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Mobilizações no processo de estágio supervisionado na formação inicial de professores : reflexos de experiências no Instituto Federal Fluminense

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO

EDALMA FERREIRA PAES

MOBILIZAÇÕES NO PROCESSO DE ESTÁGIO

SUPERVISIONADO NA FORMAÇÃO INICIAL DE

PROFESSORES: reflexos de experiências no

Instituto Federal Fluminense

CAMPINAS/SP

2017

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EDALMA FERREIRA PAES

MOBILIZAÇÕES NO PROCESSO DE ESTÁGIO

SUPERVISIONADO NA FORMAÇÃO INICIAL DE

PROFESSORES: reflexos de experiências no

Instituto Federal Fluminense

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do título de Doutora em Educação, na área de concentração de Ensino e Práticas Culturais.

Orientadora: Ana Lúcia Guedes Pinto

O ARQUIVO DIGITAL CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA EDALMA FERREIRA PAES, E ORIENTADA PELA PROFA. DRA. ANA LÚCIA GUEDES-PINTO.

CAMPINAS/SP 2017

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Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): Não se aplica.

Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas Biblioteca da Faculdade de Educação

Rosemary Passos - CRB 8/5751

Paes, Edalma Ferreira, 1960-

P138m PaeMobilizações no processo de estágio supervisionado na formação inicial de professores : reflexos de experiências no Instituto Federal Fluminense / Edalma Ferreira Paes. – Campinas, SP : [s.n.], 2017.

Orientador: Ana Lúcia Guedes Pinto.

PaeTese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação.

Pae1. Estágio supervisionado. 2. Licenciatura. 3. Mobilização. 4. Dimensão relacional. I. Pinto, Ana Lúcia Guedes, 1969-. II. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Educação. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Mobilizations in the process of supervised internship in initial

teacher training : reflections of experiences at the Fluminense Federal Institute

Palavras-chave em inglês:

Supervised internship Bachelor

Mobilization

Relational dimension

Área de concentração: Ensino e Práticas Culturais Titulação: Doutora em Educação Banca examinadora:

Ana Lúcia Guedes Pinto [Orientador] Dirce Djanira Pacheco e Zan

Cláudia Beatriz de Castro Nascimento Ometto Marissol Prezotto

Giovana Azzi de Camargo Terron

Data de defesa: 31-08-2017

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO

TESE DE DOUTORADO

MOBILIZAÇÕES NO PROCESSO DE ESTÁGIO

SUPERVISIONADO NA FORMAÇÃO INICIAL DE

PROFESSORES: reflexos de experiências no

Instituto Federal Fluminense

Autora : Edalma Ferreira Paes

COMISSÃO JULGADORA:

Orientadora: Profa. Dra. Ana Lúcia Guedes Pinto

Profa. Dra. Dirce Djanira Pacheco e Zan

Profa. Dra. Cláudia Beatriz de Castro Nascimento Ometto

Profa. Dra. Marissol Prezotto

Profa. Dra. Giovana Azzi de Camargo Terron

A Ata da Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno

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AGRADECIMENTO

A Deus – “Como é profunda a riqueza e a sabedoria do conhecimento de Deus! Como é impossível a nós compreendermos suas decisões e seus caminhos! [...]. Todas as coisas vêm única e exclusivamente dEle, e por Ele e para Ele. A Ele seja a glória para todo sempre. Romanos 11.

A minha família – que caminhou comigo cada passo dessa trajetória. Vocês não me deixaram desistir. Em especial minha irmã Elizete, com quem compartilhei meus desassossegos nessa caminhada.

À Ana – obrigada pela paciência em ler e reler meus textos. Serei sempre grata.

À amiga Vania Bernardo – pela amizade e apoio, sempre pronta a interlocuções.

À amiga Kathia Maria Miranda – Obrigada pela prontidão para ler meu texto. Seu apoio foi de fundamental importância para revigorar meus ânimos.

Aos alunos das licenciaturas do Instituto Federal Fluminense – foram as inquietações dos nossos encontros que me levaram a esses estudos.

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RESUMO

Este estudo teve como objetivo analisar o papel mobilizador do estágio enquanto tempo/espaço que dimensiona compreensões da docência, percebendo assim sua influência nos percursos escolares dos graduandos e sua relação com a escolha da profissão. A abordagem metodológica escolhida ancorou-se na perspectiva qualitativa, assumindo como referencial teórico o conceito de mobilização desenvolvido por Bernard Charlot, apropriando-se também de contribuições freirianas. Nesses termos, trata-se de um estudo de caso desenvolvido com oito estudantes e egressos do Instituto Federal Fluminense campus Campos-Centro, na cidade de Campos dos Goytacazes – RJ, das Licenciaturas em Química, Biologia, Matemática, Geografia e Letras. Os dados analisados foram produzidos a partir de entrevistas semi-estruturadas, todas realizadas pela pesquisadora, gravadas em áudio entre os anos de 2013 e 2015. As análises reafirmaram a contribuição do estágio na formação docente que, ao envolver o estagiário nos fazeres da vida da escola, a mobilização se institui como movimento articulador do processo. A tripla dimensão formativa, possibilitada nos encontros entre discentes, docentes da Instituição de Ensino Superior e docentes da Escola Básica guardam em si potencialidades inerentes ao desejo de aprender, responsáveis pela produção de conhecimentos na constituição do ser professor, elevando o estágio à posição de lugar de mobilização.

Palavras-chave: Estágio Supervisionado; Licenciatura; Mobilização; Dimensão relacional.

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ABSTRACT

This study has the purpose to analyze the mobilizing role of the internship as time/space that features understandings of teaching, noticing therefore its influence on the students’ bachelor pathways and their relationship with the choice of the profession. The chosen methodological approach has been based on the qualitative perspective, taking as theoretical framework the concept of mobilization developed by Bernard Charlot, as well as Freire’s contributions. In these terms, it is a case study developed with eight interns and graduates of the Fluminense Federal Institute - Campos Centro campus, in the city of Campos dos Goytacazes - RJ, from the Chemistry, Biology, Mathematics, Geography and Letters Undergraduate Program. The analyzed data was produced from semi-structured interviews, all carried out by the researcher, recorded in audio from 2013 to 2015. The analyzes reassure the contribution of the internship on the teaching formation, as it involves the interns on activities around the school environment, the mobilization is instituted as an articulating movement of the process.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ANPED- Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação CAPES- Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CEFET- Centro Federal de Educação Tecnológica

CNE- Conselho Nacional de Educação

CNPq- Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CONNEPI- Congresso Norte Nordeste de Pesquisa e Inovação

CP- Conselho Pleno

DCNs- Diretrizes Curriculares Nacionais

DIRLIC- Diretoria de Ensino Superior das Licenciaturas EJA- Educação de Jovens e Adultos

EPT- Educação Profissional e Tecnológica IES- Instituição de Ensino Superior

IFC- Instituto Federal Catarinense

IFFluminense- Instituto Federal Fluminense IF’s- Institutos Federais

IFSC- Instituto Federal de Santa Catarina IFSP- Instituto Federal de São Paulo

INEP- Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira LDBEN- Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

LEPED- Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diferença LIFE- Laboratórios Interdisciplinares de Formação de Educadores MEC- Ministério da Educação

NAPP- Núcleo de Apoio à Prática Profissional

NESAE- Núcleo de Estudos Avançados em Educação PAP- Plano de Ação Pedagógica

PET- Programa de Educação Tutorial

PIBIC- Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica PIBID- Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência

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PIBITI- Programa Institucional de Bolsas de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e inovação

PNE- Plano Nacional de Educação PPP- Prática Pedagógica Programada PRP- Programa de Residência Pedagógica

SETEC- Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica TICs- Tecnologias da Informação e Comunicação

UEA- Universidade do Estado do Amazonas

UENF- Universidade Estadual do Norte Fluminense UFS- Universidade Federal de Sergipe

ULBRA- Universidade Luterana do Brasil

UNESCO- United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization UNESP- Universidade Estadual de São Paulo

UNICAMP- Universidade Estadual de Campinas UNIFESP- Universidade Federal de São Paulo

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Sumário

INTRODUÇÃO: Dos sentidos e significados de uma trajetória escolar às origens das

indagações da pesquisa ... 12

1. Percepções de Estágio Supervisionado na Formação Inicial Docente ... 23

1.1. Caminhos formativos ancorados na ação-reflexão-ação... 27

1.2. Perspectivas de estágio supervisionado em experiências de formação de professores: o que vem sendo construído no cotidiano? ... 29

1.3. Enfoques interlocutivos nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial e Continuada ... 43

1.4. A teoria na prática é outra? ... 45

2. Precisando fatos da pesquisa realizada ... 54

2.1. A condução da investigação ... 54

2.2. O estudo de caso ... 56

2.3. O percurso da pesquisa ... 58

2.4. Traçando o perfil dos participantes ... 65

2.5. Contextualizando o estágio supervisionado no IFFluminense ... 68

3. Mobilidades de sentidos que tecem experiências de estágio: o sujeito se tornando autor ... 71

3.1. Apreender o mundo para com ele interagir ... 72

3.2. Mobilização: dimensão norteadora da atividade intelectual ... 74

3.3. Fronteiras que fragilizam a mobilização no exercício da docência ... 76

4. Antecedentes históricos: a formação de professores nos Institutos Federais ... 83

4.1. A constituição da formação de professores nos Institutos Federais: proposição oficial ... 83

4.2. Diferentes olhares sobre a formação de professores nos Institutos Federais .... 88

4.3. Breve discurso sobra a formação de professores no Instituto Federal Fluminense campus Campos-Centro: do CEFET Campos aos dias atuais ... 92

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4.4. Alguns antecedentes do estágio supervisionado nas licenciaturas do

IFFluminense ... 97

5. O processo de mobilização experimentado no tempo da inserção dos licenciandos no estágio ... 103

5.1. Retorno à escola básica: lugar intermediário entre aprender e ser professor .. 105

5.2. Trajetórias percorridas na escolha pela docência ... 109

5.3. Deslocando-se para o campo de estágio: mobilizações para novas aprendizagens ... 113

5.4. Movimentos produzidos a partir das experiências e do espaço reservado à inserção no campo de estágio ... 123

TECENDO CONSIDERAÇÕES FINAIS... 137

REFERÊNCIAS ... 143

Anexo I ... 156

Anexo II ... 157

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INTRODUÇÃO: Dos sentidos e significados de uma trajetória escolar

às origens das indagações da pesquisa

Estabelecer interlocuções entre os fatores que estruturam e dão relevância a uma pesquisa não é tarefa simples; é empreendimento que conduz a limites tênues, difíceis de serem definidos. Porém, também é um trabalho que dá significados às dimensões que ajudam a enxergar caminhos possíveis. Assim, os entrelaçamentos da trajetória do pesquisador, mesmo sujeitos aos lapsos da memória, das reminiscências, trazem em si potencial para indicar caminhos escolhidos e percorridos, considerando que os movimentos que tecem suas relações com o mundo propiciam sempre novas possibilidades (CHARLOT, 2000).

Mais do que pretender um memorial, entendo que a importância desse processo não se restringe às experiências encerradas em suas próprias molduras, mas o que cada uma representou nos momentos vividos, refletidos nas aprendizagens que se sucederam, tendo em vista o objetivo em questão. O tempo de rememoração é importante pois pode trazer abertura para outras possibilidades de aprendizagem.

Nesse sentido, busco fragmentos de minha trajetória de vida, tomando-os como experiências elucidativas de minhas ações profissionais, organizadores da pesquisa que ora apresento. Entendo com Fontana (2010) que as histórias de vida como abordagem de estudo sobre a profissão docente dão subsídios para pensarmos essa relação. Ela assim escreve:

Assumindo a tese de constituição recíproca entre o eu pessoal e o eu profissional, numerosos estudos buscaram trazer nas histórias de vida as maneiras como cada um se sente e se diz professora e como as foi construindo, entre modos distintos e conflitantes de encarar a profissão docente, nas diversas etapas da carreira (p. 48).

E prossegue: “Ao nascer, cada um de nós mergulha na vida social, na história, e vive, ao longo de sua existência, distintos papéis e lugares sociais, carregados de significados – estáveis e emergentes – que nos chegam pelo outro” (FONTANA, 2010, p.64). Nessa mesma direção, dizendo de outro modo, Charlot (2000) afirma que a condição humana nos permite dar sentido ao mundo. Assim, por este viés, sigo na elaboração deste pequeno memorial.

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Logo que concluí o magistério em nível médio, percorri outros campos de saberes (cursei Teologia entre os anos de 1979 e 1982) que envolveram a prática do ensino. Mas foi em meados dos anos de 1980 que, ao ser convidada para compor o quadro de docente de uma instituição particular de ensino, em minha cidade, que fui confirmando minha escolha profissional. Mais do que experimentar dois anos na docência da então 3ª série do antigo primeiro grau, vivi o despertar de novas exigências formativas, a partir do questionamento do meu próprio trabalho. Em meio à curiosidade daqueles alunos, suas aspirações profissionais que, em alguns casos eram manifestadas no desejo de aprender, eu ia percebendo que tinha minha parcela de responsabilidade sobre a qualidade da formação de cada um deles.

Após dois anos trabalhando com a mesma série, assumi a Coordenação Pedagógica deste mesmo segmento em 1987, a convite da direção daquela instituição; experiência que, por um lado abriu caminho para outras relações profissionais, mas, por outro, confirmou em mim a necessidade de buscar novos espaços formativos. Foi então que prestei vestibular para o curso de Pedagogia no ano de 1988 e, concomitante à experiência na Coordenação, ia buscando diálogos entre os discursos teóricos sobre o ensino, o compartilhamento de experiências com colegas de classe e a vivência no cotidiano da escola.

Discussões mais amplas eram trazidas para as aulas de Psicologia, marcadas pela recorrência de autores como Piaget, Vygotsky, já que neste período estavam sendo implantados, em minha cidade, Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs), e a discussão no momento centrava-se na construção do conhecimento a partir do intenso processo de interação entre os educandos. Entretanto, influenciada por uma professora recém-chegada na instituição, que havia acabado de concluir o Mestrado e voltado para o curso de Pedagogia, aproximei-me mais intensamente das ideias freirianas. A ênfase dada à libertação dos homens, pelo viés da humanização das relações através das aulas, foi fator que me fez refletir mais profundamente sobre meu papel social, enquanto educadora. Da experiência com essa professora, entendi, na prática, que a educação dialógica é o caminho para a liberdade; que, “de nada adianta o discurso competente se a ação pedagógica é impermeável a mudanças” (FREIRE, 1999, p.11), e que o processo de conscientização traz em si potencialidades libertadoras.

A intensidade desse tempo marcou meu pensar e agir como educadora, movendo-me na elaboração de um projeto de Educação de Jovens e Adultos (EJA).

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Foi assim que, com a perspectiva de oferecer oportunidade de escolarização a um grupo de adultos composto por pessoas com pouca escolaridade, uma assistente social e eu nos unimos e, juntas, demos início ao “Projeto Gamaliel”1. Para garantir

melhor desempenho na aprendizagem dos alunos, frequentemente nos reuníamos com a professora para avaliarmos e planejarmos, com o intuito de melhorar a qualidade daquele trabalho.

Dessa vivência surgiu minha pesquisa de Mestrado. Orientada pela Profª. Dra. Lilian Maria Paes de Carvalho Ramos, defendi, em 2001, a dissertação intitulada

O processo de escolarização de adultos: para além das aparências e dos estereótipos.

Minha atuação nesta modalidade de ensino aproximou-me de caminhos aparentemente distintos, porém, interligados à esfera do ensino.

Embora nesse tempo eu tenha voltado o foco de minhas discussões para a EJA, minha relação com a formação de professores permaneceu definindo minha trajetória profissional. Prossegui atuando em contextos de curso de licenciatura, como apresentarei mais adiante.

A convite de minha Orientadora de Mestrado, passei a integrar o grupo de pesquisa do CNPq, Políticas de formação, trabalho e identidade docente, liderado por ela, que em 2005 integrou o grupo de docentes da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), instituição sediada em minha cidade.

No curto período que passou nesta instituição, desenvolvemos pesquisa sobre A identidade do professor estadual do Ensino Médio no Norte Fluminense, experiência que muito me enriqueceu, tendo em vista as possibilidades de encontros presenciais que tínhamos e as oportunidades de diálogo sobre formação docente.

Retomando o viés de quando cursava a graduação em Pedagogia, recordo-me ter aguardado com expectativa o tempo do estágio. A partir das interações das aulas no curso, não foi difícil pensar na possibilidade de receber uma proposta de

1 No final da década de 1990, comecei a atentar-me para o fato de que alguns dos participantes mais idosos do meu convívio religioso não liam com fluência. Como Freire (2005) ensinou-me que “a vida proibida de ser vida é morte em vida”, comecei buscando estratégias para ajudar essas pessoas na leitura e escrita. Em parceria com uma assistente social, integrante deste grupo, elaboramos um projeto intitulado “Projeto Gamaliel”. A escolha desse nome está relacionada ao personagem bíblico, reconhecido pelo Apóstolo Paulo como seu professor.

A estrutura montada para este empreendimento (espaço físico, material, professores etc.) comportava um número maior de alunos. Então resolvemos abrir também para a comunidade externa. Conseguimos agrupar cerca de dez adultos e, num período de quatro anos, oferecemos gratuitamente classe de alfabetização para esse grupo de adultos, todos com mais de cinquenta anos. Tal trabalho converteu-se em uma fonte de dados sem precedentes para a minha pesquisa de Mestrado.

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estágio que rompesse com a que recebi na formação de professores em nível médio. Contudo, o dia a dia mostrou-me que a mediação entre o discurso teórico desenvolvido em aula e a vivência com os sujeitos da escola básica era uma prática ainda a ser construída, o que me levava a outra percepção: a escolha pelo magistério impõe desafios.

Foi uma época em que me deparei com leituras de autores consagrados na educação, como Bourdieu e Passeron (1975); Freire (1979, 1987); Candau (1984); Vygotsky, Luria e Leontiev (1988); Saviani (1986); Emília Ferreiro (1985), contribuições teóricas que subsidiavam discussões das aulas. As exigências de profissionalização da época traziam marcas fortes do tecnicismo, e a perspectiva da Prática de Ensino e Estágio Supervisionado eram considerados componentes excessivamente práticos, como, por exemplo, pouco diálogo entre o que se estudava nas disciplinas do Curso e as experiências vividas no campo de estágio.

Já cursando os últimos períodos da Pedagogia, assumi uma turma de formação de professores em nível médio, no meio do ano, em caráter de substituição, numa instituição de esfera particular, atuando na disciplina de Didática. Minhas expectativas com as vivências de estágios guardavam relação com a necessidade de diálogo teórico-prático para conhecer mais de perto outras realidades escolares. Nesse movimento entre o saber e o saber fazer, surgiam indagações sobre o significado da relação ensinar-aprender, ou melhor, como ensinar a ser professor? Assim sendo, eu atribuía a esse tempo da formação possibilidades de compreensão da realidade na qual eu já atuava. Eram questões que me acompanhavam tanto no desenvolvimento das aulas, quanto nos enfoques assumidos durante o curso.

Com a graduação concluída em 1991, surgiu a oportunidade, logo no ano seguinte, de ingressar numa Especialização em Metodologia do Ensino Superior, em uma instituição particular, que estava oferecendo formação pedagógica aos seus professores, que em sua maioria eram bacharéis. A diversidade dessa experiência foi bastante enriquecedora, visto que a turma era composta de profissionais de áreas distintas, como, por exemplo, pedagogos, engenheiros, psicólogos, contadores, dentre outros profissionais que, juntos, discutíamos questões pertinentes ao ensino.

Foi no ano de 1997 que ingressei na docência do ensino superior. Ministrando a disciplina de Didática Geral em Licenciaturas de Educação Física e Enfermagem, pude vivenciar na pele a tradicional dicotomia entre a formação geral e a formação específica, que marca entre esses sujeitos a desvalorização pelos saberes

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denominados de pedagógicos. Questionava-me, então, também sobre as razões que levavam aqueles alunos a buscarem a docência. Era uma conversa que eu travava diante do espelho, já que nas entrelinhas das falas dos coordenadores dos cursos escapavam ideias que corroboravam o comportamento dos estudantes: a alocação dos horários destinados às disciplinas de cunho pedagógico em dias de sexta-feira, à noite, a supervalorização dos componentes específicos da área de formação eram questões recorrentes nos períodos letivos.

Tal realidade me fez retomar o caminho das leituras de Paulo Freire, com destaque para Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa, considerando as reflexões sobre as exigências para ensinar, fundadas no entendimento de que “Ensinar não é transferir conhecimentos mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção” (FREIRE, 1999, p. 25). Estar iniciando neste nível de escolaridade foi um fator que me desafiou naquela experiência. As inseguranças próprias do início de qualquer trabalho puderam ser amenizadas, graças à abertura de compartilhamento que desenvolvi com a professora de Didática específica da Educação Física e Estágio Supervisionado, também da instituição. Sempre que nos encontrávamos, tinha liberdade para compartilhar questões relativas à disciplina que eu lecionava, conversávamos sobre as aproximações dos nossos componentes curriculares, buscando interação entre nossas práticas. Esse companheirismo profissional foi bastante significativo para minha identidade docente.

Não muito tempo depois, mais precisamente no ano de 2003, surgiu a oportunidade para atuar na Graduação de Pedagogia em uma outra instituição, também particular. A coordenadora deste curso havia sido minha professora quando cursei a Pedagogia, a que me aproximou do pensamento freiriano. O fato de ser um curso da minha área de formação e estar sob a liderança de uma profissional com quem eu mantinha laços de amizade, foi fator significativo para eu assumir inicialmente a disciplina de Didática.

No período seguinte, fui desafiada pela coordenação a trabalhar com Prática de Ensino e Estágio Supervisionado, numa turma de 5º período do referido curso. Trabalhando com este componente pela primeira vez, algumas situações potencializavam fragilidade a esta experiência: o curso era noturno, a turma era numerosa, o tempo de supervisão ficava circunscrito ao horário das aulas, boa parte das alunas apresentavam comprovação de extensa jornada de trabalho, dentre outras

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questões que, mesmo sendo de menor importância, acabavam por influenciar o contexto. Passei a reviver antigas indagações sobre o estágio como processo de formação, a ressignificá-las, mas meu desconforto levou-me a não prosseguir com a disciplina, apesar do empenho de algumas estagiárias.

Esses desafios foram desenvolvendo em mim certo fascínio por este tempo de aprendizagem na formação. Viver as relações de ensino na formação inicial, na perspectiva da interação entre a instituição de ensino superior e o cotidiano da escola como ponto mediador do processo formativo, foi produzindo necessidade de encontrar nessa experiência pontos de interlocuções com outros aspectos da prática educativa. Mas foi no ano de 2007, após ter sido aprovada em concurso público para atuar no núcleo pedagógico dos cursos de licenciatura do atual Instituto Federal Fluminense (doravante IFFluminense), à época, Centro Federal de Educação Tecnológica, que minha aproximação com o tempo do estágio se consolidou. A oportunidade que tive de escolher dedicação exclusiva, como regime de trabalho nesta nova atuação profissional, garantiu-me condições para retornar às práticas de pesquisa. Também, a política de incentivo à formação continuada adotada pela instituição foi outro fator que me possibilitou buscar novas experiências formativas.

Na condição de professora das licenciaturas, reencontrei-me com o estágio supervisionado e, busquei encontrar questões que contribuíssem com essa nova experiência. Nessa época, foram as leituras de Pimenta (2001), e na sequência Pimenta e Lima (2008) que permeavam nossas discussões e planejamentos. Só mais tarde descobri que a reflexividade tinha se tornado uma proposição hegemônica nos projetos de estágio.

Como ingressei no final de um período letivo, assumi turmas somente no semestre seguinte à minha admissão. Por esse motivo, fui orientada pela Coordenadora das Licenciaturas a acompanhar uma das professoras supervisoras de estágio na Instituição. Essa oportunidade de coparticipação significou para mim um tempo de “estágio” na disciplina de estágio. O apoio que recebi dessa colega de trabalho muito contribuiu neste meu processo de inserção. Juntas planejávamos e ministrávamos aulas, compartilhávamos experiências, orientávamos os estagiários, transformando essa vivência num tempo rico de aprendizagens. Como estávamos mantendo estreita parceria, coube-me ajudá-la na correção dos relatórios, o que também me permitiu maior familiarização com a proposta do IFFluminense.

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Meio que na contramão dos referenciais prescritos nas ementas, com formatos diferentes, o velho e desgastado discurso de que “a teoria na prática é outra” repercutia nos relatos dos estagiários. Um fato que marcou minhas primeiras experiências com essa disciplina, na referida instituição, foi a fala de um aluno que, no momento em que sua classe compartilhava experiências do campo, ele não poupou palavras para, com certo sentimento de repulsa, dizer: “professora, o estágio para mim não serve para nada”. A vivência foi mostrando que para um número significativo destes docentes em formação, pensar-se professor trazia desconforto. Com o passar do tempo, fui percebendo também que o distanciamento entre disciplinas ditas “pedagógicas” e as da área de formação específica era fator influente no posicionamento de muitos deles acerca da profissão, confirmando resquícios da cultura bacharelesca2.

Pelo fato de estar num contexto institucional em que a educação profissional e tecnológica tem peso histórico, foi fácil perceber que a trajetória escolar de muitos licenciandos se apoiava nessa base. Segundo seus comentários feitos em aula, na experiência de alguns deles, cursar o técnico em nível médio e prosseguir na Licenciatura dentro da mesma instituição obteriam como garantia a continuidade dos estudos em instituição pública.

Levando em conta conversas travadas com esses alunos, era possível perceber também vestígios de pouca relação com a docência. Quando interrogados sobre a opção pela licenciatura, muitos afirmavam ser esta uma escolha que acontecia após tentativas fracassadas em outras áreas profissionais; ou por se apresentar como a possibilidade de inserção no mercado de trabalho. Essa última questão é mencionada nos estudos de Gatti e Barreto (2009).

Um relato atípico se destacou em uma turma do primeiro período do curso de Ciências da Natureza. Uma aluna contou-me que tinha recorrido a essa licenciatura como “pré-vestibular”. Compartilhou que, após tentativas fracassadas no vestibular para medicina, recorreu à referida licenciatura com expectativas de prosseguir estudando química, física e biologia para que, num futuro próximo, obtivesse aprovação no curso pretendido. Em seu dizer foi firme em declarar que não aspirava à docência.

2 O Decreto 1.190, de 04 de abril de 1939, ofereceu condições estruturantes à profissão, dando origem ao modelo 3+1, esquema adotado nos cursos de Licenciatura por décadas. (SAVIANI, 2010).

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Se por um lado era possível encontrar alunos de curso de licenciaturas com pouca inclinação para o magistério, o contrário também era verdadeiro. Em meio a impasses na escolha da profissão, destacavam-se também aqueles que de maneira convicta manifestavam confiança em suas opções pela docência. Uma aluna, da Licenciatura em Geografia, contou-me que, por influência de sua irmã, ingressou no curso de Contabilidade, mas sua inclinação para o Magistério a trouxe para a licenciatura. E disse: “Eu quero mesmo é ser professora”.

Em meio a reações controversas, diferentes procedimentos e relações à efetivação do estágio eram apontadas pelos sujeitos estagiários como burocráticos, tarefa que ia se constituindo em elemento de fragilização, capaz de gerar desestímulos e desinteresse pela escolha profissional. Essa questão era agravada pela visão superficial e, por vezes, distorcida sobre o papel do estagiário na escola-campo, o que contribuía para que muitos desses sujeitos assumissem posturas conflitantes na realidade da escola, levando-os a repensarem suas escolhas pela docência. Nesse sentido, para mim, velhos problemas do estágio iam se reconfigurando.

Entre impasses e alternativas, percebia que, mesmo para aqueles estagiários que não conseguiam enxergar nessa experiência possibilidades de aprendizagem, no momento em que traziam para a discussão situações de desgastes gerados nestas relações, acabavam fomentando reflexões sobre o cotidiano da profissão, o que me levava a (re)pensar as potencialidades formativas deste tempo/espaço.

Em 2009, na relação direta com sua supervisão, tomei o estágio como objeto de estudo, entendendo que meu envolvimento com a investigação traria novos elementos para pensar minha prática. Foi assim que, ancorada nos estudos de Pimenta e Lima (2008), concebendo o estágio como locus de pesquisa, apresentei um Projeto de Pesquisa e Pós-Graduação do IFFluminense, no Núcleo de Estudos Avançados em Educação (NESAE), intitulado: O impacto do estágio na construção dos docentes em formação. O que se destacou como recorrente nessa pesquisa foi o entendimento de que as experiências de estágio exercem grande influência na constituição da identidade docente.

Na singularidade dessa minha trajetória profissional, percebo que a tarefa de formar professores se organiza em contextos relacionais, num trabalho de colaboração em que a disposição para o diálogo permanente orienta situações

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propiciadoras de aprendizagem. Na possibilidade de dedicar-me, exclusivamente, ao componente estágio supervisionado na instituição onde atuo como docente, interessei-me pelo emaranhado processo de tensões e contradições que envolve o aprendizado da profissão. Nesse processo de inquietações, segui a orientação sábia do poeta espanhol Antonio Machado: “Caminhante, não há caminho, o caminho se faz ao caminhar”. Dessa necessidade emergiu o movimento que me levou a outro nível de pesquisa, agora no Doutorado.

As leituras feitas de Guedes-Pinto e Fontana (2006) sobre seus direcionamentos na prática de ensino no contexto da formação inicial de professores, de Charlot (2000, 2002) sobre as problematizações acerca das relações dos sujeitos com o saber e sobre o papel do pesquisador, trouxeram-me indagações que acabaram por despertar meu interesse para entender o papel do estágio na formação docente.

Como dito antes, na relação com estes sujeitos, alguns manifestavam indisposição para iniciar tal atividade acadêmico-formativo, mas no decorrer de suas ações no contexto da disciplina de supervisão, movimentos aconteciam, podendo então, identificar-se com a profissão. Outros, com expectativas, aguardavam o tempo em que estariam no convívio profissional mais diretamente.

Nessa dinâmica vivida, algumas indagações se formulavam:

Como esses sujeitos mobilizam-se para se inserirem no campo do estágio? Quais encadeamentos tais mobilizações suscitam nas potencialidades que este campo oferece à formação do professor?

Tomando, portanto, essas questões como base e, por meio de entrevistas realizadas, inicialmente com um grupo de quatro estudantes, foi possível produzir dados que até o exame de qualificação mostraram-se suficientes. No entanto, as orientações da banca examinadora me fizeram perceber que uma quantidade maior de sujeitos a serem entrevistados contribuiria para ampliar minha visão sobre as indagações acima referidas. Diante de tal desafio, decidi entrevistar mais quatro estudantes. Desta vez, todos com experiências vivenciadas no campo de estágio.

Esses movimentos foram articulados em função dos objetivos desta pesquisa que são:

 analisar o papel mobilizador do estágio sobre o ser professor;

 problematizar o estágio como tempo/espaço que dimensiona compreensões da docência;

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 compreender influências dos percursos escolares relatados pelos estudantes e sua relação com a escolha pela profissão docente.

Tais objetivos foram problematizados a partir de um estudo de caso (ANDRÉ, 2008; ALVES-MAZOTTI, 2006; ESTEBAN, 2010; LÜDKE e ANDRÉ, 1986, YIN, 2001), que focaliza o papel do estágio supervisionado em cursos de licenciatura do IFFluminense – campus Campos-Centro, nos cursos de Ciências da Natureza: Ciências e Biologia, Ciências e Química; Matemática; Geografia e Letras), que reuniu 08 participantes, sendo: 02 egressos, 05 em situação de estágio e 01 licenciando ainda na primeira metade do curso.

Charlot (2000) define o conceito de mobilização na dinâmica de ensino. Ele conceitua mobilização para além da noção de movimento, dinâmica necessária para desenvolver uma atividade. Para este autor, mobilizar corresponde a pôr recursos em movimento e engajar-se em uma atividade movida por um desejo. Mais adiante tal conceito será retomado com mais vagar.

No que se refere à estrutura deste texto, está organizada em cinco partes. A primeira delas destaco estudos que tratam do estágio supervisionado como processo de formação profissional, preocupados com a superação dos desafios postos a essa prática. Para tal tarefa, tomei, como leitura de revisão, produções que dão proeminência à perspectiva de estágio como locus de pesquisa e, em contraponto a esse entendimento, tomo, também, estudos de experiências que compreendem essa atividade acadêmico-formativa pelo caminho da produção de sentidos produzidos nas relações que marcam tais vivências. Também procuro problematizar a relação teoria-prática que tanto se faz presente nesse período formativo.

Ancorada na abordagem qualitativa, no viés do estudo de caso, a segunda parte descreve então a instituição pesquisada, o IFFluminense Campus Campos- Centro, destacando aspectos da implantação de seus cursos de Licenciaturas, iniciativa que vem trazendo contribuição efetiva na formação de docentes para a cidade de Campos dos Goytacazes (RJ) e entorno. Tais procedimentos deram base ao desenvolvimento da pesquisa em questão, indicando os caminhos da produção dos dados na escuta dos enunciados do grupo de sujeitos de entrevistados.

Para elaborar a terceira parte, fundamento-me nas contribuições de Bernard Charlot. Detenho-me na compreensão de mobilização, conceito utilizado pelo seu grupo de pesquisa para estudar a relação com o saber e a escola: mobilização, atividade, sentido. Essa abordagem teórica orienta os procedimentos analíticos na

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direção de que, nas relações de estágio, só há mobilização, se a situação fizer sentido para o estagiário.

Para organizar a quarta parte, busco publicações sobre experiências de formação inicial de professores vividas em alguns Institutos Federais, como caminho de aproximação com a constituição do estágio nos cursos de Licenciaturas da instituição em que tal pesquisa se desenvolveu.

No que diz respeito à quinta parte, apresento o processo de análises e interpretações dos dados produzidos, processo que levou em consideração movimentos de constituição do estágio para os entrevistados, e as (des)mobilizações que resultaram nos sentidos no qual a docência foi assumindo para cada um deles.

Como etapa final, teço algumas considerações sobre questões que orientaram o caminho deste trabalho.

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1.

Percepções de Estágio Supervisionado na Formação Inicial

Docente

[...] é por meio da inserção dos estudantes nas relações sociais estabelecidas entre os sujeitos que fazem parte da escola que serão alicerçadas condições de se construir compreensões sobre o trabalho docente, sobre o que vem a ser professor (GUEDES- PINTO, 2012, p. 139).

Com enfoques variados, o estágio supervisionado na formação de professores destaca-se pelo seu papel formativo no eixo teórico-prático assumido pelos cursos de licenciatura e por ser responsável pela inserção do licenciando na escola básica, seu futuro campo de trabalho. Embora vários estudos recentes apontem algumas fragilidades que permeiam o processo da relação entre estagiários, escolas e prescrições legais etc, essa etapa formativa é reconhecida como premente necessidade da profissão docente.

Uma questão que ainda se destaca como desafiadora atualmente é o número pouco representativo de pesquisas que abordam o assunto, se comparado a outras temáticas voltadas à esfera da docência, é o que sugere as pesquisas de Calderano (2014). Ao buscar identificar e problematizar concepções e práticas relacionadas ao estágio curricular – frente a sua importância no currículo –, a pesquisadora constatou que o tema não se configura entre os mais destacados no assunto. Tal certificação ancorou-se num levantamento de teses e dissertações sobre o assunto acessado no portal da Capes, de artigos disponibilizados no banco de dados da Scielo e Educ@, todos com recorte temporal entre os anos de 1998 e 2012

.

O levantamento das teses de doutorado e das dissertações de mestrado se deu com base nos descritores “formação docente” e “trabalho docente”. Utilizamos como filtro “estágio curricular” e “estágio docente”. O levantamento dos artigos se deu a partir da combinação dos seguintes descritores “estágio curricular”, “estágio e formação docente” e “estágio e formação de professores.

[...] encontramos um conjunto de 330 teses defendidas entre 1998 e 2012. Dentre elas, localizamos 25 sobre estágio curricular, das quais apenas 16 tratam do estágio curricular docente – representando 4,8% do total. [...], nenhuma tese sobre estágio curricular docente foi localizada entre os anos de 1998 e 2003, embora tenham sido encontradas 56 teses, nesse período, dentro dos descritores

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destacados.

[...] encontramos 1.362 dissertações e, ao aplicar o filtro estágio curricular, resultaram 51 trabalhos. Refinando a busca, localizamos um montante de 25 dissertações que tratam de estágio curricular docente, representando apenas 1,8% do total de dissertações defendidas na área da formação e trabalho docente. [...] Não encontramos nenhuma dissertação sobre estágio curricular docente defendida no ano de 1998 [...].

[...] levantamos no site da Scielo 71 trabalhos que tratam do estágio curricular – ora relacionados à formação docente, ora a outras áreas profissionais. A partir dos mesmos descritores, fizemos a busca na Educ@ e localizamos 23 artigos que versam sobre a mesma temática (CALDERANO, 2014, p. 51, 52, 54 e 56).

A pesquisadora entende que no processo de formação e trabalho docente, o estágio é um ambiente agregador e potencializador dos percursos formativos, campo de conhecimento e de iniciação à profissão docente.

Referindo-se à escassez de investigação que impactam de alguma maneira a formação dos professores, Guedes-Pinto e Fontana (2006) reforçam a questão ao citar dados de pesquisas de Brzezinski e Garrido (2001). Ressaltam que entre os anos 1992 e 1998, no Grupo de Trabalho “Formação de Professores” da ANPED (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação), a problematização do processo de ensino vivido pelos formadores dos futuros professores esteve ausente.

No que diz respeito ao processo sócio-histórico relacionado à formação docente e estágio supervisionado, Valsechi (2016), em sua tese de doutorado, ao problematizar os modos de inserção de estagiários nas práticas acadêmicas, oferece uma leitura esclarecedora sobre avanços e recuos que configuram esse tempo formativo, apontando marcos da história que vêm promovendo o barateamento desta formação, instigado pela política econômica, especialmente pelo Banco Mundial. Destaca a necessidade de se discutir pontos controversos que garantam a concretização dessas conquistas.

Na contramão de normativas que regem a formação dos profissionais do magistério fundamentadas em tais perspectivas, direta ou indiretamente, a pesquisadora ressalta iniciativas governamentais que sinalizam para a valorização da formação docente. Dentre os exemplos citados por ela, destaca-se o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID).

Com relação a esse aspecto, a tese de doutorado de Camargo (2015) investigou as implicações deste Programa na formação inicial de professores. Seu

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interesse pela temática deu-se a partir do contato com essa proposta na qualidade de professora da disciplina de Estágio Supervisionado na instituição em que trabalhava. Nesta experiência, observava que as práticas escolares reduzidas ao tempo de estágio traziam fragilidades ao percurso formativo. Percebia que seus alunos licenciandos bolsistas do PIBID3 mostravam-se motivados pelo trabalho nas escolas

e mais, que o Programa favorecia o estreitamento entre eles, as instituições formadoras e a escola.

A pesquisadora apoiou-se nos pressupostos da História Oral para compor a metodologia de sua pesquisa, recorrendo assim a entrevistas para gerar os dados. As análises mostraram que o envolvimento dos estudantes no PIBID possibilitou maior proximidade com o trabalho docente e que, a participação dos integrantes do Programa deu suporte para a efetivação de imersão no universo da escola. Contudo, Camargo (2015) questiona se as atividades propostas para o PIBID não configuram atribuições próprias do estágio supervisionado.

Ainda sobre esta questão, Valsechi (2016) toca num ponto importante para a realidade de grande parte dos alunos da licenciatura4: “[...] reconheço que o PIBID,

em virtude do apoio político-econômico que oferece, muitas vezes concorre com o estágio supervisionado pelo lugar legitimado na formação inicial docente” (p. 36).

Diante da proximidade desses campos formativos, com impactos tão distintos na formação daqueles que de maneira concomitante vivem as duas experiências, indago-me sobre as mobilizações que conduzem o querer desses estudantes para desenvolverem e se envolverem nas atividades tanto do estágio quanto do PIBID, a investirem nelas, a estabelecerem relações, enfim, quais móbiles dão origem a estas atividades?

Valsechi (2016) também esclarece que, em grande medida, as concepções que definem a experiência de estágio foram se estruturando em meio a compreensões de formação de professor, assumida em posições antagônicas por militantes que entendem a prática como estruturante da formação ou, então, por aqueles que

3 O PIBID é um Programa federal junto às universidades brasileiras que visa à valorização do magistério e melhoria da formação de professores da educação básica. Para alcançar seus objetivos, “oferece bolsas para que alunos de licenciatura exerçam atividades pedagógicas em escolas públicas de educação básica, contribuindo para integração entre teoria e prática, para aproximação entre universidades e escola e para a melhoria de qualidade da educação brasileira” (BRASIL, 2013b, p. 27). 4 Gatti (2009, p.164) apresenta dados estatísticos comprovando que os atuais estudantes de cursos de Licenciaturas formam um grupo majoritário (50,4%) com concentração de renda familiar média, cujo intervalo é de três a dez salários mínimos.

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supervalorizam o papel da teoria: seja pelas lentes da imitação de modelos, da instrumentalização técnica, ou da pesquisa como instrumentalizadora da práxis docente (PIMENTA e LIMA, 2008).

As pesquisas que também tratam dessa temática revelam que há grande influência da abordagem “professor reflexivo”, enquanto movimento teórico presente no contexto educacional brasileiro desde o início da década de 1980, no que diz respeito aos estudos sobre estágio supervisionado na docência. Ou seja, esse referencial teórico se destaca como dimensão epistemológica hegemônica neste assunto (CRISTOFOLETI, 2015)

Pimenta e Lima (2008), em seus estudos, reconhecem que a possibilidade de superar a pretensa dicotomia entre atividade teórica e atividade prática como desenvolvimento de habilidades para conhecer o contexto escolar, pode ser assegurado na perspectiva do professor como intelectual crítico e reflexivo. Nessa direção, elas redefinem o estágio como processo de interação que propicia ao aluno aproximação da realidade na qual atuará.

Nesse contexto, destaco as produções de Guedes-Pinto e Fontana (2006), pesquisadoras da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), que vêm atuando nas disciplinas de Prática de Ensino e Estágio Supervisionado, desde meado da década de 1990, ocupadas em compreender questões relativas aos processos de apropriação e de elaboração das práticas docentes na formação inicial (GUEDES-PINTO e FONTANA, 2006; GUEDES-(GUEDES-PINTO, 2011a), estudos que serão retomados mais à frente.

Com base em relatos de experiências publicados nas últimas décadas, é importante reafirmar que o foco em direção ao aprimoramento da formação dos professores, no componente estágio supervisionado, tem se valorizado cada vez mais como movimento recente. A visão reprodutora de aprendizagem da profissão legitimada pela cultura de uma formação técnica vem cedendo lugar a uma percepção de atuação docente, enquanto profissional com capacidade de análise e atuação crítica. Nesse sentido, embora sejam muitos os desafios enfrentados pelos atores envolvidos nas experiências vivenciadas, as narrativas colhidas por muitos estudos potencializam significações e ressignificações acerca dessa importante etapa formativa.

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1.1. Caminhos formativos ancorados na ação-reflexão-ação

Ao tomar como ponto de referência em seus estudos as ideias de Dewey, Donald Schön parte da valorização do fazer e a reflexão sobre esse mesmo fazer, isto é, “reflexão na ação”, para propor um modelo de formação baseado na reflexão sobre a prática. Tal proposta provoca modificação nas estruturas de currículos que obedecem à ordem de primeiro tomar a ciência, depois sua aplicação e por último um estágio que supõe a aplicação dos conhecimentos técnicos profissionais adquiridos sobre o conhecimento em questão (ALARCÃO, 1996; PIMENTA, 2002). Nesse sentido, o modelo tradicional de estágio na escola básica, baseado na sequência de o estudante primeiro observar, depois participar e, por último, realizar regência, dá lugar à pesquisa no estágio como método de formação do futuro professor, em um processo contínuo de ação-reflexão-ação.

Para os expoentes dessa última abordagem, a formação estruturada num currículo segmentado não oferece elementos mediadores às situações que surgem no dia a dia, visto que a dinâmica que tece o cotidiano da escola básica está para além da simples aplicação dos conhecimentos científicos já difundidos e de respostas técnicas estruturadas. À vista disso, um currículo normativo já não responde mais aos desafios de formar professores na contemporaneidade, dados os contextos vividos no cotidiano das várias instituições envolvidas, universidade e escola.

Alarcão (1996), autora bastante citada por pesquisadores brasileiros para problematizar a formação de professores, faz alerta sobre prejuízos provenientes da fragmentação de um currículo segmentado, por não possibilitar o diálogo entre elementos da formação e reflexão sobre práticas transformadoras.

Nas instituições de formação, os futuros profissionais são normalmente ensinados a tomar decisões que visam a aplicação dos conhecimentos científicos numa perspectiva de valorização da ciência aplicada como se esta constituísse a resposta para todos os problemas da vida real. Porém, mais tarde, na vida prática, encontram-se perante situações que, para eles, constituem verdadeiras novidades (p.15).

Com base nessa compreensão, a perspectiva da reflexividade, enquanto movimento teórico fundamentador de novas vivências de estágio, tem intenção de superar antigas posições formativas, em que o ensino e a realidade são tomados de formas fracionadas, razão pela qual a valorização da experiência e a reflexão na

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experiência iluminam a realização do estágio em forma de pesquisa (PIMENTA e LIMA, 2008).

Retomando o raciocínio de Schön, a autora propõe uma formação baseada numa epistemologia da prática, ou seja, o conhecimento na ação (tácito), a reflexão na ação (refletir no processo da ação), a reflexão sobre a ação (reconstruir mentalmente a ação para tentar analisá-la retrospectivamente) e a reflexão sobre a reflexão na ação (progredir no desenvolvimento e construir sua forma pessoal de conhecer) que se constituem valores epistêmicos no processo de formação docente (ALARCÃO, 1996, p. 18, 19).

Como exposto antes, a pesquisadora alerta que, em contextos formativos com base na experiência, as múltiplas possibilidades de diálogo assumem grande importância: diálogo consigo próprio, diálogo com os outros incluindo os que referenciaram nossos conhecimentos e o diálogo com a própria situação. Ela reforça o sentido da reflexão e diz que essa prática “precisa ser sistemática nas suas interrogações e estruturante dos saberes dela resultantes” (ibid., p.46). Para Pimenta (2002), as ideias de Schön abrem horizontes para a valorização da pesquisa na formação docente, prática que possibilita a estes profissionais em formação reconstruírem situações a partir de suas necessidades.

A operacionalização dessa proposta, de se tomar o professor reflexivo e pesquisador, na atualidade, é desafio posto aos currículos de formação docente. Mas, quando se leva em consideração que levantar dados na escola, estabelecer relação com profissionais em exercício, refletir, analisar, conceituar, articular teorias com situações do cotidiano, como movimentos próprios do estágio e da docência, a possibilidade de concretização dessa proposta torna-se viável. É o que defende boa parte de pesquisadores que se debruça sobre a temática (PIMENTA e LIMA, 2008; ALMEIDA e PIMENTA, 2014).

Ancorando-se em publicações sobre estágio na formação inicial docente no país, reafirma-se que a perspectiva teórica do professor reflexivo e pesquisador vem exercendo forte influência em projetos, pondo em movimento propostas de estágio com perfis variados, apoiados num mesmo alicerce teórico (GOMES, 2011; ALMEIDA e PIMENTA, 2014).

Diante da natureza deste estudo, que considera os movimentos que envolvem esse tempo formativo como estruturantes dos sentidos que a docência vai assumindo nas vivências dos licenciandos, considerei ser necessário conhecer

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configurações de estágios no olhar de estudiosos e pesquisadores que vivenciam tais experiências.

A seguir, pretendo desenvolver uma retomada da produção desses estudos.

1.2. Perspectivas de estágio supervisionado em experiências de formação de professores: o que vem sendo construído no cotidiano?

Focalizadas nos sentidos que os estagiários atribuem ao ser e o saber- fazer docente, Guedes-Pinto e Fontana (2006), Guedes-Pinto (2011a, 2011b) e Fontana (2013) problematizam aspectos do processo de apropriação e elaboração das práticas docentes na formação inicial, numa articulação entre o trabalho por elas desenvolvido em aula na graduação e os debates teóricos sobre a temática, enquanto objeto de análise do Grupo de Pesquisa a que pertencem. Por esse ângulo, buscam elementos no cotidiano escolar que oferecem pistas esclarecedoras do processo de apropriação e reinvenção de suas práticas, com foco na formação de seus alunos.

Abrigadas na abordagem histórico-cultural, estas pesquisadoras dão centralidade à linguagem nas relações intersubjetivas de compreensão do trabalho docente. Dessa forma, problematizam a dinâmica discursiva dos docentes em formação, a partir dos registros de suas experiências de estágio, tomando-as como indícios de apropriação desta profissionalidade. Entendem que, ao serem inseridos no contexto da escola básica, os estudantes/estagiários desenvolverão relações com os sujeitos que dela fazem parte, construindo sentidos sobre os fazeres dos professores que ali atuam, criando possibilidades de produção de novos de saberes (GUEDES-PINTO e FONTANA, 2006; GUEDES-PINTO, 2012); distanciando-se assim de propostas de formação construídas sob o enfoque técnico-academicista, no qual o estagiário é orientado a olhar o cotidiano da escola à luz dos aportes teóricos alavancados na instituição formadora de origem.

Nesse entendimento, o objetivo fundamental do estágio, enquanto atividade formativa, é promover um alargamento da compreensão da cultura escolar, pondo em articulação concepções que caracterizam a existência da escola, presentes no processo de formação profissional (FONTANA, 2013).

Uma das problematizações trazidas por essas pesquisadoras diz respeito à relação do estagiário com a escola quanto à (in)definição do seu lugar social na

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instituição e nas relações de ensino. Ancoradas nas ideias de Augé (1994), afirmam que o lugar desses sujeitos dentro da escola pode ser definido como um “não lugar”, visto que nesta sua condição, seu “vínculo” com a escola-campo é de passagem (de alguém que não tem um lugar assegurado, mas de quem registra e interpreta o que vivencia ali) entremeado por relações muitas vezes superficiais, definida pelo efêmero. Por esse viés, problematizam a inserção do estagiário na escola-campo, enquanto momento relevante para sua interação na dinâmica das relações ali produzidas (GUEDES-PINTO E FONTANA, 2006; FONTANA, 2013).

Importante destacar que, dos diferentes momentos organizadores das relações do estagiário na escola-campo, o da inserção é ocasião demarcadora de fronteiras no que diz respeito à qualidade das interações ali desenvolvidas. Relações institucionais, interpessoais, intrapessoais (em seus desdobramentos) são fatores que alinhavam o desempenho dessa prática, visto que esta formação envolve pressuposições sobre o outro, sobre as razões dos seus fazeres, sobre seus saberes e as surpresas diante desse outro, na medida em que a docência envolve escolhas e julgamento que escapam às prescrições (FONTANA, 2011).

Ao defender a formação “com” os sujeitos e não “sobre” eles, as autoras destacam a importância do “olhar” enquanto possibilidade de aprendizagem, isto é, o aprender a olhar para o outro e para si mesmo, a registrar e a descrever o que conseguem captar com esse olhar, entendendo que esta relação propicia saberes sobre o cotidiano da instituição e das práticas compartilhadas entre seus sujeitos.

Guedes-Pinto (2011a) compreende a prática da escrita como elemento fundamental no trabalho da formação profissional docente.

Assim, as produções escritas dos estudantes serão problematizadas a partir de seu contexto, dentro de seus limites, entendendo-as como uma prática sócio-cultural que se realiza situada na história dos sujeitos que dela participam e na história institucional da realidade dos cursos de formação de professores (GUEDES-PINTO, 2011a, p. 23). Nesse movimento, os saberes que vão sendo produzidos nessa prática assumem posição privilegiada na formação dos futuros professores, o que exerce influência na aproximação do real.

As autoras também chamam atenção para a “escuta” dos sujeitos que fazem a escola. Afirmam que somente a prática do olhar não basta para compreender os significados das relações presentes, sem conhecer o enunciado produzido na

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experiência, uma escuta que busca encontrar indícios que definem o vivido. Elas tomam como preceito a ideia de que cada enunciado se constitui como um elo na corrente da comunicação verbal que encadeado em meio a muitas vozes, remetem à complexa trama enunciativa de que faz parte (GUEDES-PINTO E FONTANA, 2006).

Essa compreensão de estágio traz como pressuposto a postura dialogal enquanto estratégia de ação, por entender que, a partir do momento que as professoras na universidade apresentam aos alunos o plano de trabalho, abrem-se espaços para discussão e reorganização, se for o caso. Importante destacar, conforme esclarece Guedes-Pinto (2011a), que o referido plano traz as orientações para as idas ao campo de estágio, assim como para a elaboração de textos. Os planos são entendidos como documentos tomados para análises, pelo seu caráter orientador, da produção dos trabalhos na disciplina de estágio.

São nos desdobramentos das aulas que as discussões se desenvolvem, em diálogo com os referenciais teóricos assumidos. Os aportes teóricos propostos também auxiliam os estudantes no encaminhamento de suas interlocuções na escola. Destacam-se, nesse contexto, as leituras de obras literárias, documentários, sempre norteados por aspectos que focam o processo de ensino.

Nessa proposição de estágio, faz-se necessário destacar que o estagiário não se distancia dos fatos vividos pela escola para “compreendê-los”, mas observa e registra não apenas “sobre” o outro, como também narra sua experiência “com” o outro, levando em consideração suas intervenções, percepções (GUEDES-PINTO e FONTANA, 2006).

Diante dos desafios enfrentados pela realidade histórica do componente estágio curricular, concordo com essas pesquisadoras que a perspectiva da descrição é um caminho capaz de tornar compreensível os meandros da escola. Apoiada no pensamento de Charlot (2000), compreendo também que as interlocuções necessárias à descrição trazem em si potencial para pôr em ação procedimentos mobilizadores de produção de conhecimento sobre a profissão.

Seguindo essa mesma linha de percepção e interessada em compreender como as relações de supervisão de estágio enquanto espaço de orientação influenciam estagiários e formadores, Cristofoleti (2015), em sua pesquisa de doutorado, toma como locus de investigação sua própria prática. Na condição de Supervisora de Estágio numa turma de 17 alunas, utilizando os pressupostos teóricos da teoria enunciativa de Bakhtin, a pesquisadora põe, em perspectiva e

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questionamento, as interlocuções produzidas nos encontros semanais com suas alunas em um curso de Pedagogia, de um município do estado de São Paulo.

No período de maio a dezembro de 2012, gravou encontros semanais que foram analisados à luz da perspectiva analítico-interpretativa. Como resultado, a autora indica que a complexidade da supervisão de estágio está na trama das réplicas que organiza a relação de supervisão e na pluralidade de vozes sociais que a constitui. Ela entende ser esta uma relação na qual confluem muito mais do que a vivência desse tempo, considerando que o teor e o estilo dessas réplicas dependem das situações em que foram produzidas, das circunstâncias vividas entre os sujeitos envolvidos, da história de cada um, do projeto de formação no qual estão inseridos, das compreensões de docência, escola, aprendizagem etc.

Esse processo relacional, distante de uma lógica de causa e efeito, dá-se mediante fatores tanto de mobilização (de dentro), quanto de motivação (de fora). Charlot (2000) afirma que, “eu me mobilizo para alcançar um objetivo que me motiva e que sou motivado por algo que pode me mobilizar”. Nesse sentido, percebo que os argumentos e compreensões manifestados na pluralidade de vozes dos estagiários dispõem de móbiles que exprimem suas ações. (Na perspectiva charloniana, móbil é entendido como “boas razões” para agir).

Giglio et al. (2011), trazem uma descrição do Programa de Residência Pedagógica (PRP) do Curso de Pedagogia da Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade Federal de São Paulo, UNIFESP/Guarulhos, que ajuda entendê-lo em seu contexto. O programa surgiu pretendendo viabilizar um processo formativo que estabelecesse diálogo entre referenciais teóricos, realidade das escolas e as práticas educativas construídas no cotidiano dessas instituições, por meio da imersão dos residentes-estagiários no cotidiano da escola-campo, acompanhados pelo preceptor-professor da Universidade e de professores e gestores da escola-campo.

Assim, a articulação entre práticas educativas dos educadores da escola básica e preceptoria dos professores da universidade foi o princípio que deu origem ao PRP, experiência que institui nova configuração formativa da relação teoria-prática na formação inicial dos docentes em formação da referida instituição. Nos dizeres de Giglio et al. (2011, p. 17), o Programa “busca inovar a prática usual das instituições formadoras no que se refere ao estágio supervisionado”.

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O PRP tem como propósito “criar situações de aprendizagem da docência”, possibilitando ao futuro professor compreensões sobre a escola e seus condicionantes políticos, econômicos sociais e pedagógicos, reconhecendo este espaço como gerador de cultura. O Programa busca também desenvolver uma profissionalidade que possibilite ao residente reconhecer e defender o referencial político e epistemológico que conduz a sua prática (GIGLIO et al., 2011; SILVESTRE e VALENTE, 2014).

Ao respeitar os dispositivos legais e abrigar a ideia de que formar professores exige situá-los historicamente, no sentido de que eles percebam que de acordo com as exigências conjunturais de cada período a profissão vai se reconfigurando (SILVESTRE e VALENTE, 2014, p. 42), os idealizadores do Programa assumiram compromisso com uma formação de qualidade.

Nessa perspectiva, a escola pública foi tomada como principal espaço de formação do pedagogo na elaboração do PRP, considerando que o Programa foi idealizado no contexto do curso de Pedagogia. Essa tomada de decisão exigiu diálogo com professores e gestores destas escolas de Guarulhos, realizada através de pesquisas, informações que permitiram conhecer demandas da formação inicial e continuada desses profissionais. Um aspecto importante dessa sondagem inicial foi investigar a contribuição da formação inicial dos docentes pesquisados em suas práticas atuais. Chamam atenção as considerações sobre estágio, feitas pelos professores integrantes daquela pesquisa:

Comparando a avaliação que fizeram da formação inicial e da parte prática dessa formação, foi importante perceber que, apesar da “adequação” indicada pela maioria, a avaliação da formação prática –

estágios – apresentou constante tendência de queda na satisfação

(GIGLIO et al., 2011, p. 28). (Grifo nosso).

Os indicadores da pesquisa serviram de base para elaboração e implantação do PRP, ações preliminares que favoreceram a relação de confiança entre a universidade e as escolas. Para um projeto que tem como base a formação inicial e contínua de professores e gestores, essas primeiras medidas foram determinantes para tomada de consciência dos desafios postos à formação naquele contexto, diz Giglio et al. (2011).

Seguindo essa lógica, o desenvolvimento do PRP está estruturado em linhas de trabalho que têm, como proposta, possibilitar aos residentes dividirem-se em

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grupo, sendo estes, orientados por professores-preceptores. Desde o início do curso, experiências de aproximação ao processo educativo são oportunizadas. Nos quatro primeiros semestres do curso é ofertada a disciplina Prática Pedagógica Programada (PPP) – espaço interdisciplinar, que se dá na articulação entre estudos teóricos das diferentes disciplinas e práticas. Nos quatro últimos semestres, as disciplinas de Residência Pedagógica (RP) têm como propósito levar os estagiários a atuarem como colaboradores-aprendizes junto a outros profissionais. Os dois últimos semestres têm como proposta a elaboração e desenvolvimento do projeto de monografia, de modo a materializar questões advindas das experiências vivenciadas pelo residente, a merecer reflexão e aprofundamento investigativo (GIGLIO et al., 2011; SILVESTRE e VALENTE, 2014).

O desenvolvimento do Programa se dá basicamente na relação dos seguintes personagens: o residente (docente em formação), o preceptor (docente responsável pelo residente durante o estágio) e os professores-formadores (docentes da escola-campo que recebem os residentes em suas salas de aula ou gestores da escola). As ações que articulam seus fazeres são embasadas, por um lado, nas demandas das escolas-campo e, por outro, nas possibilidades de concretização da universidade (SILVESTRE e VALENTE, 2014).

Uma etapa significativa do Programa é a imersão, tarefa básica dos residentes que, num período contínuo de 80 horas, permanecem na escola. Nesse tempo, eles se aproximam das experiências de sala de aula, do contexto escolar, da organização do trabalho pedagógico do professor formador e da escola, com maior afinco. A estruturação desse período tem como organização: primeiro o residente reconhece o espaço escolar, estabelece as primeiras relações com os alunos e com o professor formador e entra em contato com o plano de ensino da turma. Em seguida, esboça seu plano de ação que deve ser desenvolvido na turma pretendida, sempre em diálogo com o professor formador. A efetivação dessa intervenção deve ter como base o perfil da classe, sempre orientado pelo professor formador e preceptor. Esse caminho orienta o residente sobre as interlocuções necessárias aos fazeres pedagógicos. E, por fim, sempre em articulação com o preceptor, o residente desenvolve seu Plano da Ação Pedagógica (PAP) (SILVESTRE e VALENTE, 2014).

Os pesquisadores anteriormente citados reconhecem ser a etapa do desenvolvimento do PAP o momento de maior expressão, visto que a realização

Referências

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