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Acupunctura em neurologia veterinária de animais de companhia

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Academic year: 2021

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Mestrado Integrado em Medicina Veterinária

Ciências Veterinárias

Dissertação de Mestrado

Acupunctura em neurologia veterinária de animais de companhia

Cristina dos Santos Rosa Caetano

Orientador:

Professor Doutor Artur Severo Proença Varejão

Co-orientador:

Dr. Fernando Américo de Oliveira Ribeiro Couto

UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO

VILA REAL, 2011

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Mestrado Integrado em Medicina Veterinária

Ciências Veterinárias

Dissertação de Mestrado

Acupunctura em neurologia veterinária de animais de companhia

Cristina dos Santos Rosa Caetano

Orientador:

Professor Doutor Artur Severo Proença Varejão

Co-orientador:

Dr. Fernando Américo de Oliveira Ribeiro Couto

UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO

VILA REAL, 2011

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"L'art de la médecine consiste à distraire le malade pendant que la nature le guérit."

Voltaire

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Resumo

A acupunctura é uma forma de terapia baseada na Medicina Tradicional Chinesa, que consiste na introdução de agulhas finas na pele, desencadeando uma cascata de efeitos fisiológicos locais, regionais ou sistémicos. Apesar de ser amplamente usada no controlo da dor e na fisioterapia, ainda é pouco usada como único método de tratamento.

Nesta dissertação são abordados cinco casos clínicos de cães tratados com acupunctura, diagnosticados com polirradiculoneurite idiopática, espondilomielopatia cervical caudal, hérnia discal, luxação vertebral e síndrome de cauda equina.

Todos os animais recuperaram parcial ou totalmente. No cão com polirradiculoneurite idiopática, apesar de ter havido uma melhoria temporária, o resultado foi insatisfatório. A ineficácia da acupunctura neste caso seria previsível de acordo com a literatura consultada. Apesar da casuística reduzida e heterogénea, concluiu-se que a acupunctura pode ser eficaz como tratamento de doenças neurológicas, especialmente nas que provocam compressão da medula espinhal e como alternativa à descompressão cirúrgica.

Abstract

Acupuncture is a type of therapy based on Traditional Chinese Medicine. It consists of inserting fine needles through the skin, triggering a cascade of local, regional and sistemic physiological effects. Despite being widely used for pain control and physical therapy, it is still fairly used as the sole treatment.

In this essay, we addressed five clinical cases of dogs treated with acupuncture. The dogs were diagnosed with idiopathic polyrradiculoneuritis, caudal cervical spondylomielopathy, intravertebral disc herniation, vertebral luxation and cauda equina syndrome.

All animals recovered parcially or completely. In one dog, with idiopathic polyrradiculoneuritis, although there was a temporary recovery, the results were unsatisfying. The ineffectiveness of acupuncture in this case was predictible according to the literature.

Even though the casuistry was small and heterogeneous, we conclude that acupuncture can be an effective treatement for neurological diseases, especially in those causing spinal cord compression and as an alternative to surgical decompression.

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Índice Geral

Resumo ... Abstract ... Índice Geral ... Índice de Figuras ... Índice de Quadros ... Lista de Siglas e Abreviaturas ... Código alfabético dos meridianos ... Agradecimentos ...

INTRODUÇÃO ...

REVISÃO DA LITERATURA CIENTÍFICA ... 1. História da acupunctura ... 1.1. História da acupunctura veterinária ... 2. Princípios da Medicina Tradicional Chinesa ... 2.1. Yin e Yang ... 2.2. Cinco Fases ou Cinco Movimentos ... 2.3. Substâncias básicas ... 2.4. Órgãos Zang Fu ... 2.5. Acupontos ... 2.6. Meridianos ... 2.7. Deqi ... 2.8. Nomenclatura ... 2.9. Causas de doença ... 2.10. Exame físico de Medicina Veterinária Tradicional Chinesa ... 3. Formas de acupunctura ... 3.1. Acupunctura com agulha seca ... 3.2. Moxabustão ... 3.3. Aquapunctura e farmacopunctura ... 3.4. Pneumoacupunctura ... 3.5. Acupressão ... 3.6. Implantes ... 3.7. Auriculopunctura ... 3.8. Ventosa de vácuo ... 3.9. Hemoacupunctura ... 3.10. Electroacupunctura ... 3.11. Laser ... 3.12. Outros métodos de estimulação ...

v vi vii x xi xii xii xiii 1 3 3 4 7 7 8 9 10 11 14 14 15 15 16 18 18 19 20 20 21 21 22 22 23 23 24 24

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4. Efeitos e mecanismos de acção da acupunctura ... 4.1. Efeitos locais ... 4.2. Efeitos gerais e sistémicos ... 4.3. Mecanismo somato-visceral ... 4.4. Efeito anti-inflamatório ... 4.5. Analgesia ... 5. Utilização da acupunctura veterinária na prática clínica ... 5.1. Acupunctura em neurologia veterinária ... 5.1.1. Doença vascular cerebral ... 5.1.2. Epilepsia ... 5.1.3. Paralisia ... 5.1.3.1. Paralisia como sequela da esgana ... 5.1.4. Doenças do disco intervertebral e da medula espinhal ... 5.1.5. Regeneração nervosa periférica ... 5.1.6. Outras doenças neurológicas ... 5.2. Referenciação de casos clínicos para tratamento com acupunctura ...

MATERIAIS E MÉTODOS ...

CASOS CLÍNICOS ... 1. Apresentação dos casos clínicos ... 1.1. Caso clínico nº 1 ... 1.2. Caso clínico nº 2 ... 1.3. Caso clínico nº 3 ... 1.4. Caso clínico nº 4 ... 1.5. Caso clínico nº 5 ... 2. Discussão dos casos clínicos ... 2.1. Caso clínico nº 1 ... 2.2. Caso clínico nº 2 ... 2.3. Caso clínico nº 3 ... 2.4. Caso clínico nº 4 ... 2.5. Caso clínico nº 5 ... CONCLUSÕES ... REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... ANEXOS ... Anexo I. Artigo editorial publicado no jornal The Lancet, a 9 de Novembro de 1823, intitulado

Acupuncturation ...

Anexo II. Lista dos médicos veterinários ocidentais pioneiros na acupunctura veterinária e suas áreas de investigação ... Anexo III. Características Yang e Yin ... Anexo IV. Características segundo a teoria das Cinco Fases ...

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Anexo V. Classificação dos animais segundo a teoria das Cinco Fases ... Anexo VI. Funções dos órgãos Zang Fu ... Anexo VII. Trajecto dos doze meridianos regulares e dos dois meridianos extraordinários principais ... Anexo VIII. Ficha de exame de Medicina Veterinária Tradicional Chinesa ... Anexo IX. Ficha de tratamento de acupunctura ... Anexo X. Exame da língua na MVTC ... Anexo XI. Exame do pulso na MVTC ... Anexo XII. Reacções locais desencadeadas pela acupunctura e seus mediadores ... Anexo XIII. Interacções fisiológicas desencadeadas pela estimulação com agulha ... Anexo XIV. Localização dos principais acupontos utilizados nos casos clínicos ... Anexo XV. Plano de tratamento do caso clínico nº 1 ... Anexo XVI. Plano de tratamento do caso clínico nº 2 ... Anexo XVII. Plano de tratamento do caso clínico nº 3 ... Anexo XVIII. Plano de tratamento do caso clínico nº 4 ... Anexo XIX. Plano de tratamento do caso clínico nº 5 ...

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Índice de Figuras

Figura 1. Símbolo Tai Ji que representa as interrelações entre Yin e Yang ... Figura 2. Equilíbrio e desequilíbrio entre Yin e Yang ... Figura 3. Ciclo Sheng ou de promoção ... Figura 4. Ciclo Ke ou de inibição ... Figura 5. Diagrama das medidas em cun no cão e no homem ... Figura 6. Agulhas de acupunctura esterilizadas descartáveis de aço inoxidável ... Figura 7. Cilindro de moxa para moxabustão indirecta ... Figura 8. Moxabustão indirecta ... Figura 9. Sedação por farmacopunctura com acepromazina no ponto Yin Tang ... Figura 10. Aspecto radiográfico dos implantes de ouro para tratamento de displasia da anca ... Figura 11. Materiais disponíveis comercialmente para a prática de auriculoterapia ... Figura 12. Aparelho de electroacupunctura portátil, com regulação da intensidade, frequência, modo e tipo de corrente ... Figura 13. Ligação do aparelho de electroacupunctura à agulha através de pinça de crocodilo ... Figura 14. Dispositivo portátil de emissão laser com três modos ... Figura 15. Modelo de integração víscero-somática ... Figura 16. Circuitos centrais envolvidos na mediação da analgesia por acupunctura através do sistema endógeno de opióides ... Figura 17. Contenção com açaime durante as sessões de acupunctura ... Figura 18. Aspecto da língua ... Figura 19. Palpação dos pontos Shu na região paravertebral ... Figura 20. Pormenor do exame mielográfico na projecção ventrodorsal ... Figura 21. Pormenor do exame mielográfico na projecção lateral ... Figura 22. Pormenor do exame radiográfico na projecção lateral ... Figura 23. Pormenor do exame radiográfico na projecção ventrodorsal ... Figura 24. Possíveis efeitos da electroacupunctura no tratamento do traumatismo da medula espinhal ... Figura 25. Aspecto da língua nos padrões de doença mais frequentes ... Figura 26. Avaliação do pulso por palpação digital da artéria femoral ... Figura 27. Interacções fisiológicas desencadeadas pela acupunctura ... Figura 28. Medição de cun na extremidade do membro torácico ... Figura 29. Vista dorsal da coluna vertebral ... Figura 30. Vista dorsal da coluna vertebral ... Figura 31. Vista lateral de corpo inteiro ... Figura 32. Pormenor da região nasal ... Figura 33. Pormenor da região anal ... Figura 34. Região umbilical no abdómen ventral ... Figura 35. Face lateral do membro torácico esquerdo ... Figura 36. Face medial do membro torácico esquerdo ... Figura 37. Face lateral do membro pélvico direito ... Figura 38. Face lateral do membro pélvico direito ... Figura 39. Superfície plantar do membro pélvico ... Figura 40. Face medial do membro pélvico esquerdo ...

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Índice de Quadros

Quadro 1. Código alfabético dos doze meridianos regulares e dos dois meridianos extraordinários principais, segundo a nomenclatura internacional da OMS ... Quadro 2. Influência dos fármacos na resposta à acupunctura ... Quadro 3. Conteúdo de uma cápsula de NEURO® (ANIMO Complexe) ... Quadro 4. Escala de classificação neurológica nas DDIV e terapias alternativa ... Quadro 5. Áreas de investigação dos primeiros acupuncturistas veterinários ocidentais ... Quadro 6. Comparação das características Yang e Yin ... Quadro 7. Características segundo a teoria das Cinco Fases ... Quadro 8. Função dos órgãos Zang na fisiologia da MTC ... Quadro 9. Função dos órgãos Fu na fisiologia da MTC ... Quadro 10. Alterações do aspecto da língua e respectiva interpretação pela MVTC ... Quadro 11. Características do pulso e sua interpretação pela MVTC ... Quadro 12. Reacções locais desencadeadas pela acupunctura e mediadores envolvidos ... Quadro 13. Localização da colocação dos eléctrodos de electroacupunctura no tratamento do caso clínico nº 1 ... Quadro 14. Acupontos utilizados com maior frequência no tratamento do caso clínico nº 1 ... Quadro 15. Localização da colocação dos eléctrodos de electroacupunctura no tratamento do caso clínico nº 2 ... Quadro 16. Acupontos utilizados com maior frequência no tratamento do caso clínico nº 2 ... Quadro 17. Localização da colocação dos eléctrodos de electroacupunctura no tratamento do caso clínico nº 3 ... Quadro 18. Acupontos utilizados com maior frequência no tratamento do caso clínico nº 3 ... Quadro 19. Localização da colocação dos eléctrodos de electroacupunctura no tratamento do caso clínico nº 4 ... Quadro 20. Acupontos utilizados com maior frequência no tratamento do caso clínico nº 4 ... Quadro 21. Localização da colocação dos eléctrodos de electroacupunctura no tratamento do caso clínico nº 5 ... Quadro 22. Acupontos utilizados com maior frequência no tratamento do caso clínico nº 5 ...

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Lista de Siglas e Abreviaturas

ACTH Hormona adrenocorticotrófica AVC Acidente vascular cerebral

CGRP Péptido relacionado com o gene da calcitonina

COPD Doença pulmonar obstructiva crónica COX-2 Ciclooxigenase-2

DDIV Doença de disco intervertebral EA Electroacupunctura

GABA Acido gama-aminobutírico

GBS Síndrome de Landry-Guillain-Barré HLC Hormona libertadora da corticotrofina

Hz Hertz

IL Interleucina

iNOS Enzima óxido nítrico sintase induzida IV Intervertebral

IVAS International Veterinary Acupuncture Society Kg Quilograma

ON Óxido nítrico ME Medula espinhal mg Miligrama mm Milímetro

MMM Miosite dos músculos mastigadores MP Membro pélvico

MT Membro torácico

MTC Medicina tradicional chinesa

mV Milivolt

MVCA Medicina veterinária complementar e alternativa

MVTC Medicina veterinária tradicional chinesa mW Miliwatt

NAVA National Association of Veterinary Acupuncture

NGF Factor de crescimento neural nm Nanómetro

NT Neurotrofina

OMS Organização Mundial de Saúde PGE2 Prostaglandina E2

RM Ressonância Magnética SNA Sistema nervoso autónomo SNC Sistema nervoso central SNP Sistema nervoso periférico

SSMP Succinato sódico de metilprednisolona TC Tomografia axial computadorizada TENS Neuroestimulação eléctrica transcutânea TGF-! Factor beta de transformação do

crescimento

TNF Factor de necrose tumoral TrK Receptor tropomiosina cinase VIP Péptido intestinal vasoactivo

Código alfabético dos meridianos

BL Bexiga CV Vaso da Concepção GB Vesícula Biliar GV Vaso Governador HT Coração KI Rim LI Intestino Grosso LR Fígado LU Pulmão PC Pericárdio SI Intestino Delgado SP Baço ST Estômago TE Triplo Aquecedor

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Agradecimentos

Ao Professor Doutor Artur Varejão pelo privilégio de ter aceite ser o Orientador desta dissertação. Agradeço o seu apoio, os conhecimentos, a simpatia e a confiança que depositou nesta minha aventura pelo mundo desconhecido da acupunctura.

Ao Dr. Fernando Couto, pela disponibilidade em me receber e em partilhar comigo a sua vasta experiência e conhecimento na área da Medicina Veterinária Tradicional Chinesa. Agradeço a simpatia, a amizade, a informação que disponibilizou e todo o conhecimento que, como diz um provérbio chinês, "lhe roubei".

À Dra. Isabel Leite e à Dra. Ana Paula Domingues por me terem recebido na clínica Oficina dos Animais, pela disponibilidade, apoio e pela simpatia. Agradeço a amizade, a confiança, os conhecimentos que me transmitiram e acima de tudo a possibilidade que me proporcionaram de adquirir uma experiência prática riquíssima.

À Júlia e à Milena pela enorme simpatia e amizade. Agradeço a ajuda e a boa disposição com que tornaram a minha passagem pela clínica uma experiência tão agradável.

À Dra. Ana Neves e à Dra. Susana Sampaio, por me terem recebido na clínica Cliniczoo. Agradeço a simpatia e a disponibilidade.

Aos meus amigos por me aturarem ao longo destes anos, sempre com amizade, boa disposição e palavras sábias e menos sábias.

Aos meus pais, por tudo! Agradeço o apoio incondicional que sempre me deram, os valores que me transmitiram, o incentivo, a ajuda, os mimos e os sonhos que me permitiram realizar. Agradeço ao meu mano, que mesmo a quilómetros de distância, ajudou a construir a pessoa em que me tornei.

Ao Tobias, por ter sido um modelo exemplar de cão rafeiro, velhote e gordo.

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INTRODUÇÃO

A escolha deste tema para dissertação, justifica-se por se considerar que a acupunctura pode ser uma boa alternativa à Medicina Veterinária convencional.

A acupunctura é uma forma de terapia reflexa, na qual o estímulo de um ponto de acupunctura pela introdução de agulhas finas, produz efeitos fisiológicos locais, regionais ou sistémicos. Em Medicina Veterinária, a acupunctura tem sido amplamente utilizada no alívio da dor crónica, reabilitação motora e na redução da atrofia muscular como complemento à fisioterapia. Em Neurologia, a sua utilização está descrita no tratamento de diversos tipos de paresia e paralisia, doença do disco intervertebral, traumatismo medular, síndrome de Wobbler, síndrome da cauda equina, epilepsia e sequelas da esgana. Está também indicada no tratamento de distúrbios de comportamento, como alternativa ao uso de sedativos e de tranquilizantes.

Com frequência, as principais limitações ao tratamento convencional, principalmente ao tratamento cirúrgico, são os custos associados e a possibilidade de falha do tratamento ou mesmo de agravamento do estado clínico. A paralisia e a incontinência urinária e/ou fecal são sinais clínicos frequentes em certas doenças neurológicas e estes sintomas têm grande impacto no proprietário, de tal modo que muitos optam pela eutanásia dos animais. Um bom profissional proporá ao proprietário todos os meios possíveis para tratar o seu animal. Para tal é essencial que o clínico conheça as opções de tratamento disponíveis, e no caso concreto da acupunctura, que conheça as possíveis indicações e as limitações desta terapia.

A aplicação de acupunctura por um profissional treinado não tem contra-indicações e é pouco provável que cause efeitos adversos. Na medicina humana os relatos de complicações com acupunctura são extremamente raros e a incidência de efeitos adversos é substancialmente inferior à relatada por utilização de fármacos ou outros procedimentos aprovados para as mesmas doenças.

Na elaboração desta dissertação foi feito o acompanhamento e análise retrospectiva de vários animais com doenças neurológicas tratados com acupunctura. Foi analisado o processo de tratamento por acupunctura e a resposta ao mesmo foi comparada com a resposta esperada aos tratamentos convencionais. Teve como principal objectivo a análise crítica da utilidade da acupunctura na prática clínica de neurologia veterinária, como alternativa ou como complemento terapêutico. São levemente abordados os princípios fundamentais da Medicina Tradicional Chinesa de modo a enquadrar a acupunctura e apresentados os mecanismos de acção e os efeitos fisiológicos desencadeados pela acupunctura cientificamente comprovados. É feita uma abordagem sucinta à aplicação da acupunctura em medicina veterinária e mais pormenorizada à sua utilização em neurologia veterinária de animais de companhia.

O estágio curricular do qual resultou esta dissertação consistiu no acompanhamento da actividade de um médico veterinário acupuncturista que desenvolve a sua actividade nos

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distritos de Aveiro e Coimbra. Com ele dei os primeiros passos na Medicina Veterinária Tradicional Chinesa, tendo aprendido os conceitos básicos, as particularidades do exame e os princípios de diagnóstico e tratamento empregues nesta modalidade. Nesse contexto, aprendi as técnicas usadas em acupunctura veterinária, os tipos de acupontos, a sua localização e os métodos de estimulação. Acompanhei as consultas de MVTC, as sessões de tratamento de acupunctura e a evolução do estado clínico dos animais tratados. Assisti ao uso de técnicas de acupunctura com agulha seca, electroacupunctura, laser, moxabustão, farmacopunctura e administração de fitoterapia e tive a oportunidade de aplicar, sob supervisão, algumas destas técnicas em cães.

Como o estágio decorreu numa clínica veterinária de pequenos animais, a Clínica Veterinária Oficina dos Animais em Mira, acompanhei e participei activamente nas actividades normais de uma clínica veterinária, nomeadamente nas consultas, vacinações, tratamentos, partos e eutanásias, assim como nos cuidados de higiene, enfermagem, alimentação e tratamento dos animais internados. Acompanhei e participei na realização dos diversos tipos de exames complementares e efectuei tarefas como a preparação e administração de vacinas e fármacos, colocação de micro-chips, colocação de catéteres endovenosos e algaliações. Acompanhei e auxiliei cirurgias de diversas especialidades, desde a preparação pré-cirúrgica do doente e do material cirúrgico, à anestesia e analgesia, monitorização e participação activa na cirurgia propriamente dita. As cirurgias realizadas foram maioritariamente ovariohisterectomias, orquiectomias, laparotomias, remoção de tumores, mastectomias, cesarianas e cirurgias de ortopedia (principalmente resolução de fracturas de ossos longos). Tive também a oportunidade de realizar, sob supervisão, orquiectomias de felinos e ovariohisterectomias de felinos e canídeos.

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REVISÃO DA LITERATURA CIENTÍFICA

1. História da Acupunctura

A origem da acupunctura não é consensual. Os documentos históricos sugerem que a acupunctura e os outros métodos de estimulação semelhantes se desenvolveram por todo o mundo, em diferentes culturas e sem cruzamento cultural (Lindley e Cummings, 2006).

Independentemente da sua verdadeira origem, foi na China que esta técnica terapêutica foi incorporada num sistema complexo de medicina, formalizada e descrita detalhadamente. O sistema de sincretismo adoptado pelos chineses evitou a formação de ramos divergentes segundo diferentes crenças ou práticas. Nesse contexto, ideias e técnicas provenientes da Índia, como a teoria das Cinco Fases, foram incorporadas nas teorias da Medicina Tradicional Chinesa (MTC) e o sistema difundiu-se a outras culturas (Lindley e Cummings, 2006).

Na literatura chinesa há referências à utilização de pedras polidas e afiadas (Bian Shi), no período Neolítico, para puncionar certas partes do corpo (Jaggar e Robinson, 2001), e foram descobertas agulhas feitas de osso em túmulos neolíticos (Baldry, 2005). No entanto, pensa-se que estes objectos eram utilizados apenas para abrir e drenar abcessos, e não numa forma primitiva de acupunctura como foi especulado (Jaggar e Robinson, 2001).

A prática de acupunctura na China aparece ligada ao Taoísmo ou Daoísmo (300 a.C.), vertente filosófica e religiosa que substituiu a crença de que as doenças eram provocadas por demónios, trazendo uma visão mais antropocêntrica sobre as doenças e a interacção Homem-Universo (VanderPloeg e Yi, 2009). O "pai" do Taoísmo, Laotse (circa 500 a.C.) descreveu a natureza essencial do Tao como uma força abstracta responsável pela criação, mudança e desenvolvimento de todas as coisas na Natureza. O Tao reúne a polaridade entre Yin e Yang, conceitos com origem na filosofia do Naturalismo, que representam a dualidade fundamental existente no mundo natural (Lindley e Cummings, 2006).

A acupunctura foi formalmente reconhecida como prática terapêutica no primeiro texto de medicina chinesa, "Nei Jing" (O Livro do Imperador Amarelo), datado de 305-204 a.C. (Ma, 1992). Em 259 d.C., foi publicado o "Zhen Jiu Jia Jing" (Clássico de Acupunctura), que continha o nome e a função de cada ponto de acupunctura (Kayne, 2009). Com o desenvolvimento da metalurgia, as agulhas de pedra, osso, espinha de peixe e bambu, foram sendo substituídas por agulhas de metal (bronze, ferro, ouro e prata) de formas variadas, o que permitiu desenvolver os métodos de acupunctura, potenciar o seu efeito terapêutico e ampliar o espectro de utilizações (Ma, 1992).

Na Europa, foram os missionários Jesuítas que, no século XVI, introduziram estas práticas terapêuticas trazidas da China e criaram o termo acupunctura. Willem Ten Rhijne, médico na Companhia da Índia, foi o primeiro médico ocidental a descrever a acupunctura em 1680,

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depois de testemunhar tratamentos realizados no Japão (White et al., 2008).

Na primeira metade do século XIX aumentou o interesse nesta terapia, principalmente nos EUA e Inglaterra e surgiram várias publicações na literatura científica, incluindo um artigo editorial no

The Lancet em 1823 (Anexo I). Berlioz, em 1816, desenvolveu ensaios clínicos em acupunctura

e publicou alguns artigos sobre o tema (White et al., 2008). Em 1863 foi publicado o livro "A Medicina na China" em Paris, por Pierre Dabry, que incluía uma secção sobre acupunctura veterinária (Rogers, 1991).

George Soulier de Morant (1878-1955), um diplomata francês que passou vários anos na China, foi responsável pela reintrodução da acupunctura em França. Ele influenciou profundamente o estilo de acupunctura ocidental, tendo sido o primeiro a traduzir os textos chineses sobre acupunctura e publicado a partir de 1939 uma série de tratados sobre o tema (White et al., 2008). A sua terminologia é ainda hoje utilizada, ainda que com alguma polémica na escolha dos termos adoptados na tradução (Cassidy, 2002).

Nos EUA, a acupunctura tornou-se extremamente popular depois da visita do Presidente Nixon à China, em 1972, quando um dos jornalistas na comitiva foi tratado com acupunctura no pós-operatório de uma apendicectomia. O relato da sua experiência suscitou o interesse da comunidade médica americana (Ceniceros e Brown, 1998). A subsequente publicidade internacional dada à medicina chinesa, incluindo à acupunctura, despoletou o interesse dos clínicos e investigadores ocidentais nesta técnica terapêutica.

1.1. História da acupunctura veterinária

Na China, a domesticação de animais data do século XVI a XVII a.C., época em que os praticantes de medicina tratavam pessoas e animais (Lindley e Cummings, 2006). Os primeiros tratamentos estavam a cargo dos "sacerdotes de cavalos", que se julgava terem poderes curativos por apaziguarem os espíritos maléficos que causavam doenças (Klide e Kung, 1977). O primeiro médico veterinário de que há registo foi Chao Fu, durante o Império de Mu Huang (947 a 928 a.C.), considerado um perito em doenças dos animais e uma lenda nos livros clássicos de história e da medicina veterinária (Rogers, 1991). A abordagem distinta à medicina veterinária surge com a publicação da "Norma de Medicina Veterinária" de Bai-Le (650 a.C.) e desde então as duas áreas de medicina seguiriam vias separadas (Lindley e Cummings, 2006). A publicação dos livros "Nei Jing" e "Nan Ching" (Tratado dos Conceitos Difíceis), viria a influenciar não só a MTC, mas também a medicina veterinária. Pensa-se que estas publicações, assim como alguns textos sobre doenças dos animais, tenham sido utilizadas pelos sacerdotes dos cavalos. Nos séculos seguintes houve uma ampla publicação de textos sobre veterinária e foi formalizada a educação veterinária (Rogers, 1991).

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entidade governamental responsável pela revisão e correcção dos livros antigos de medicina publicados até à data. Este governo foi o primeiro a formalizar o armazenamento de fármacos, que eram fornecidos aos veterinários por funcionários do estado (Klide e Kung, 1977).

Nos anos seguintes, a publicação de textos sobre equinos, bovinos, camelídeos, suínos, nutrição e lavoura tornou-se frequente. No entanto, apesar de existirem várias escolas ao estilo ocidental, não existia ainda uma formação nacional de médicos veterinários (Rogers, 1991). A Escola de Medicina Veterinária de Shangai, privada, surgiu em 1917 e foi pioneira na educação veterinária formal (Rogers, 1991). Só em 1947 foram fundados os departamentos de medicina veterinária nas escolas públicas de agricultura, marcando o início da medicina veterinária moderna na China (Klide e Kung, 1977).

Em 1955 foram reeditados os clássicos sobre equinos e bovinos com terminologia médica moderna, incluindo o livro "Hsing Yue Ma Ching" (Novo tratado de cavalos e bovinos) por Kim Chung-Tze, baseado no antigo Tratado do Cavalo. No ano seguinte seriam fundados dois jornais de veterinária, o "Chung-kuo Shou-i-hsueh Tsa-chih" (Jornal Chinês de Medicina Veterinária) e o "Hsu-mu Shou-i" (Pastores e Medicina Veterinária) (Klide e Kung, 1977).

Três anos depois, a Academia Chinesa de Agricultura patrocinou a primeira Conferência Nacional de Investigação de Medicina Veterinária Chinesa em Lanchow. Esta iniciativa foi marcada pela fundação do Instituto de Investigação de Medicina Veterinária Chinesa (Lanchow) e pela nomeação de um comité responsável pela revisão dos clássicos de veterinária chineses, japoneses e coreanos. Este foi um período de padronização e de modificação da prática de medicina veterinária. Os métodos antigos foram reunidos, editados, aplicados e a sua eficácia foi avaliada. Os métodos com bons resultados eram então usados na prática clínica e nas escolas de Medicina Veterinária dos Institutos de Agricultura. Aos estudantes, eram leccionados os métodos chineses e ocidentais (Klide e Kung, 1977).

Entre 1958 e 1972 houve um grande aumento de ensaios clínicos e experimentais sobre a acupunctura e os seus mecanismos e investigação de novas aplicações desta técnica. Neste contexto, a acupunctura foi utilizada em analgesia pela primeira vez em 1958 em humanos e, em 1969, em burros e cavalos (Rogers, 1991).

Em 1972 o Instituto de Medicina Veterinária de Lanchow publicou o "Shou-i Shou-chai" (Manual de Medicina Veterinária), que combinava os métodos de Medicina Veterinária Tradicional Chinesa e os ocidentais. Este livro viria a tornar-se o manual de referência para os estudantes de Medicina Veterinária na China (Klide e Kung, 1977).

Após os trabalhos de Soulier de Morant no início do século XX, alguns veterinários começaram a utilizar acupunctura durante as décadas de 30 e 40 em França, Alemanha e Áustria, mas pouco foi publicado acerca dos seus resultados. Na década de 50 surgiram os pioneiros da acupunctura veterinária no ocidente: Kothbauer (Áustria), Milin (França), Westermayer (Alemanha) e nos EUA: Altman, Bressler, Cain, Jaggar, Klide, Grady Young, cujas principais

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áreas de investigação podem ser consultadas no Anexo II. Em 1954 foi publicada a primeira tese ocidental sobre acupunctura veterinária, por Benard na Escola de Veterinária de Alfort (Paris) (Rogers, 1991). Na década de 70, foram publicados uma série de ensaios básicos e clínicos em acupunctura veterinária, desenvolvidos por clínicos, alunos de pós-graduação e docentes de universidades europeias e americanas (Klide e Kung, 1977).

Nos EUA a acupunctura veterinária foi liderada por duas grandes associações, ambas fundadas em 1974. Os bons resultados clínicos obtidos no Projecto de Investigação em Acupunctura Veterinária na Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA) em 1973, contribuíram para a fundação da National Association of Veterinary Acupuncture (NAVA). No mesmo ano seria fundada a International Veterinary Acupuncture Society (IVAS). Devido à dificuldade de gerir duas organizações de uma especialidade minoritária, muitos membros da NAVA juntaram-se à IVAS e a NAVA foi extinta (Rogers, 1991).

Actualmente a IVAS é a maior organização de acupunctura veterinária fora do Oriente, com membros e contactos informais em 38 países. Os seus objectivos incluem a integração plena da acupunctura nas ciências veterinárias e a padronização da formação internacional. A associação ministra cursos básicos, nos países que o solicitem, que incluem um exame final para acreditação pela IVAS como acupuncturistas veterinários. Apenas os médicos veterinários ou os estudantes finalistas podem frequentar estes cursos e realizar o exame final.

Em Portugal, a acupunctura é abrangida pela Lei do enquadramento base das terapêuticas não convencionais (Lei 45/2003, de 22 de Agosto), que estabelece o enquadramento da actividade e do exercício dos profissionais que aplicam as terapêuticas não convencionais, tal como definidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS). No entanto, a lei ainda não foi aplicada e continuam por definir os parâmetros de creditação, formação e certificação dos profissionais, assim como a regulamentação do exercício da actividade. Esta lei não especifica os critérios de regulamentação para a acupunctura veterinária. Nos países da União Europeia com legislação e regulamentação da acupunctura veterinária, esta é considerada um acto exclusivamente médico-veterinário. Nos restantes países, a creditação pela IVAS, apesar de ser uma opção pessoal, contribui para a credibilidade dos profissionais que praticam acupunctura veterinária.

2. Princípios da Medicina Tradicional Chinesa

Acupunctura é a introdução de agulhas finas na pele, em pontos específicos da superfície corporal. O termo deriva do latim acus (agulha) e pungere (picar). Após a colocação das agulhas, estas são manipuladas de modo a reequilibrar as energias vitais do organismo (VanderPloeg e Yi, 2009). Esta prática ancestral é uma componente importante da MTC.

O livro de referência da MTC, "Nei Jing", refere que para dominar a medicina, é preciso dominar o uso de metáforas, pois estas aplicam-se tanto à medicina como ao corpo (Wynn e

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Marsden, 2003). A MTC baseia-se em filosofias, lógicas e crenças de uma civilização diferente da ocidental, com uma percepção de saúde e de doença completamente distinta. A sua base teórica e de diagnóstico não pode ser explicada em termos de fisiologia e anatomia ocidentais, o que dificulta a aceitação por parte dos médicos com formação técnica ocidental. Tal como a medicina ocidental, ela envolve uma série de práticas com o propósito de curar a doença e manter a saúde e o bem-estar, que na MTC representam uma intervenção energética destinada a restabelecer a harmonia e o equilíbrio de cada paciente (Kayne, 2009).

2.1. Yin e Yang

A teoria de Yin e Yang é um enquadramento conceptual que permite interpretar todos os fenómenos complementares e inseparáveis. Yin e Yang representam dois fenómenos de natureza oposta e também dois aspectos diferentes e opostos presentes no mesmo fenómeno. Na MTC, considera-se que tudo no Universo pode ser comparado segundo as suas propriedades Yin ou Yang (Anexo III). A natureza Yin ou Yang de qualquer fenómeno é relativa, pois o Yin pode transformar-se em Yang e vice-versa, e tudo pode ser dividido infinitamente nos seus aspectos Yin ou Yang (Chonghuo et al., 1988). O símbolo Tai Ji (Figura 1) é usado tradicionalmente para representar as inter-relações entre Yin e Yang (Xie e Preast, 2002).

Em condições normais, Yin e Yang existem no organismo num equilíbrio, de modo que as actividades fisiológicas sejam normais. A MTC considera que a doença é um estado de desarmonia resultante do desequilíbrio entre Yin e Yang, provocado pelo aumento (Excesso) ou pela diminuição (Deficiência) de uma das partes (Figura 2).

Figura 1. Símbolo Tai Ji que representa as inter-relações entre Yin e Yang (Adaptado de Xie e Preast, 2002). ! Oposição: todas as coisas na Natureza têm dois aspectos

e podem ser divididas em Yin (negro) ou Yang (branco).

! Relatividade: nada é absolutamente Yin e absolutamente

Yang. Por exemplo, uma noite de Verão é o Yin no Yang (círculo negro no fundo branco) e um dia de Inverno é o Yang no Yin (círculo branco no fundo negro).

! Interdependência: nenhum pólo existe sozinho, ou seja,

um conceito não existe sem o outro. Representada pela divisão do símbolo em duas metades que parecem encaixar uma na outra.

! Interconsumo e intertransfomação: Yin e Yang

controlam-se mutuamente mantendo o equilíbrio. Enquanto um lado aumenta de tamanho, o lado oposto diminui formando um círculo perfeito. Os dois lados fundem-se formando um ciclo contínuo em que cada metade se vai transformando na oposta.

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Na Figura 2 pode observar-se que há um predomínio de Yin em A e em D. No primeiro, o Yang encontra-se dentro dos limites normais e existe um excesso (absoluto) de Yin. Para repôr o equilíbrio é necessário sedar o Yin, reduzindo a sua influência sobre o Yang. No segundo, apesar do predomínio de Yin, este encontra-se dentro dos limites normais (é um excesso relativo) e o Yang está diminuído. Neste caso, o tratamento consistirá na tonificação do Yang.

2.2. Cinco Fases ou Cinco Movimentos

Enquanto o conceito de dualidade definido por Yin e Yang é útil para compreender processos polares, a introdução do sistema das Cinco Fases ou Cinco Movimentos permite classificar processos que cursam por fases. Pensa-se que a teoria das Cinco Fases tenha tido origem na Índia. Com a difusão do Budismo (entre 100 a.C. e 600 d.C.) pode ter chegado à China e sido incorporada nas teorias da MTC (Lindley e Cummings, 2006).

O sistema de Cinco Fases é utilizado para descrever a natureza dos órgãos Zang Fu, as inter-relações entre órgãos e a relação do animal com o mundo natural. Da mesma forma, é usado para classificar e agrupar uma série de características na MTC (Anexo IV). Por exemplo, a cada Fase corresponde um orifício corporal que constitui a abertura de um órgão Zang Fu e um tecido que manifesta o estado funcional do órgão correspondente.

As Cinco Fases são: madeira, fogo, terra, metal e água, representando o ciclo da vida. A teoria das Cinco Fases explica, por analogia, as funções fisiológicas dos órgãos internos segundo dois ciclos: promoção (ciclo Sheng) e inibição (ciclo Ke), representados respectivamente na Figura 3 e na Figura 4. No ciclo de promoção cada fase promove, alimenta e gera a fase seguinte numa ordem circular. Neste ciclo, a fase que promove chama-se "mãe" e a fase seguinte chama-se "filho". O ciclo de inibição tem uma forma alternada em que, cada fase inibe a seguinte não consecutiva, formando um pentagrama. Neste ciclo a fase inibitória é o "avô" e

Yin Yang

Equilíbrio: Yin = Yang

C

B

Excesso de Yang

A

Excesso de Yin Deficiência de Yang

D

Deficiência de Yin

Figura 2. Equilíbrio e desequilíbrio entre Yin e Yang. Existe um desequilíbrio quando um dos componentes se encontra dentro dos limites normais e o outro está aumentado (Excesso) ou diminuído (Deficiência).

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a fase inibida é o "neto". Em conjunto, os ciclos de promoção e inibição formam um sistema de

feedback que mantém os órgãos em funcionamento no nível adequado, evitando que algum se

torne excessivo ou deficiente (Xie e Preast, 2002).

Os princípios das Cinco Fases podem ser aplicados na classificação dos animais quanto às suas características individuais. Esta classificação permite associar a fisionomia e a personalidade do animal à predisposição a determinadas doenças e desequilíbrios (Xie e Preast, 2002). A classificação dos animais segundo a teoria das Cinco Fases pode ser consultada no Anexo V.

2.3. Substâncias básicas

O Qi, Xue, Jing, Shen e Jin Ye constituem as substâncias fundamentais do organismo na MTC. Elas são a base para as actividades fisiológicas dos órgãos Zang Fu (órgãos internos), tecidos e meridianos. O termo substância é relativo, pois não implica necessariamente matéria ou energia e frequentemente representa uma forma intermédia. As cinco substâncias são formadas e armazenadas nos órgãos Zang Fu e transportadas, especialmente via Jing Luo (sistema de meridianos), para todos os tecidos do organismo (Ross, 1985).

O conceito de Jing é traduzido como Essência, que é herdada dos progenitores e determina a constituição e a vitalidade do indivíduo (à semelhança do ADN), sendo responsável pelo crescimento, desenvolvimento, reprodução, produção de medula óssea e promoção do Qi do Rim. Shen é a Mente ou Espírito, governado pelo Coração. O Shen é responsável pela consciência, saúde mental e emocional e o seu desequilíbrio pode traduzir-se em insónias, alterações do comportamento ou distúrbios psiquiátricos. Na MTC, o Xue ou Sangue é mais do que um sistema de transporte. Xue e Qi são duas substâncias complementares e

Figura 4. Ciclo Ke ou de inibição. Figura 3. Ciclo Sheng ou de promoção.

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interdependentes, uma mais Yang (Qi) e outra mais Yin (Xue). O Qi é indispensável na produção e no transporte do Xue e por sua vez, o Xue nutre os órgãos que produzem o Qi (Kayne, 2009; Limehouse e Taylor-Limehouse, 2001). Jin Ye representa os fluidos corporais, que podem ser divididos em Jin e em Ye. Jin são os fluidos externos, aquosos e pouco densos como a saliva, suor e lágrimas. Ye são os fluidos mais densos que circulam no interior do organismo como as secreções gástricas e o líquido sinovial. O Jin Ye é essencial na manutenção do Qi saudável, tendo como função a nutrição e a lubrificação (Kayne, 2009). O Qi [tchi], é geralmente traduzido como energia ou força vital, mas pode ter vários significados consoante o contexto: energia, vapor, gás ou fôlego (Cassidy, 2002). Os chineses consideram que o Qi é omnipresente na Natureza e aparente em todas as coisas, sob a forma de vida e de movimento (Lindley e Cummings, 2006). Na MTC, o organismo é a expressão do equilíbrio dinâmico de duas componentes: energia e substância, ou Qi e Xue (Cassidy, 2002). O Qi é inato (ou hereditário) e adquirido, através da comida e da respiração. Ele acumula-se nos órgãos e flui pelo organismo através de canais ou meridianos segundo um padrão específico, regulando as funções vitais e nutrindo os órgãos. Quando o seu fluxo é perturbado por agentes patogénicos, a doença instala-se. A estimulação de determinados pontos nos meridianos permite influenciar o fluxo do Qi e exercer portanto um efeito terapêutico sobre o organismo (Lindley e Cummings, 2006).

2.4. Órgãos Zang Fu

Na MTC existem doze órgãos internos principais, os órgãos Zang Fu, emparelhados dois a dois formando uma equipa que desempenha uma função vital. O seu objectivo é receber ar, comida e bebida do ambiente externo e transformá-los nas Substâncias e em produtos de excreção. Os Zang Fu, são responsáveis por manter uma interacção harmoniosa entre o organismo e o ambiente externo.

Enquanto na medicina ocidental o termo órgão designa uma estrutura anatómica, na MTC o termo refere-se a um conjunto de funções desempenhadas por uma entidade sem estrutura física definida. Nas publicações traduzidas do chinês, a nomenclatura dos órgãos Zang Fu é igual à dos órgãos da medicina ocidental mas sem correspondência directa, o que pode suscitar alguma confusão. O órgão San Jiao ou Triplo Aquecedor, representa um conceito puramente fisiológico sem qualquer estrutura física associada e sem correspondência na medicina ocidental. Para distinguir os conceitos orientais dos ocidentais, a maioria dos autores opta pelo nome em Pinyin (chinês romanizado) ou pelo nome traduzido escrito com maiúscula (Ross, 1985), sistema que foi adoptado neste trabalho.

Cada par funcional é composto por um órgão Zang e um órgão Fu. Os órgãos Zang são mais calmos e portanto mais Yin. São órgãos geralmente maciços, mais internos e sem

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comunicação com o exterior (Wynn e Marsden, 2003). Os órgãos Fu são os mais activos e portanto mais Yang, responsáveis pelo "trabalho sujo". Geralmente são órgãos ocos, que interagem directamente com o ambiente, movendo materiais para e pelo interior do organismo e excretando materiais para o exterior (Ross, 1985).

Do ponto de vista ocidental considera-se que os órgãos Fu contêm músculo liso e portanto estão sujeitos a condições espásticas como cólicas. Têm como função a absorção de nutrientes e eliminação de produtos. Os órgãos Zang processam as substâncias nutritivas absorvidas e armazenam os produtos de metabolismo (Limehouse e Taylor-Limehouse, 2001). As funções dos órgãos Zang Fu são descritas no Anexo VI.

2.5. Acupontos

Na acupunctura chinesa, um acuponto diz-se Shu Xue, sendo que Shu significa passagem ou comunicação e Xue significa orifício ou saída. Um acuponto pode ser definido como um orifício na pele que comunica com um ou mais órgãos internos, através de um meridiano ou seu colateral. O tamanho dos acupontos pode variar de 1 mm a 25 mm, dependendo da sua localização e do tamanho do animal (Limehouse e Taylor-Limehouse, 2001).

Cada acuponto tem uma localização única, desencadeia um efeito fisiológico (Xie e Preast, 2007) e comunica com um dos órgãos Zang Fu, reflectindo o estado desse órgão (Hwang e Egerbacher, 2001). Quando um órgão sofre alterações fisiopatológicas, um ou mais dos acupontos relacionados podem tornar-se sensíveis, mudar de cor ou tornar-se mais firmes. Se estes pontos forem tratados por MTC (acupunctura ou outros métodos), o efeito chegará rapidamente até ao órgão-alvo, através dos respectivos meridianos. Esta perspectiva assemelha-se aos conceitos ocidentais de reflexo víscero-somático e somato-vísceral, assim como a relação ponto-gatilho (trigger-point) com a dor miofascial e vísceral (Hwang e Egerbacher, 2001).

Os vários tipos de acupontos podem ter efeitos locais, efeitos à distância ou ainda efeitos sistémicos. Todos os acupontos tem um efeito local na área adjacente. Os pontos dolorosos, endurecidos e sensíveis, que não pertencem a um meridiano, são os pontos Ah-Shi e também podem ser usados como acupontos locais (Ahn et al., 2009).

Os acupontos actuam sobre as desarmonias do meridiano a que pertencem, do meridiano par e do órgão Zang Fu e nos tecidos e órgãos sensoriais correspondentes. Os pontos localizados nas extremidades, distalmente à articulação do joelho e do cotovelo, têm influência nas regiões proximais (cabeça, pescoço e face). São chamados os Cinco pontos Shu que são sedados ou tonificados segundo a teoria das Cinco Fases. Alguns acupontos têm também efeitos específicos que podem ser usados como tratamento sintomático de náusea, vómito, diarreia, obstipação, soluços e febre entre outros (Ahn et al., 2009).

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A caracterização dos acupontos, em termos histológicos e fisiológicos, tem sido alvo de estudo para compreender os possíveis mecanismos de acção da acupunctura. Há uma relação íntima entre a localização dos acupontos e os receptores envolvidos. Uma agulha inserida num ponto na pele, estimula receptores sensoriais de tacto e de pressão, mas se inserida mais profundamente estimulará as fibras musculares nessa região. Um ponto numa articulação irá estimular os receptores de pressão e/ou do órgão tendinoso de Golgi. Estima-se que 70 a 80% dos pontos de acupunctura sejam pontos-gatilho, e que a maioria dos acupontos são também pontos motores musculares (Cab!oglu et al., 2006).

Nos estudos morfológicos, observou-se uma alta densidade de troncos nervosos, terminações nervosas e redes vasculares no tecido subcutâneo, nos pontos de acupunctura ou próximo destes. Outros estudos relatam uma elevada concentração de folículos pilosos e de papilas dérmicas ricas em ansas capilares e uma escassez de núcleos na derme. Há também uma relação íntima entre os pontos de acupunctura e a vasculatura. Na maioria dos acupontos existem ansas capilares com invólucro simpático e, sob os acupontos, existem vasos sanguíneos (normalmente veias). Pensa-se que a inervação simpática dos vasos sanguíneos poderá contribuir na sensação de Deqi e na sequência de reacções à aplicação das agulhas (Hwang e Egerbacher, 2001).

Os acupontos são frequentemente descritos como tendo características eléctricas distintas: elevada condutância, capacitância e potencial eléctrico, e uma baixa impedância e resistência (Ahn e Martinsen, 2007). No entanto, nem todos os pontos com estas características correspondem a pontos de acupunctura descritos. De um modo geral, os autores descrevem a existência de zonas e bandas estreitas com baixa resistência dérmica, semelhantes a meridianos, que se estendem pelo eixo longo dos membros torácicos e pélvicos. A baixa resistência dérmica pode dever-se a um aumento local da permeabilidade capilar resultante da alteração patológica do órgão Zang Fu correspondente, ou pode resultar de um reflexo simpático (Hwang e Egerbacher, 2001). Com base nestas propriedades eléctricas, foram desenvolvidos aparelhos de localização e análise, úteis no diagnóstico de desarmonias. No entanto, a caracterização eléctrica dos acupontos apresenta vários problemas técnicos frequentemente desvalorizados: capacidade de polarização dos eléctrodos e sua geometria, presença de glândulas sudoríparas e meio de contacto, entre outros. Estas variáveis interferem nos resultados finais e constituem um obstáculo à reprodução de resultados em estudos subsequentes. Por este motivo, Ahn e Martinsen (2007), consideram que a utilidade e validade dos aparelhos de electrodiagnóstico comercializados é bastante dúbia.

Em acupunctura veterinária podem usar-se os pontos descritos na literatura tradicional (acupontos clássicos) ou os pontos transpostos a partir do modelo humano (acupontos transpostos). A literatura tradicional contém apenas a descrição e localização dos acupontos em equinos, bovinos e suínos, porque a acupunctura veterinária era utilizada essencialmente

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nas espécies de interesse pecuário. Com a difusão da acupunctura veterinária na sociedade moderna ocidental, aumentou o interesse da sua utilização nos animais de companhia (cães, gatos e aves). Como estas espécies não eram alvo de estudo, muitos dos acupontos nelas utilizados foram transpostos do modelo humano, equino e bovino (Chrisman e Xie, 2007). Para localizar os pontos de acupunctura, usam-se referências anatómicas. Como o tamanho dos animais é muito variável, não podem ser usadas medidas absolutas. Por isso, usa-se o cun [tsun], uma unidade de medida relativa, proporcional à estatura de cada indivíduo. Por exemplo, a distância entre o bordo cranial e o bordo caudal da escápula é sempre de 3 cun, independentemente de se tratar de um cão de raça miniatura ou de raça gigante (Figura 5). Nos animais, um cun, equivale ao comprimento da primeira vértebra caudal ou à largura da última costela (Xie e Preast, 2007). No entanto, o comprimento da primeira vértebra caudal só pode ser determinado por imagiologia e a última costela pode ser difícil de palpar em animais obesos. Na prática, usa-se frequentemente as referências anatómicas da medicina humana, na acupunctura de animais de companhia. Nesse caso, a largura dos quatro dedos do animal, ao nível das articulações interfalangianas proximais, corresponde a 3 cun. Para localizar os acupontos das regiões craniais do corpo, a medição é feita nos dedos da extremidade torácica e para localizar os acupontos das regiões caudais, a medição é feita na extremidade pélvica.

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2.6. Meridianos

Os meridianos constituem a base da acupunctura pois são as vias através das quais o Qi e o Xue circulam pelo organismo. Não são estruturas físicas, mas a sua existência e distribuição foi já demonstrada por medição dos potenciais neuroeléctricos. O sistema de meridianos une todas as regiões do organismo, ligando os órgãos internos às regiões mais externas e mantendo o equilíbrio (Limehouse e Taylor-Limehouse, 2001).

O sistema de meridianos ou Jing Luo, é formado por uma série de meridianos distintos: regulares, extraordinários, colaterais e divergentes. Os meridianos mais importantes são os doze meridianos regulares, cada um correspondendo a um órgão Zang Fu. Estes meridianos são pares, simétricos e bilaterais. Os meridianos extraordinários são oito, ímpares, e não se ligam directamente aos órgãos Zang Fu. Destes, dois são meridianos principais, uma vez que são formados por acupontos únicos que não correspondem a nenhum dos meridianos regulares. Estes dois meridianos percorrem o organismo longitudinalmente pela linha média, ventralmente (meridiano do Vaso da Concepção) e dorsalmente (meridiano do Vaso Governador). Existem ainda meridianos colaterais e meridianos divergentes, com pontos comuns aos meridianos regulares e que são utilizados em condições específicas (Xie e Preast, 2007). O trajecto dos meridianos regulares e dos meridianos extraordinários principais pode ser consultado no Anexo VII.

2.7. Deqi

A inserção de uma agulha de acupunctura provoca uma sensação invulgar conhecida como Deqi que significa chegada do Qi. O Deqi é descrito subjectivamente como uma sensação de dormência, formigueiro, lassidão ou tumefacção que emana do acuponto e se prolonga pelo meridiano. Nos animais, o Deqi é evidenciado pela contracção do músculo e da pele e por respostas comportamentais como a vocalização e a evasão. O manipulador sente o Deqi como se o músculo agarrasse a agulha, o que pode resultar de um reflexo de estiramento à introdução da agulha. Os acupuncturistas consideram que a sensação de Deqi é fundamental para se conseguir os efeitos terapêuticos da acupunctura (Hwang e Egerbacher, 2001).

O Deqi ou sensação propagada ao longo do meridiano, é um fenómeno vastamente investigado. A componente aferente da sensação de Deqi, está a cargo das fibras sensoriais mais finas (A-! do grupo III) e grossas (A-" do grupo II), tal como o efeito analgésico da acupunctura. A injecção de anestésicos locais anula completamente esta sensação (Hwang e Egerbacher, 2001). Sendo uma sensação subjectiva pode estar associado ao sistema nervoso central (SNC) e corresponder a uma excitação expansiva que ocorre no córtex sensorial. Porém, esta teoria não explica o facto de ser acompanhado por reacções na pele, vasos sanguíneos e nervos (Wang, Ayati e Zhang, 2010).

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2.8. Nomenclatura

A OMS aprovou uma nomenclatura para meridianos e acupontos de modo a padronizar as publicações sobre acupunctura e facilitar a comunicação entre colegas. Esta nomenclatura contém quatro elementos. O meridiano pode ser designado pelo caractere Han que representa o nome original, pelo nome em Pinyin segundo a pronúncia padrão usada na China ou pelo nome em inglês (traduzido do caractere Han), (Quadro 1).

O nome do acuponto é composto por um código alfanumérico no qual as letras são a abreviação do nome do meridiano, em inglês, e a numeração é atribuída ao longo do trajecto de cada meridiano. Por exemplo, o 36º acuponto no meridiano do Estômago representa-se por ST36. O código alfanumérico dos pontos extra, contém o prefixo EX (extra), um código alfabético para a região anatómica (cabeça e pescoço HN, toráx e abdómen CA, zona lombar B, membro anterior UE, membro posterior LE) e a numeração é atribuída em direcção dorsal a ventral (na cabeça, pescoço e tronco), proximal a distal (membros) e de medial para lateral. Por exemplo, um acuponto extra na cabeça representa-se EX-HN7 (OMS, 1991).

2.9. Causas de doença

Na MTC, a doença é um estado de desarmonia ou desequilíbrio, no qual o organismo é incapaz de repôr o equilíbrio e o Wei Qi (Qi defensivo) é incapaz de combater a invasão por agentes patogénicos. A desarmonia resulta do desequilíbrio entre Yin e Yang, entre os órgãos Zang Fu ou da perturbação do fluxo do Qi, e manifesta-se por um conjunto de sinais clínicos que correspondem a um padrão de doença (ou síndrome de MTC) (Chonghuo et al., 1988). As causas de doença são divididas em três categorias: agentes internos, externos e mistos. Enquanto na medicina ocidental as causas endógenas representam doenças genéticas, na MTC representam as emoções. As emoções são respostas normais do indivíduo ao ambiente e fazem parte da sua saúde mental. Quando estas respostas se tornam habituais, exageradas ou inadequadas podem ter efeitos deletérios no fluxo de Qi. Os sete agentes internos ou

Meridiano Código Meridiano Código

Pulmão LU Intestino grosso LI

Estômago ST Baço ou Baço-Pâncreas SP

Coração HT Intestino delgado SI

Bexiga BL Rim KI

Pericárdio PC Triplo aquecedor TE

Vesícula biliar GB Fígado LR

Vaso governador GV Vaso da concepção CV

Quadro 1. Código alfabético dos doze meridianos regulares e dos dois meridianos extraordinários principais, segundo a nomenclatura internacional da OMS (1991).

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emocionais são: alegria, ira, melancolia, ansiedade, medo, tristeza e susto. Nos animais, a avaliação do estado emocional pode ser difícil e depende da cooperação do proprietário mas, frequentemente, as alterações são óbvias por exemplo, quando surgem comportamentos estereotipados (Cassidy, 2002). O conceito de agentes externos deriva das alterações climáticas capazes de provocar stress no indivíduo e inclui: Vento, Frio, Calor, Humidade, Secura e Fogo. Em condições normais, o organismo é capaz de se adaptar a estas alterações. Quando os agentes externos se manifestam de forma exagerada ou sobre um indivíduo debilitado, podem ultrapassar as barreiras de defesa e penetrar no organismo provocando doença (Chonghuo et al., 1988). Os factores patogénicos mistos ou intermédios não são internos nem externos. Nesta categoria inserem-se diversas causas de doença como traumatismo, toxinas, venenos, parasitas, doenças genéticas e estilos de vida inadequados (Cassidy, 2002). Existem também os factores patogénicos epidémicos ou pestilências epidémicas que, dependendo do autor, são incluídos nos factores patogénicos mistos ou constituem uma classe independente. Os factores epidémicos são responsáveis pelas doenças infecciosas graves que são contagiosas e de evolução aguda (Chonghuo et al., 1988).

2.10. Exame físico de Medicina Veterinária Tradicional Chinesa

O exame de MVTC consiste em: anamnese, observação, auscultação, olfacção, palpação, exame da língua e exame do pulso. As duas últimas fases são fundamentais para a identificação do padrão de doença ou da síndrome presente. De qualquer modo, o acupuncturista veterinário não deve descurar a medicina convencional e deve, obviamente, usar os meios de diagnóstico modernos à disposição, reunindo o máximo de informação possível para determinar qual o tratamento mais indicado (Broadfoot et al., 2008). No Anexo VIII é apresentada uma ficha de exame físico que combina os parâmetros do exame de MVTC e os do exame de medicina veterinária.

O acupuncturista deve avaliar todos os factores que fazem os sinais clínicos melhorar ou piorar: impacto do clima, actividades da vida normal e a hora do dia (Wynn e Marsden, 2003) e questionar o proprietário quanto à atitude e comportamento do animal. Por exemplo, se procura locais quentes ou frescos e se ingere mais água do que o habitual (Casasola, 1999). Tal como na Medicina Veterinária, a história médica é importante no diagnóstico de MVTC, pois a doença presente pode reflectir a progressão de uma dinâmica energética que não foi tratada, ou ter a mesma dinâmica presente em doenças anteriores. O aparecimento de sinais clínicos associado à administração de fármacos ou vacinas, sugere normalmente o agravamento de uma condição latente ou de uma tendência para doença no organismo. Esta tendência geralmente tem a mesma natureza que o fármaco. Portanto, fármacos que arrefecem (como antibióticos) podem agravar tendências para o Frio, ou vacinas podem desencadear um episódio de Calor Tóxico

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pois os organismos infecciosos são considerados toxinas ambientais (Wynn e Marsden, 2003). A observação consiste na avaliação das características físicas que incluem o aspecto da pele, pelagem, compleição física e corrimentos nasais, oculares, brônquicas ou dos ouvidos, assim como a vitalidade do animal ou seja a atitude, resposta a estímulos e vivacidade do olhar. A localização das lesões cutâneas e das alterações na pelagem é especialmente importante quando se distribuem ao longo de um meridiano. O aspecto dos corrimentos é característico de certas perturbações internas e a compleição física pode ser indicativa de afecções subjacentes, como a perda ou ganho súbito de peso (Wynn e Marsden, 2003; Schwartz, 2001).

A auscultação é realizada sem estetoscópio, para avaliar as características do latido ou do miar, a tosse e os sons respiratórios. Um latido forte, especialmente num animal que vocaliza frequentemente, pode indicar um padrão de Excesso. Pelo contrário, um latido ou um miar fraco podem indicar um padrão de Deficiência (Casasola, 1999).

A cada órgão Zang Fu está associado um determinado odor e a sua classificação pode ajudar na identificação da área ou órgão problemático (Schwartz, 2001). De um modo geral os odores fétidos indicam padrões de Calor e Excesso. Quando as fezes e a urina são inodoras estão presentes padrões de Frio ou Deficiência (Casasola, 1999).

O exame de MVTC deve incluir a palpação da superfície corporal, músculos e massas anormais, à semelhança do exame ocidental (Broadfoot et al., 2008). Deve pesquisar-se tumefacções quentes, frias, dolorosas, áreas ulceradas, massas duras e massas brandas pouco definidas (Schwartz, 2001). A palpação deve também incluir os acupontos diagnósticos

Shu e Mu, que se relacionam com cada um dos órgãos Zang Fu reflectindo o seu estado. Os

pontos Shu ou pontos de associação pertencem ao meridiano da Bexiga e localizam-se no bordo dos músculos longissimus thoracis e iliocostalis (Xie e Preast, 2007). Estes pontos devem ser palpados com pressão leve a moderada (Schwartz, 2001). Os pontos Mu ou pontos de alarme situam-se na região lateral e ventral e pertencem a vários meridianos (Xie e Preast, 2007). Nestes pontos, uma leve pressão é geralmente suficiente para suscitar uma resposta. A sensibilidade à palpação dos acupontos pode reflectir um desequilíbrio do órgão Zang Fu ou do meridiano correspondente. O animal manifesta-a rosnando, ganindo, voltando a cabeça para morder, sentando-se ou simplesmente pela reacção de enrugamento da pele (Schwartz, 2001). O aspecto da língua é um indicador dos efeitos cumulativos de Qi, Xue, Yin e Yang nos tecidos e tem alta prioridade na interpretação dos sinais físicos e comportamentais (Wynn e Marsden, 2003). A língua deve ser avaliada quanto à cor, forma, movimento, revestimento, humidade e características particulares (Wen, 1985). Uma língua normal é rosa e viva, ligeiramente húmida, preenche o chão da boca, tem bordos afiados semelhantes aos de um fígado ou baço saudável e geralmente não possui saburra, apenas uma espuma persistente (Wynn e Marsden, 2003). A interpretação dos vários parâmetros do exame da língua pode ser consultada no Anexo X. Na MVTC o pulso é usado para avaliar o sistema cardiovascular mas também para avaliar o

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estado geral do animal (Broadfoot et al., 2008). Nos animais de companhia o pulso é palpado na artéria femoral e nos animais de grande porte é avaliado na artéria carótida (Xie e Liu, 2001). O pulso é classificado segundo uma série de parâmetros: profundidade, tensão, força, diâmetro, taxa e ritmo (Anexo XI). A profundidade do pulso depende da pressão necessária para sentir a intensidade máxima da pulsação e indica a localização da energia Yang e do Qi indiferenciado. A tensão do pulso depende da facilidade com que a pulsação e a parede do vaso desaparecem sob pressão digital e representa a facilidade com que o Qi flui no organismo. A força com que a pulsação bate nos dedos equivale à pressão do pulso e representa a quantidade de Qi. O diâmetro, é a área de superfície ocupada na ponta dos dedos e varia consoante a quantidade de Xue ou de Yin do organismo. A avaliação da taxa de pulso é feita por contagem das pulsações sentidas. O ritmo de pulso depende da rapidez das pulsações e da existência de pausas esporádicas ou regulares (Wynn e Marsden, 2003).

3. Formas de acupunctura

3.1. Acupunctura com agulha seca

A definição clássica de acupunctura refere-se à acupunctura com agulha seca, na qual se introduzem agulhas filiformes (Figura 6) na superfície corporal. Esta é a forma mais comum de acupunctura veterinária. As agulhas utilizadas têm comprimento e diâmetro adequado à espécie animal, porte, constituição e padrão de doença (Ferguson, 2007). Em pequenos animais usam-se agulhas de 28 a 34 gauge. O ângulo e a profundidade da inserção varia com a localização anatómica, idade, porte e estado de saúde do doente. Dependendo do padrão de doença, as agulhas podem ser manipuladas devagar ou depressa e rodadas em sentido horário ou anti-horário, de modo a tonificar ou sedar os acupontos (Cantwell, 2010).

O número de acupontos estimulados numa sessão de tratamento é muito variável. Podem usar-se até 60 pontos, por exemplo no tratamento de febre alta aguda, ou usar apenas um, por exemplo na diarreia. Em medicina veterinária geralmente usa-se um número moderado, 5 a 19 acupontos por sessão. Os tratamentos duram 10 a 30 minutos mas, em certas situações, pode ser necessário reter as agulhas durante algumas horas ou adoptar um método de estimulação permanente (implantes). Alguns acupontos são muito sensíveis (nos pés, olhos e nariz) e só devem ser estimulados por alguns segundos ou minutos (Ferguson, 2007).

A frequência das sessões de tratamento dependerá da natureza e gravidade da doença e da evolução do paciente. Na maioria dos casos usam-se tratamentos semanais ou até cada quatro semanas, num total de 3 a 7 sessões. Em animais com doença aguda ou grave, internados ou sob cuidados especiais, pode aumentar-se a frequência do tratamento. Por exemplo, num cavalo com laminite grave pode tratar-se a cada 12 horas para alívio da dor. Após resolução

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dos sinais clínicos pode ser recomendável uma re-avaliação aos 6 a 12 meses para afinar o organismo e re-equilibrar o Yin e o Yang (Ferguson, 2007).

3.2. Moxabustão

A moxabustão consiste no aquecimento dos acupontos queimando ervas (Artemisia vulgaris ou

Artemisia sinensis) na pele ou acima da pele. O objectivo é introduzir calor no organismo de

modo a corrigir o equilíbrio Yang-Yin e a promover a circulação do Qi e do Xue (Cassidy, 2002). Geralmente chama-se moxa ao preparado de ervas secas e prontas a queimar, seja na forma de cones ou de cilindros enrolados semelhantes a charutos (Figura 7).

Figura 7. Cilindro de moxa para moxabustão indirecta. Figura 8. Moxabustão indirecta.

Figura 6. Agulhas de acupunctura esterilizadas descartáveis de aço inoxidável. Estas agulhas têm guia (tubo de plástico) que facilita a sua colocação. São indicadas para acupunctura com agulha seca e para electroacupunctura.

Imagem

Figura 1. Símbolo Tai Ji que representa as inter-relações entre Yin e Yang (Adaptado de Xie e Preast, 2002).
Figura 2.  Equilíbrio e desequilíbrio entre Yin e Yang. Existe um desequilíbrio quando um dos componentes  se encontra dentro dos limites normais e o outro está aumentado (Excesso) ou diminuído (Deficiência).
Figura 4. Ciclo Ke ou de inibição.
Figura 5. Diagrama das medidas em cun no cão e no homem (Adaptado de Xie e Preast, 2007; OMS, 2009).
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Referências

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