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O propósito negocial como elemento de legitimação do planejamento tributário

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Academic year: 2017

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NERYLTON THIAGO LOPES PEREIRA

O PROPÓSITO NEGOCIAL COMO ELEMENTO LEGITIMADOR DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito

Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa

Stricto Sensu

em Mestrado em Direito

O PROPÓSITO NEGOCIAL COMO ELEMENTO

DE LEGITIMAÇÃO DO PLANEJAMENTO

TRIBUTÁRIO

Brasília-DF

2013

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NERYLTON THIAGO LOPES PEREIRA

O PROPÓSITO NEGOCIAL COMO ELEMENTO DE LEGITIMAÇÃO DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em direito na Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito tributário Contemporâneo. Orientadora: Drª. Liziane Angelotti Meira

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus em primeiro lugar, pois sem ele essa difícil caminhada jamais teria ocorrido. À minha mãe, pelo amor e educação que me dedica, de modo que renunciou os seus sonhos para realizar os meus. Obrigado mãe! Ao meu pai, meu exemplo, pelo amor e educação. Obrigado pai! À minha avó Alexandrina Pereira.

À minha esposa Patrícia, eterna namorada, companheira nessa caminhada. Te amo muitão! Ao meu irmão Felipe, meu orgulho, que sempre me incentiva. Obrigado pelo amor e convívio. Aos meus irmãos Ana Cristina e Ghandy, que sempre me incentivaram nas horas mais difíceis.

À minha família (tias, tios, primas, primos, agregados e muito mais), meu pilar, sem vocês eu não teria conseguido. Muito obrigado.

Ao professor Manuel Moacir, pois a sua postura instigadora deixou uma marca indelével na minha vida acadêmica.

Ao professor Maurin, pelas profícuas aulas se principalmente por me revelar que tributo não é apenas uma prestação pecuniária compulsória, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

Ao professor Marcos Valadão, pelos ensinamentos e instigantes debates sobre o tema planejamento tributário.

Aos professores José Eduardo Sabo e Antônio de Moura Borges, exemplos de vida e simplicidade.

Agradeço especialmente a minha orientadora, professora Liziane Angelotti Meira, exemplo de dedicação e profissionalismo, sempre atenciosa com meu trabalho.

Aos colegas de mestrado, por terem contribuído como o meu desenvolvimento acadêmico. Agradeço aos meus sócios e amigos Willington Raminez Barreto e Michelle Cristhina Dias, por suprirem a minha ausência durante essa caminhada.

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RESUMO

REFERÊNCIA: PEREIRA, Nerylton Thiago Lopes. Título: O propósito negocial como elemento de legitimação do planejamento tributário. 2013. 140f. Dissertação (Mestre em Direito tributário Contemporâneo). Universidade Católica de Brasília, 2013.

No presente trabalho o tema planejamento tributário será estudado considerando que as normas tributárias não se resumem à arquitetura de conceitos e de meros instrumentos de promoção de interesses do Estado ou do contribuinte, consagram-se como um meio de concretização dos valores básicos da pessoa humana e do seu convívio em sociedade. As interpretações puramente formais do direito tributário devem ser superadas, de modo que o tributo possa ser compreendido como um importante instrumento social e econômico, um verdadeiro dever de cidadania. O planejamento tributário é um fenômeno intersistêmico, a compreensão dos problemas e das soluções relacionados às consequências jurídicas dos atos ou negócios que visam reduzir, postergar ou eliminar a incidência tributária exigem abertura cognitiva do direito, a fim de fornecer os mecanismos necessários para legitimação do planejamento tributário frente a imposição da vontade democrática. A aplicação da teoria do propósito negocial (business purpose) na análise dos atos e negócios elisivos contribui para distinção dos casos de abusos no planejamento tributário.A intenção final é identificar, o limite da oponibilidade do planejamento tributário realizado pelo contribuinte.

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ABSTRACT

Tax planning is an intersystemic phenomenon, understanding of problems and solutions related to the legal consequences of acts or business to reduce, delay or eliminate the tax incidence cognitive demand of entitlement in order to provide the necessary mechanisms to legitimize the planning tax levy against the democratic will. In the present work issue tax planning will be studied considering that the tax rules are not limited to architecture concepts and mere instruments for the promotion of interests of the State or the taxpayer, are consecrated as a means of achieving the basic human values and your life in society. The purely formal interpretations of tax law must be overcome so that the tax can be understood as an important social and economic tool, duty of citizenship, promoting rapprochement of the tax law with the theory of justice and ethics. Research on the applicability of the business purpose test (business purpose) in the analysis of cases of tax planning can help to distinguish cases of legitimacy and illegitimacy of tax planning. The ultimate intention is to identify, limit the enforceability of tax planning undertaken by the taxpayer.

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LISTA SIGLAS

CF – Constituição Federal

CTN – Código Tributário Nacional

CARF - Conselho Administrativo de Recursos Fiscais

CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

ICMS – Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de comunicação

II – Imposto de Importação IE – Imposto de Exportação

IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados

IPTU – Imposto sobre Propriedade Territorial Urbana

IPVA – Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores IRPF - Imposto de Renda Pessoa Física

IRPJ – Imposto de Renda Pessoa Jurídica IRC – Internal Revenue Code

IRM - Internal Revenue Manual IRS - Internal Revenue Service

ISSQN – Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza

ITBI – Imposto de Transmissão de Bens Imóveis e Direitos Reais sobre Imóveis ITCD – Imposto sobre a Transmissão “causa mortis” e Doação

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 10

1. A CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO...13

1.1 DO DIREITO AO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO AO DEVER DE PAGAR TRIBUTOS: UMA CONSTRUÇÃO IDEOLÓGICA...16

1.1.1A evolução ideológica do tributo ...17

1.1.2 A atual concepção ideológica do tributo: direito da coletividade ...20

PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO: UM FENÔMENO INTERSISTÊMICO...23

2. TEORIAS DE INTERPRETAÇÃO DO DIREITO E SUAS IMPLICAÇÕES SOBRE A REGULAMENTAÇÃO DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO ...25

2.1 A TEORIA DA JURISPRUDÊNCIA DOS CONCEITOS...27

2.2 A TEORIA DA JURISPRUDÊNCIA DOS INTERESSES...29

2.3 A TEORIA DA JURISPRUDÊNCIA DOS VALORES...33

3 PAPEL DE REGRAS E PRINCÍPIOS NA REGULAMENTAÇÃO DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO...36

3.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS...37

3.2 A IMPORTÂNCIA DA DISTINÇÃO E APLICAÇÃO DE REGRAS E PRINCÍPIOS PARA O PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO...37

3.3 O MODELO DE RONALD DWORKIN...39

3.4 O MODELO DE ROBERT ALEXY...41

3.5 MITOS E EQUÍVOCOS NOS MODELOS DE DISTINÇÃO E APLICAÇÃO DE REGRAS E PRINCÍPIOS DE RONALD DWORKIN E ROBERT ALEXY...44

3.6 REGRAS E PRINCÍPIO: DUAS FACES DA MESMA MOEDA? ...48

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REGULAMENTAÇÃO DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO...54

4.1.1 Princípios da liberdade econômica...54

4.1.2 Princípio da livre concorrência...55

4.1.3 Princípio legalidade em matéria tributária...58

4.1.4 O princípio da isonomia ou igualdade tributária...60

4.1.5 Princípio da capacidade contributiva...62

4.1.6. Princípio da segurança jurídica em matéria tributária...65

5 PRIMAZIA DAS REGRAS NA REGULAMENTAÇÃO DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO...70

5.1 OS FUNDAMENTOS JURÍDICOS DAS REGRAS ANTIELISIVAS...71

5.2 REGRAS GERAIS ANTIELISIVAS...72

5.3 REGRAS ESPECIAIS DE PREVENÇÃO OU DE CORREÇÃO À ELISÃO...77

5.4 OS MODELOS DE REGRAS ANTIELISIVAS NOS ORDENAMENTOS DOS PAÍSES: ALEMANHA, ESPANHA, FRANÇA, ITÁLIA, ESTADOS UNIDOS E BRASIL ...79

5.4.1Regras antielisivas no direito alemão: proibição de abuso de forma...80

5.4.2 Regras antielisivas no direito espanhol: fraude à lei...83

5.4.3 Regras antielisivas no direito francês: abuso de direito...86

5.4.4 Regras antielisivas na Itália: método de regras específicas...87

5.4.5 Regras antielisivas nos Estados Unidos: propósito negocial...90

5.4.6 As regras antielisivas no ordenamento brasileiro...97

6 O PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO: LEGITIMIDADE FRENTE O ORDENAMENTO JURÍDICO...103

6.1 O PROPÓSITO NEGOCIAL COMO MÉTODO DE ANÁLISE DA LEGITIMIDADE PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO...105

6.2 TRIBUNAL ADMINISTRATIVO FISCAL FEDERAL: EXIGÊNCIA DE PROPÓSITO NEGOCIAL NO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO...110

6.3 PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO: ANÁLISE DO PROPÓSITO NEGOCIAL PELO PODER JUDICIÁRIO...120

CONCLUSÕES...122

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1. INTRODUÇÃO

O tema planejamento tributário é um dos temas mais instigantes do direito tributário, pois o debate sobre o direito e os limites dos atos e negócios elisivos tem acompanhado a história dos tributos. Podemos afirmar que juntamente com o primeiro tributo surgiu o primeiro planejamento tributário. Não se pode negar que os tributos representam reduções nos rendimentos ou patrimônio colocados à disposição dos contribuintes e partindo do pressuposto de que as pessoas não gostam de ter o seu patrimônio reduzido, é natural que se procure maximizar a sua utilidade esperada no cumprimento fiscal. Todavia, no que pese representar redução nos rendimentos colocados à disposição dos contribuintes, os tributos, na concepção hodierna, são importantes instrumentos de desenvolvimento econômico e social, pois financiam os bens e serviços públicos, realizam distribuição de renda, maximizando o bem-estar social.

O planejamento tributário representa uma reação à força exercida pelos tributos. Portanto, do mesmo modo que os tributos sofreram reflexos das mudanças sociais ocorrida no último século, o tratamento jurídico concedido aos atos e negócios elisivos demonstrou permeabilidade aos fatos políticos e econômicos.

O planejamento tributário é um fenômeno intersistêmico, com pontos de interseção nos sistemas jurídicos, político e econômico. A compreensão dos problemas e das soluções relacionados às consequências jurídicas dos atos ou negócios que visam reduzir, postergar ou eliminar a incidência tributária exige abertura cognitiva do direito, a fim de fornecer os mecanismos necessários para legitimação do planejamento tributário frente à imposição da vontade democrática. Não se pode negar que o direito opera por um sistema normativamente fechado, entretanto, ele é cognitivamente aberto, permite uma leitura de significações advindas de outros subsistemas, a fim de auxiliar uma fundamentação ético-discursiva.

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tributário se legitima, na conformação entre os princípios da liberdade econômica, legalidade capacidade contributiva, isonomia e neutralidade a liberdade.

O objetivo específico do trabalho é propor a aplicação da teoria do propósito negocial como método de análise da legitimidade do planejamento tributário frente ao sistema jurídico. O propósito negocial requer a adequação entre a realidade fática das relações econômicas e a formalidade jurídica, permitindo, desse modo, a compatibilização entre o direito à economia fiscal e o dever de pagar tributos.

A metodologia empregada na investigação é de cunho reflexivo-teórico, com pesquisa bibliográfica em artigos científicos, livros especializados e análise de casos concretos julgados no Conselho de Administrativo de Recursos Fiscais, sistematizando-se o conhecimento existente sobre o assunto e alcançando conclusões a partir das teorias que orientam o planejamento tributário.

No capítulo primeiro, busca-se evidenciar o planejamento tributário como um fenômeno intersistêmico, demonstrando que as diversas mudanças sociais, políticas e econômicas ocorridas ao longo dos últimos séculos influenciaram o tratamento jurídico concedido ao planejamento tributário. Tanto o direito ao planejamento tributário quando o dever de pagar tributos decorrem de uma construção ideológica, resultado das trocas entre o sistema jurídico, econômico e político.

O segundo capítulo trata das teorias que orientam a interpretação das normas jurídicas. É relevante compreendê-las, pois a interpretação é o primeiro passo do planejamento tributário. As normas jurídicas não preexistem à interpretação, dessa forma, a legalidade ou ilegalidade, legitimidade ou ilegitimidade, validade ou invalidade, mas são constatadas a partir das teorias que auxiliam a interpretação das normas jurídicas.

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modelos propostos por Ronald Dworkin e Robert Alexy, bem como as críticas formuladas por Marcelo Neves e Humberto Ávila contra a recepção desses modelos pela doutrina e prática constitucional brasileira.

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1. A CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO

O planejamento tributário comporta uma análise sob a perspectiva de processo e produto1. Como processo, consiste na interpretação dos sistemas jurídicos e na análise

prospectiva dos efeitos dos atos ou negócios que serão realizados nesse sistema, a fim de criar ações que oportunizem ao contribuinte a legítima economia fiscal. Na perspectiva de produto, o planejamento tributário consiste na prática de atos ou negócios jurídicos lícitos que tenham por objetivo impedir, reduzir ou postergar a incidência da tributação, proporcionando ao contribuinte a legitima economia fiscal.

Para Heleno Tôrres o planejamento tributário: “é a expressão que deve servir para designar, tão-só, a técnica de organização preventiva de negócios, visando a uma lícita economia de tributos”2. Corresponde, na perspectiva do autor, à orientação concedida na

constituição dos atos e negócios jurídicos, a partir do plano elaborado para aperfeiçoar os custos com as obrigações tributárias, antecipando os efeitos e as consequências jurídico-tributárias.

A definição de planejamento tributário pode considerar apenas o objetivo dos atos ou negócios realizados - economia de tributos3, desconsiderando as consequências do

planejamento adotado (licitude ou ilicitude). Doutro modo, a definição de planejamento tributário pode exigir a licitude dos atos ou negócios realizados com objetivo de reduzir ou postergar o ônus tributário. Marco Aurélio Greco afirma que: “o requisito da licitude corresponde à primeira exigência para reconhecer a existência de planejamento tributário”4.

No mesmo sentido, Heleno Tôrres afirma que o planejamento tributário representa à noção de legítima economia de tributos, pois constitui: “atitudes lícitas na estruturação ou reorganização de seus negócios tendo como finalidade a economia de tributos, seja evitando a incidência destes, seja reduzindo ou diferindo o respectivo impacto fiscal sobre as operações”5.

1 TÔRRES, Heleno. Direito tributário e direito privado: autonomia privada: simulação: elusão tributária. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2003, p. 175.

2 TÔRRES, Heleno. op. cit., p. 175

3 A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE define planejamento tributário como: TAX PLANNING --Arrangement of a person's business and/or private affairs in order to minimize tax

liability. Disponível em: <http://www.oecd.org/ctp/glossaryoftaxterms.htm>. Acessado em 26.03.2013.

4 Marco Aurélio Greco afirma que: O requisito da licitude corresponde à primeira exigência para reconhecer a existência de planejamento tributário. GRECO, Marco Aurélio. Planejamento tributário. 3ª ed. São Paulo: Dialética, 2011, p. 120.

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Portanto, o presente trabalho, na linha de Heleno Tôrres e de Marco Aurélio Greco, parte da concepção do pressuposto da licitude dos atos ou negócios praticados pelo contribuinte, pois de modo inverso não se estará diante de um planejamento tributário, mas de um ato ilícito. A definição do planejamento não comporta atos ou negócios criminosos destinados à evasão fiscal, tais como: omitir informação, prestar declaração falsa, falsificar ou alterar nota fiscal. O direito de o contribuinte realizar planejamento tributário visando redução dos encargos tributários não é objeto de controvérsias, elas surgem no debate sobre os efeitos, a extensão, delimitação e oponibilidade do planejamento perante o Fisco.

O planejamento tributário constitui um direito fundamental do contribuinte, decorrente da autonomia privada e da autonomia da vontade6, corolário dos princípios

democráticos garantidores do exercício da cidadania. O indivíduo tem indiscutível liberdade de ordenar seus negócios de modo menos oneroso, inclusive tributariamente. Alfredo Augusto Becker afirma que é aspiração naturalíssima e intimamente ligada à vida econômica, a de se procurar determinado resultado econômico com maior economia, isto é, com a menor despesa7. Para Alberto Xavier, a liberdade fiscal ou liberdade de opção fiscal é a garantia de

liberdade para fins tributários8.

Com o crescente aumento da mobilidade do capital, dos fatores produção e dos ambientes fiscais altamente competitivos9, o planejamento tributário implica novos desafios

aos Estados, às empresas e à sociedade. Aos Estados, os desafios decorrem de uma concorrência tributária internacional10, forçando-os a executarem políticas de convergências

dos sistemas tributários11, para adaptá-los à dinâmica do movimento global de capitais, do

multilateralismo e dos processos de integração econômica, facilitando, assim, o fluxo de

6 Heleno Tôrres distingue autonomia privada de autonomia da vontade. Segundo o autor, autonomia privada decorre de uma composição de princípios democráticos garantidores do exercício da cidadania, vinculados aos interesses maiores da comunidade. A autonomia da vontade é algo intrínseco ao indivíduo, aos seus interesses. TÔRRES, Heleno. Direito tributário e direito privado: autonomia privada: simulação: elusão tributária. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2003, p. 119.

7BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2001, p.122.

8 XAVIER, Alberto. Tipicidade da tributação, simulação e norma antielisiva. São Paulo: Dialética, 2001, p. 32. 9 GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. Direito Tributário Comparado e tratados internacionais fiscais. Porto Alegre, p. 30.

10 Segundo os ensinamentos de Antônio de Moura Borges: “Concorrência tributária ocorre quando Estados alteram as respectivas normas tributárias a fim de atrair atividades empresariais, fluxos de investimentos ou indivíduos com determinadas habilidades profissionais. Considerações Sobre o Combate à Concorrência Tributária Internacional Prejudicial. Fórum de Direito Tributário, Belo Horizonte, v. 12, p. 53-70, 2004.

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investimentos com o propósito de aumentar oferta de empregos e a promoção ou manutenção do crescimento econômico12.

Marcos Aurélio Pereira Valadão ressalta que a necessidade de atração do capital externo não se faz tão somente em razão do investimento, mas também em decorrência da necessidade do financiamento da dívida pública13. Os Estados têm buscado, ao longo dos

últimos anos, ampliar e diversificar sua base de investidores, bem como aprimorar sua relação com detentores de seus títulos14. O financiamento ou refinanciamento15 da dívida pública é

essencial para o controle dos gastos públicos, da política monetária e fiscal.

Com relação às empresas, há necessidade de um planejamento tributário para que permaneçam competitivas e possam enfrentar a concorrência nacional e internacional, buscando uma redução dos custos de produção e ambientes economicamente favoráveis para consecução de seus objetivos sociais. Com o dinamismo dos fatores de produção e a forte concorrência global, o planejamento tributário passou a ser uma necessidade básica das empresas, tão essencial quanto um planejamento econômico, técnico, comercial16, mormente

considerando que o pagamento de tributos representa três tipos de ônus: (i) perda de eficiência; (ii) o custo administrativo; e (iii) o custo de conformidade17. Conforme bem

elucidado por Jonathan Barros Vita, “nenhum sujeito conscientemente produz a maior ineficiência econômica em suas operações por conta de uma ineficiência na alocação da mínima carga tributária”18.

12 Vide. Thomas F. FIELD, “Tax competition in Europe and America”, Tax Notes International Magazine, (29): 1235, mar. 2003 (29 Tax Notes Int’l 1235, 1235). Aput BORGES, Antônio de Moura. Considerações Sobre o Combate à Concorrência Tributária Internacional Prejudicial. Fórum de Direito Tributário, Belo Horizonte, v. 12, p. 53-70, 2004.

13 VALADÃO, Marcos Aurélio Pereira. Efeitos da globalização no sistema tributário brasileiro. Brasil, Rússia, Índia e China (BRIC): Estruturas dos Sistemas Tributários. Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial. Brasília: Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial, 2011, p 27-28.

14 Vide o trabalho publicano pela Secretaria de Tesouro Nacional. BITTENCOURT, Jeferson Luis. A base de

investidores da Dívida Pública Federal no Brasil. Disponível em:

http://www3.tesouro.gov.br/divida_publica/downloads/Parte%203_5.pdf>. Acessado em 05.02.2013.

15 O refinanciamento da dívida corresponde à emissão de novos títulos públicos, objetivando arrecadar recursos para a amortização ou para o pagamento dos títulos vencidos ou vincendos. Assim, constituiu mera substituição dos títulos vencidos ou vincendos por novos títulos.

16 "O planejamento tributário insere-se nesse procedimento amplo e geral que deve preceder a qualquer novo negócio ou alteração de rumo do existente. Tão essencial quanto um planejamento econômico, técnico, comercial, de mercado, etc., o planejamento tributário é aquele que visa à eficiência em seu campo, ou seja, o menor ônus tributário para o negócio, dentro dos limites da lei.” HUCK, Hermes Marcelo. Evasão e elisão: rotas nacionais e internacionais do planejamento tributário. São Paulo: Saraiva, 1997, 148.

17 Vide. GICO JR, Ivo Teixeira. VALADÃO, Marcos Aurélio Pereira. PLUTARCO, Hugo Mendes. O custo social das obrigações tributárias acessórias. Economic Analysis of Law Review, V. 3, nº 2, p. 338-349, Jul-Dez, 2012, p. 342/344. Brasília. Disponível em: <http://www.ealr.com.br>. Acessado em 03.02.2013.

18VITA, Jonathan Barros. Teoria Geral das Normas Antielisivas (Re)Definição e Classificação. ELALI, André;

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Do ponto de vista da sociedade, o planejamento tributário não pode servi de instrumento para um apartheid fiscal entre os contribuintes que conseguem fugir da imposição tributária e os contribuintes que não conseguem fugir, concedendo uma leniência as distorções praticadas por agentes privados que querem tomar para si os escassos recursos (rent seeking). Para sociedade a legitimidade da tributação passa por uma matriz tributária eficiente, justa, racional, progressiva, que seja estimuladora da inovação, produção e do emprego19. Com isso, não se pode ser leniente com os comportamentos free rider de

contribuinte que se utilizam do sistema jurídico para fugir do dever fundamental de pagar tributos.

O planejamento tributário é uma atividade lícita, legitima e necessária, sendo perfeitamente válida a organização lícita dos negócios com objetivo de reduzir os custos tributários. Ao Estado, não cabe controlar a atividade do contribuinte quando este estrutura os seus negócios visando à redução dos custos20, deve-se resguardar o direito ao exercício da

autonomia privada, a propriedade e a liberdade econômica. Todavia, uma postura laissez faire, laissez passer do Estado com relação aos atos ou negócios que visem à fuga da imposição tributária malfere a justa repartição das despesas e coloca em risco o importante papel desempenhado pelo tributo nas relações sociais, políticas e econômicas.

1.1 DO DIREITO AO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO AO DEVER DE PAGAR TRIBUTOS: UMA CONSTRUÇÃO IDEOLÓGICA

A liberdade, conferida ao contribuinte, de buscar o menor ônus fiscal está insitamente ligada à compreensão do tributo por parte da sociedade, pois quanto mais o resultado da tributação está à disposição da sociedade – redistribuição de renda, financiamento de bens e serviços públicos e correção de falhas de mercado – menor é sua

19A política tributária brasileira tem demonstrado o caminho inverso, na medida em que é ineficiente, injusta, irracional e altamente regressiva, desestimuladora da inovação, produção e emprego. Com isso, há déficit de legitimidade da matriz tributária brasileira, mormente considerando que o retorno social oferecido pelo Estado à sociedade fica aquém do que seria possível obter com os recursos que são arrecadados. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) dos 34,9% do PIB auferidos em 2008 apenas 10,4% do produto retornaram à sociedade na forma de investimentos públicos em educação (4,7%), saúde (3,7%), segurança pública (1,4%) e habitação e saneamento (0,6%). Seminário Internacional sobre Justiça Fiscal (2011: Brasília). Anais do Seminário Internacional sobre Justiça Fiscal. Brasília: Presidência da República, Secretaria do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, 2011.

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rejeição social21. O tributo acompanhou as diversas mudanças sociais e de modelo de Estado

ocorridas ao longo dos últimos séculos, o que demonstra a sua permeabilidade aos fatos políticos, econômicos e sociais que marcaram a evolução ideológica da sociedade22.

1.1.1A evolução ideológica do tributo

Marco Aurélio Greco afirma que é possível identificar três fases no debate sobre do tema planejamento tributário. Na primeira fase, o contribuinte tem liberdade absoluta para agir, salvo se os atos praticados forem ilícitos, realizados depois do fato gerador ou com simulação. A base teórica desta fase resulta na concepção de que o tributo é visto como agressão à propriedade. O Direito Tributário – como conjunto de normas que regulam o exercício desse poder – passa a ser o escudo para o cidadão se defender de uma invasão do Estado. O contribuinte tem liberdade absoluta para caminhar pelas lacunas da lei tributária sem que o Fisco possa se opor. Na segunda fase do debate, há liberdade, salvo patologias do abuso de direito e fraude à lei. Além dos atos ilícitos e de simulação, as patologias do negócio jurídico contaminam o planejamento tributário. Por fim, a terceira fase: liberdade com capacidade contributiva. Nessa fase, além dos vícios no planejamento existentes nas fases anteriores, o autor acrescenta que a legitimidade dele deve ser analisada a partir da perspectiva da capacidade contributiva23.

A história da humanidade pode ser contada a partir da história dos tributos. Do mesmo modo, a história do tributo pode ser contada a partir da resistência à tributação. As reações dos contribuintes à imposição tributária deram causa a profundas revoluções dentro da sociedade, contribuindo com o aperfeiçoamento gradativo das instituições políticas e jurídicas24. Vale lembrar a Revolta do Chá25 (1773), um dos movimentos que contribuíram

21 Jean-Jacques Rousseau já verificava que: “Infere-se daí que quanto mais aumenta a distância entre o povo e o governo, mais se tornam onerosos os tributos. Assim sendo, na democracia, o povo é o menos sobrecarregado; na aristocracia, ele o é um pouco mais; na monarquia, carrega o maior peso.” ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social. Ed Ridendo Castigat Mores, 2002, p. 43.

22 FALCÃO, Maurin Almeida. A construção doutrinária e ideológica do tributo: do pensamento liberal e socialdemocrata à pós-modernidade. Atividade empresarial e mudança social/ Jussara Suzi Assis Borges Nasser Ferreira, Maria de Fátima Ribeiro, organizadoras. São Paulo: Arte & Ciência; Marília: UNIMAR, 2009.

23 Vide: GRECO, Marco Aurélio. Planejamento tributário. 3ª ed. São Paulo: Dialética, 2011.

24 MARTON, Ronaldo Lindimar José. Tributação, Representação Política e Democracia. Disponível em <http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/fortaleza/3670.pdf>. Acessado em 25.10.2012.

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para independência dos Estados Unidos, a própria Revolução Francesa26, em grande parte foi

consequência da atividade tributária extorsiva e arbitrária do Estado e a nossa Inconfidência Mineira27 (1789).

As primeiras ideias de tributo tinham origem de uma sujeição do perdedor da guerra ao vencedor, caracterizava-se como uma servidão, o preço devido para permanecer nas terras dominadas pelo vencedor28. No feudalismo, o tributo caracterizava-se como preço pela

utilização da terra e proteção dos senhores feudais29. Com o surgimento do Estado

patrimonialista, os tributos passaram a ter a finalidade de manter as regalias e os privilégios do clero e da nobreza30 (tributação regaliana). Nesse período, o fruto da arrecadação dos

tributos pertencia ao rei, sendo que o tributo nada mais era que uma contribuição devida ao rei pelos seus súditos.

Com o advento do Estado de Polícia, o mercantilismo do ponto de vista econômico, tem início um lento processo de separação das finanças do Estado das finanças do rei, entre as rendas patrimoniais e tributo, e, ainda, desenvolvimento das técnicas de arrecadação, contabilidade e controle das contas públicas31.

Nesse diapasão, em todos esses períodos, a tributação tendia à arbitrariedade, decorria de uma relação de poder e tinha característica de um fiscalismo ilimitado. O tributo consistia em uma agressão à liberdade e à propriedade, sendo que não eram raros os tributos confiscatórios e utilizados para sancionar os particulares. Por tais razões, o tributo encontrava

Parlamento Inglês que havia criado um imposto sobre o chá exportado. A revolta constituiu-se em um evento-chave para proclamação da independência das colônias e a formação dos Estados Unidos da América. Destaca-se que diversas outras medidas tributárias impostas pelo Parlamento Inglês contribuíram para a declaração de independência dos Estados Unidos, podemos citar a Lei do Selo, Lei do Açúcar e Lei do Chá. Assim, na Constituição norte-americana de 1.787 atribuiu expressamente ao Congresso, isto é, ao órgão de representação popular, o poder: “Section. 8. The Congress shall have Power To lay and collect Taxes, Duties, Imposts and Excises, to pay the Debts and provide for the common Defence and general Welfare of the United States; but all Duties, Imposts and Excises shall be uniform throughout the United States”. Disponível em: <http://history.state.gov/milestones/1784-1800/french-rev > Acessado em 10.03.2013.

26 As Décíarations des Droits de 1789 consagram, no seu artigo 13, o princípio de que 'Timpôt ne peut être vote que parla nation ou ses representants"

27A Inconfidência Mineira movimento social que se insurgiu contra o abuso na cobrança de tributos por Portugal. Com a decadência da mineração, houve redução no pagamento dos tributos exigidos pela Coroa Portuguesa. Com isso, o governo português passou a exigir que toda a população, inclusive quem não fosse minerador, contribuísse com a arrecadação de 20% do valor do ouroretirado. Os colonos se revoltaram e passaram a conspirar contra Portugal.

28 VANONI. Ezio. Natureza e interpretação das leis tributárias. Tradução Rubens Gomes de Sousa. Edições Financeiras S.A. 1952.

29 FALCÃO, Maurin Almeida. A teoria do fato social em Durkheim e os elementos de conexão para uma análise sociológica do tributo.

30 TÔRRES. Direito tributário e direito privado: autonomia privada: simulação: elusão tributária. São Paulo: Editora Revistas dos Tribunais, 2003, p. 201-202.

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forte resistência na sociedade e o planejamento tributário era utilizado como salvaguarda ao direito de propriedade e de liberdade.

Com a chegada do liberalismo, a ideia de tributo e de liberdade econômica é repensada. A tributação deixa de ter a finalidade de domínio e de sustentar as regalias do clero e da nobreza e passa a ser decorrente de um contrato social, constituindo um preço pela proteção e pelo fornecimento de bens e serviços por parte do Estado. O Estado liberal inaugura os fundamentos da tributação contemporânea, calcado nos princípios da neutralidade fiscal, equidade e certeza.

Na concepção liberal clássica, o tributo era concebido como um peso-morto que reduziria a produção e o consumo, sendo que o valor pago jamais retornaria à sociedade, porquanto é gasto pelo governo de maneira improdutiva32. Por consequência dessa concepção,

o contribuinte tinha liberdade absoluta para fugir da imposição tributária, não cabia ao Estado intervir ou desconsiderar a forma de organização dos negócios que visavam à economia tributária, na medida em que o tributo representava redução no bem-estar social. O Estado liberal, assentado na garantia da propriedade e da liberdade econômica dos indivíduos, tinha na ordem jurídica prevalência de valores que asseguravam a livre organização dos negócios do contribuinte.

No fim século XIX, o limitado papel desenvolvido pelo Estado liberal é colocado em xeque. A eclosão da Revolução Industrial revelou a incapacidade do mercado em promover o bem-estar dos indivíduos e a justa repartição de riqueza, o que exigiu do Estado a adoção de uma postura positiva, intervencionista, a fim de garantir direitos à população e o desenvolvimento econômico.

A partir do século XX, com a promulgação de Constituições Sociais, como a Constituição Mexicana (1917) e a Constituição Alemã (1919), foi construído o paradigma do Estado Social e dos denominados direitos de segunda geração, transferindo-se do mercado para o Estado a responsabilidade pelo desenvolvimento econômico e pelo bem-estar social. Outro fato que contribuiu para encerrar definitivamente o modelo liberal foi a crise de 1929, quando os Estados Unidos, por meio do presidente Franklin Delano Roosevelt, introduziu o New Deal, plano de recuperação econômica calcado no intervencionismo do Estado nas questões econômicas e sociais.

(21)

O Estado, para fazer frente aos direito sociais e executar medidas econômicas, teve de expandir a sua estrutura administrativa, incrementando os gastos com pagamento de funcionários, manutenção da estrutura administrativa e investimentos públicos. Com o aumento das despesas, emergiu a necessidade do Estado auferir receitas, e o tributo se tornou um importante instrumento de financiamento de políticas públicas destinadas à satisfação das demandas sociais33.

O tributo antes encarado como um peso-morto, que somente suprimia o bem-estar da sociedade ao aumentar os custo de produção e reduzir o consumo, passa a ser um importante instrumento de redistribuição de renda, de correção de falhas de mercado34, de financiamento

de bens e serviços públicos, sinalizando um novo marco teórico da tributação35, mormente

para o relacionamento entre o contribuinte e Estado. O direito tributário deixa de ser apenas uma forma de coerção legítima para expropriar a propriedade do contribuinte, para se transformar no ramo jurídico orientado por normas que afetam não só a relação cidadão/Estado, mas também a relação dos cidadãos uns com os outros. A tributação deixa de ser compreendida como limitação a propriedade e aos direitos dela decorrentes, para ser compreendida como instrumento que garante o seu exercício. O direito tributário passa a ser um Direito da Coletividade36 e alicerça novo marco teórico da tributação.

1.1.2 A atual concepção ideológica do tributo: direito da coletividade

Agora o debate sobre o planejamento tributário não se reduz à economia de tributos, contempla o estudo sobre o dever fundamental de pagar tributo, na medida em que o direito de buscar uma redução ou postergação da incidência tributária encontra limite na cidadania fiscal. Segundo José Cassalta Nabais, após as trágicas experiências históricas dos regimes fascistas, nazistas e estalinistas, os textos constitucionais concederam absoluta primazia aos

33 Vide. VALADÃO, Marcos Aurélio Pereira. Direitos Humanos e Tributação: Uma concepção Integradora. Direito em Ação (UCB/DF), Brasília - DF, v. 2, n. 1, 2001, p. 221-241.

34 Falhas de mercado é um conceito econômico que demonstra as ineficiências, imperfeições e os resultados sociais indesejáveis decorrentes de mercado sem qualquer regulamentação do Estado, deixado livremente ao seu próprio funcionamento. As falhas do mercado são: 1) bens públicos; 2) externalidades; e 3) mercado não competitivos.

(22)

direitos fundamentais, a fim de evitar o retorno de tais regimes totalitarista. O tema dos deveres fundamentais foi renegado, pois estava relacionado com a opressão do Estado. Hoje a concepção de direitos fundamentais está ligada com a responsabilidade comunitária que faz dos indivíduos simultaneamente livres e responsáveis. Trata-se de uma categoria constitucional jurídica própria, não rival da categoria dos direitos fundamentais, pois são imbricadas nos valores constitucionais de uma sociedade37.

O pagamento de tributo constitui um desses deveres fundamentais da vida em sociedade, pois todos devem contribuir, na medida da sua capacidade contributiva, para o financiamento das despesas do Estado. Conforme verificado José Cassalta Nabais, há um dever fundamental de pagar impostos:

Como dever fundamental, o imposto não pode ser encarado nem como um mero poder para o estado, nem como um mero sacrifício para os cidadãos, constituindo antes o contributo indispensável a uma vida em comunidade organizada em estado fiscal. Um tipo de estado que tem na subsidiariedade da sua própria acção (económico-social) e no primado da autoresponsabilidade dos cidadãos pelo seu sustento o seu verdadeiro suporte. Daí que não se possa falar num (pretenso) direito fundamental a não pagar impostos38

A tributação é parte importante da vida em sociedade, porquanto se destina a manutenção da esfera pública39 e ao financiamento dos direitos. Os direitos não são dádivas

divinas, fruto da natureza e autorealizáveis, dependem de financiamento. Flávio Galdino afirma, a partir da teoria dos custos dos direitos, que “os direitos não nascem em árvores”, deve-se reconhecer que a concretização dos direito fundamentais necessita de recursos públicos40. Por isso, a melhor abordagem para os direitos seja vê-los como liberdades

privadas com custos públicos, pois todos os direitos têm custos comunitários41.

Stephen Holmes e Cass Sunstein no livro The Costs of Rights: Why Liberty Depends on Taxes, discorrem sobre o problema dos custos dos direito. Segundo os autores, tanto os direitos negativos quanto os direitos positivos implicam custos, na medida em que exigem

37 NABAIS, José Casalta. O dever fundamental de pagar impostos. Coimbra: Livraria Almedina, 1998, p. 17-40. 38 NABAIS, José Casalta. op. cit., p. 679.

39 Conforme Paulo Caliendo “A esfera pública será considerada toda a forma de organização institucional que possui objetivos gerais em oposição a objetivos meramente particulares”. SILVEIRA, Paulo Antônio Caliendo Velloso da. Direito tributário e análise econômica do direito: uma visão crítica. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009, p. 211.

40 GALDINO, Flávio. Introdução à teoria dos custos dos direitos: direitos não nascem em árvores. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 215.

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uma ação do Estado para sua efetivação. O Estado sem recursos financeiros não consegue proteger e garantir os mais diversos direitos individuais; direito à propriedade, direito ao voto, à liberdade religiosa, à privacidade, ao acesso à justiça, à liberdade de expressão, à greve, o direito de apresentar petições ao Estado, proteção de direitos autorais, o direito a um ambiente de trabalho seguro, e assim por diante. Para garantir e aplicar todos esses direitos é necessária uma complexa organização administrativa, legislativa e judicial, tanto nas esferas federal, estadual e municipal, o que implica custos42.

Assim, a partir da compreensão de que os direitos individuais e coletivos, positivos ou negativos implicam custos comunitários, suportados por toda a sociedade por meio do pagamento de tributos, o direito ao planejamento tributário deixa de ser absoluto. Conforme Klaus Tipke, sem impostos e contribuintes não há como construir um Estado, muito menos Estado de Direito43. O direito tributário não é excepcional, justamente porque corresponde à

consciência coletiva: se esta considera necessária a existência do Estado, tem de admitir também a necessidade dos tributos, porque o Estado precisa de meios financeiros para realizar seus fins44, logo, antes de tudo, o direito tributário é direito atinente à coletividade.

Nesse contexto, a burla à imposição tributária e os comportamentos free riders45

revelam-se ilegítimos, na medida em que malferem a tributação por meio da capacidade contributiva e a justa repartição do ônus tributário. A norma tributária deve, dessa forma, distinguir os planejamentos tributários construídos artificialmente, sem qualquer objetivo comercial, com o simples propósito de elidir a imposição tributária, malferindo os princípios da capacidade contributiva, neutralidade da tributação e a justa repartição dos encargos sociais.

O direito tributário não se resume à arquitetura de conceitos e de meros instrumentos de promoção de interesses de Estado ou do contribuinte. Ao revés, consagram-se como um meio de concretização dos valores básicos da pessoa humana e do seu convívio em

42Stephen Holmes, Cass R. Sunstein. The Cost of Rights: Why Liberty Depends on Taxes. New York: W. W. Norton &Co., 1999, 255.

43 TIPKE, Klaus. Tradução Luiz Dória Furqui. Moral tributária do Estado e dos Contribuintes. Porto Alegre: Antonio Frabris Editor, 2012, p. 14.

44 SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. São Paulo: Resenha Tributária, 1975. Ed. póstuma – 1. ed. de 1952.

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sociedade46. As interpretações puramente formais do direito devem ser superadas, de modo

que o tributo possa ser compreendido como um importante instrumento social e econômico, dever de cidadania, promovendo a reaproximação do direito tributário com a teoria da justiça47 e com a ética48.

Conquanto a liberdade econômica de organizar os negócios visando à redução nos custos seja um direito do contribuinte - corolário do direito de propriedade e de liberdade - o planejamento tributário realizado pelo contribuinte tem o dever de manter correção material com os valores justiça, ética e cidadania, fundamentos axiológicos da isonomia, neutralidade tributária, a fim de encontrar legitimidade social e afastar comportamentos de a imposição tributária, contribuindo para formação de uma sociedade economicamente desenvolvida.

Assim, podemos afirmar que, do mesmo modo que as diversas mudanças sociais, políticas e econômicas ocorridas ao longo dos últimos séculos influenciaram o papel do tributo na sociedade, a liberdade concedida ao contribuinte para realizar o planejamento tributário sofreu a influência dessa evolução. Por tais razões, é indissociável a função desempenhada pelo tributo na sociedade com os limites do planejamento tributário, pois a partir do momento que o tributo consegue promover a o bem-estar social, encontrando sua legitimidade social, a burla à imposição tributária deixa de ser um ato heroico e passa a ser considerada uma violação ao dever ético da vida em sociedade.

1.2 PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO: UM FENÔMENO INTERSISTÊMICO

O tema planejamento tributário transcende ao estudo estritamente jurídico49, pois o

tributo revela-se um fenômeno intersistêmico com pontos de intersecção no direito, na política e economia. Importante destacar, que cada sistema vai compreender as mensagens ao seu modo, sem prevalência de um sobre o outro, mantendo, contudo, a abertura necessária para as significações advindas de outros subsistemas50. Essa compreensão permite elaborar

indagações que auxiliam a convergência entre a justiça tributária e eficiência econômica.

46 GRECO, Marco Aurélio. Planejamento tributário. 3ª ed. São Paulo: Dialética, 2011, p. 45.

47 RAWLS, John. Uma teoria da justiça. Tradução Almiro Pisetta e Lenita M. R. Esteves. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

48 TIPKE, Klaus. op. cit., 2012.

49 ROLIM, João Dácio. Normas antielisivas tributárias. São Paulo: Dialética, 2001, p. 141.

(25)

Com isso, os problemas e soluções relacionados as consequências jurídicas dos atos ou negócios que visam a reduzir, postergar ou eliminar a incidência tributária não estão imunes ao contexto social, político e econômico. Ao contrário, as normas jurídicas são resultado da interpretação do texto (mundo do dever-ser) e dos elementos da realidade (mundo o ser), porquanto, segundo Eros Roberto Grau, “o interprete toma como objeto de compreensão também a realidade em cujo contexto dá-se a interpretação, no momento histórico em que ela se dá”51. Paulo de Barros Carvalho afirma que o sujeito do conhecimento

não “extrai” ou “descobre” o sentido que se achava oculto no texto. Ele o “constrói” em função de sua ideologia e, principalmente dentro dos limites de seu “mundo”, vale dizer, do seu universo de linguagem52. Nesse passo, os efeitos, a extensão, delimitação e oponibilidade

do planejamento tributário perante a administração tributária sofre influencia contexto social, político e econômico.

2. TEORIAS DE INTERPRETAÇÃO DO DIREITO E SUAS IMPLICAÇÕES

SOBRE A REGULAMENTAÇÃO DO PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO

A interpretação do direito é o primeiro passo do planejamento tributário, eis que a legalidade ou ilegalidade, legitimidade ou ilegitimidade, validade ou invalidade é constatada a partir das teorias que amparam a interpretação. O planejamento tributário compreendido como

51 GRAU, Roberto Eros. Por que tenho medo dos juízes (a interpretação/aplicação do direito e os princípios). São Paulo: Malheiros, 2013, p. 46.

(26)

técnica de organização preventiva de negócios, com a finalidade antecipar efeitos e as consequências jurídico-tributárias dos atos ou negócios que serão realizados, visando a uma lícita economia de tributos53, contempla, primordialmente, a interpretação.

A necessidade de interpretação do direito não se resume ao fato de que a linguagem jurídica é ambígua e imprecisa, carecendo de interpretação. Eros Roberto Grau afirma que “interpretamos para aplicar o direito e, ao fazê-lo, não nos limitamos a interpretar (=compreender) os textos normativos, mas também compreendemos (=interpretamos) a realidade e os fatos aos quais o direito há de ser aplicado”54. O texto normativo não contém

imediatamente a norma jurídica, é apenas uma fração da norma, eis que essa é construída pelo interprete no decorrer do processo de concretização do direito. A interpretação do direito, segundo Eros Roberto Grau, é um exercício constitutivo, não simplesmente declaratório, pois parte da compreensão do texto, da realidade e dos fatos, passa pela produção das normas que devem ser ponderadas para solução do caso e finda como a escolha de determinada solução, consignada na norma de decisão55. As normas, dessa forma, são construídas pelo interprete

após o processo de interpretação, composto por elementos fornecidos pelo texto, contexto histórico e pela realidade dos fatos, o que garante o dinamismo e adequação social do direito56.

53 TÔRRES, Heleno. Direito tributário e direito privado: autonomia privada: simulação: elusão tributária. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2003, p. 175.

54 GRAU, Roberto Eros. Por que tenho medo dos juízes (a interpretação/aplicação do direito e os princípios). São Paulo: Malheiros, 2013, p. 31.

55 Segundo Eros Roberto Grau “A interpretação, destarte, é meio de expressão dos conteúdos normativos das disposições, meio através do qual buscamos as normas contidas nas disposições. Do quê diremos ser – a interpretação atividade que se presta a transformar disposições (texto, enunciados) em normas. GRAU, Roberto Eros. op. cit, p. 32-38.

(27)

A interpretação das leis tributárias, como de todas as outras leis, vem ao longo dos anos sofrendo profundas transformações em decorrência da abertura de horizontes provocada pela hermenêutica filosófica, pelas teorias de argumentação, pela releitura das ideias de liberdade, justiça e segurança e, principalmente, pela inserção dos princípios e valores como vetores da interpretação. Nos dois últimos séculos, o direito tributário caracterizou-se pela escolha de métodos interpretativos que, em movimento pendular, ora se aliam claramente às posições favoráveis, ora às contrárias ao Fisco57. O pêndulo é influenciado pelas posições

ideológicas adotadas, alterando o paradigma tributário. As teorias que fundamentam a interpretação das normas jurídicas têm influência direta sobre o planejamento tributário, porquanto a correção material do planejamento é verificada a partir da ótica das teorias que fundamentam a interpretação das normas jurídicas.

Portanto, é relevante para o tema planejamento tributário o estudo das teorias que orientam a interpretação das normas jurídicas. Segundo Ricardo Lobo Torres, a interpretação do direito tributário se faz a partir das posições firmadas no campo da teoria geral da interpretação: a jurisprudência dos conceitos, a jurisprudência dos interesses e a jurisprudência dos valores58. Essa três expressões designam verdadeiras matrizes reguladoras

da compreensão do conceito de direito e de como este se orienta: “por conceitos normativos abstratos (Jurisprudência dos Conceitos), por interesses extraídos dos fatos sociais ou econômicos (Jurisprudência dos Interesses), ou por valores contidos em regras e princípios jurídicos (Jurisprudência dos Valores)”59. A compreensão das teorias de interpretação

constitui fundamento basilar para o estudo do tema planejamento tributário.

2.1 A TEORIA DA JURISPRUDÊNCIA DOS CONCEITOS

viii) a metodologia sistêmica privilegia a consideração das contínuas alterações do sistema jurídico e as características do sistema jurídica atual, no momento no qual a interpretação é processada; e ix) a interpretação, no quadro da ideologia dinâmica, é uma atividade criadora ex definitione. WRÓBLEWSKI, Jerzy. Constitución y teoría general de la interpretación jurídica. Tradução Arantxa Azurza. Madri, Civitas. Apud: GRAU, Roberto Eros. op. cit, p. 77-78.

57 RIBEIRO, Ricardo Lodi. TORRES, Ricardo Lobo (org.). Temas de interpretação do direito tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 332.

58 TORRES, Ricardo Lobo. Planejamento tributário: elisão abusiva e evasão fiscal. Rio de Janeiro: Elisevier, 2012, p. 11.

(28)

A jurisprudência dos conceitos é construção teórica formulada em decorrência das profundas alterações na estrutura econômica, política e social ocorrida a partir século XIX. A interpretação fundada na jurisprudência dos conceitos parte do pressuposto que os conceitos e as categorias jurídicas expressam plenamente a realidade social e econômica subjacente à norma60, de modo que não cabe ao intérprete buscar outros elementos além dos positivados. A

jurisprudência dos conceitos separa o direito e a moral, a fim de que a norma passa a ser o grande pilar do sistema jurídico. O papel da ciência jurídica, dessa forma, é o de verificar como suas proposições encontram-se reciprocamente condicionadas, por um meio de um processo de derivação que remonta à genealogia de cada uma61.

A teoria da jurisprudência dos conceitos tem o seu ponto de partida nas obras dos autores Frederich Carl Von Savigny e Gustavo Hugo, considerados os precursores do positivismo jurídico e que formaram na Alemanha a Escola Histórica do Direito. Segundo Norberto Bobbio, a Escola Histórica do Direito e o historicismo em geral, representavam uma crítica ao direito natural - conforme concebia o iluminismo62.

Conquanto, tenha sido nas obras de Frederich Carl Von Savigny e Gustavo Hugo o início da separação entre o direito e a moral, a jurisprudência dos conceitos teve o seu desenvolvimento com o jurista alemão Georg Friedrich Puchta. Segundo Karl Larenz, Puchta criou a pirâmide de conceitos, enfatizando o caráter lógico-dedutivo e hierarquicamente organizado do sistema jurídico, como desdobramento de conceitos e normas abstratas, da generalidade para a singularidade, em termos de uma totalidade fechada e completa. A ideia de Georg Friedrich Puchta de sistema tem como base um conceito geral e fundamental que ocupa o topo da pirâmide jurídica, sendo que a partir de um raciocínio formal lógico-dedutivo desse conceito, deduzem todos demais conceitos que integram o sistema normativo63.

A construção teórica da jurisprudência dos conceitos desenvolveu-se ao longo do século XIX e XX, com manifestações no positivismo e entre diversas outras correntes64, que

60 TORRES, Ricardo Lobo. Normas gerais antielisivas. Revista eletrônica de direito administrativo econômico. Salvador: Instituto de Direito Público da Bahia, nº 4, nov/dez, 2005. Disponível em <

http://www.direitodoestado.com/revista/REDAE-4-NOVEMBRO-2005-RICARDO%20LOBO%20TORRES.pdf>. Acessa do em 19.10.2012, p. 2.

61CAMARGO, Margarida Maria Lacombe .Hermenêutica e Argumentação: uma contribuição ao estudo do direito. 3º ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 87.

62 BOBBIO, Noberto. O positivismo jurídico: lições de filosofia do direito. Tradução de Márcio Pugliesi, Edson Bini, Carlos E. Rodrigues. São Paulo: Ícone, 1995, p.53.

63 LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 3ª ed. Tradução José Lamego. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, p. 22-25.

(29)

embora guardem suas distinções históricas, de uma forma ou de outra se identificam pelo corte entre o direito e a moral, reduzindo a realidade jurídica à lei65.

Hans Kelsen, no inicio do século XX, desenvolveu uma teoria jurídica pura, o maior exemplo de construção lógico-estrutural do ordenamento jurídico até o momento66. Teoria

jurídica consciente da especificidade do seu objeto, de modo separar a psicologia e a sociologia, a ética e a teoria política do estudo do direito, aproximando-se tanto quanto possível aos resultados do ideal de toda a ciência: objetividade e exatidão67. Hans Kelsen

elabora a ideia de que existe uma norma pressuposta que confere validade a toda ordem jurídica - Grundnorm, e que autoriza o ato emanado de outra norma inferior, formando um sistema dinâmico de normas. Essa concepção compreende que o direito seria um sistema lógico fechado e coerente de regras da qual a decisão jurídica correta sempre poderia ser inferida lógica e autonomamente do direito posto68. Portanto, a interpretação

jurídico-científica não pode fazer outra coisa senão estabelecer as possíveis significações de uma norma jurídica69. A jurisprudência dos conceitos garante a designada justiça formal,

sustentada na lei, relacionada diretamente aos valores da ordem e da segurança jurídica70.

As formulações teóricas da jurisprudência dos conceitos refletiram sobre o direito tributário, pois em nome da segurança jurídica a legalidade tributária passa exigir uma reserva de lei qualificada até mesmo sobre o conteúdo das decisões administrativas, limitando a interpretação à literalidade da regra tributária. Nesse passo, a legalidade da tributação passa a se manifestar pelo princípio da tipicidade da tributação, de modo que todos os elementos integrantes do tipo tributário sejam precisos e determinados na sua formulação legal, a fim de que o órgão de aplicação do direito não possa introduzir critérios subjetivos na sua aplicação concreta71.

O princípio da tipicidade tributária tem por finalidade garantir a segurança jurídica e estabilidade nas relações entre o contribuinte e o Estado, sobretudo, constitui uma proteção do contribuinte em relação ao poder tributário do Estado, na medida em que afasta qualquer

65 RIBEIRO, Ricardo Lodi A segurança jurídica do contribuinte da Idade Média à crise do Estado-Nação. Disponível em: <https://lw13468781785047b925.websiteseguro.com/wp-content/uploads/2012/11/ricardo_lodi.pdf>. Acessado em 20.02.2013.

66CAMARGO, Margarida Maria Lacombe .Hermenêutica e Argumentação: uma contribuição ao estudo do direito. 3º ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 101.

67 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução João Baptista Machado. 6ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 1.

68 GICO JR. Ivo T. Metodologia e Epistemologia da Análise Econômica do Direito. In: GICO JR. Ivo T, SILVA JÚNIOR, Gilson Geraldino da (Org.). Economic Analisys of Law Review: v. 2. n. 1. 1 ed. Brasília: Universa, 2011, p. 4.

69 KELSEN, Hans. op. cit., p. 250.

70CAMARGO, Margarida Maria Lacombe .op. cit., p. 61.

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subjetividade na aplicação e na interpretação do direito tributário. A tipicidade em matéria tributária, liberta de interpretações teológicas ou metafísicas, concede prevalência à liberdade de opção fiscal.

Os efetivos dessa concepção teórica sobre a liberdade do contribuinte realizar planejamento tributário são de grande relevância, porquanto concedem um direito absoluto ao contribuinte de se mover livremente para além das zonas rigidamente demarcadas pelos tipos legais de tributos, sendo que as únicas consequências tributárias serão àquelas que resultam taxativamente da lei72. Por essa concepção teórica, a ilicitude do planejamento é verificada

caso ocorra à prática de violação à lei, tais como simulação, dolo, fraude e sonegação.

Assim, pouco importa que ato e negócio jurídicos realizados tenham o único objetivo de mitigar ou eliminar o ônus fiscal, o que deve ser verificado é se houve a subsunção do fato à hipótese normativa, pois o contribuinte tem liberdade absoluta para criar estruturas e praticar atos que evitem a incidência tributária, desde que respeitada a lei.

Essa linha teórica recebe fortes críticas em decorrência das distorções que provoca ao tolerar condutas que visam a burlar a legislação tributária e da perda de arrecadação do Estado.

2.2 A TEORIA DA JURISPRUDÊNCIA DOS INTERESSES

A jurisprudência dos interesses tem seu ponto de partida com Rudolf Von Jhering, antes um dos principais teóricos da jurisprudência dos conceitos. Jhering passou a lançar críticas contundentes ao método lógico-dedutivo e ao formalismo jurídico73, a partir do que

designava de doutrina de utilitarismo social. Karl Larenz afirma que Rudolf Von Jhering contribuiu para evolução da ciência do direito, ao reconhecer que toda a proposição jurídica tem necessariamente de ser vista também na sua função social74.

Com Tübingen, Philipp Heck, a jurisprudência dos interesses se desenvolve em reação ao formalismo da jurisprudência dos conceitos. Tem como pano de fundo a ascensão do Estado Social em face do individualismo do Estado Liberal, situando-se entre as

72 XAVIER, Alberto. op. cit., p. 32.

73CAMARGO, Margarida Maria Lacombe.Hermenêutica e Argumentação: uma contribuição ao estudo do direito. 3º ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 90.

(31)

tendências formalistas tradicionais e as ideias sociológicas renovadoras que surgiam na Europa.

O movimento sociológico do inicio do século XX, promoveu uma revisão no pensamento jurídico defendido pelos liberais, superando uma interpretação formalista do direito. A jurisprudência dos interesses apresenta o direito como instrumento voltado à realização dos interesses sociais, permitindo a integração do discurso jurídico aos elementos sociais, econômicos, morais que eram rejeitados pelo positivismo legalista dominante75.

Para Karl Larenz, a jurisprudência dos interesses, com sua afirmação justeorética fundamental, considera o direito como tutela de interesses. Os preceitos legislativos que constituem essencialmente o direito “não visam apenas delimitar interesses, mas são, em si próprios, produtos de interesses”76. A norma deixa de ser o centro da problemática jurídica,

como anteriormente sustentava o positivismo formalista, passando para os fatos históricos, sociais ou econômicos77. Karl Larenz ressalta que, embora a jurisprudência dos interesses não

ultrapassasse verdadeiramente os limites do positivismo, teve uma atuação libertadora e fecunda, possibilitando o desenvolvimento do direito não apenas na fidelidade da lei, mas em harmonia com as necessidades da vida78.

A intromissão da concepção teórica dos interesses no direito tributário teve vários reflexos na liberdade concedida ao contribuinte realizar planejamentos tributários. A inserção de elementos econômicos, sociais e morais ao discurso jurídico, permitiu o surgimento da designada interpretação econômica do fato gerador (Alemanha) e da interpretação funcional do direito tributário (Itália), que proclamavam uma autonomia do direito tributário em relação ao direito privado.

A interpretação econômica do fato gerador foi desenvolvida na Alemanha por Albert Hensel e Enno Becker, este autor do anteprojeto do Código Tributário Alemão de 1919. Com esse critério de interpretação do direito tributário, o Estado pode desconsiderar o planejamento tributário realizado pelo contribuinte quando verificada a sua capacidade econômica. A incidência da norma tributária passa a ser associada ao conteúdo econômico, de

75Alexandre Araújo Costa acrescenta que: “Essa tentativa de harmonizar o discurso legalista a certos aspectos sociológicos deu origem a uma concepção não de abandono nem de superação à lei, mas a aplicação do direito positivo dentro de parâmetros socialmente adequados” COSTA, Alexandre Araújo. Direito e método: diálogos entre a hermenêutica filosófica e a hermenêutica jurídica. Tese de doutoramento em direito. Faculdade de direito da Universidade de Brasília. Brasília, 2008.

76LARENZ, op. cit., p 65.

77 RIBEIRO, Ricardo Lodi A segurança jurídica do contribuinte da Idade Média à crise do Estado-Nação. Disponível em: <https://lw13468781785047b925.websiteseguro.com/wp-content/uploads/2012/11/ricardo_lodi.pdf>. Acessado em 20.02.2013.

(32)

modo que mesmo que o ato ou negócio do contribuinte não se adéque ao previsto na hipótese tributária, mas tenha o mesmo resultado econômico previsto na norma, o Estado pode exigir o pagamento do tributo.

A interpretação econômica em direito tributário surgiu quando a Alemanha passava por profunda crise social, política e econômica causada pela primeira guerra mundial. O Estado Alemão precisava de recursos financeiros para sua reconstrução e para financiar os direitos sociais criados pela Constituição alemã de Weimar de 1919. Assim, em razão dessas circunstâncias, Enno Becker, quando da elaboração da Codificação Tributária Alemã, inseriu o critério de interpretação econômica das leis tributárias79, a fim de aumentar a arrecadação

tributária para custear as despesas do Welfare State ou Estado Providência e garantir a incidência tributária a partir da capacidade econômica.

A interpretação econômica do fato gerador desconsidera os planejamentos tributários e se utiliza de analogia exigir o pagamento de tributos. Conforme Aurélio Pitanga Seixas Filho, a interpretação econômica em direito tributário constitui uma forma de a autoridade fiscal, no exercício de sua potestade administrativa de exigir o pagamento do tributo, efetivar o lançamento tributário com base na real ou verdadeira atividade econômica praticada pelo contribuinte80. Assim, por esse critério, o que importa para a incidência da norma tributária é

a primazia da realidade econômica sobre a forma, concedendo prevalência da capacidade econômica sobre a legalidade e a segurança jurídica.

Na Itália, a jurisprudência dos interesses criou a Interpretação Funcional do Direito Tributário, Escola de Pavia, desenvolvida por Benvenuto Griziotti e integrada por Dino Jarach, Ezio Vanoni, Antonio Pesenti, entre outros. A Interpretação Funcional do Direito Tributário investigava a causa da imposição tributária e os seus elementos constitutivos, a partir da dialética entre os elementos políticos, econômicos e jurídicos, a fim de integrar o fenômeno financeiro ao direito tributário. A referida escola considera que o direito tributário tem finalidades próprias e atende a interesses distintos daqueles protegidos pelo direito privado, pois é dirigida ao dever de contribuir para o financiamento dos gastos públicos. Assim, deve-se interpretar e aplicar a hipótese de incidência tributária a partir das relações

79 O §4º do Código Tributário Alemão de 1919 tinha a seguinte redação: “Na interpretação das leis tributárias deve-se considerar seu escopo, o significado econômico e a evolução das situações de fato”. TÔRRES, Heleno. Direito tributário e direito privado: autonomia privada: simulação: elusão tributária. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2003, p. 208.

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