criar condições necessárias para que os indivíduos e as

demais sociedades que nela integram consigam atingir seus fins

particulares, nestas a participação independe de ato de vontade, tem

como exemplos: família, clã, tribo, Estado.

Assim, pois, são sociedades políticas todas aquelas que,

visando a criar as condições para a consecução dos fins

particulares de seus membros, ocupam-se da totalidade das

ações humanas, coordenando-as em função de um fim

comum. Isso não quer dizer, evidentemente, que a sociedade

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