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Os fatores críticos de acompanhamento social em contexto de habitação social

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Academic year: 2021

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OS FATORES CRÍTICOS DE SUCESSO DO

ACOMPANHAMENTO SOCIAL EM CONTEXTO DE

HABITAÇÃO SOCIAL

Dissertação apresentada à Universidade Católica

Portuguesa para obtenção do grau de mestre em Serviço

Social

Por

Ana Catarina Ribeiro Loureiro

Faculdade de Ciências Humanas

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OS FATORES CRÍTICOS DE SUCESSO DO ACOMPANHAMENTO

SOCIAL EM CONTEXTO DE HABITAÇÃO SOCIAL

Dissertação apresentada à Universidade Católica Portuguesa para

obtenção do grau de mestre em Serviço Social

Por

Ana Catarina Ribeiro Loureiro

Faculdade de Ciências Humanas

Sob orientação de Ana Maria da Costa Oliveira

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I. Resumo

O presente trabalho consiste num estudo de caso no Espaço Mais Perto do Zambujal, na freguesia de São Domingos de Rana, concelho de Cascais. Pretende-se dar um contributo para a compreensão e análise dos fatores críticos de sucesso do acompanhamento social em contexto de habitação social.

A investigação é qualitativa, na medida em que tem como objetivo compreender a conduta humana a partir dos pontos de vista das pessoas que nele atuam. O grupo junto do qual foram recolhidos os dados é composto por técnicos do Espaço Mais Perto do Zambujal e por famílias acompanhadas por esses técnicos.

De acordo com os dados recolhidos através da observação direta, análise documental e entrevistas individuais semiestruturadas, constatou-se a importância do acompanhamento social em contexto de habitação social, que tem como finalidade a autonomização e o bem-estar das pessoas. Foram identificados os seguintes fatores críticos de sucesso experienciados por técnicos e famílias: a relação como fator estruturante do processo de acompanhamento social; a disponibilidade profissional como elemento facilitador do processo de acompanhamento social em contexto de habitação social; o perfil das famílias; o perfil dos técnicos; o trabalho em parceria e em rede.

A presente investigação pretende aprofundar este tema, acerca do qual existe pouca bibliografia e abrir o caminho para que este possa ser mais investigado e aprofundado.1

Palavras-chave: acompanhamento social, habitação social, fatores críticos.

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II. Abstract

This research consists of a case study in Espaço Mais Perto do Zambujal, at São Domingos de Rana, Cascais. The goal of the work is to be a contribute to understand and analyze of critical success factors of social accompaniment in social housing context.

The research is qualitative, meaning that its objective it is the comprehension of human behaviour from the point of view of those who act in this context. The group of people who participate in the case study are composed by technicians from Espaço Mais Perto do Zambujal and families who are accompanied by these technicians.

The informations was collected from a direct observation, documentary analysis and individual interviews. It was possible to verify the importance of social accompaniment in a context of social housing, that has two goals: autonomization and welfare. The technicians and the families identified the following critical success factors: the relationship as a structuring factor of the social accompaniment process in social housing context; the professional availability as a facilitator of the social accompaniment process in social housing context; the profile of the families; the profile of the technicians; work in partnership and network.

The present investigation allows to verify the importance of social accompaniment in social housing context and open the way so that this theme is deeper under study in the future.

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III. Agradecimentos

Começo por agradecer à minha família - Mãe, Pai, Irmã e Avô. Primeiro, porque sem eles não teria sido possível entrar no Mestrado. Segundo, pelo apoio, força e suporte. De seguida, à minha orientadora, Professora Ana Oliveira, que para além de ser uma excelente profissional, tem um enorme coração. Foi um ano e meio de trabalho, com momentos melhores e momentos menos bons, onde a Professora esteve sempre presente, com muita paciência, não me deixando olhar para trás.

Quero agradecer também ao meu namorado e aos meus amigos, que estiveram sempre presentes, prontos a ouvir-me e com palavras de incentivo.

Gostaria de deixar um agradecimento à Câmara Municipal de Cascais, em especial aos técnicos e às famílias do Espaço Mais Perto do Zambujal.

Obrigada!

Foram meses onde aprendi e cresci muito, tanto a nível académico, como profissional e pessoal. Não foi um caminho fácil, mas hoje considero que valeu a pena.

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IV. Índice I. Resumo ... 1 II. Abstract ... 2 III. Agradecimentos ... 3 IV. Índice ... 4 V. Índice de Figuras ... 5

VI. Índice de Quadros ... 6

VII. Lista de abreviaturas e siglas ... 6

VIII. Introdução ... 7

1. Habitação Social, vulnerabilidade e exclusão social ... 9

1.1. O direito à habitação e o direito à cidade ... 9

1.2. O nascimento e a evolução dos bairros sociais ... 10

1.3. Os bairros sociais e os processos de segregação, vulnerabilidade e exclusão social ... 13

1.4. Repensar as políticas de habitação como instrumentos de integração social ... 20

1.5. A intervenção social em contexto de habitação social ... 22

2. Acompanhamento social: uma prática de intervenção social ... 26

2.1. A relação de ajuda como base do acompanhamento social ... 27

2.2. O processo de acompanhamento social: características, fases e momentos ... 29

2.3. Modelos do acompanhamento social ... 33

2.3.1. O modelo psicossocial ... 33

2.3.2. O modelo sistémico ... 35

2.4. Novos desafios do acompanhamento social na contemporaneidade ... 36

3. Metodologia ... 41

4. O Acompanhamento social em contexto de habitação social ... 50

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4.2. Os fatores críticos de sucesso experienciados por técnicos e famílias no processo de

acompanhamento social em contexto de habitação social ... 56

4.2.1. A relação como fator estruturante do processo de acompanhamento social em contexto de habitação social ... 56

4.2.2. A disponibilidade profissional como elemento facilitador do processo de acompanhamento social em contexto de habitação social ... 61

4.2.3. O perfil das famílias ... 64

4.2.4. O perfil dos técnicos ... 65

4.2.5. O trabalho em parceria e em rede ... 67

5. Conclusão ... 72

6. Bibliografia ... 75

IX. Anexos ... 80

Anexo A – Grelha de análise documental ... 80

Anexo B – Grelha de observação direta ... 84

Anexo C – Guiões de entrevista ... 86

Anexo D - Consentimento informado ... 88

Anexo E – Transcrição das entrevistas ... 89

Anexo F – Análise ... 131

V. Índice de Figuras Figura 1 – Integração/exclusão ... 15

Figura 2 – Bairro Brejos A ... 43

Figura 3 - Espaço Mais Perto do Zambujal ... 43

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VI. Índice de Quadros

Quadro 1 – Dimensões de análise da integração socioespacial ... 17

Quadro 2 – Modelo psicossocial ... 33

Quadro 3 – Modelo sistémico ... 35

VII. Lista de abreviaturas e siglas

CAT – Centro de Atendimento de Toxicodependentes

CLAII – Centros Locais de Apoio à Integração de Imigrantes CLDS – Contratos Locais de Desenvolvimento Social

CMC – Câmara Municipal de Cascais

CPCJ – Comissão de Proteção de Crianças de Jovens DIIS – Divisão de Intervenção Social

DHS – Departamento de Habitação e Desenvolvimento Social ECJ – Equipa de Crianças e Jovens

IHRU – Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana IPSS – Instituição Particular de Solidariedade Social MISP – Mediação Intercultural para os Serviços Públicos PER – Programa Especial de Realojamento

PIMP - Plano de Intervenção a Médio Prazo PSI – Prestação Social para a Inclusão RSI – Rendimento Social de Inserção SEF – Serviço de Estrangeiros e Fronteiras

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VIII. Introdução

A investigação é uma ferramenta essencial e transversal a todas as áreas. O Serviço Social não é exceção, pelo que a investigação nesta área deve ser valorizada, pois, por um lado, permite a produção de conhecimento e, por outro, é uma forma de valorização da profissão. “As mudanças e as transformações ocorridas na sociedade contemporânea impõem ao Serviço Social recorrer à investigação como caminho seguro e rigoroso para interpretar a realidade social e a sua complexidade, de forma a encontrar respostas eficazes e adequadas ao objeto de intervenção” (Ferreira, 2011: 99). É neste enquadramento que situamos o contributo que este trabalho pretendeu trazer.

O presente estudo tem como tema os fatores críticos de sucesso do acompanhamento social em contexto de habitação social. As duas perguntas que surgiram inicialmente e que originaram a escolha do presente tema foram as seguintes: Como é feito o acompanhamento social em contexto de habitação social? Que fatores críticos são experienciados por utentes e profissionais no processo de acompanhamento social em contexto de habitação social?

O interesse nesta temática e o aparecimento das questões de investigação remetem para o início da prática profissional da mestranda, mais concretamente, no estágio curricular. Aqui nasce o gosto pela relação de proximidade que se estabelece entre profissional e utente e pelo que se pode atingir através de um trabalho em conjunto. Em termos de pertinência e relevância, considera-se que o tema do acompanhamento social, e mais concretamente do acompanhamento social em contexto de habitação social, é ainda pouco estudado e aprofundado, sendo necessário estudar e produzir conhecimento neste âmbito. O presente trabalho pretendeu compreender os fatores críticos que podem levar ao sucesso ou ao insucesso da intervenção no processo de acompanhamento social em contexto de habitação social e mostrar a importância do acompanhamento social neste contexto, contribuindo para a melhoria e adaptação das práticas profissionais.

Neste sentido, traçou-se como objetivo geral compreender e analisar os fatores críticos de sucesso do acompanhamento social em contexto de habitação social. Os objetivos específicos definidos consistiam em: i) perceber quais os fatores críticos de sucesso experienciados por utentes e profissionais; ii) entender quais os resultados dos fatores críticos de sucesso no processo de acompanhamento social.

Os resultados obtidos através do presente estudo permitiram identificar a importância do acompanhamento social em contexto de habitação social, bem como duas

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finalidades para o mesmo: a autonomização e o bem-estar. Foram identificados os seguintes fatores críticos de sucesso: a relação como fator estruturante do processo de acompanhamento social; a disponibilidade profissional como elemento facilitador do processo de acompanhamento social; o perfil das famílias; o perfil dos técnicos; o trabalho em parceria e em rede.

Em termos metodológicos, o presente estudo consistiu num estudo de caso no Espaço Mais Perto do Zambujal, na freguesia de São Domingos de Rana, no concelho de Cascais. Consiste numa investigação qualitativa, caracterizada pela sua subjetividade e por colocar o investigar numa perspetiva “insider”. A investigação qualitativa pretende compreender a conduta humana a partir dos pontos de vista das pessoas que nele atuam, com um fundamento na realidade. Para isso, foram recolhidos dados junto de três técnicos do Espaço Mais Perto do Zambujal e de sete famílias que residem no território de intervenção do Espaço Mais Perto do Zambujal.

O presente estudo divide-se em sete partes: introdução; habitação social, vulnerabilidade e exclusão social; acompanhamento social: uma prática de intervenção social; metodologia; o acompanhamento social em contexto de habitação social; conclusão; bibliografia. Cada capítulo tem os subcapítulos necessários ao desenvolvimento do tema. Na introdução é apresentado o tema da investigação, a relevância do estudo, a motivação do autor, as questões de investigação, os objetivos, uma breve nota metodológica e a estrutura e organização do estudo. Os dois capítulos seguintes pretendem enquadrar o tema em termos teóricos, através de uma revisão de literatura. No capítulo da metodologia são apresentados: o objeto de estudo; os objetivos (geral e específicos); o paradigma, método e estratégia; a caracterização do campo empírico; o procedimento e técnicas; a caracterização do grupo junto do qual se recolheram os dados. O capítulo seguinte é referente ao acompanhamento social em contexto de habitação social e consiste na análise e reflexão acerca da informação recolhida, onde são apresentados a importância e os fatores críticos de sucesso do acompanhamento social em contexto de habitação social. Para além disso, apresenta as limitações do estudo, a recomendação à equipa do Espaço Mais Perto do Zambujal e as perspetivas futuras. A conclusão apresenta uma síntese sobre o processo e os resultados da investigação.

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1. Habitação Social, vulnerabilidade e exclusão social

A presente investigação pretende identificar quais os fatores críticos do acompanhamento social em contexto de habitação social. Para uma melhor compreensão do objeto de estudo, pretende-se compreender a função da habitação social no que concerne ao desenvolvimento social e económico da população. Neste sentido, o presente capítulo irá enquadrar e desenvolver o tema da habitação social, relacionando-o com os conceitos de vulnerabilidade e exclusão social.

Contudo, antes de abordar a questão dos bairros sociais é necessário enquadrá-los dentro do vasto tema que é a habitação. Assim, o presente capítulo começa por abordar a questão dos direitos à habitação e à cidade. Posteriormente procurar-se-á compreender a génese e evolução dos bairros sociais. Em seguida serão abordados os conceitos de exclusão, vulnerabilidade e segregação socioespacial e como estes se relacionam com a questão da habitação social. O capítulo termina com uma revisão das políticas de habitação e com uma abordagem à intervenção social em contexto de habitação social.

1.1. O direito à habitação e o direito à cidade

O direito à habitação, considerado um direito fundamental e que influencia o acesso a outros direitos fundamentais, surge através do Estado para tentar reduzir a exclusão. O direito à habitação é um dos Direitos Fundamentais do Homem e encontra-se consagrado no artigo 65.º da Constituição da República Portuguesa. Este artigo prevê o direito a uma “habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar” para todas as pessoas (Artigo n.º 65 da CRP). Neste artigo encontram-se também enumeradas uma série de incumbências ao Estado de modo a assegurar o acesso a este direito social, nomeadamente: programar e executar uma política de habitação; promover a construção de habitações económicas e sociais; estimular a construção privada; incentivar e apoiar as iniciativas das comunidades locais e das populações, que pretendem resolver os respetivos problemas habitacionais (Artigo n.º 65 da CRP).

Através do direito à habitação, pretende-se que todas as pessoas tenham acesso a uma habitação condigna. A habitação é vista como um dos eixos básicos e fundamentais na vida de uma pessoa, juntamente com o emprego e a saúde. Com estes três pontos assegurados, o indivíduo terá ferramentas que lhe permitirão ter melhor qualidade de vida.

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Todavia, a habitação não tem contribuído para uma lógica de integração, criando, pelo contrário, uma segregação socioespacial e o conhecido conceito de guetização, transformando-se ela mesma num problema social (Santos, 2015). Os bairros sociais, em vez de se terem tornado espaços de inclusão, permitindo que todos tenham acesso a uma habitação condigna, são cada vez mais espaços de exclusão (Santos, 2015). Os bairros sociais tornaram-se num espaço físico distante do resto da cidade e onde se encontram pessoas em situação de vulnerabilidade ou exclusão social, devido não só às suas características arquitetónicas, mas também à construção social do espaço (Santos, 2015). Interligado ao direito à habitação, encontra-se o direito à cidade, que consiste no acesso ao espaço urbano e aos seus recursos e infraestruturas. O direito à cidade relaciona-se com a cidadania e participação pública, com o acesso físico a recursos urbanos e com os direitos sociais (educação, saúde, justiça, habitação, trabalho, entre outros) (Carreiras, 2015). O direito à cidade prende-se com o direito à vida urbana, pensando na cidade como um espaço comum, de encontro e de usufruto (Carreiras, 2015). Apesar de, teoricamente, todas as pessoas terem direito à cidade e terem direito a assumirem-se como cidadãos, na prática, existem pessoas que não têm acesso a este direito, nomeadamente as pessoas que residem em habitação social. Estas podem ter assegurado o direito à habitação, todavia, muitas vezes não veem consagrado o direito à cidade, na medida em que não participam na vida da comunidade e não têm uma voz ativa. Quem reside em habitação social vê dificultado o acesso ao mercado de trabalho, à cidadania participativa e, por vezes, até à justiça.

O direito à cidade inclui a questão da habitação (e dentro deste ponto engloba-se a habitação social), porém, é analisado numa perspetiva mais ampla, em que a cidade é concebida e vivida por todos.

Ainda que exista o direito à cidade, muitas pessoas ainda se encontram em situação de exclusão e segregação socioespacial, o que não lhes permite fazer jus a esse direito.

1.2. O nascimento e a evolução dos bairros sociais

Os bairros sociais constituem uma categoria específica dentro dos bairros. Os seus antecedentes estão relacionados com casas económicas em bairros operários na altura da Revolução Industrial, na segunda metade do século XIX, devido à necessidade de albergar os operários das fábricas (Cachado, 2013).

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A designação “bairros sociais” surgiu em 1918, na I República, no âmbito de uma política de habitação com esse mesmo nome (Cachado, 2013). O Estado assume algum protagonismo nesta área em 1932, com a criação do “Programa de Melhoramentos Urbanos” juntamente com os Municípios (Cachado, 2013). Mais tarde, em 1933, com o Estado Novo, surgiu o Programa das “Casas Económicas”, que foi o mais longo e ambicioso programa de habitação da época (Cachado, 2013). Em 1938, nasce o Programa das “Casas Desmontáveis”, destinado a famílias que não conseguiam aceder ao programa das “Casas Económicas” (Cachado, 2013). O objetivo das “Casas Desmontáveis” consistia em alojar provisoriamente as famílias em situações mais graves de habitação, até poderem ingressar no programa das “Casas Económicas” (Cachado, 2013).

Devido à proliferação desenfreada e sem controlo da construção de barracas no início da segunda metade do século XX, foi celebrado a 11/06/1987 o Protocolo de Acordo do Plano de Intervenção a Médio Prazo para a Habitação Social de Lisboa (PIMP) entre a Câmara Municipal de Lisboa e a Secretaria de Estado da Construção e Habitação (Cachado, 2013). O PIMP tinha como objetivo definir, quantificar, programar e financiar a construção de 9698 fogos de habitação social, que se destinavam ao realojamento de famílias que residiam em barracas ou fogos de construção precária (Cachado, 2013).

O PIMP não foi suficiente para terminar com o grave problema sócio urbanístico da proliferação desenfreada e sem controlo da construção de barracas (Cachado, 2013). Visto que esta questão representava grandes impactos em termos sociais, habitacionais, urbanísticos, ambientais e económicos, surgiu poucos anos mais tarde o Programa Especial de Realojamento (Cachado, 2013). O PER foi legislado a 7 de maio de 1993, através do Decreto-Lei n.º 163/936. São três os principais eixos de leitura que se podem encontrar no texto deste diploma legal: “(1) erradicar as barracas; ao nível da metodologia executiva (2) envolver os municípios de forma vincada no processo; e finalmente, a um nível mais complexo de leitura sociopolítica (3) potenciar, com o realojamento, uma mudança no estilo de vida dos moradores” (Cachado, 2013: 141).

O PER destinou-se às áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto e consistiu na disponibilização, por parte do IHRU:

“de apoios financeiros para a construção, aquisição ou reabilitação de fogos ou de prédios devolutos, propriedade das entidades beneficiárias; a aquisição de prédios ou fogos devolutos e pagamento do custo das respetivas obras de recuperação ou, ainda, para o pagamento de parte do custo do arrendamento de habitações destinadas a realojamento dos agregados familiares recenseados no âmbito do PER” (IHRU, 2019).

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A implementação do PER implicou a elaboração do recenseamento das famílias e dos alojamentos por parte dos Municípios (IHRU, 2019). Competia também aos Municípios o controlo e o cumprimento do planeamento e execução do programa e a neutralização das tentativas de construção de novas barracas (IHRU, 2019). O processo contou com o trabalho de técnicos da área social ao longo de todo o processo para trabalhar com os indivíduos/famílias/comunidade e acompanhar todo o processo (IHRU, 2019).

No caso concreto do concelho de Cascais, onde se realizou o presente estudo de caso, a Câmara Municipal assinou um protocolo com o Instituto Nacional de Habitação (atual IHRU) e com o Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado em janeiro de 1994 (Laboratório Nacional de Engenharia Civil, 1995). Tinha como objetivo proceder ao realojamento de 2039 agregados que habitavam em barracas ou em condições habitacionais degradadas no concelho até 2001 (Laboratório Nacional de Engenharia Civil, 1995). Foi criado um grupo de trabalho, denominado Gabinete PER, que tinha a responsabilidade de programação e gestão de todo o processo (Laboratório Nacional de Engenharia Civil, 1995). O grupo era constituído por: dois arquitetos, uma engenheira de sistemas, uma economista, uma técnica de serviço social e uma administrativa (Laboratório Nacional de Engenharia Civil, 1995).

Relativamente à avaliação do PER em Cascais, destacam-se os seguintes pontos:

· Devido a alguns constrangimentos, a data prevista para a conclusão do Programa foi alterada, demorando mais tempo do que tinha sido projetado inicialmente;

· Para a maioria da população de Cascais, o PER teve um impacte positivo, quer nas famílias realojadas, quer na qualidade de vida do concelho;

· Porém, existe a convicção de uma mudança “para pior” no “ambiente social nas áreas de acolhimento” (Laboratório Nacional de Engenharia Civil, 2005).

Uma avaliação global do PER, segundo uma notícia do Jornal Público (15 de abril de 2017), afirma que ao fim de 20 anos o programa ainda não estava concluído, pois desde 2009 que ficou sem verbas (Jornal Público, 2017). Em 1995 estavam identificadas quase 48500 famílias para realojar e à data (2017) ainda faltavam mais de três mil famílias (Jornal Público, 2017).

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Apesar do PER não estar concluído, em 2004 surge o Programa PROHABITA, que tinha como objetivo a resolução global das situações de grave carência habitacional de agregados familiares residentes no território nacional (IHRU, 2019).

Para além da questão do realojamento, tem havido uma aposta nos mecanismos de incentivo à renovação do parque edificado existente, através dos projetos: Regime Especial de Comparticipação e Financiamento na Recuperação de Prédios Urbanos em Regime de Propriedade Horizontal (RECRIPH) e Regime de Apoio à Recuperação Habitacional em Áreas Urbanas Antigas (REHABITA) (1966); Solidariedade de Apoio à Recuperação de Habitação (SOLARH) (1999); Reabilitar para Arrendar (2013); financiamentos da Comissão Europeia (CE) e do Grupo da Associação Europeia de Comércio Livre (EFTA) (1994 – 2012) (IHRU, 2019).

Apesar da existência de políticas na área da habitação, que promoveram a criação de bairros sociais, de modo a assegurar que as pessoas tinham acesso a uma habitação condigna, os bairros sociais tornaram-se locais complexos a nível social. São espaços segregados social e espacialmente, onde estão presentes a vulnerabilidade e a exclusão social.

Segundo Marina Carreiras (2015), a segregação socioespacial:

“pressupõe uma separação geográfica de um determinado grupo e apresenta-se como um processo no qual os diversos grupos populacionais (étnicos, sociais, …) se distribuem no espaço de formas distintas. A segregação, no seu sentido mais comum, remete para uma situação de concentração e (…) tende a ter uma conotação negativa, quando se refere a comunidades desfavorecidas” (Carreiras, 2015: 31).

Os bairros sociais encontram-se rotulados, entre várias denominações, como “bairros dos pobres”, “bairros problemáticos”, “bairros críticos” e “territórios sensíveis”.

1.3. Os bairros sociais e os processos de segregação, vulnerabilidade e exclusão social

Os bairros sociais começaram a revelar fragilidades, nomeadamente devido à concentração de problemas sociais, à homogeneidade dos habitantes (em termos culturais, étnicos e de capital de exclusão social) e ao seu isolamento relativamente ao resto da cidade. Aqui as situações de exclusão social surgem, não só devido às características arquitetónicas, mas também devido à construção social do espaço (Santos, 2015).

Se atentarmos à arquitetura, os bairros são muito homogéneos, contrapondo-se à heterogeneidade do restante espaço urbano; encontram-se localizados em zonas

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periféricas das cidades; com difícil acessibilidade; construções megalómanas (muitas vezes em altura), de modo a realojar o maior número possível de pessoas; materiais de construção diferentes do resto do tecido urbano e de qualidade inferior; com um fraco investimento em equipamentos sociais e coletivos (como espaços de lazer, de desporto e de ocupação dos tempos livres); poucos espaços exteriores; bairros fisicamente (e socialmente) bem delimitados (Augusto, 1998). A falta de “zonas de convívio” leva a um individualismo e a um fechamento das pessoas relativamente à vida coletiva (Augusto, 1998). Todas estas características físicas e arquitetónicas promovem uma descontinuidade humana, que origina uma situação de segregação socioespacial, fazendo com que os habitantes possam estar em situação de isolamento/marginalização/exclusão social e criando guetos sociais e urbanos (Augusto, 1998).

O Fórum Não Governamental para a Inclusão Social apresenta a seguinte definição (2019):

“A exclusão social é entendida como um processo através do qual algumas pessoas são atiradas para a periferia da sociedade. A exclusão impede-as de participar plenamente na vida social devido à pobreza, à falta de competências de base e à falta de possibilidades de aprendizagem ao longo da vida ou devido a alguma discriminação. Este processo afasta-as das possibilidades de rendimento e educação, assim como de actividades sociais e comunitárias. Essas pessoas possuem acesso muito restrito ao poder e aos organismos de decisão e sentem-se incapazes de influenciar as decisões que afectam a sua vida quotidiana. (Tradução do Relatório Conjunto Sobre Inclusão Social, COM 2003, 773 Final)”

(http://www.fngis.pt/exclusao-social/)

Denomina-se exclusão social quando a pessoa é colocada na periferia da sociedade e não participa na vida social (Fórum Não Governamental para a Inclusão Social, 2019). Isto pode acontecer devido a vários fatores, nomeadamente a pobreza, a falta de competências base e a falta de possibilidades de aprendizagem ao longo da vida (Fórum Não Governamental para a Inclusão Social, 2019). A exclusão social traz consequências, como dificuldades no acesso a rendimentos, educação, atividades sociais e comunitárias, poder e organismos de decisão (Fórum Não Governamental para a Inclusão Social, 2019).

Almeida (1993) afirma que a exclusão surge devido à crise de valores, à crise das instituições essenciais de referência (como a Igreja, a escola e os partidos) e à crise do emprego (que parece ser o motivo da geração e reprodução da pobreza) (Almeida, 1993). Associado ao conceito de exclusão, surge o conceito de vulnerabilidade, que, segundo Almeida (1993), “não é só a probabilidade objetiva de percursos de

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empobrecimento. Ela é também, com alguma frequência, a aprendizagem da desqualificação social e, por vezes, a habituação inicial à estigmatização e à inferiorização, à perda de dignidade e de estatuto” (Almeida, 1993: 833).

A zona de vulnerabilidade, para Castel (1995), é definida como:

“Um espaço social de instabilidade, de turbulências, povoado de indivíduos em situação precária na sua relação com o trabalho e frágeis na sua inserção relacional. Daí o risco de caírem na última zona, que aparece, assim, como o fim de um percurso. É a vulnerabilidade que alimenta a grande marginalidade ou a desafiliação.” (Castel, 1995: 26)

A zona de vulnerabilidade consiste então no espaço social onde se encontram pessoas numa situação precária, frágil e instável (Castel, 1995). É vista como a zona antes do “fim do percurso” (Castel, 1995), ou seja, o espaço antes da exclusão social.

Quando um indivíduo tem um défice pessoal (quer pela sua história de vida, quer pela sua posição na estrutura social) e não consegue participar ativamente na produção da vida em comunidade, fica fragilizado e torna-se vulnerável. Para Robert Castel (2005), o aumento da vulnerabilidade social cria um perfil de indivíduo fragilizado pelas transformações sociais, que se encontra em “défice de integração” (Castel, 2005).

A figura seguinte apresenta e relaciona os conceitos de integração, não integração (exclusão) e vulnerabilidade.

Figura 1 – Integração/exclusão

Fonte: Adaptado por Nicolas Queloz a partir da proposta de Castel para os processos de exclusão/integração (Queloz, 2000: 191)

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Existe uma linha que separa a integração e a exclusão, sendo que existe sempre a possibilidade de intervir e de infletir a situação. Porém, quanto mais perto da zona de exclusão/não integração a pessoa estiver, mais difícil é reverter essa situação.

A zona de vulnerabilidade é aquela onde estão os indivíduos que se encontram a flutuar na estrutura social, com dificuldades em termos de estabilidade e sem laços sociais (ou presos por laços muito frágeis que ameaçam quebrar) (Castel, 1995). Os indivíduos que se encontram em situação de vulnerabilidade não estão excluídos, porém estão em risco de entrar na zona de exclusão (Castel, 1995). A vulnerabilidade está relacionada com a exposição de um indivíduo à ocorrência de riscos, ou seja, consiste numa zona intermediária e instável (Castel, 1995).

Segundo Castel (1995), com o surgimento de um acontecimento na sociedade (como uma crise económica, por exemplo) a zona de vulnerabilidade irá dilatar, avançando sobre a zona de integração e fazendo aumentar a zona de desafiliação (Castel, 1995). Castel (2005) define desafiliação como a tendência ao enfraquecimento ou rutura dos laços sociais que ligam o indivíduo à sociedade (Castel, 2005

)

. O esquema apresentado na imagem 1 não é estático, ou seja, irá variar consoante os acontecimentos e mudanças societais.

As pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade encontram-se numa linha muito ténue que liga a integração e a exclusão. Assim sendo, estes indivíduos encontram-se em défice de integração, pois não se encontram totalmente integrados na sociedade.

Existem vários fatores que podem levar as pessoas a estar numa situação de vulnerabilidade e/ou de exclusão social, como: a falta de competências pessoais e relacionais; a ausência de saberes básicos (como ler e escrever); a falta de formação académica ou profissional; a escassez de oportunidades para aquisição de saberes; o fraco acesso à cultura; as ligações a comportamentos desviantes e de risco; o racismo.

E são vários os grupos que se encontram numa situação de exclusão ou em risco de exclusão: os desempregados de longa duração, as pessoas sem qualificações ou com baixas qualificações, os “grandes idosos”, as pessoas com deficiência, as famílias monoparentais, os imigrantes/minorias étnicas, os toxicodependentes e ex-toxicodependentes, as crianças e jovens em risco, os detidos ou ex-reclusos e as pessoas sem-abrigo (Capucha et al., 2002).

Contrapondo ao conceito de exclusão, torna-se relevante fazer uma referência ao conceito de integração, "que procura representar de forma abrangente a ideia de

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construção de uma sociedade inscrita num espaço urbano inclusivo, conjugando as dimensões espacial e social" (Carreiras, 2018: 71). Os moradores dos bairros sociais encontram-se numa situação paradoxal de integração/exclusão: se, por um lado, aspiram a integração, por outro, devido às opiniões e olhares exteriores, preferem manter-se afastados e na sua zona de conforto, onde não são estigmatizados - no bairro (Santos, 2015).

O quadro seguinte apresenta as macro dimensões, as dimensões socioespaciais e a caracterização da integração socioespacial. Em oposição à segregação socioespacial, surge a integração socioespacial, que valoriza os seguintes fatores: o espaço físico (proximidade entre grupos sociais); as funcionalidades do espaço (acesso a serviços e infraestruturas); a questão relacional (interação entre os grupos sociais e presença de equipamentos e respostas sociais); a questão simbólica (existência de segurança e poucos comportamentos de risco e de marginalidade) (Carreiras, 2015). Os bairros sociais encontram-se em situação de exclusão e segregação socioespacial, pois estão isolados do resto da cidade (dimensão física), o que origina o difícil acesso aos serviços e infraestruturas (dimensão funcional) (Carreiras, 2015). Ao sentirem-se excluídas, as pessoas passam a relacionar-se e a interagir apenas com pessoas do bairro, deixando de participar na vida social e política da comunidade onde se insere o bairro social (dimensão relacional) (Carreiras, 2015). Todos os fatores acima referidos, aliados à marginalidade, insegurança e comportamentos de risco criam uma imagem simbólica em torno da habitação social (dimensão simbólica) (Carreiras, 2015).

Quadro 1 – Dimensões de análise da integração socioespacial

Macro dimensões Dimensões

socioespaciais Caracterização

Espacial

Incidência na relação entre indivíduo e sociedade mediada

pelo espaço

Físicas

Proximidade física entre diferentes grupos sociais (definidos por poder e status). Distribuição espacial de usos e funções.

Exemplo indicadores: qualidade do design dos espaços, distância espacial entre diversos grupos, concentração socioespacial, etc.

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Funcionais

Acesso e oportunidade de recorrer a serviços no território.

Exemplo indicadores: distância geográfica e qualidade de equipamentos e serviços, oportunidades de recorrer aos serviços, etc.

De âmbito social

Incidência nas relações entre indivíduos

Relacionais

Interação entre diferentes grupos sociais. Exemplo indicadores: práticas de interação, presença e acesso a instituições comunitárias, densidade das redes sociais, participação política, etc.

Simbólicas

Associadas a valores e símbolos.

Exemplo indicadores: níveis de identificação e de diferenciação entre o espaço de análise e a envolvente, perceções de normalidade, segurança e desordem, etc.

Fonte: Carreiras, 2015 (adaptado de Ruiz-Tagle, 2013)

Nos dias de hoje estamos perante uma cidade dual, com dois mundos, onde se encontram assimetrias e desigualdades sociais. Nesta cidade dual, acentuam-se os contrastes e as desigualdades entre as pessoas, dividindo os indivíduos entre os integrados e os excluídos. Jacquier afirma que “os lugares de residência dizem o lugar que se ocupa na cidade e na sociedade” (Jacquier, 1991: 56).

Os bairros surgem então como o local onde se concentram aqueles que dificilmente podem aceder a outros espaços (Augusto, 1998). Assim, as pessoas que residem em habitação social começam a fechar-se dentro do bairro e evitam trazer relações mantidas fora desse contexto ao interior do bairro (como amigos da escola ou colegas de trabalho), devido ao estigma que é sentido em relação ao local onde residem (Augusto, 1998). Este fechamento das relações sociais reforça o processo de guetização dos bairros sociais, onde emergem processos de rutura de laços sociais e dos processos de socialização, devido ao sentimento de segregação e de exclusão (Augusto, 1998).

Segundo Nuno Augusto (1998), o conceito de apropriação do espaço consiste na imagem que as pessoas têm do espaço e na forma como os indivíduos se relacionam nesse

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mesmo espaço (Augusto, 1998). A apropriação do espaço depende da avaliação que as pessoas fazem do mesmo e da sua identificação com ele (Augusto, 1998). Geralmente, quem reside em habitação social acaba por assimilar uma identidade negativa que caracteriza o bairro e que vem do exterior (Augusto, 1998). Os motivos que levam a esta estigmatização negativa vêm de fora, mas são reconhecidos no interior do bairro; são eles: os conflitos, a insegurança, a visibilidade do fenómeno da droga, a existência de grupos de jovens desocupados e as famílias disfuncionais (Augusto, 1998). Todos estes fatores podem fazer com que o bairro se torne num centro de marginalidade e de economias paralelas (Augusto, 1998). As dimensões sociais, associadas à imagem arquitetónica do bairro (dimensões urbanísticas), acabam por rotular os moradores e estes bairros passam a ser vistos como “becos sem saída” e “mundos à parte”, onde pessoas exteriores ao bairro não entram (Augusto, 1998).

Porém, nem tudo são aspetos negativos, Teresa Costa Pinto (1994, as cited in Augusto, 1998) considera que apesar de existir um “desgosto pelo bairro”, existe um “gosto pela casa” (Augusto, 1998). O “gosto pela casa” surge devido à precaridade das habitações anteriores e pode promover um grande investimento na casa (Augusto, 1998). O “desgosto pelo bairro” aparece relacionado com os estigmas negativos face ao bairro e tem como consequência um desinvestimento neste (Augusto, 1998).

O “desgosto pelo bairro” leva a que este passe a ser visto como o “espaço dos outros” e não é assumido como um espaço comum e coletivo, pois os indivíduos não se identificam com o bairro e não pretendem fazer parte do grupo/da comunidade (Augusto, 1998). Simultaneamente, os territórios marcados pela segregação socioespacial estão bastante vinculados à ideia de desinteresse e passividade por parte dos organismos públicos de poder (Augusto, 1998).

Assim, torna-se difícil criar condições para que pessoas em situação de vulnerabilidade e/ou exclusão participem na vida coletiva. Esta fraca participação na vida coletiva e do bairro constitui um obstáculo ao exercício da cidadania e o desafio consiste em alterar a imagem que os habitantes têm do seu bairro, de modo a que deixe de existir o referido “desgosto pelo bairro”. Para isso, é essencial uma focalização nas dinâmicas e aspetos positivos e o reconhecimento nos vários atores (tanto nos moradores, como nos técnicos) de capacidades e recursos para um desenvolvimento socioterritorial (Ramos, 2009).

A habitação assume um papel importante na estruturação da vida social e o território não é imparcial na construção de identidades individuais e coletivas dos

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cidadãos que nele habitam (Simões, 2010). Assim sendo, torna-se muito importante reabilitar os bairros e os respetivos moradores aos olhos da cidade, para que todos (inclusive os próprios habitantes) se libertem de uma imagem negativa e desvalorizada.

Para além de verem alterada a sua imagem, os habitantes dos bairros sociais devem ser reconhecidos e reconhecerem-se como atores e não como sujeitos passivos, carenciados, figurantes ou objetos, para que se envolvam na vida coletiva e tenham uma palavra ativa nas tomadas de decisão e, consequentemente, nas mudanças.

1.4. Repensar as políticas de habitação como instrumentos de integração social

Tendo em conta a importância da habitação na vida das pessoas, este é um tema que tem vindo a ser cada vez mais debatido no âmbito das políticas. Não só a habitação social, como o acesso à habitação no geral.

Com os (elevados) preços que estão a ser praticados no mercado imobiliário, o direito à habitação tem ficado esquecido e as pessoas não estão a ter acesso a uma habitação condigna. Os jovens que não têm capacidade financeira para sair de casa das famílias, as pessoas que residem em habitações precárias porque os preços dos imóveis estão impraticáveis e a habitação social que tem ficado esquecida pois não se tem apostado na construção nem na reabilitação de fogos.

Nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU 2015-2030 surge uma referência à questão da habitação no ponto 11 – cidades e comunidades sustentáveis, com o objetivo geral de “tornar as cidades e comunidades inclusivas, seguras, resilientes e sustentáveis”. Pretende-se por exemplo:

· Até 2030, garantir o acesso de todos à habitação segura, adequada e a preço acessível, e aos serviços básicos, e melhorar as condições nos bairros de lata; · Até 2030, aumentar a urbanização inclusiva e sustentável, e as capacidades para

o planeamento e gestão de assentamentos humanos participativos, integrados e sustentáveis, em todos os países (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU 2015-2030

)

.

Em outubro de 2017, o Governo lançou um documento denominado “Para uma nova geração de políticas de habitação. Sentido estratégico, objetivos e instrumentos de atuação”. Aqui são apresentados os grandes objetivos em matéria de política de habitação e reabilitação para a presente legislatura. São eles: dar resposta às famílias que vivem em

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situação de grave carência habitacional; garantir o acesso à habitação aos que não têm resposta por via do mercado; criar as condições para que a reabilitação seja a principal forma de intervenção ao nível do edificado e do desenvolvimento urbano; promover a inclusão social e territorial e as oportunidades de escolha habitacionais.

A Resolução do Conselho de Ministros n.º 50-A/2018, publicada em Diário da República a 02/05/2018, veio aprovar o sentido estratégico, objetivos e instrumentos de atuação para uma Nova Geração de Políticas de Habitação. Esta Nova Geração de Políticas de Habitação tem como missão: garantir o acesso de todos a uma habitação adequada, entendida no sentido amplo de habitat e orientada para as pessoas, passando por um alargamento significativo do âmbito de beneficiários e da dimensão do parque habitacional com apoio público; criar as condições para que tanto a reabilitação do edificado como a reabilitação urbana passem de exceção a regra e se tornem nas formas de intervenção predominantes (Resolução do Conselho de Ministros n.º 50-A/2018). De acordo com as metas definidas na Resolução do Conselho de Ministros n.º 50-A/2018, foram definidas as seguintes estratégias: dar resposta às famílias que vivem em situação de grave carência habitacional; garantir o acesso à habitação aos que não têm resposta por via do mercado; tornar a reabilitação na principal forma de intervenção ao nível do edificado e do desenvolvimento urbano.

A 15/07/2018, o Governo lança a Resolução do Conselho de Ministros n.º 48/2015, onde é aprovada a Estratégia Nacional para a Habitação para o período de 2015-2031. A presente estratégia tem como visão facilitar o acesso das famílias portuguesas à habitação.

As políticas e diretrizes podem ser mundiais, europeias ou nacionais, porém a aplicação e execução das mesmas pode variar de acordo com o país e com o município.

Apesar da questão da habitação ter estado um pouco esquecida, desde 2015 que tem sido crescente a preocupação e a discussão acerca deste tema, tentando promover a integração social. É uma problemática atual, que merece a maior atenção dos decisores políticos e dos interventores sociais. A área social não intervém apenas com as famílias que residem em habitação social, mas também com famílias que habitam em condições precárias (como casas em sobreocupação, casas em elevado estado de degradação e casas sem saneamento básico).

Em suma, tem sido crescente a preocupação com este tema e a evolução das políticas no ponto de vista da habitação. Estas não abrangem apenas questões habitacionais, mas também questões sociais, promovendo a integração social.

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1.5. A intervenção social em contexto de habitação social

Os bairros sociais configuraram-se num campo complexo a nível da intervenção social, nomeadamente no que diz respeito à população (menores, seniores, diferentes raças e etnias, jovens desocupados) e ao objeto de intervenção (formação, educação, emprego, habitação, documentação, entre outras) (Santos, 2015).

Os indivíduos que residem em habitação social poderão defrontar-se com a vulnerabilidade/exclusão em mais do que uma área da sua vida. Para além da questão habitacional, podem encontrar-se excluídos a outros níveis, que são transversais a todas as pessoas, como por exemplo nas áreas do emprego, da educação e da formação. Uma pessoa que se depare com a questão do desemprego, mas que não resida em habitação social, poderá ter mais facilidade em ultrapassar a situação do que uma pessoa que resida em habitação social, pelo estigma e preconceito associados aos moradores dos bairros sociais.

É importante que os moradores dos bairros sociais passem de sujeitos a atores, ou seja, que deixem de ter um comportamento passivo e passem a ter um comportamento ativo, de presença e participação nas decisões da comunidade, tendo como finalidade a sua integração na sociedade. Para isso, é preciso que se crie uma relação de confiança, através de um processo de valorização e reconhecimento das suas competências, que se constrói ao longo da ação e do tempo (Ramos, 2009). A realização de pequenas ações e o facto de se atingirem objetivos e de se celebrarem vitórias, contribuem para a construção do sentimento de pertença ao grupo/comunidade, para um reconhecimento social e para a construção de uma identidade coletiva (Ramos, 2009). Estes processos coletivos permitem uma maior sociabilização, comunicação e aprendizagem (Ramos, 2009), contribuindo para a integração socioespacial.

A intervenção de caráter holística na comunidade e uma prática profissional centrada no território onde se inserem os bairros são a chave para o grande desafio que se coloca: a integração dos indivíduos na sociedade. Porque tal como afirma Isabel Guerra (1994), “as pessoas não são coisas que se ponham em gavetas” e a habitação social é muito mais do que uma questão urbanística e financeira. A habitação social também é uma questão social.

Centrado em conceções de territorialidade e comunidade, surge o conceito de intervenção comunitária. Pereira & Niza (1987) sugerem os seguintes princípios orientadores da intervenção comunitária: incidência sobre a identidade comunitária como

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forma de manutenção e continuidade da ação; participação e negociação permanente com a comunidade na definição de objetivos e estratégias; concetualização holística e existência de multidisciplinaridade na intervenção (Pereira & Niza, 1987).

Num processo de intervenção comunitária muitas vezes o enfoque não está no resultado final, mas no processo em si e nas externalidades que este pode ter. Isto quer dizer que, apesar de se trabalhar para a supressão de necessidades concretas das pessoas, trabalha-se também para que os indivíduos, grupos ou comunidades, tenham, de futuro, uma voz cada vez mais ativa na sua comunidade. Este facto permitirá uma maior aproximação das respostas às necessidades reais e uma maior democratização do poder de cidadania com o empoderamento da sociedade civil.

Desta forma, e de acordo com Nunes & Van de Hoven (1996), este trabalho tem duas frentes principais: “libertar as potencialidades existentes nas comunidades” e “alterar onde necessário as relações das pessoas das comunidades e as instituições que regulam as suas vidas” (Nunes & Van de Hoven, 1996: 56). Se por um lado o trabalho através do coletivo e da associação de pessoas potencia energias e sinergias latentes nas comunidades; então por outro, tornam as comunidades ativas na condução dos seus próprios destinos.

Podemos ainda considerar a intervenção comunitária como:

“uma disciplina do Trabalho Social que parte dos valores e da cidadania democrática, baseia-se na metodologia científica, aborda problemas que demandam uma resposta colectiva, aplica-se através de um processo de diagnóstico, planificação, organização, desenvolvimento e evolução e leva a um processo de enriquecimento (empowerment) pessoal e comunitário” (Garcia & Pelaez, 2008: 17).

A intervenção comunitária faz parte do trabalho social e pretende desenvolver e empoderar a comunidade (a nível coletivo) e as pessoas (a nível individual) que nela se inserem. O empowerment, no contexto de desenvolvimento, pode ser compreendido como o processo dinâmico que sustenta a participação, ou seja, o reforço de capacidades que levem à possibilidade de controlar recursos e ter acesso às oportunidades que a sociedade oferece, ou ainda, de movimentar-se com o intuito de criar novas oportunidades. Deverá também ser numa lógica “bipartida”: se por um lado o foco estará na lógica de

empowerment comunitário, este não será conseguido se ao nível individual não for feito

um percurso paralelo de desenvolvimento. Assim, na perspetiva de Friedman (1996), o desenvolvimento deverá: estar centrado num processo de empowerment social e político, com o intuito de diminuir o gap de poder entre classes, aumentando a capacidade dos

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cidadãos de participar ativamente nos processos de decisão; exigir do Estado uma maior transparência e responsabilidade; e ainda criar oportunidades para a supressão das necessidades coletivas (Friedman, 1996). Importa salientar que os princípios e ideias-chave sobre os quais discorrem as conceções de Serviço Social comunitário ou intervenção comunitária são os mesmos sobre os quais discorrem as perceções de Desenvolvimento Local. Na perspetiva do Desenvolvimento Local, para desenvolver a comunidade é necessário que exista empreendedorismo (individual e coletivo) e cooperação entre as pessoas. Torna-se coerente afirmar que a finalidade última do Serviço Social comunitário é, naturalmente, o Desenvolvimento Local.

Considerando que os princípios são semelhantes, importa agora identificar algumas características generalizadas do trabalho comunitário. Assim, em primeiro lugar refere-se o ponto de partida como sendo a prática, a experiência de vida e os problemas concretos sentidos pelas populações. É daqui que se parte para uma intervenção e para uma coletivização das necessidades das pessoas. Em segundo lugar, pode referir-se que a autonomia e independência das populações é, ou tem que ser, um princípio norteador de toda a prática de intervenção neste contexto. Apenas assim é possível concretizar o pressuposto da detenção total do controlo do processo por parte dos atores. Neste sentido, o Assistente Social deverá ser um “mobilizador das habilidades e forças das pessoas”, no sentido de operacionalizar as potencialidades latentes ou manifestas das comunidades, grupos ou indivíduos.

Tendo como base o coletivo e a coletividade, o trabalhador comunitário deve procurar os pontos partilhados ou as vivências e experiências comuns para ter neles a base do seu trabalho. Só nessa base é possível trabalhar, também, as necessidades comuns.

Para além do trabalho comunitário, outro dos desafios que se coloca na intervenção social em contexto de habitação social consiste na existência de uma equipa técnica que intervenha diretamente com e para o bairro. É importante a presença de técnicos no interior do território de intervenção e que estes conheçam as suas dinâmicas internas e as especificidades locais. Só assim é possível exercer um trabalho de proximidade, onde todos os intervenientes podem e devem interagir e participar, criando uma dinâmica coletiva. A intervenção do Serviço Social nestes territórios é essencial para responder às necessidades das pessoas e melhorar a sua qualidade de vida. Deve ser uma intervenção baseada em dados empíricos, elaborada e executada com as pessoas e tendo sempre em vista a integração dos indivíduos. Estes fatores permitem a capacitação e a

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melhoria da autoestima dos moradores e, simultaneamente, poderão alterar a forma como as pessoas exteriores olham para o bairro e para os seus habitantes.

Deve fazer-se um entendimento sistémico da realidade social, pensando globalmente e fazendo localmente. A descentralização na gestão e execução de projetos e a não burocratização dos processos são a chave para a transformação da forma de pensar e agir de quem reside e de quem intervém nestes espaços de vulnerabilidade e de exclusão. É importante também criar oportunidades e espaços de abertura para que os moradores saiam do bairro e tenham contacto com outras pessoas e outras realidades, aliado a um processo de empowerment (através da valorização e do protagonismo) (Santos, 2015).

O Assistente Social, seja qual for o contexto em que trabalhe, luta contra a exclusão social e promove a integração dos indivíduos. Contudo, o Assistente Social em contexto de habitação social tem um trabalho ainda mais complexo, pois quem reside em habitação social encontra-se excluído fisicamente e socialmente.

O Assistente Social deve ter a capacidade de conseguir observar o que existe de melhor em cada território e em cada indivíduo com quem intervém, acreditando sempre nas pessoas e nas suas potencialidades. O técnico (como suporte) e o indivíduo (como ator central da ação) podem, em conjunto, superar as adversidades e atingir objetivos.

Em síntese, os bairros sociais foram pensados e criados para promover uma lógica de integração, porém, estes espaços têm potenciado a vulnerabilidade, a exclusão e a segregação socioespacial. A homogeneidade da população (questões sociais), conjugada ao isolamento face ao resto da cidade (questões físicas), leva a que os bairros sociais se tornem guetos.

Tem havido um crescente desenvolvimento das políticas sociais e habitacionais nos últimos anos, porém ainda existe um caminho a percorrer no sentido de criar políticas que promovam efetivamente a integração dos indivíduos.

A intervenção social no âmbito da habitação social tem um papel preponderante, na medida em que trabalha no terreno, junto das famílias. Dentro da intervenção social, surge a intervenção comunitária como uma ferramenta para trabalhar o empoderamento e a participação junto da comunidade, aliada a uma intervenção a nível individual e de proximidade.

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2. Acompanhamento social: uma prática de intervenção social

O processo de acompanhamento social é transversal a todas as áreas de intervenção do Serviço Social. Desta forma, o Assistente Social pode realizar acompanhamento social a vários indivíduos, grupos ou comunidades que se encontrem em situação de vulnerabilidade ou exclusão social e intervir em diferentes áreas (como a habitação, saúde, educação, formação e emprego).

As pessoas que residem em habitação social, para além das problemáticas transversais a todas as pessoas (como os problemas de saúde, o desemprego, o absentismo escolar, a baixa escolaridade/formação), têm a agravante de residirem em habitação social. Este facto coloca-as em maior situação de vulnerabilidade ou exclusão social do que os indivíduos que não residem em habitação social.

A intervenção em Serviço Social divide-se, segundo Cristina de Robertis (2011), em intervenção direta e intervenção indireta (Robertis, 2011). Para que exista intervenção direta é necessária uma relação frente a frente entre o profissional e o utente e são ambos atores da ação (Robertis, 2011). As intervenções diretas consistem em: acolher, apoiar, acompanhar; informar, orientar, educar; persuadir e influenciar (Robertis, 2011: 141 e 142). Na intervenção indireta o profissional é o único ator, age para o utente, mas não na presença deste (Robertis, 2011). São intervenções indiretas: organização e monitorização social; planeamento de projetos; intervenção de caráter holística; colaboração entre assistentes sociais; intervenção ao nível dos organismos sociais (Robertis, 2011: 181 e 182).

O acompanhamento social insere-se, segundo Cristina de Robertis (2011), na intervenção direta, no subgrupo “acolher, apoiar e acompanhar” (Robertis, 2011).

O conceito de acompanhamento social vem do latim adcumpanis, ad – movimento e cum panis – com pão, isto é, “aquele que come o pão com” (Robertis, 2011). Este conceito está relacionado com os laços de proximidade entre as pessoas, “estar ao lado”, “fazer com” e partilhar (Robertis, 2011: 150). A noção de acompanhamento social é utilizada desde a década de 1980 pelas associações de luta contra a exclusão social (Santos et al., 2013).

O acompanhamento social é um instrumento privilegiado dos Assistentes Sociais, que deve ser baseado numa relação de empatia e de confiança mútua. Este acompanhamento poderá ser uma enorme mais-valia na intervenção social em contexto de habitação social, uma vez que permite a intervenção, através de um acompanhamento

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de proximidade ao indivíduo e à sua situação. Visto que os bairros sociais se tornaram num espaço físico distante do resto da cidade e onde se encontram pessoas em situação de vulnerabilidade ou exclusão social, o acompanhamento social irá intervir com o intuito de quebrar a barreira que separa os dois mundos da cidade dual, promovendo a integração.

2.1. A relação de ajuda como base do acompanhamento social

A relação de ajuda é a base do acompanhamento social, na medida em que este pressupõe o estabelecimento de uma relação entre duas pessoas - o utente e o profissional. Esta relação é “de ajuda” porque o utente procura o profissional para que este o ajude a superar algum obstáculo/dificuldade. A partir do momento em que se estabelece essa relação é possível fazer-se um trabalho conjunto, entre profissional e utente, sempre com o intuito de melhorar a qualidade de vida das pessoas.

A importância e a valorização da relação entre profissional e utente remonta aos pioneiros do Serviço Social, como Octavia Hill, Elizabeth Fry, Mary Richmond e Florence Hollis, que se interessavam muito pelas pessoas e acreditavam “que uma boa relação podia levar à mudança social” (Pena, 2014: 57 e 58).

É interessante constatar que desde o início do Serviço Social que a relação de ajuda se destaca como uma ferramenta que poderia levar à mudança social. E esta ideia mantém-se. Howe (2009) afirma que todas as teorias do Serviço Social reconhecem a importância da relação (Howe, 2009). Atualmente, tal como refere Cristina Albuquerque (2013), tão importante como as qualificações técnicas, são as dimensões como a relação, a proximidade, a troca, a conexão e a criatividade (Albuquerque, 2013).

A relação de ajuda é definida por Mucchielli (1994, as cited in Rafael, 2007) como “uma relação profissional na qual uma pessoa deve ser apoiada no sentido de conseguir o seu ajustamento pessoal a determinada situação, à qual ela não se adaptava” (Mucchielli, 1994: 15 as cited in Rafael, 2007). Para a autora, a relação de ajuda (e consequentemente o acompanhamento social) exige simpatia, solidariedade, cooperação e uma relação dinâmica e desprovida de preconceitos, que procure construir uma ação conjunta para a resolução de um problema (Rafael, 2007).

A pessoa que pede ajuda, segundo Graça Rafael (2007), está fragilizada, em situação de vulnerabilidade e, por vezes, em sofrimento, não permitindo que encontre dentro de si o caminho para ultrapassar as dificuldades (Rafael, 2007). No processo de acompanhamento social, com base na relação de ajuda, o profissional procura garantir

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(direta ou indiretamente) a satisfação de uma ou mais necessidades do indivíduo/família/grupo/comunidade (que não tem condições de a(s) satisfazer de forma autónoma) (Rafael, 2007).

A relação de ajuda implica um “trabalho com o Outro”, conceito apresentado por Astier (2003, as cited in Branco, 2008). Esta nova forma de trabalho apresenta várias especificidades para o Assistente Social: “a capacidade de se ajustar com a maior proximidade da situação dos utentes para melhor os acompanhar”; “a procura de uma certa proximidade social entre o interventor e o utente”; “a proactividade, adoptando uma posição não de expectativa face à procura mas suscitando a sua expressão pelo utente(s)” (Branco, 2008: 85). O “trabalho com o Outro” assenta numa abordagem compreensiva, na medida em que o Assistente Social deve “compreender melhor e apreender os problemas inéditos com os quais os utentes se encontram confrontados” (Giuliani, 2006, as cited in Branco, 2008: 85). Importa sublinhar a questão da proatividade, devido à “relevância que assume para a qualidade da intervenção social a capacidade dos profissionais se apropriarem do espírito das novas missões da acção social, construindo os novos quadros de trabalho com capacidade de autonomia, risco e iniciativa” (Branco, 2008: 86). Acompanhamento social Intervenção direta Relação de ajuda como base Empatia Confiança

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A referida abordagem compreensiva, dentro do “trabalho com o Outro” é essencial para que se estabeleça uma relação entre técnico e utente. Acerca da relação, Howe (2009, as cited in Pena, 2013) afirma que as opiniões dos profissionais se dividem: para uns a relação é o meio através do qual surge a mudança; para outros a relação é o elemento-chave e é a qualidade da mesma (e não as técnicas) que determina o sucesso ou o insucesso da intervenção, não sendo necessário olhar para além da relação (Pena, 2013). Os Assistentes Sociais são profissionais qualificados e o seu trabalho deve assentar em teorias e modelos. Todavia, a relação estabelecida entre o utente e o profissional é essencial para ditar o sucesso da intervenção, tal como o perfil do técnico.

O Assistente Social deverá ser um profissional com uma série de características, na medida em que é através destas que o técnico estabelece uma relação com o utente e, consequentemente, atinge a mudança social. De entre as várias características, podem destacar-se as seguintes: capacidade e disponibilidade para ouvir; interesse real pela outra pessoa e pela sua situação; observar, identificar e analisar capacidades, forças e potencialidades; sensibilidade para entender o que está por detrás do óbvio e sensibilidade na sua forma de comunicar e de agir. Deve também ter a capacidade de se posicionar adequadamente nos contextos, de modo a ter uma visão holística sobre a realidade.

O perfil do Assistente Social é determinante para a criação da relação e esta é um ponto fulcral na intervenção social em geral e, nomeadamente, no acompanhamento social em contexto de habitação social. Para além de ter como base a relação de ajuda, o acompanhamento social apresenta determinadas características, divide-se em várias fases e pode ser executado em diversos momentos, que serão desenvolvidos no subcapítulo seguinte.

2.2. O processo de acompanhamento social: características, fases e momentos

O acompanhamento social caracteriza-se pela confiança, aceitação e compreensão entre o Assistente Social e o indivíduo (Rafael, 2007). O acompanhamento social implica: proximidade, presença, participação ativa do interessado, movimento, evolução, individualização e consiste num momento de passagem, ou seja, com tempo limitado (Robertis, 2011).

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“(…) visa ajudar as pessoas em dificuldade a resolver os problemas gerados por situações de exclusão e visa estabelecer com elas uma relação de escuta, de apoio, de aconselhamento e de entreajuda, uma relação de solidariedade, de reciprocidade e de empenhamento de uma parte e de outra.” (Bouquet & Garcette, 1998 as cited in Robertis, 2011: 151)

São duas as atitudes essenciais que o profissional deve ter ao longo de todo o processo de acompanhamento social: a aceitação positiva incondicional e a compreensão empática (Rafael, 2007). A aceitação positiva incondicional consiste em aceitar a outra pessoa incondicionalmente, livre de juízos de valor, críticas e preconceitos (Rafael, 2007). A compreensão empática pretende, não só aceitar, mas também compreender a pessoa na sua globalidade (Rafael, 2007). A técnica da escuta ativa é transversal e deverá estar presente nas duas atitudes acima referidas (Rafael, 2007).

Hipólito (1994, as cited in Graça Rafael, 2007) afirma que a empatia consiste em: “com delicadeza e cuidado mover-se no interior do mundo dos outros sem julgamentos, sem crítica, sensível aos seus sentimentos respeitando o ritmo de descoberta do outro. É também transmitir ao outro de forma adequada. Empatia significa assim, compreender o mundo do outro como ele próprio o compreende” (Hipólito, 1994: 198 as cited in Rafael, 2007).

A escuta ativa, segundo Thomas Gordon (as cited in Graça Rafael, 2007), consiste num processo ativo no qual o técnico está empenhado em compreender a mensagem completa (tanto o conteúdo cognitivo como o conteúdo emocional) que a outra pessoa está a transmitir (Rafael, 2007).

Leonardo Rosa (2017) defende que existem três fases no processo de acompanhamento social: organização, execução e sistematização/avaliação (Rosa, 2017). Na primeira fase pretende-se planear as ações e encontrar recursos (Rosa, 2017). A segunda fase consiste no desenvolvimento das ações planeadas (Rosa, 2017). Na última fase pretende-se fazer um levantamento das informações, para analisar e interpretar, de modo a que seja possível tirar conclusões (como eficiência, impacto e resultados) (Rosa, 2017).

São vários os momentos em que pode ocorrer o acompanhamento social. São eles: atendimento (no gabinete ou no domicílio), visita domiciliária, contacto telefónico, acompanhar o utente a determinado serviço (exemplos: finanças, segurança social, hospital, centro de saúde, SEF) ou realização de determinada tarefa com o utente (exemplos: limpar a casa, arrumar a casa, apoio na toma de medicação, apoio na confeção de alimentação).

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O acompanhamento social em si já pressupõe uma relação de empatia e confiança entre técnico e utente. Em contexto de habitação social esta relação está ainda mais presente e desenvolvida, visto que se encontram os dois (técnico e utente) no mesmo espaço (o bairro). Assim, existe facilidade em o técnico se deslocar a casa do utente (visita domiciliária) e apoiar em determinada tarefa em casa.

O atendimento, segundo Michel Binet (2013, as cited in Sousa, 2015), divide-se em três etapas: abertura, corpo principal e fecho (Sousa, 2015). A abertura consiste num momento inicial, de “quebra-gelo”, onde as pessoas se apresentam e cumprimentam. Neste momento é importante acolher/receber as pessoas e promover o toque (exemplo: cumprimentar a pessoa, seja com um perto de mão ou um beijinho). O corpo principal consiste no desenvolvimento do atendimento, que varia consoante a situação/o indivíduo. O fecho é o momento de término do atendimento, em que as pessoas se despedem. O técnico deve mostrar sempre disponibilidade e abertura para esclarecer qualquer questão do utente e, eventualmente, pode ficar agendado o próximo momento do acompanhamento social. Nesta fase, tal como na abertura, é importante acompanhar as pessoas à saída e valorizar a questão do toque.

As visitas domiciliárias também se devem dividir em três momentos: início (abertura), meio (corpo principal) e fim (fecho). As visitas domiciliárias devem ser realizadas apenas se existir um propósito para a execução das mesmas e os motivos devem ser explicados ao utente (Santos, 2012). Para as visitas domiciliárias o profissional deve levar consigo o endereço e todos os documentos inerentes ao assunto que vai tratar com a pessoa. Durante a visita domiciliária, o profissional deve estar atento a todos os pormenores que o rodeiam (Santos, 2012), mas sem fazer com que o utente se sinta “avaliado” ou desconfortável com a situação. Os ambientes das visitas domiciliárias podem ser bastante variados e o profissional deve estar preparado e saber adaptar-se a todas as situações e circunstâncias, sem nunca ferir a suscetibilidade da pessoa.

O contacto telefónico, à semelhança do atendimento, deve dividir-se nos três momentos: início (abertura), meio (corpo principal) e fim (fecho).

O acompanhamento a determinado serviço e a realização de determinada tarefa com o utente não se regem por regras concretas e pré-definidas de execução. Estes momentos do acompanhamento social requerem a existência de uma relação (positiva e de confiança) entre o profissional e o utente e todos os fundamentos teóricos inerentes ao Serviço Social.

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Figura 1 – Integração/exclusão
Figura 2 – Bairro Brejos A
Figura 4 - Território de intervenção do Espaço Mais Perto do Zambujal

Referências

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