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Ô do mar: processo de criação inspirado no encontro com pescadores de Macau/RN

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

DEPARTAMENTO DE ARTES LICENCIATURA EM TEATRO

MAX KENNEDY COSTA SOUZA

Ô DO MAR: processo de criação inspirado no encontro com pescadores de Macau/RN

NATAL/RN 2018

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Ô DO MAR: processo de criação inspirado no encontro com pescadores de Macau/RN

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado no curso de Licenciatura em Teatro, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, requisito obrigatório para aquisição do título de Licenciado em Teatro.

Orientação: Professora Drª. Melissa dos Santos Lopes.

NATAL/RN 2018

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Departamento de Artes - DEART

Souza, Max Kennedy Costa.

Ô do Mar : processo de criação inspirado no encontro com pescadores de Macau/RN / Max Kennedy Costa Souza. - 2018. 76 f.: il.

Monografia (licenciatura) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Licenciatura em Teatro, Natal, 2018.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Melissa dos Santos Lopes. 1. Processo de criação. 2. Personagens. 3. Histórias de pescador. I. Lopes, Melissa dos Santos. II. Título.

RN/UF/BS-DEART CDU 792.02

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Ao meu avô, Cícero Guiló, por me inspirar o mar e apresentar as primeiras histórias de pescas juntamente com minha avó, Maria da Penha. Aos meus pais, Valdemir Nunes e Norma Cléia, meu porto seguro, pelo incentivo, apoio e amor. A minha esposa, Ana Carla, por ser uma excelente parceira de viagem e meu porto seguro na vida. Ao meu Grupo de Teatro Amagoa por ser o grande navio dessa viagem.

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Primeiramente a Deus, minha âncora e meu farol, por me propor momentos e encontros lindos através do teatro.

À minha orientadora, Melissa Lopes, por ter acreditado em mim e neste trabalho, além de ter sido bússola nas horas em que mais me encontrei perdido.

A todos os funcionários e professores do Departamento de Artes, em especial aos professores André Carrico, Mayra Montenegro, Laura Figueiredo, Ana Caldas, Jefferson Fernandes, Karyne Dias, José Sávio, Makarios Maia e Carla Martins.

Ao professor e amigo macauense, Tião Maia pelo grande incentivo à minha formação.

Aos artistas da Cia. Amagoa de Teatro, em especial a Jardel Amorim, Zezinho Lopes, Raniere Santos, Johnny Silva e Hans Grazzyany, meus parceiros de grupo.

Aos pescadores Raimundo, João Batista, Sueli e meu avô Cícero Guiló, pela grande atenção e pelo encontro inspirador a esta pesquisa.

Ao fotógrafo amigo João Marcos Oliveira por acompanhar e registrar meu encontro com os pescadores.

Às amigas Erilania Karla e Izamara Ketillin pela grande contribuição na produção do espetáculo “Ô do Mar”.

Ao amigo Rafael Alves, pela grande parceria de trabalho e pela contribuição com som e luz do espetáculo.

À Samara Batista, pelo apoio e contribuição ao figurino do espetáculo. À amiga Alanna Silva, pelo incentivo e carinho a este trabalho.

Aos amigos blogueiros e fotógrafos Jailton Silva, Robson Dantas, Adriano Oliveira, Micarla Oliveira e Arafran Soares, pelo grande apoio na divulgação do espetáculo.

Aos radialistas João Maria Albano e Gilson Barbosa da 87,9 FM, Arafran Soares, Chico Paraiba e Irineu Candido da 94,9 FM, pela oportunidade em compartilhar minha pesquisa com os macauenses num bonito bate-papo.

Às minhas irmãs, Monique Costa e Talita Cléia pelo carinho, amor e incentivo. À minha avó, Maria Aparecida por toda sua dedicação e cuidado com todos nós da família.

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período.

Aos meus líderes espirituais Prª Verônica Gomes e o Miss. Gelvane Batista, pelo apoio, palavras de incentivo e acompanhamento.

Aos amigos, Wandeson Alves, Fátima Régis (Fafá), Mafaldo Pinto, Maria Márcia e Bruno Barbosa pelas conversas e desabafos no Deart.

Aos amantes de Macau, Getúlio Moura, Edinho Queirós e Herbert Martins, por me inspirar a respirar essa terra salineira.

Aos amigos, Sérgio Leonardo e família, Eriberto Lima e família, Jaime Mello e família, Rodrigo Dias e família, Wilson Júnior e Família, Diego Moura e família, por todo o apoio e companheirismo durante minha permanência em Natal.

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Esta monografia trata do processo de criação do espetáculo teatral “Ô do Mar”, inspirado no meu encontro com os pescadores de Macau/RN. A montagem cênica nasce do meu reencontro com a minha cidade natal e com as minhas “raízes” teatrais. Este processo criativo tem como base a observação e as histórias e depoimentos de trabalhadores do mar. Para elaboração das personagens me apoiei em algumas metodologias, a saber, do ator e encenador russo, Constantin Stanislavski e a Mímesis Corpórea, desenvolvida pelo Grupo LUME Teatro (Campinas/SP). Tanto a escrita quanto o trabalho artístico também foram atravessados pelo universo literário, contos, poemas e músicas macauenses.

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This monograph deals with the process of creating the theater play "Ô do Mar", inspired by my meeting with the fishermen of Macau / RN. The theatrical production borns from the reunion with my hometown and my theatrical "roots". This creative process is based on the observation of the stories and testimonies of sea workers. For the characters building I relied on some methodologies, namely the Russian actor and director, Constantin Stanislavski and Corporeal Mimesis, developed by Lume Teatro group (Campinas / SP). Both the writing and the artistic work were also crossed by the literary universe, short stories, poems and songs from Macau.

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INTRODUÇÃO ... 11

CAPÍTULO 01 – O MENINO E O MAR DE TEATRO ... 16

1.1 MEU ENCONTRO COM O TEATRO EM MACAU ... 16

1.2 O CONTEXTO DA PESCARIA EM MACAU ... 27

1.3 MEU ENCONTRO COM OS PESCADORES ... 33

CAPÍTULO 2 – O MAR INVADE A CENA ... 41

2.1 ELABORAÇÃO DE PERSONAGENS ... 41

2.1.1 A observação ... 42

2.1.2 Registro de material ... 44

2.1.3 O surgimento de cada personagem ... 46

2.2 AS HISTÓRIAS QUE FORAM FISGADAS... 55

2.3 A EMBARCAÇÃO COMPLETA: ENSAIOS, CENÁRIO, FIGURINO, ILUMINAÇÃO, SONOPLASTIA ... 58

2.4 Ô DO MAR - CONVERSAS DE PESCADOR ... 68

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 73

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Figura 01: Sr. João, um antigo pescador de Macau com muitas histórias

para contar ... 49

Figura 02: Material de pesquisa. A marisqueira Sueli relatando suas histórias ... 51

Figura 03: Material de pesquisa. Na ordem: João batista (Galego) e Raimundo ... 52

Figura 04: Material de pesquisa. Criança brincando ... 54

Figura 05: Material de pesquisa. Crianças brincando ... 54

Figura 06: Material de pesquisa. Pipa ... 55

Figura 07: Registro do cenário no ensaio aberto do espetáculo em Macau/RN, em 27 ago. 2018 ... 60

Figura 08: Registro do cenário no ensaio aberto do espetáculo em Macau/RN, em 27 ago. 2018 ... 60

Figura 09: Registro do ensaio aberto do espetáculo em Macau/RN, em 27 ago. 2018 ... 61

Figura 10: Registro do ensaio aberto do espetáculo em Macau/RN, em 28 ago. 2018 ... 62

Figura 11: Registro do ensaio aberto do espetáculo em Macau/RN, em 28 ago. 2018 ... 62

Figura 12: Registro do ensaio aberto do espetáculo em Macau/RN, em 27 ago. 2018 ... 63

Figura 13: Registro do ensaio aberto do espetáculo em Macau/RN, em 28 ago. 2018 ... 64

Figura 14: Registro do ensaio aberto do espetáculo em Macau/RN, em 28 ago. 2018. ... 65

Figura 15: Registro do ensaio aberto do espetáculo em Macau/RN, em 28 ago. 2018 ... 66

Figura 16: Registro do ensaio aberto do espetáculo em Macau/RN, em 28 ago. 2018 ... 67

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INTRODUÇÃO

“Canta tua aldeia e cantarás o mundo.”

Liev Tolstói

Sempre fui uma pessoa apaixonada por minha aldeia, pela minha linda cidade, meu porto, meu cais. Nela cantei as melhores músicas, vivi muitas emoções. Mas, agora, faltava cantar o mundo; faltava lançar as redes em outros mares. E assim, eu fiz. Por isso, estou escrevendo essa monografia. Permita-me apresentar. Meu nome é Max Kennedy, nasci e cresci em Macau, cidade do interior do Rio Grande do Norte que tem cerca de 35.000 habitantes.

Foi em Macau que tive meu primeiro contato com teatro, aos sete anos de idade. Meu pai, Valdemir Nunes foi meu primeiro professor e continua sendo, porque até hoje trabalhamos juntos na Cia. de Teatro Amagoa. A Cia. fundada em 22 de agosto do ano de 2000 é voltada para produção, organização e promoção de espetáculos artísticos e eventos culturais e tem como objetivo promover o desenvolvimento, a difusão e o fortalecimento das artes e da cultura brasileira (CIA. AMAGOA, 2016).

Dentro do Grupo, sou ator e diretor teatral e meu pai cuida da parte financeira e da circulação das produções culturais. Antes, se tratava apenas de um grupo amador. Hoje, além de ser uma produtora cultural, é também uma escola de formação em Artes. Durante quinze anos me dediquei ao grupo, até que decidi dar um passo maior.

Toda minha vivência teatral estava limitada ao grupo, eu precisava buscar uma formação acadêmica não só para contribuir ainda mais com o trabalho que fazíamos, mas também para que eu mesmo pudesse me aprofundar e ter mais referências sobre o fazer teatral. Foi então que em 2015 mudei-me para Natal/RN, para cursar a graduação em Licenciatura em Teatro.

E, aqui estou eu, quase 4 anos em alto mar, à deriva, longe do cais, lançando minha vara de pescar em outros mares, para poder retornar para casa com a cesta cheia de peixes. Durante esse tempo, posso afirmar que foi uma grande viagem, longa e que por vezes, enfrentei grandes tempestades. Contudo, tenho certeza que estou no caminho certo, afinal, mar calmo nunca fez um bom marinheiro.

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Saí de Macau para Natal com minha bússola e na bagagem levei todo meu conhecimento sobre teatro popular. Contudo, quando cheguei ao porto, ou melhor, ao curso, percebi que o teatro popular, ao qual eu estava acostumado não era presente no curso, pelo menos de forma direta. Tamanho foi o meu susto quando percebi que o teatro que era feito na universidade, não tinha um “sabor” familiar. O peixe tinha outro sabor, era mais requintado. Com apenas dois anos e meio de curso e, assim como todo pescador, veio a saudade de casa, a saudade da família e, principalmente, do teatro que fazia por lá.

Esta saudade veio como uma provocação difícil, mas desafiadora. No final de 2016, ainda com meu barco atracado em Natal, resolvi dar um mergulho rápido de volta ao teatro que eu fazia em Macau. A busca era me encontrar novamente e reencontrar o que me motivou a escolher o teatro como profissão. Este mergulho profundo me proporcionou reencontros, emoções, que foram fundamentais para que eu pudesse dar meus próximos saltos.

Voltar a este teatro foi mais do que um retorno ao teatro popular. Foi necessário relembrar minha trajetória, meus primeiros contatos com o teatro, o contexto cultural de Macau, para me fortalecer e entender que teatro era esse que eu estava sentindo falta e assim, dar seguimento a minha formação acadêmica.

A formação de cada indivíduo é muito influenciada pelo meio em que estamos inseridos e a respectiva cultura deste lugar. Antes da Universidade, só havia morado em Macau e meu vínculo com teatro estava atrelado a meu núcleo familiar. Minha primeira formação teatral era muito intuitiva e foi sendo aperfeiçoada através de oficinas teatrais que participei e estudos pessoais movidos pela curiosidade. Além disso, meu teatro tinha muita influência das manifestações populares de Macau porque eram estas experiências as quais eu tinha acesso como espectador.

Na Universidade, quanto mais me distanciava das manifestações populares, e isso se deve a boa parte do curso se dedicar ao estudo de encenadores pedagogos, em sua maioria, europeus, mais eu ficava intrigado e frustrado com os novos aprendizados. Ao mesmo tempo, ouvia de meus professores, que todo o aprendizado deveria somar a experiência vivida com o conhecimento adquirido em sala de aula. Então, reconheço que em alguns momentos fui resistente ao aprendizado de novas linguagens.

Diante disso, com a oportunidade de pensar um tema para escrever meu trabalho de conclusão de curso, resolvi voltar às minhas origens. E, a partir desta

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ideia de somar experiências tomei a decisão de elaborar um espetáculo que retratasse a minha trajetória de vida e que dialogasse com tudo aquilo que vivi e aprendi durante o curso de teatro.

Portanto, esta monografia busca refletir sobre o processo de criação do espetáculo “Ô do Mar”. A peça retrata depoimentos de pescadores que pude ter contato por meio de entrevistas realizadas no Porto da Pescaria em Macau e de alguns relatos de pescadores que estão no livro “Um Rio Grande e Macau” (2003) do artista, fotógrafo, músico e escritor, Getúlio Moura.

O tema do espetáculo nasceu muito inspirado nos processos de criação da Cia Amagoa, que sempre foram criados, tendo como ponto de partida, contos, lendas, canções, poesias e pessoas que retratam a realidade de Macau. Para esta pesquisa decidi manter esse princípio e fui a campo encontrar pescadores de Macau. A escolha por esta categoria deve-se ao fato de que meu avô é pescador e esse universo tão familiar me acompanha desde a infância até os dias de hoje.

Outro fator importante desta pesquisa está no resgate das histórias vivenciadas por estes pescadores. Resgatar e transmitir estas memórias através de uma encenação é acima de tudo dar voz a esta comunidade e valorizar este sujeito que é base de seu próprio sustento, assim como seu modo de sobrevivência.

Sendo assim, minha investigação é justamente compreender como o encontro com os pescadores foi essencial para a elaboração da dramaturgia e criação de personagens e cenas. Mais especificamente, o que fazer com este material investigado? Como transpor tudo isto para a cena? Como representar estas pessoas através da observação de ações? Como apresentar cenograficamente, Macau em um palco?

A estrutura do texto está organizada da seguinte forma: no primeiro capítulo falo sobre minha trajetória teatral até chegar no encontro com os pescadores. Para isto, faço um relato sobre o teatro que é feito na cidade de Macau. Esta informação se faz importante porque é peça chave para a compreensão de meu percurso artístico, desde os primeiros ensinamentos à criação do meu grupo de teatro, até meu ingresso no curso de Licenciatura em Teatro.

Em seguida, fez-se necessário contextualizar a cidade de Macau, e, por conseguinte, o modo de vida dos pescadores. Considero importante apresentar esse lugar, e desta forma entender de onde vim e que por muitas vezes serviu de base para o meu fazer teatral. E finalmente, fechando o primeiro capítulo, trago

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relatos sobre o meu encontro com os pescadores. Como foi voltar nesta comunidade e sentar com eles para ouvir suas várias histórias de pesca no alto mar e da vida, partilhar um pouco as impressões e reações que tive nesses encontros.

No segundo capítulo, apresento meu relato de experiência sobre o processo de criação do espetáculo. A investigação do trabalho se deu a partir da observação e encontros com pescadores. Este material serviu de base para elaboração das personagens, das cenas e da dramaturgia. Por fim, como o espetáculo estreou em Macau, no mês de julho de 2018, considero importante partilhar alguns relatos e depoimentos de espectadores que acompanharam os ensaios abertos e algumas apresentações do trabalho.

No que diz respeito à metodologia utilizada na pesquisa, trarei o processo de observação fazendo um paralelo com a metodologia desenvolvida pelo Núcleo Interdisciplinar de Pesquisas Teatrais da Unicamp – LUME Teatro (Campinas/SP)1. Grupo este que desenvolve a Mimesis Corpórea, prática teatral que consiste na construção de personagens, a partir da observação de pessoas do cotidiano, imagens (quadros e fotos) e animais2.

Para somar às investigações sobre a personagem, também me aproximei da metodologia do ator e encenador russo, Constantin Stanislavski (1863-1938).

Além desta referência teatral, meu trabalho também foi atravessado pelo universo literário. Ao longo da pesquisa tive contato com alguns contos do autor moçambicano Mia Couto, depoimentos do navegador brasileiro Amyr Klink e o romance “O velho e o mar”, do autor inglês, Ernest Hemingway, cuja abordagem revela o universo de pescadores. O contato com essa literatura foi muito importante para o desenvolvimento da pesquisa prática.

Compartilho da ideia de que cada ator e/ou atriz precisa encontrar em si o seu teatro, mapear sua trajetória e voltar às origens sempre que necessário. Pois, essa

1

O LUME é um coletivo de sete atores que se tornou referência nacional e internacional para artistas e pesquisadores, principalmente com relação aos princípios técnicos e éticos do ofício de ator. “[...] O grupo difunde sua arte e metodologia por meio de oficinas, demonstrações técnicas, intercâmbios de trabalho, trocas culturais, assessorias, reflexões teóricas e projetos itinerantes, que celebram o teatro como a arte do encontro” (LUME TEATRO, 2014, n.p.).

2 Do site do Lume: “A Mímesis Corpórea é uma metodologia de criação de ações físicas e vocais -

desenvolvida pelo LUME Teatro - que busca a poetização e teatralização dos encontros afetivos entre um atuador-observador e corpos/matérias/imagens. O pressuposto da Mímesis Corpórea é que esse encontro potencialize a transformação e recriação do corpo singular daquele que atua-observa” (LUME TEATRO, 2014, n.p.).

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compreensão redimensiona a formação artística de cada artista. Espero que este trabalho revele a minha aldeia, assim como na citação que abre essa Introdução.

Quanto ao amigo leitor, fica o meu desejo de uma boa viagem nesse mar de teatro que mudou completamente minha forma de lançar as redes e colher os bons peixes da vida. Que comece a jornada pelo mar da pesquisa.

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CAPÍTULO 01 – O MENINO E O MAR DE TEATRO

1.1 MEU ENCONTRO COM O TEATRO EM MACAU

Costumo sempre dizer que o teatro em minha vida vem de berço. Tudo começou com meu pai, Valdemir Nunes. Em sua juventude sempre foi uma pessoa dedicada ao movimento estudantil. Em 1987 foi criado em Macau a AMES,

Associação Macauense dos Estudantes Secundaristas3, na qual meu pai se

candidatou como presidente da entidade e foi eleito começando seu mandato no ano seguinte.

Quando a AMES foi criada, o grupo de teatro Flocos foi a primeira ação artística, realizada pela entidade. Este grupo foi criado não só com o intuito de promover ações culturais para os estudantes, mas também para através do teatro abordar temas que dialogassem com o contexto social da cidade.

Em seguida, a associação conseguiu levar para Macau junto à Secretaria de

Educação do Estado, através da Subcoordenadoria de Atividades Culturais (SAC),

duas oficinas de Teatro, que foram ministradas por dois professores da classe teatral de Natal/RN. Depois de fazer convocação dos estudantes, a AMES conseguiu obter um bom número de alunos da rede municipal para participarem da oficina. Ao final da mesma, os alunos que participaram das duas oficinas resolvem dar continuidade ao fazer teatral na cidade e assim formaram dois grupos, o Sonho Dourado da Escola Municipal Pe. João Penha Filho e o Fantasia da Escola Municipal Edinor Avelino.

Nessa época, os membros do antigo grupo FLOCO’S se dividiram nestes dois novos grupos. Foi graças a esta oportunidade, que minha mãe Norma Cléia, que era aluna da Escola Municipal ingressou nestas oficinas e passou a participar das práticas teatrais da cidade.

3

A AMES é uma associação representativa dos estudantes de Macau. Sua diretoria pode ser eleita por votação de todos os alunos da rede escolar através de uma eleição. A eles compete elaborar planos de exercícios e tomada de decisões, comunicação e interação com todos os alunos das escolas da cidade, fiscalização das contas, promover ações em prol dos estudantes, entre outros.

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Aqui começa a trajetória teatral em Macau, que segue até os dias de hoje. Claro que anterior a isto existiram algumas expressões teatrais, até mesmo por Macau sempre ter sido uma cidade rica em manifestações da cultura popular. Entretanto, enquanto formação de grupos de teatro, acredito que seja aqui o início das manifestações teatrais propriamente dita. Durante a pesquisa, busquei registros de grupos anteriores a estes e não encontrei nenhum material4.

Embora estes grupos fossem caracterizados como amadores foi nesse período que surgiram as primeiras organizações teatrais. Estes grupos começaram a apresentar peças e esquetes em Macau, baseadas em improvisações dos próprios atores. Por meio destas primeiras experiências, participaram de eventos em escolas, apresentações comunitárias, entre outras.

Em 1990, surgiu a oportunidade destes grupos se inscreverem e participarem de um festival de teatro no campus universitário da UFRN em Natal. O evento foi promovido pela Secretaria de Educação do Estado e foi responsável por lançar alguns nomes do teatro macauense, tais como: Tião Maia, Secretário de Cultura da época. Maia incentivou e apoiou a criação de grupos e posteriormente, ingressou no curso de Educação Artística com Habilitação em Artes Cênicas, da UFRN; Francisco

Filgueira, diretor do grupo “Fantasia” e que foi secretário da AMES; a Professora Ivanise Ribeiro, do Grupo “Fantasia”, que além de atuar, revisava os textos

trabalhados; Humberto Pinheiro, Presidente do Grêmio da Escola Pe. João Penha Filho e um dos fundadores do grupo “Sonho Dourado”, do qual também foi ator;

Graciene Morais, também coordenadora do “Sonho Dourado” e atriz; Herbert Martins

que além de coordenar o “Sonho Dourado”, atuava e dirigia algumas cenas; e claro,

Valdemir Nunes, que também começou incentivando os dois grupos como

Presidente da AMES e mais à frente passou a escrever peças, dirigir e atuar.

Com o fim de seu mandato no movimento estudantil da AMES em 1990, meu pai se dedicou apenas ao movimento comunitário e cultural, quando fundou um grupo de jovens chamado “União da Juventude Macauense”, que durou apenas um ano. Neste período, veio meu nascimento em 12 de outubro de 1990.

Meu pai havia escrito uma peça chamada “Dores e Paixão”, em 1988 para atender um convite da cidade de Guamaré/RN. A peça conta a história do amor

4

Boa parte deste levantamento histórico foi extraído, de conversas que tive com meu pai, Valdemir Nunes, que atualmente é produtor cultural, presidente da CEMOP e ex-presidente da Fundação Municipal de Cultura. Já são 30 anos dedicados a cultura de Macau. Todas as conversa foram gravadas e serviram de material para a elaboração dessa escrita.

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entre dois jovens, que por diferença de classe social e cor de pele, são impedidos de ficarem juntos pelo pai da garota. Esta foi a primeira peça que meu pai escreveu para o teatro e além da dramaturgia, meu pai dirigiu e atuou no espetáculo. O protagonista da peça se chamava Max e meu pai ganhou um grande destaque ao interpretá-lo. Quando eu nasci, meu pai não teve dúvida e colocou em mim o nome de Max, em homenagem a importância que essa peça teve em sua vida.

Em 31 de Julho de 1991, meu pai funda em Macau com alguns amigos do movimento comunitário, a entidade CEMOP, Centro de Mobilização Popular5. Esta entidade começa a desenvolver um movimento cultural fortíssimo em Macau, através da realização de eventos comunitários em prol de campanhas de gêneros alimentícios e agasalhos. Neste período surge mais um grupo através do CEMOP, que ficou conhecido como “Nova Era”, que trabalhava em suas peças dança dramática.

Eu cresci junto ao movimento comunitário e cultural do CEMOP. Esta entidade ajudou a expandir a cultura de Macau e região, nos idos de 91 a 96, e revelou novos talentos na cidade. Mesmo criança, eu sempre era levado para as programações e viagens da entidade, uma vez que toda a família era engajada nas apresentações. Minhas irmãs, Talita Cléia e Monique Costa, já dançavam no Grupo

de Dança Mirim do CEMOP. Meu pai passou apenas a coordenar as atividades

como presidente do CEMOP, a escrever e a dirigir peças. Minha mãe, além de cuidar de todos nós nas viagens, era a oradora da entidade e ainda atuava como atriz em algumas encenações Eu era o único a ficar somente na plateia por ser ainda muito novo. Ainda conservo em minha mente as várias noites de apresentações do CEMOP. Lembro das apresentações do palhaço e comediante

Edicharles Bezerra, pois quando ele começava a se apresentar, eu fechava os olhos

e me tremia de medo de sua performance. Mas, mesmo temendo, quando me perguntavam o que eu queria ser quando crescer eu respondia de prontidão: “Paiaço!”.

Em 1997 meu pai foi convidado para assumir o cargo de Diretor de Eventos Culturais do município. O objetivo era auxiliar o Coordenador Cultural Véscio Lisboa, o Subhadro como era chamado na época. O prefeito em questão era José Antônio

de Menezes Sousa, que investiu bastante na cultura e nos artistas da cidade de

5

Trata-se de uma entidade sem fins lucrativos, reconhecida pela Lei de Utilidade Pública, que através de ações culturais fazem campanhas beneficentes em prol de pessoas e comunidades carentes.

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Macau. Foi neste período que a cidade começou a ser destaque no Estado por suas manifestações artísticas. E é neste momento que eu começo a ter meus primeiros contatos fazendo teatro.

Entre 1997 e 1998, meu pai começou a ministrar aulas de teatro na COHAB, uma comunidade que pertence à Macau e que era o lugar onde nossa família morava. Esta comunidade fica à 10km da cidade e portanto as oficinas eram ministradas no Conselho Comunitário da mesma. Todas as noites eu acompanhava as aulas e me divertia como espectador, assistindo os alunos participando dos jogos teatrais.

Em seguida, esse grupo de alunos fez a montagem da peça, “Fel de Menino de Rua”, de autoria e direção de Valdemir Nunes. Lembro-me que acompanhava tanto os ensaios, que cheguei a decorar as falas de quase todos. Tem uma cena na peça que o garoto de rua assalta uns turistas que surgem e para complementar estes figurantes meu pai me colocou na cena para acompanhar os demais. Afinal, de tanto assistir os ensaios eu conhecia as marcações. Esta foi a minha primeira participação numa peça de teatro. Dali em diante, eu comecei a participar das oficinas, não mais como plateia e sim como aluno.

Paralelo à Assessoria de Ação Cultural, o coordenador cultural, Véscio Lisboa também coordenou o “Programa de Criança”, da PETROBRAS6e meus pais me colocam neste programa. No mesmo, eram oferecidas várias oficinas culturais e os alunos participavam de apresentações. Lembro-me que fui colocado no elenco da peça “Chapeuzinho Vermelho”, de Maria Clara Machado para fazer uma das árvores e um tempo depois pedi a meu pai que me tirasse do Programa de Criança por não ter gostado de fazer teatro.

Eu cresci assistindo peças de vários grupos de Macau e de outras cidades. Acompanhei meu pai ministrando várias oficinas e por conta disso, sempre achei mágico estar no lugar da plateia. Não tinha muita noção de como era estar em cena e dentro deste projeto, fui colocado no elenco de “Chapeuzinho Vermelho”. Apesar do texto que recebi para falar ser muito pouco, o meu encanto havia sido quebrado,

6 “O Programa de Criança Petrobrás é um programa voltado para crianças na faixa etária de 7 a 16

anos e 11 meses, oriundas de famílias de baixa renda. O projeto tem como objetivo a melhoria da qualidade de vida e ampliação das possibilidades educacionais, culturais e existenciais das crianças e adolescentes atendidos pelo Programa, proporcionando-lhes a possibilidade de construção de um projeto de vida fundamentado em valores e princípios éticos e de cidadania” (CEPE, 2018, n.p.).

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pois tive que decorar falas e fazer leituras repetidas da peça por vários encontros. Vale ressaltar que nessa época eu tinha apenas sete anos de idade.

Véscio Lisboa fica à frente da cultura como coordenador durante um ano e

meio e com sua saída meu pai passa a assumir o seu lugar, dando continuidade aos trabalhos da Assessoria de Ação Cultural, que pertencia na época a Secretaria de Educação do município. À frente da Cultura, além de vários projetos novos, meu pai deu continuidade ao projeto “Intervenção Cultural – 100 dias de Cultura em Macau”. Durante este período acontecia na cidade programações culturais de todas as categorias artísticas, como exposições de artes, feiras artesanais, palestras, apresentações diversas, lançamentos de livros, noites de MPB, oficinas culturais diversas, entre várias outras atrações e ações.

Em 1999, Sebastião Alves Maia se forma como Professor de Teatro pela UFRN em Natal e volta a morar em Macau. Com sua chegada, ele passa a promover oficinas de teatro. Lembro que duas vezes por semana, saia uma Kombi à noite, para levar alguns alunos que moravam na COHAB para participarem destas aulas em Macau. Vários jovens e eu que participávamos da peça do meu pai na COHAB começamos também a absorver as aulas que eram ministradas em busca de aperfeiçoamento.

Neste período, aconteceram várias apresentações de teatro na cidade e boa parte dos artistas vinham de fora. Como eu já estava com um grande interesse pelo teatro eu fixava os olhos nas apresentações e, sobretudo, nos ensaios e comentários destes. Eu absorvia tudo e ia vendo “como se fazia”. Em 2000, já morando novamente dentro da cidade, meu pai continuava ministrando aulas de teatro, só que agora em Macau, e após participarmos de um cortejo da “Semana do Folclore” resolvemos batizar nosso grupo de alunos como “Grupo de Teatro Chama Maré”, no dia 22 de Agosto deste mesmo ano.

Ainda nesse período de Intervenção Cultural, após a apresentação de um grupo de Natal com a peça “As Noivas de Milho”, sob a direção de Rivaldino Santos, um diretor sergipano com práticas teatrais voltadas para o teatro de rua. Este diretor é convidado a voltar na cidade e ministrar aulas de “teatro de rua” e “perna-de-pau” dentro da programação da Intervenção Cultural. Nosso grupo estava trabalhando na montagem da peça “A Herança do Tio Barnabé”, de Márcio Maia, para apresentar no fechamento da “Intervenção Cultural” como resultado das oficinas de Teatro que havíamos tido com meu pai. Todos os alunos de teatro deste tempo foram

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direcionados a fazer oficinas com o Dino, como o chamávamos. As aulas aconteceram durante o dia com uma turma pela manhã e outra à tarde. À noite, como aconteciam nossos ensaios, Dino passou a nos acompanhar e a nos orientar assumindo a direção de nossa peça.

O período em que ele passou por Macau foi exatamente o período em que houve uma reviravolta no teatro que fazíamos. O Dino trouxe até nós uma prática de teatro de rua com cantigas, perna de pau e tudo aquilo que nós não estávamos acostumados. Junto com ele veio mais três atores e uma atriz de seu grupo que os auxiliavam nas oficinas. Podíamos ver uma alta disciplina e dedicação de todos estes que trabalhavam com ele. Aprendemos bastante nesse período não só a prática teatral, mas também a como se dedicar inteiramente a estas práticas.

Com 10 anos de idade, havia aprendido com Rivaldino e sua equipe a andar de perna-de-pau, a fazer máscaras de gesso, a cantar várias músicas populares, a como apresentar na rua, a improvisar figurinos, a se virar com o que tinha para criar nossos cenários e aprendi uma grande quantidade de jogos teatrais e para quê serviam cada um deles. Claro que isto não foi em apenas uma única vinda de Rivaldino, houve outras vezes em que ele voltou para Macau para fortalecer nossas práticas teatrais. Com ele, além de “Herança do Tio Barnabé”, estreamos na mesma noite o nosso primeiro espetáculo de rua “Causos e Brincadeiras” como resultado de suas oficinas. Depois disto, com sua volta em outra ocasião, montamos “A Verdadeira História de Cinderela” (autor desconhecido), “O Matuto com Balaio de Maxixe” e “A Moça que Bateu na Mãe e Virou Cachorra”, ambas de José Pacheco em Linguagem de Cordel.

O grupo agora estava fortalecido e com vários integrantes novos que a esta altura, fazia-se necessário juntar toda esta equipe e dar seguimento a um novo grupo de teatro, a partir de tudo que aprendemos com Dino. Marcamos uma reunião numa manhã para combinar estratégias e criar um nome para nosso grupo. Lembro que surgiram vários nomes na ocasião, inclusive a proposta de seguir com o “Chama Maré”. Contudo, tínhamos um nome sugerido por Ceição Martins que gritou em nossos corações por sempre gostarmos de colocar coisas de nossa terra dentro de nossas montagens. Assim surge o Grupo Teatral Amagoa. A palavra Amagoa tem o mesmo significado da palavra Macau que, segundo escreveu o pesquisador

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Macau é o único município do Rio Grande do Norte e no Brasil, a possuir nome no idioma chinês. [...] Macau é uma contração de

Ama-goa ou Ama-kao, valendo ‘porto de ama’, ‘abrigo de ama’. Ama é a

deusa Neong-ma, protetora dos navegantes, dizendo-se comumente ‘Ma’ por ‘Ama’ (CASCUDO, 2002, n.p.).

Até hoje, mantemos a data de fundação 22 de agosto de 2000 por entendermos que surgiu aí a proposta de criar um grupo de teatro. Com as peças em repertório, o grupo tinha a coordenação de Valdemir Nunes e as cenas iam sendo adaptadas ou remontadas por nós atores seguindo a base de tudo que havíamos apreendido com Dino.

Assim, seguimos por quatro anos como um grupo pertencente à Assessoria de Ação Cultural. Foi um período de bastante investimento no grupo, uma vez que tínhamos na coordenação da Ação Cultural o meu pai e ainda como prefeito o médico José Antônio Menezes de Sousa, que, como falei anteriormente, investia bastante na cultura e nos artistas. Com isso, o grupo só veio a crescer e rapidamente começamos a apresentar em outras cidades. Duas participações que nos marcaram bastante no início de nossa trajetória foram dois eventos que aconteceram em Natal e que nos deram um impulso no aprimoramento de nossas atividades.

A primeira foi a “II Semana do Teatro Nordestino” em 2003, quando passamos uma semana em Natal assistindo palestras e assistindo a várias apresentações de artistas consagrados do nosso estado e de outros. O evento aconteceu no Teatro

Alberto Maranhão e na Capitania das Artes. A segunda foi a 3ª Mostra Potiguar de Artes Cênicas em 2004, em que apresentamos no Teatro Municipal Sandoval Vanderlei em Natal, a peça “A Moça que Bateu na Mãe e Virou Cachorra”. Esta

participação foi muito importante para todos nós, não só pela apresentação em si, mas também pelo momento de troca com outros grupos.

Neste meio tempo já havia sido inaugurado três pontos de cultura em Macau, sendo o primeiro o teatro “Porto de Ama – Centro Petrobrás de Cultura” inaugurado em 14 de Setembro de 2002; depois veio o “Teatro Municipal Hianto de Almeida”, inaugurado em 16 de Agosto de 2003 e que hoje se encontra em ruínas; e por fim, a “Casa de Cultura Popular” inaugurado pelo estado em 19 de Maio de 2004, denominada “Palácio dos Salineiros de Macau” e quem também se encontra em ruínas. Estes espaços foram de grande valor para a expansão de nossas práticas

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teatrais, pois além de fortalecer nossas apresentações, presenciávamos de vez em quando grupos de fora e mais uma vez absorvíamos o máximo que podíamos contemplando os espetáculos. Apesar de nos dedicarmos quase sempre ao teatro de rua, aprendíamos bastante com o que víamos nos palcos. Na verdade nossas peças sempre eram montadas para a rua e dessa forma, conseguíamos adaptá-las em espaços convencionais ou não.

No final de 2004, próximo ao fim da gestão do prefeito José Antônio de Menezes Souza resolvemos dar continuidade ao grupo de forma totalmente independente. Foi aí que o grupo começou a perder forças. As apresentações começaram a diminuir e juntamente com elas nossos encontros semanais. Neste período perdemos vários integrantes e cada um começou a se dedicar em outras áreas de suas vidas.

Nesse período de transição, recebemos o apoio do ator e comediante

Edicharles Bezerra que nos acompanhou algumas noites e com ele tentamos

remontar as peças com novos atores e atrizes no elenco. Mas tivemos alguns desentendimentos com os criadores das esquetes e começamos a desanimar ainda mais com os ensaios. Até que em um determinado momento, paramos de nos encontrar de vez.

Neste meio tempo de minha adolescência, eu já havia ministrado algumas oficinas de teatro acompanhando meu pai. Além dos estudos, eu me dedicava muito ao teatro e mesmo sendo adolescente, estava mais do que provado para mim o que eu queria seguir como profissão. Quando veio esse período de recaída do grupo, foi muito angustiante para mim, pois os encontros à noite eram os momentos mais esperados por mim.

Lembro-me de por várias vezes pegar uma antiga bicicleta que eu tinha e sair de casa em casa dos antigos integrantes entregando convites a todos para participarem de reuniões e debater a continuidade do grupo, mas sempre aparecia uma ou duas pessoas. Entre elas, havia uma pessoa que sempre esteve ao meu lado nestas tentativas de continuidade e que ainda continuou trabalhando comigo à frente do grupo por alguns anos, a atriz Rejane Laura. Entre idas e voltas, também tive o apoio de Hans Grazzyany, irmão de Laura. Ambos começaram a fazer teatro no início do Grupo Amagoa em Macau.

Em 2005, finalmente me veio a ideia de começar do zero, convidar novas pessoas, oferecer aulas e aos poucos reconstruir o grupo novamente. Assim o fiz,

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chamei amigos da escola que por sua vez, convidaram outros amigos e em pouco tempo, comecei a dar aulas de teatro reunindo tudo que havia aprendido. No período em que estava “parado” enquanto lutava por reerguer o grupo, passei várias noites em casa fazendo anotações e criei um caderno com as letras de todas as músicas que havia aprendido com Dino e uma lista de todos os jogos que lembrava que havia feito. Assim, eu tinha a minha própria “bibliografia teatral” e muita empolgação para repassar tudo que sabia.

Por ter reerguido o grupo, passei a coordenar o mesmo com o apoio de Valdemir Nunes, que uma vez ou outra sempre aparecia para ministrar uma oficina e participar das reuniões. Depois de um bom período de encontros semanais com treinamentos e jogos, decidimos nos dedicar na montagem de um espetáculo. Na metade de 2005 e com quatorze anos de idade, dava-se início a minha primeira direção de espetáculo. Se você me perguntar se é possível um adolescente desta idade dirigir um espetáculo teatral, sem medo de qualquer crítico da área eu direi que é possível sim. Quando surgiu esta oportunidade de direção, a única coisa que fiz foi me colocar no lugar da plateia e isso eu já sabia fazer desde pequeno e ia analisando o que funcionava ou não.

Minha primeira direção foi o espetáculo “O Casamento Num Convém”, de autoria de Valdemir Nunes. Um espetáculo projetado para a rua e para o palco. A estreia aconteceu no dia 09 de Dezembro de 2005 no Teatro Municipal Hianto de Almeida em Macau. Como faço aniversário em outubro, na minha estreia eu já estava com 15 anos de idade. Valdemir fez toda a produção cultural do espetáculo e assumia a parte burocrática. Repassei para ele tudo o que precisava e passamos a correr atrás juntos de cada material. Boa parte dos figurinos foram doados por um amigo carnavalesco da cidade, o “Manoelzinho de Binha” como era conhecido, juntando depois com outras peças de roupas que os atores conseguiram em casa com familiares.

O cenário contou com caixotes feitos por encomendas em serralheria e as telas de fundo pintadas pelo artista plástico da cidade, Herbert Martins. Na noite de estreia fizemos uma homenagem à Herbert pelo seu histórico artístico e apoio ao grupo. Mandamos confeccionar cartazes e espalhamos pela cidade e distritos. Com tudo pronto e a casa cheia, estávamos nós ansiosos para entrar em cena enquanto o Véscio Lisboa, nosso convidado, pronunciava algumas palavras na abertura. Tenho até hoje a filmagem deste dia na qual o Véscio fez a seguinte fala:

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Boa noite pessoal! Eu estou muito feliz hoje por muitas razões. Uma delas é estar aqui nesse momento com vocês quando está estreando como diretor de teatro na nossa cidade o Max, nosso ex-aluno do programa de Criança, que teve um ótimo desempenho lá. Apesar de que na época não tinha assim muito entusiasmo por teatro. Mas, uma sementinha que foi plantada lá e bem cuidada, bem regada, bem trabalhada e bem adubada pelo nosso amigo Valdemir no seu trabalho que vem desenvolvendo há anos em Macau. Estão os frutos já sendo colhidos. Isso é muito bonito. Porque eu acho fantástico a semente quando cai em gente. Porque você planta na terra, planta em muitos lugares e as vezes custa a produzir frutos. Mas quando se planta em gente, é semente inteligente mesmo. Não tem jeito de morrer. Ela se desenvolve rapidinho que é uma beleza e produz frutos fantásticos (Véscio Lisboa, 2005. Arquivo pessoal gravado em mídia DVD).

Depois desta montagem o grupo retomou forças, cresceu e deste então as produções não pararam mais. Participamos de novos festivais, fizemos novas montagens, recebemos convites para apresentações dentro e fora de Macau, recebi convites para ministrar oficinas e palestras. Considero que minha prática teatral é mais voltada para os jovens, procuro me aproximar e incluí-los na sociedade como agentes fazedores de cultura. Desde 2004 até hoje, o grupo trabalha ministrando aulas de teatro na cidade.

Em 2009 criamos o quadro “Teatro de Rádio” no programa “A Voz da Cultura Macauense” criado há muito tempo por Valdemir Nunes e o artista plástico Herbert Martins, sendo reativado depois pelo Amagoa. No quadro, fazíamos leituras dramáticas de literaturas de cordéis na rádio com histórias bastante engraçadas. Em 2012, criei juntamente com a Cia. a “Escola Amagoa” onde eu pude oferecer aulas de teatro a toda cidade e descobrir novos artistas, trabalhando assim separadamente as produções do grupo e as práticas teatrais com novos integrantes.

Em Agosto de 2013 tirei meu registro profissional na DRT como Ator e Diretor e, com isso, a Cia. Amagoa passou a ser uma escola de teatro reconhecida pelo SATED RN, “Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do

Estado do Rio Grande do Norte”. Em 2014 abrimos em Macau uma delegacia

regional do SATED e me tornei diretor da mesma.

Fui professor de Teatro da Fundação Municipal de Cultura de Macau de 2013 a 2016, fundei pela Cia. Amagoa as trupes de humor “Borecos & Borecagens” e “Clowns & Alegria”; fui premiado com o “Troféu Arquivo Cultural” – Os melhores da

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Cultura de 2013 e 2014 em Macau na Categoria de Melhor Diretor e Espetáculo do Ano (Lanterna dos Afogados-2013 / A Guerra da Coréia de Macau-2014).

Em 2014 fui Coordenador de Cultura do Complexo Educacional Pe. João Penhas Filho onde também fui diretor do espaço Teatro Ginásio Nossa Senhora da

Conceição. Sou diretor geral da encenação da Paixão de Cristo em Macau há 12

anos realizado pela entidade CEMOP que desenvolve projetos até os dias de hoje. Com o grupo são mais de 17 anos de existência, sobrevivência e resistência. Sou o único ator que faz parte desde sua fundação. No grupo vivo as maiores alegrias da minha vida. Hoje, morando em Natal, conto com o apoio de dois diretores que também nasceram no grupo o Zezinho Lopes e o Raniere Santos. Dois grandes amigos que já há muito tempo caminham comigo no grupo e dedicam boa parte de suas vidas para manter o mesmo. Além deles, cito o Jardel Amorim que tem sido uma pessoa fundamental para manter o grupo de pé nos dias atuais, além de lógico, os demais integrantes do Amagoa.

Toda minha trajetória e maturidade teatral vieram com a vivência e troca com amigos fazedores de teatro. Mas eu sempre soube que me faltava aprender mais e fundamentar toda essa vivência em estudos teóricos do teatro. Foi quando em 2014 decidi tentar entrar para o Curso de Licenciatura em Teatro da UFRN em Natal. Era uma decisão difícil porque eu tinha que abrir mão de muita coisa para poder morar em Natal e me dedicar na vida acadêmica. Assim fiz, no final de 2014 veio o THE (Teste de Habilidades Específicas) e em 2015 ingressei no curso.

Estava bastante empolgado em fundamentar toda minha prática, além de aprender várias coisas novas. Casei-me nesse mesmo período, início de 2015, com Ana Carla Lima de Souza e fomos morar na capital com toda a novidade de vida de casados e longe dos parentes. Passei o ano de 2015 e 2016 indo quase todos os finais de semanas à Macau para ministrar aulas de teatro pela Fundação Municipal de Cultura.

A chegada à Universidade foi de início muito empolgante e ao mesmo tempo cheia de receios. Deparei-me com várias formas teatrais que pareciam ter uma grande distância das minhas práticas teatrais no interior. Claro que tudo aquilo tinha importância na minha formação e eu também não poderia julgar o curso logo no seu início. Contudo, na medida em que os semestres iam passando eu me distanciava cada vez mais do teatro popular que eu aprendi e gostava de fazer. Confesso que cheguei a ficar desestimulado. Venho de um teatro popular, venho da rua, venho

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dos textos em cordéis, das cantigas de roda, das danças populares, não tem como meu teatro não envolver tudo isso. Na verdade, sempre busquei assumir isso. Não que eu tenha me fechado a outras formas teatrais na universidade, pelo contrário, minha base teatral hoje foi muito mais fortalecida depois de conhecer e passar por diversas outras estéticas teatrais. Mas eu precisava me encontrar novamente em meio a tudo isso.

Foi nesse momento que percebi que eu precisava voltar às minhas origens, entender melhor o meu teatro, fundamentá-lo e me encontrar novamente nessa reta final de curso para só assim, definir um caminho teatral a ser trilhado daqui para frente. Não só o meu teatro, mas minha vida inteira tem influência de minha cidade e da sua cultura popular. Voltar às minhas origens exatamente no final do curso era a peça que faltava para que eu pudesse fechar este ciclo. E unir minha vivência teatral do interior às práticas pedagógicas teatrais que desenvolvi na universidade.

Aqui estou numa viagem de volta a Macau para entender quem sou e o que me pertence. Como escreveu o comandante de embarcações e escritor, Amyr Klink (2000, p. 35): “Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas próprias árvores e dar-lhes valor”.

1.2 O CONTEXTO DA PESCARIA EM MACAU

Tendo relatado o meu encontro com o teatro, proponho a partir de agora retratar o contexto da pesca em Macau e a seguir, partilhar sobre o meu encontro com os pescadores. Nesta parte do texto, abordo um pouco sobre a nossa riqueza natural que tanto me inspirou na montagem do espetáculo.

Macau é conhecida como a “terra do sal” por ser o maior produtor de sal marinho do Brasil. Contudo, não é somente da exportação de sal que depende a economia desta terra. Segundo o site oficial da Prefeitura da cidade (2018), a economia de Macau tem sustentação também no gás natural e no petróleo através da extração marítima e terrestre. A pesca artesanal e a comercialização de peixe, lagosta e camarão são muito importantes na economia da cidade.

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Ao tentar me aprofundar sobre a pesca de Macau, percebi que pouco temos de registro sobre nossas atividades pesqueiras. Acredito que isso contribua também para a desvalorização da mesma. Além de não existir perfis registrados sobre a pesca e os pescadores, os últimos dados de produção coletados pela prefeitura da cidade são de 2003.

No que diz respeito a informações diversas de Macau, penso que nossa maior conquista tenha sido o livro “Um Rio Grande e Macau” de Getúlio Moura (2003). Neste livro podemos encontrar a história da cidade, a cultura, entrevistas, acontecimentos, entre outros. Nele também encontramos alguns dados da pesca de Macau. Getúlio afirma que em 2002, Macau continuava sendo um dos maiores municípios pesqueiros do Estado (MOURA, 2003).

Quando buscamos esta atividade dentro da história do município, percebemos que a pesca sempre fez parte do contexto da cidade antes mesmo de sua fundação. Moura afirma que,

Talvez tenham sido os índios tremembés, um povo mais antigo, os primeiros a se utilizarem do estuário de Macau como fonte de alimento. E os últimos, antes da colonização, foram os índios Tarairiú, a grande nação da bacia hidrográfica do rio Açu. (MOURA, 2003, p. 215).

Assim, sabemos que a pesca sempre fez parte da história de nossa fundação, uma vez que os índios têm a pesca como uma de suas principais atividades.

A pesca artesanal começa a se tornar uma atividade tradicional e econômica em Macau, a partir de meados do século XVII, quando salineiros e pescadores foram aos poucos se estabelecendo em Guamaré e Macau (MOURA, 2003). Hoje ela é realizada de diversas formas: na costa, nas enseadas, nas marés e sua maior parte em alto mar. Os peixes podem ser adquiridos diretamente com os pescadores e isso torna mais atrativo o pescado em Macau por causa do baixo preço em relação aos grandes comércios.

Em Macau, existem vários pontos de atividades de pesca e comunidades pesqueiras. Entre elas, destacam-se: Barreiras, cerca de 22 km da cidade; ao lado de Barreiras, a comunidade de Diogo Lopes, cerca de 25 km de Macau e 3km de Barreiras; a Ilha de Santana, comunidade ao lado da cidade, fazendo apenas a travessia pela ponte sob o Rio Açu Piranhas; o Bairro dos Navegantes, uma

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comunidade com trapiche sob o Rio Açu Piranhas onde concentra-se uma atividade de pesca. E, por fim, o lugar de minha infância e inspiração para minha peça, o Porto da Pescaria, situado no Bairro Porto São Pedro, um dos principais portos de pesca dentro da cidade e habitada por uma comunidade de famílias de pescadores. O porto encontra-se na costa da cidade, de frente para mangues e maré, com enseadas para o Oceano Atlântico.

Segundo registros, Diogo Lopes é a comunidade pesqueira do município responsável por 80% do pescado da cidade. Produz cerca de 30.000 toneladas/ano só de sardinha (MOURA, 2003). Em Abril de 2011 foram divulgados números que afirmam existir em Macau cerca de 1.100 pescadores no geral e 329 embarcações veleiras e motorizadas. A cidade também ocupa a segunda maior produção entre os 25 municípios litorâneos do Rio Grande do Norte, perdendo apenas para a capital que pratica a pesca industrial (LUZ, 2013).

Um fator importante para a pesca de Macau foi à criação da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Ponta do Tubarão (RSDPT). Esta reserva foi criada em Julho de 2003 e constitui-se em uma Unidade de Conservação (UC) de uso sustentável (SNUC, 2002). Em outras palavras, esta reserva está voltada para a preservação dos recursos naturais e a sustentabilidade da comunidade local. Ela engloba uma parte dos municípios de Macau e Guamaré, sendo em Macau as comunidades de Diogo Lopes, Barreiras e Sertãozinho.

A criação desta reserva tem um marco muito importante para os pescadores uma vez que esta foi resultado de um longo período de luta pela preservação ambiental. A bióloga Thelma Lúcia Pereira Dias aponta em sua tese de doutorado

“Os Peixes, a Pesca e os Pescadores da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Ponta do Tubarão (Macau-Guamaré/RN), Brasil” em 2006, que esta mobilização deu

início depois da população sentir-se ameaçada por um grupo de italianos que estavam tentando construir um hotel na região. Para isso, foi solicitada à Gerência Regional do Patrimônio da União a mudança da restinga da área proposta para a construção. Em 1995 houve muitas manifestações da população e suas reivindicações foram atendidas.

Depois da luta vencida, no ano de 2000 surgiu outra empresa que ao tentar construir viveiros de camarão dentro de uma das ilhas do manguezal, queimaram quatro hectares de mangue. A população ao barrar este acontecimento, fortificou as reivindicações e enviaram pedidos aos órgãos ambientais, estadual e federal, para a

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criação da reserva (DIAS, 2006). Como falado anteriormente, esses registros são fundamentais, pois além da preservação de nossa cultura ajuda na valorização destas atividades.

Apesar de Macau ter um grande destaque na pesca artesanal, acredito que ainda falta uma valorização maior e até mesmo um melhor aproveitamento econômico desta área. A falta de iniciativa neste aproveitamento faz com que o valor comercial do pescado seja baixo, embora este não seja o problema central. Esta área que cobre a reserva tem uma alta produção pesqueira, mas quando se tem uma alta produção e uma grande desvalorização, a alta produção acaba sendo um problema, pois acaba levando a uma diminuição no tamanho e volume do pescado.

Quanto às colônias de pescadores, temos a Colônia Z-41 em Diogo Lopes e a Z-09 em Macau. Focando agora para as áreas corespondentes às comunidades dentro da cidade, a Colônia de Pescadores e Maricultura Z-9 de Macau tem seus trabalhos voltados para as atividades de associações de defesa de direitos sociais. As informações publicadas no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica data a fundação da colônia criada em 09 de outubro de 1974. Segundo informações publicadas pelo jornalista Alex Gurgel no site “Macau em Dia” em 21 de abril de 2011, afirma que:

Conforme o presidente, a Colônia de Pescadores de Macau Z-09 possuem 504 pescadores colonizados, dos quais 380 homens e 124 mulheres (marisqueiras), entretanto menos de 100 desses associados estão regularizados. A Colônia de Diogo Lopes possui 460 pescadores e 20 marisqueiras (GURGEL, 2011, n.p.).

Na matéria, o presidente relata na entrevista sobre as dificuldades que tem de manter um trabalho relevante voltado para os pescadores. Segundo ele, por vários pescadores não pagarem à colônia, isso impede que seja desenvolvido um trabalho para beneficiar os próprios pescadores. Ao mesmo tempo, relata a falta de convênios por parte da prefeitura da cidade. Ainda na mesma matéria ele fala também da falta de zelo dos pescadores.

De um modo geral, todas estas questões fazem com que as atividades da pesca artesanal sejam cada vez menos valorizadas. Atividades estas que têm uma grande importância não somente por ser fonte de renda de diversas famílias, mas também por trazer “o pão” a grande parte destas comunidades. Segundo Getúlio

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Moura (2003), de todo o produto de pesca, 50% são repassados às bancas do

mercado público de Macau e restaurantes, enquanto a outra metade do produto vai para a Capital e demais cidades.

Sobre os tipos de barcos Getúlio afirma que “(...) Hoje, pelos rios de Macau, deslizam os batelões à pano, à zinga ou à vara; no mar vão os veleiros, os botes de convés” (MOURA, 2003, p. 215). E, sobre os tipos de pescaria, vemos que “A pescaria ribeirinha é feita com tarrafas e redes de malhas média e pequena; no mar são utilizadas grandes redes de malhas média e grande, e espinhéis (vários anzóis numa só linha, fundeados e sinalizados com boias)” (ibidem, p. 215). Contudo, afirma que o pescado que já foi outrora abundante está cada vez mais escasso e que algumas espécies comuns já não são mais apanhadas, a não ser quando um ou outro exemplar cai na rede raramente (MOURA, 2003).

Mesmo a pesca artesanal em Macau esteja sendo pouco valorizada, considero um fator importante para o avanço do mesmo a criação do curso de Recursos Pesqueiros (RP), no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia, o IFRN Campus Macau. O Instituto está localizado na COHAB, distrito da cidade, e foi inaugurado em 20 de Agosto de 2009. Os primeiros cursos oferecidos no IFRN Macau foram Biologia, Química e Recursos Pesqueiros, visando justamente contribuir com a economia local e a formação de alunos para os mesmos.

No projeto pedagógico do curso técnico de nível médio em Recursos Pesqueiros (aprovado pela Resolução Nº 38/2012-CONSUP/IFRN, de 26/03/2012), vemos o seguinte objetivo:

O Curso Técnico Integrado em Recursos Pesqueiros, presencial, tem como objetivo geral formar técnicos de nível médio, com competência técnica, ética e política para desempenhar suas atividades profissionais, nas atividades de captura e de cultivo de organismos que tenham como principal habitat a água para seu aproveitamento integral na cadeia produtiva, com segurança de qualidade e sustentabilidade econômica, ambiental e social. (IFRN, 2011, p. 8)

Como exemplo da contribuição do curso de RP para a pesca local, destaco as atividades realizada pelos alunos e professores do curso nas comunidades pesqueiras de Macau com interferências educativas. O objetivo do trabalho foi promover a divulgação dos conteúdos científico-tecnológicos do curso através de

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práticas educativas, valorizando a atividade pesqueira, o sentimento de pertencimento de pescadores, pescadoras, marisqueiras, e seus familiares. Desta forma, contribuindo para que os pescadores e marisqueiras acompanhem o desenvolvimento global, garantindo melhorias em suas condições de trabalhos, evitando a total descaracterização de seus aspectos socioeconômicos e culturais (MACEDO; MENDES; SANTOS et. al., 2012).

Estas atividades iniciaram em julho de 2012, na qual os alunos e professores visitaram a Colônia de Pescadores Z-09 em Macau e apresentaram o projeto e equipe executora ao presidente e vice-presidente da colônia. No trabalho desenvolvido pela equipe, vemos a metodologia aplicada da seguinte forma:

Foi explicada a flexibilidade das atividades do projeto à realidade da comunidade pesqueira local, tanto para as capacitações ofertadas (quais serão prática da navegação marítima, assistida por GPS e carta náutica, boas práticas pesqueiras, e técnicas de gestão para a atividade pesqueira), como também para o período de realização das mesmas. Foi realizada capacitação da equipe executora através de reuniões periódicas, além de troca de experiências sobre atividades extensionistas, e também de materiais didáticos sobre Andragogia (a arte de educação voltada a adultos) (MACEDO; MENDES; SANTOS et. al., 2012, n.p.).

Os alunos realizaram uma pesquisa através de visitas nas casas dos pescadores e marisqueiras de setembro a outubro, fazendo um levantamento socioeconômico de cada um. A Colônia foi fundamental nesse processo de cadastramento. Para esta primeira capacitação foram inscritos 50 participantes dentre pescadores e pescadoras, marisqueiras e jovens. Os encontros foram discutidos junto aos participantes ficando 2 finais de semanas a cada mês (totalizando um mês, cada). Como relatado pela equipe

Através da aplicação dos questionários, observou-se que os interessados, em sua grande maioria, são alfabetizados, alguns já com ensino fundamental ou médio concluído, o que permitirá maior abordagem dos assuntos com material impresso (MACEDO; MENDES; SANTOS et. al., 2012, n.p.).

Espera-se que através desta atividade, que os pescadores e marisqueiras possam adquirir conhecimentos para ampliar a gestão técnica de seus afazeres. Desta forma, tenham melhores condições de trabalhos, uma melhor conscientização

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sobre a localização e a segurança no mar, a vender seu peixe de forma mais apropriada. E claro, a gestão financeira da atividade adquirindo conhecimentos de como melhorar a questão socioeconômica tornando- a suficiente para a renda das respectivas famílias.

Por fim, o contexto da pesca em Macau vem tendo ao longo do tempo os seus altos e baixos. Esperamos que estes projetos de extensão do curso de RP do IFRN possam dar voz a estas comunidades, assim como dar continuidade ao aprimorando das atividades de pesca. Contudo, faz-se necessário que, além disto, as autoridades competentes possam estar sempre contribuindo com estas atividades através de convênios, e dessa forma, a economia pesqueira em Macau possa crescer ainda mais. O que seria algo benéfico para todos nós macauenses.

1.3 MEU ENCONTRO COM OS PESCADORES

Tendo apresentado o contexto da pesca em Macau, trago neste capitulo o meu encontro com os pescadores e como os observei durante as entrevistas, que em alguns momentos misturavam-se a contações de histórias. Descrevo a partir destes encontros, como pude perceber a espetacularidade de cada um daqueles pescadores ao darem seus depoimentos. Assim como escreveu o encenador Peter Brook:

O teatro não tem categorias, é sobre a vida. Este é o único ponto de partida, e além dele nada é realmente fundamental. Teatro é vida. [...] Para se fazer teatro somente uma coisa é necessária: o elemento humano. Isto não significa que o resto não tenha importância, mas não é o principal (BROOK, 1999, p. 7-12).

Cresci na no bairro de pescadores ouvindo várias histórias de sobre o que acontecia em alto mar, muitas vezes histórias curiosas e cheias de riscos. Como toda criança com imaginação aguçada, eu sempre ouvia as histórias imaginando como elas haviam acontecido. A contação de histórias ajuda no desenvolvimento do raciocínio da criança e na sua criatividade.

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Dentro de casa, sempre gostei de sentar numa roda e ouvir causos. Alguns deles eram comentados por minha avó ou minha mãe. Por meu avô ser pescador, ele sempre falava das situações que ele enfrentava no mar. Não somente as dele, mas também histórias antigas sobre alguns casos e curiosidades de pescadores que já tinham morrido. Contudo, pouco me recordo de como conheci estas histórias, pois na verdade o que ficou gravado na minha cabeça foi mais as próprias histórias contadas pelos pescadores, do que os pescadores contando as histórias.

Sempre tive vontade de fazer um espetáculo que fosse inspirado nestas referências. Quando me veio a oportunidade do TCC, fui recolher estes materiais diretamente com os pescadores. Eu precisava ver e ouvir pessoalmente cada um deles contando as histórias para entender como seus corpos contavam essas histórias.

O recorte geográfico onde foi desenvolvida a minha pesquisa se chama Porto da Pescaria, lá se concentra uma comunidade de pescadores situada em Macau/RN. Antes de ir até lá, relacionei os nomes de quem eu iria procurar, pois seria quase impossível ouvir todos os pescadores e suas histórias.

Busquei conversar com pescadores que, de certa forma, fizeram parte da minha infância, mesmo que indiretamente. Os escolhidos foram os seguintes pescadores: Raimundo, João Batista (conhecido por Galego) e meu avô Cícero (conhecido por Cicinho). Também escolhi uma marisqueira e mulher de pescador chamada Sueli. Com Raimundo, Galego e meu avô a conversa foi realizada ao mesmo tempo e o assunto foi sobre a vida de pesca no mar de um modo geral. Ambos relataram não só histórias deles, mas também de outros pescadores que eles conheciam.

Já com a Sueli, o assunto acabou girando em torno da ansiedade e da preocupação de quem fica em terra esperando a volta dos companheiros. Além deste tema, no relato da marisqueira também apareceram fatos da vida naquela comunidade.

Ressalto, que mesmo tendo ido ao Porto, não existe um momento próprio ou um lugar específico onde eles compartilham suas histórias. Elas podem surgir num papo de calçada, no rancho onde fazem suas redes ou até mesmo entre eles durante o trabalho. Na verdade, basta alguém puxar o assunto, que as histórias brotam e fluem uma após a outra. No meu caso, especificamente, pedi ao meu avô

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que me levasse ao rancho de Raimundo e Galego para que eu pudesse conversar com eles. Os dois não estavam esperando a minha chegada.

Achei melhor não avisar, porque não queria que eles se preparassem para contar as histórias, eu queria que tudo acontecesse da forma mais natural possível. Da mesma forma foi com Sueli, fui até sua casa sem que ela estivesse esperando minha chegada.

O Porto da Pescaria é uma região popular, a pesca artesanal é a principal renda desta comunidade. Esta atividade é repassada de geração em geração pelas famílias que buscam através da pesca o sustento. Este modo de vida traz consigo situações de perigo e aventuras que são rapidamente compartilhadas por viverem em comunidade. Todo morador desta comunidade saberá contar pelos menos uma destas histórias vividas em alto mar, e é neste momento de compartilhamento que a memória ocupa um papel importante de registro, já que não existem muitos documentos sobre essas vivências.

A narrativa oral nesse caso é de suma importância para preservar a memória daquela comunidade. Estar numa destas rodas de conversa com os pescadores é uma experiência tão rica quanto assistir a uma peça teatral. Tem narrador, personagem, fábula, conflito, as imagens da narrativa muitas vezes repercutem no corpo e na voz destes pescadores, mesmo que eles não se deem conta desta teatralidade que aparece através da sua espontaneidade.

Na medida em que as histórias são contadas, é possível viajar com a imaginação. Durante as histórias, os pescadores conseguem situar muito bem o tempo e o espaço da ação e facilmente, nós ouvintes, entramos na dimensão física e psicológica das personagens que compõem aquelas histórias.

O primeiro encontro com os pescadores, João Batista, Raimundo e meu avô Cícero, se deu no dia 22 de Janeiro de 2017. Ambos pescam juntos há muitos anos. Minha família de vez em quando gostava de fazer passeios de barco nos finais de semana para uma costa que se chama “Pontal dos Anjos”. Em quase todos estes passeios o barco que utilizávamos era o de Raimundo, uma navegação denominada de “Charmoso”. Assim, Raimundo e Galego estavam sempre conosco nestes passeios e é daí que vem a minha aproximação com estes pescadores.

Inicialmente, meu avô e eu nos dirigimos até a comunidade em direção ao rancho de Raimundo. Ao chegarmos lá, encontramos no local somente o João Batista. Meu avô falou para ele que eu queria saber sobre as histórias contadas

Referências

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